Boa noite, Aquiles ✓

By sofianeglia

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" O olhar dava medo e eu quase perdi o sorriso o qual tentava seduzir ela do rosto. - Esquece, porque i... More

intro + sinopse
0. prólogo
1. ela procura
2. ele tem que sair
3. ela se nega
4. ele cozinha e convence
6. ele quebra uma das regras
7. ela não consegue dormir
8. ele chega de madrugada
9. ela conhece o resto do grupo
10. ele não quer ela no grupo - pt.1
10. ele não quer ela no grupo - pt.2
11. ela não consegue dormir de novo
12. ele quebra mais uma regra - pt.1
12. ele quebra mais uma regra - pt.2
13. ela tenta ser simpática - pt.1
13. ela tenta ser simpática - pt.2
14. ele conquista algo
15. ela vira gelo
16. ele é fogo
17. ela vê o que não quer
18. ele sente o que não queria
19. ela cozinha e chora (repostado)
20. ele fica
epílogo
epílogo olímpios
nota final
OLIMPIOS REESCRITO!!

5. ela estabelece as regras

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By sofianeglia




5. ela estabelece as regras

Muitas coisas tinham acontecido em um curto período de tempo. Uma das coisas foi que eu tinha tomado a louca decisão de aceitar Aquiles como meu colega de apartamento. Essa decisão foi, na realidade, o motivo principal de todas as outras infelicidades acontecerem, e o motivo de eu estar tão apreensiva enquanto esperava o próprio peste chegar com as suas caixas de mudança.

Com essa decisão, eu já tinha perdido a cabeça em função do estresse e quebrado dois pratos, os quais eu ia ter que gastar dinheiro e os repor, porque tinha ainda o sentimento de que logo o meu apartamento estaria cheio de pessoas que eu não conhecia, e eu teria que ter pratos para elas mesmo que eu odiasse a ideia de outras pessoas frequentarem minha casa.

Essa era a infelicidade maior: reconhecer que, ao aceitar, teria que abrir mão de algumas coisas. Relutantemente? Sim. Mas em respeito e como uma forma de fazer ele se sentir melhor, pois eu ia com certeza cobrar que todas as minhas regras fossem postas em prática e ia fazer a vida dele no máximo um inferno. Era uma brecha para ele convidar alguns familiares e reclamar de mim, algo que sabia que ia se tornar necessário.

Eu não ia pegar leve com ele.

Estava repensando como proceder a parte de fazer a vida dele um inferno, já que ele estava atrasado e aquilo só alimentava a raiva que eu estava guardando como um animal de estimação. Era uma ótima oportunidade para já começar a impor as regras, mas acabei me desligando.

Lucas não sabia do que estava acontecendo, e eu estava preocupada que a minha sede de vingança fosse alertar os vizinhos, o que imediatamente significava que eles iriam ligar para o meu (ex) namorado.

E, suspirando, admiti que queria ligar, e talvez quisesse que outros ligassem. Se ele soubesse que era Aquiles que viria morar comigo, talvez criasse um tipo de ciúmes e alguma motivação para ele voltar ao apartamento, mas ele me atender era ainda improvável e causar ciúmes de propósito não era correto.

Girei o telefone nos meus dedos, sentando na calçada na frente do prédio. As ruas estavam quietas demais para um sábado de noite, eu ainda estava com as roupas do meu trabalho: uma calça preta de linho, camiseta social branca e uma gravata vermelha com listras pretas. Eles exigiam a vestimenta mais comportada, e eu podia muito bem usar um vestido como todas as outras colegas, mas preferia as calças.

Assim não corria o risco de acabar quebrando mais uma vez a mão de algum homem executivo que adorava e se achava no direito de passar a mão nas mulheres só porque suas pernas estão a mostra. Não era como se eu gostasse de ser assim, mas tinha se tornado um reflexo, e eu estava na minha contagem de quatro no total, e não só no trabalho.

Se isso acontecesse lá mais uma vez eu perderia o emprego e já estava sofrendo para pagar as minhas contas do jeito que estava. Nisso, lembrei exatamente porque tinha concordado com Aquiles e a raiva diminuiu, abrindo espaço para a frustração.

Passando as mãos no rosto, deixei meu pulso cair e olhei as horas. Sabia que era demais esperar pontualidade, mas ainda tinha expectativa que ele não passaria de 20 minutos de atraso, o que meu relógio mostrava cinco para fechar exatamente esse limite.

Suspirando de novo, vi os ponteiros seguindo os seus mesmos caminhos rotineiros, escutei os carros acelerando e buzinando. Senti meus olhos começarem a cair por causa da fadiga que os meus dois trabalhos e esperar por Aquiles causavam.

Não era divertido estar naquela posição, não era como eu esperava estar.

Mas era exatamente onde eu estava, então, o que isso mostrava de mim? Limpando meus olhos de novo, estralei meu dedos, tentando alimentar o meu tédio com barulhos que não fossem dos poucos carros contra o asfalto e o silêncio da noite.

Quando bateu um minuto para fechar os 20, uma caminhonete preta estacionou perto do meu prédio. Eu olhei, ainda sentada, enquanto ela fazia todos os movimentos calculados para estacionar em perfeita distância do meio fio. O brilho da luz da rua batendo contra a cor escura do carro.

Eu me levantei, sem saber exatamente se era o meu futuro importuno ou não, minhas mãos contra o chão e então contra a minha calça escura, limpando a sujeira e questionando quantas vezes já tinha colocado aquela calça para lavar, tentando lembrar no meio daquele caos se eu precisava colocar na lista os materiais de limpeza.

Encarando o veículo, fiquei mais apreensiva ainda quando um homem de cabelos castanho claro saiu do lado do motorista. Ele vestia uma camiseta normal e um rosto igual o meu: incerto.

Sem tardar, ele me encarou, ainda vestindo um sorriso sem certeza. Minhas sobrancelhas se juntaram enquanto eu via uma espécie de esperança entrelaçada nos seus olhos, e então Aquiles saiu do lado do carona, e a raiva tomou conta do meu corpo.

— Demorou o suficiente. — Falei, não me importando com o amigo que ele tinha trazido junto. Meus braços se cruzaram, e sob o olhar dele senti uma necessidade maior de cobrir o meu corpo. Seus olhos cruzaram da minha gravata até os meus saltos, e algo sobre os seus olhos curiosos e o rosto confuso faziam eu ficar envergonhada. Não gostava de me sentir daquele jeito.

O amigo dele deu uma risada, o que fez Aquiles olhar feio para ele, enquanto o motorista ia até onde eu estava. Ele era alto, tão alto quanto Aquiles, e o que mais me chamava atenção naquele homem era o fato de ele se mover confortavelmente, de um jeito que mostrava o quanto era seguro na sua pele sem perceber. Bem diferente de Aquiles.

— Tu deve ser a sortuda. — estendeu a mão — Meu nome é Apolo.

Olhando para a sua mão e de volta para o outro, minhas sobrancelhas se juntaram. — Que isso? Reunião grega? — Disse, com o meu mais formoso sarcasmo.

O homem riu, dando de ombros. — Podemos dizer que sim. Sou o irmão dele.

— Hm... — Respondi, ignorando sua palma estendida e olhando para Aquiles, que mordia seu lábio rosado e olhava incessantemente para a mão de quem eu descobri ser seu irmão. Confusa, dei um aceno com a cabeça e arrumei meus braços cruzados para que eles ficassem mais firmes contra meu corpo.

— Tá, tá, vamos descarregar as coisas. — Disse Aquiles, emburrado.

O modo como ele mudou de humor enquanto desceu do carro e ficou encarando tudo aquilo só fazia eu ficar mais irritada.

— Agora tu quer apressar as coisas, né. — Acabei comentando, revirando os olhos e querendo mostrar o quanto estava insatisfeita com o seu atraso. Ele ia acabar pagando por aquilo, mas eu ia esperar para falar tudo o que estava trancado quando não estivéssemos na presença do seu irmão.

Ele foi até a parte de trás da caminhonete, abrindo o tampão e mostrando quatro grandes caixas e uma mala igualmente grande. Olhando para mim, ele puxou a mala e levantou a alça na parte de cima. Seus olhos não pediam ajuda, e mesmo assim ele me entregou a mala. Alguma coisa dentro de mim se incomodou mais ainda com o fato de ele saber que eu queria de alguma forma me ocupar.

Por mais que evitasse admitir e por mais que odiasse Aquiles e seus maneirismos, queria me sentir útil ao ponto de esquecer o que estava acontecendo ali. Eu aceitar alguém conhecido por trovar tudo que andava, que me tinha como alvo, e que era minha última e única opção. Ele se botava ao meu dispor mesmo sabendo minha vontade de arruinar sua vida.

Com os lábios em uma linha estreita, Aquiles pegou duas caixas, enquanto seu irmão pegou as outras duas, apoiando elas no chão para fechar o carro.

— Ah, meu! Minhas coisas no chão, não! — Aquiles reclamou, seu rosto se juntando em desgosto, a cabeça caindo para um lado.

Essa é nova... — Apolo comentou, pegando as caixas do chão, e nada o outro respondeu. Ignorando mais uma vez tudo aquilo, me virei e entrei para o prédio, os dois seguindo logo depois.

Cada um carregando algo, passamos pelo porteiro e então até o elevador. Eu fingi que não conhecia nenhum, vivendo através daquele silêncio e o peso das nossas respirações no espaço confinado de metal, até chegarmos ao que seria o meu andar.

Pegando a minha chave, abri a porta do apartamento, me sentindo novamente brava com toda a aquela situação.

Dinheiro, carinho, comunicação, eu... todos fatores que me levaram a perder a capacidade de me entender e conseguir sozinha uma solução melhor. E agora eu precisava somar Aquiles para um resultado positivo. Grande merda de positividade. Não conseguia ser uma pessoa de "copo meio cheio" quando eu que tomava todas as decisões erradas.

— Podem deixar as coisas na frente daquela porta. — Apontei para onde seria o quarto do meu mais novo colega de apartamento.

Durante a madrugada do dia anterior, logo depois de eu arrumar a bagunça que eu tinha feito na cozinha, arrumei o quarto. Retirando o que eu tinha de entulho lá dentro, mas deixando o suficiente para fazer Aquiles trabalhar para ter o seu quarto arrumado.

Quando os dois deixaram as caixas na frente da porta, limparam ao mesmo tempo as mãos nas calças, parecendo mais irmãos do que quando eu tinha os visto pela primeira vez. Mas Apolo olhou ao redor do apartamento, e Aquiles pegou o celular do bolso, com certeza vendo qualquer mulher que tinha o respondido.

— Gostei do sofá. — Apolo disse, um leve sorriso no rosto e um ar pensante. — Minha noiva provavelmente iria dizer a mesma coisa.

Levantando as sobrancelhas, encarei seu rosto, notando a animação dele no simples comentário. Ele deve ter entendido como curiosidade, porque continuou falando.

— Ela está procurando coisas novas pro nosso apartamento... onde que tu comprou? — Questionou, passando a mão sobre o tecido do móvel, ainda portando o sorriso de lado. Aquiles tinha deixado o telefone e revirava os olhos.

— Meu namorado que comprou, não sei... — Respondi, evitando falar que eu e Lucas estávamos separados, tentando acreditar que era só um tempo, um tempo que eu tinha causado. Ele iria voltar, eu ia fazer com que ele visse que eu estava arrependida, qualquer jeito que fosse.

— Ah... — Foi o que Apolo respondeu, tirando as mãos do sofá e colocando elas nos bolsos da sua calça. Algo passou pelos seus olhos enquanto ele me examinava e então examinava Aquiles, algo não bem resolvido.

Antes que conseguisse falar mais alguma coisa, como sua boca aberta mostrava que queria, Aquiles o interrompeu.

Com mãos em cada um dos ombros do seu irmão, começou a empurrar ele em direção a porta. Eu me retirei do meio do caminho, deixando ele expulsar o familiar o mais rápido que quisesse.

— Certo... Até amanhã. — Aquiles disse, dando mais um empurrão em Apolo para que ele saísse completamente da minha casa. Seu irmão virou e tirou as mãos do outro dele, olhar sério. Aquiles então portou uma reação de tédio, mas eu enxerguei uma espécie de medo.

— Foi um prazer Lívia. — Disse, acenando com a cabeça na minha direção. Voltando para o irmão, ele relaxou o corpo de novo e continuou falando. — Amanhã?

Aquiles simplesmente concordou com a cabeça, e eu não era nada além de uma espectadora naquele pequeno show de irmãos, sem ideia do que aquilo significava, sem saber exatamente o que que era ter um irmão que conseguisse e quisesse conversar comigo daquele jeito, em sinais.

Fechando a porta, estávamos então só eu e o meu inferno astral humano. Meus braços estavam cansados de ficarem em uma posição só, então os descruzei, me afastando do seu corpo no momento em que seu rosto se dividiu no meio, um sorriso branco e safado nele.

— Então, meu bem, como vamos passar nossa primeira noite juntos?

Automaticamente eu engoli a saliva e prensei meus dentes uns contra os outros, controlando minha língua e minha fúria que começava a subir do meu peito até a minha cabeça. Me sentia quente, com raiva, e não me importava o que ele achava, ela era pura e não era apenas mais uma brincadeira. Aquilo não era mais uma simples brincadeira.

Indo até a cozinha, não o respondi, mas peguei uma das folhas que estavam em cima do balcão. Coloquei a cópia da principal sob um imã na geladeira, o papel branco contrastando contra o metal escuro.

— Nós vamos passar a limpo as regras, Aquiles. — Disse, me colocando atrás do balcão de novo e pegando a lista original. Minha voz era grossa, minha postura tão profissional quanto no trabalho.

O homem colocou as mãos nos bolsos, levantando uma das sobrancelhas e fechando o sorriso de dentes, forçando o lábio inferior para fora, um canto levantado. A visão daquela careta tão juvenil no corpo tão robusto e masculino combinava de alguma maneira, e eu de novo me repreendi por pensar algo como aquilo.

— Eu tenho regras? — Perguntou, cada passo dele aumentando a travessura no seu olhar. — E eu ganho alguma punição se eu não obedecer?

— Se for necessário que eu quebre um prato na tua cara ou jogue qualquer coisa em ti pra que tu entenda que elas não podem ser quebradas, claro, punições vão acontecer.

Desta vez, quem engoliu a saliva foi ele, sua garganta movendo e a postura alterando durante alguns segundos, mas então ele voltou a careta inicial e se aproximou de mim, o balcão no nosso meio. Seu braço se apoiou na madeira, a camiseta arregaçada deixando das mãos ao seu cotovelo à mostra, as veias traçando sua pele como uma costura atrapalhada.

Eu tinha decorado aquela lista, não precisava ficar olhando para saber exatamente o que iria falar, mas preferi manter o papel na minha mão.

— A primeira regra, e esta eu preciso que tu entenda o quão vital vai ser, é que meu quarto é área proibida. Tu não pode nem se quer abrir a porta, parar na frente dela ou qualquer coisa que remotamente faça com que tu acabe vendo ou entrando nele.

— Essa eu já esperava, mas né, sempre temos o meu quarto. — Foi sua resposta, dando ênfase ao fato de que ele tinha o quarto, a cabeça apoiada agora em uma das suas mão, me encarando.

Meus dentes se juntaram de novo, rangendo, mas continuei com a voz nivelada.

— A semana de compras para as comidas vai alterar entre nós dois, mas quem sempre vai cozinhar é tu. Todas as coisas dentro dos armários tem seu lugar certo, eu listei eles abaixo desse item e sempre que tu precisar lembrar, tem uma cópia no imã da geladeira.

Ele acenou, concordando e não se abalando muito com a ideia de cozinhar todos os dias. Algo na minha mente tinha questionado se ele estava mesmo confortável em criar jantas todos os dias, mas no fundo eu agradeci. Ele nunca ia saber disso, nunca ia saber o alívio que era saber que não precisaria mais passar fome para não gastar. Não ia saber da minha verdade, e nunca o que era precisar fazer isso, pelo visto.

Abaixando minha cabeça para olhar o papel e ignorar seu rosto, ele levantou um dedo, fazendo eu voltar a examinar suas feições tranquilas demais.

— Uma pergunta: meu irmão meio que tem a noiva dele né, como ele disse, e ela tem essa cafeteria. Posso trazer algumas coisas de lá ou eu preciso realmente cozinhar tudo que a gente consumir aqui dentro? Porque eu não sei fazer croissants e ainda não consegui acertar a receita de pão de queijo, e sei lá. É bom, sabe? Uma coisa pra mastigar durante o dia, antes da janta...

Era desconcertante a leveza quando ele falava daquilo.

— Sim, pode, mas eu só me comprometo em comprar a comida que nós vamos consumir aqui dentro. Se tu decidir gastar lá o dinheiro tem que ser teu, não me coloco nesse cálculo, e também não vou exigir que tu compre o suficiente para os dois comerem.

Aquiles acenou com a cabeça, não se importando. Eu acenei, continuando.

— Nós vamos dividir o banheiro, então não é pra colocar qualquer tralha que tu tiver e que acha que cabe ficar no banheiro. Tem uma cômoda dentro do teu quarto pra essas coisas. As toalhas ficam sempre na parte de baixo da pia, coisas de dente na primeira gaveta, coisas de cabelo na segunda. Tu pode colocar o que mais tu quiser na terceira, mas, olha, não fica trocando as coisas de lugar. As escovas de dente tem capinha, mas não dá pra querer cabelo na mesma gaveta.

— Anotado, capitã. — Disse e levantou uma das suas mãos até a testa, saldando. Eu revirei os olhos.

— Não sei se nas tu vai trazer ainda uma Tv, mas eu não tenho uma no meu quarto, então eu fico na sala a maioria das vezes para assistir minhas séries e filmes. Nós vamos dividir o controle da televisão da sala. Segunda, quarta e sexta sãos os meus dias. O resto dos dias, menos Domingo, são teus. Domingo é um dia sem Tv aqui em casa.

Seus olhos se cerraram, a sobrancelha meio arqueada, meio confusa. — Por que, Deuses, Domingo não? Domingo é o melhor dia pra e ver Tv. — Falou como se eu tivesse matado os seus sonhos, a voz aumentando um nível.

— Eu preciso organizar minha semana e a TV tem que ficar desligada. — Respondi, sem alterar minha voz. Aquela era a rotina que eu precisava manter, e ele realmente não queria mexer com a única coisa que eu tinha que ter durante minha semana.

— Beleza... — Disse, levantando as mãos, se rendendo. Só para voltar a se apoiar no balcão.

Eu respirei fundo, sabendo que a cada coisa que eu falasse à partir dali, mais eu alimentaria a curiosidade. Ele me encarou quando eu demorei pra seguir falando, e eu tentei o máximo esquecer os motivos daquela regra específica.

— Dentro dessa casa, — coloquei a palma aberta em cima do balcão, — bebidas alcóolicas não entram.

A primeira reação dele foi rir, mas quando percebeu que eu não estava falando só por falar, a cabeça pendeu para o lado, e eu já me preparei para o questionamento que ia seguir, palavras de ódio se formando na minha garganta como defesa.

— Sabe, eu sei que eu vou só meio que repetir o que eu acabei de falar, mas... Por que, Deuses, não posso beber aqui dentro? No momento em que eu pego e te dou a metade do dinheiro pra pagar as contas e o aluguel, isso aqui também é meu.

Todo o seu corpo começou tranquilo, mas quando ele seguiu falando, as mãos se afastaram no balcão, a posição ficou ereta e a voz engrossou. Todas as implicâncias dele saíram do seu corpo, e ali só estava o adulto, o homem poderoso que ele se considerava, e que eu encarei tentando o máximo não mostrar o quanto queria caminhar para trás, o quanto queria me esconder.

Mas a sua voz grossa e poderosa fez eu também aumentar e engrossar a minha, minha coluna se esticando, meu queixo erguido. Eu segurei a vontade de chorar dentro de mim, e foquei no jeito presunçoso dele de falar sobre a minha casa.

— Não, Aquiles, — olhei diretamente para ele, minha voz alta mas o mais seca possível — isso só te dá o direito de morar aqui, mas a casa continua sendo minha. Meu nome no contrato. E essa regra vai ser cumprida. Sem bebidas aqui dentro.

— Eu acho no mínimo engraçado que só porque tu não deve beber, eu tenho que parar. O que eu fiz pra merecer vocês no meu pé?

Suas mãos apontaram pra mim, e eu dei o passo pra longe dele, me afastando do balcão. Estava irritado agora, mudando completamente, e eu odiei que me sentia na obrigação de falar aquilo, odiava se quer pensar em bebida, mas não deixei de notar que ele também não queria comentar e como ele usou o plural e não estava falando só de mim.

Tinha que ter colocado aquilo no questionário, não só feito uma regra.

— Não disse que tu precisa parar, mas, aqui dentro, — coloquei a palma de novo no balcão, batendo duas vezes na madeira e fazendo o som ecoar pelo cômodo — tu não vai trazer bebida alguma, e, ainda, pode ter certeza que não vai entrar se estiver completamente bêbado.

— Isso é realmente sério? — Perguntou, realmente impressionado.

Foi a minha vez de rir, irônica. — Tua cabeça é tão pequena que nem isso tu consegue entender? Talvez se tu tirasse ela um pouquinho do meio das pernas das tuas gurias, ia perceber que tu não tem mais 15 anos e que existem certas coisas na vida que tu precisa cumprir. Tu que não pode ser tão idiota assim.

O barulho da minha voz só tinha aumentado a tensão, e agora o que preenchia o nosso redor era a nossa respiração acelerada. A mandíbula dele mexia, e ele estava rangendo os dentes também, suas narinas abertas, o peito estufado. O aceno que ele deu foi o menor possível, mas eu enxerguei, e não acreditei em nada naquele movimento.

Pigarreando, voltei para mais próximo do balcão, minhas pernas tremendo com a adrenalina que corria junto da ira, e passando a língua na boca, tentei colocar alguma umidade pelas rachaduras que tinham secado só naqueles minutos.

— Eu coloquei todos os gastos que nós vamos ter, com margem de erro. A minha conta tá no final da página pra que tu faça a transferência do valor do aluguel.

Agora, minha voz estava rouca e sem força, como se não conseguisse falar porque todo o meu corpo trabalhava pra alimentar o meu coração que estava rápido demais. Meu rosto focava na folha agora, tentando acalmar de novo todo o meu corpo. O silêncio era demais, e eu estranhei quando ele não disse nada.

E ele não falou, porque ele tinha a capacidade de, depois de tudo aquilo, fingir estar dormindo com a cabeça apoiada nas suas mãos.

— É sério isso? — Questionei quase do mesmo jeito que ele tinha o feito, levantando a minha sobrancelha. Todo o medo que tinha sentido se indo com a mesma facilidade que o seu humor mudou.

— Algum problema? — Ele perguntou como resposta.

— Sim, vários.

Revirando os olhos, ficou apoiado em uma mão agora, e outra coçando o braço. — Tu parece a Iara.

Com a resposta dele, revirei os olhos do mesmo jeito que ele tinha feito. Eu estava pouco me lixando para as peguetes dele, e foda-se quem era essa Iara, eu queria que ele simplesmente entendesse que aquilo não era algo divertido. Que levasse com a mesma seriedade que ele levou o fato de eu tirar a sua preciosa bebida dele.

Sacudindo a cabeça, peguei o papel e deslizei-o até ele. — A última coisa aí são os meus horários. Vou colocar um calendário na parede do lado da geladeira pra marcar todas as datas dos depósitos, os vencimentos e de novo os meus horários. Espero que tu coloque tuas atividades ali também, pra que eu encontre pelo menos algum jeito de não te ver com frequência.

— Falando assim eu vou começar a acreditar que tu não gosta de mim. — Respondeu, colocando uma mão no seu coração.

— Pensei que já sabia.

Saindo de trás do balcão, fui até a porta do meu quarto, ao lado do banheiro e na diagonal do outro quarto. Me virando, abri minhas mãos e as deixei cairem contra minhas pernas.

— Bem vindo a sua nova casa. — Disse, veneno saindo com cada palavra e ele simplesmente riu. — As chaves estão na mesinha de centro, e eu espero que tu leia e veja de novo tudo o que eu coloquei nesse papel.

— Ah, com certeza... — Ele respondeu antes de eu continuar, também usando do sarcasmo que eu tanto amava, seus dedos fazendo um sinal de "ok".

Revirando de novo meus olhos, virei de costar pra ele, escondendo meu rosto na porta e tentando esquecer dos seus olhos desinteressados e malvados, tão de repente, e tudo o que estava acontecendo.

— Boa noite, Aquiles... — Disse, minha voz quase não saindo, enquanto entrava no meu quarto e me apoiava contra a porta, fechando ela por completo e girando a chave para que tivesse certeza que ele não ia entrar.

E deixei o vazio me preencher, se é que isso era possível.

Caindo no chão, olhei em volta o meu lençol branco com listras pretas, o outro verde e mais um branco. O armário, a penteadeira, o tapete... tudo aquilo que eu tinha comprado junto do meu ex, examinando o lugar que eu quase nunca conseguia dormir e que Lucas conseguia ter o sono sempre perfeito.

Respirando fundo, cocei meus olhos, concluindo que mais uma coisa era certa: aquela decisão tinha afetado muito mais do que eu tinha previsto, e causaria muito mais do que todas as infelicidades que estavam acontecendo.


n o t a d a a u t o r a:

OIE! Gente, desculpa pela demora pra atualizar, mas é que o Wattpad estava variando de novo essa semana e eu fiquei com medo de que ninguém recebesse notificação ou que desse algum outro erro. Mas aqui está o capítulo! O que acharam? Agora é que as coisas realmente começam a acontecer hehe

p e r g u n t a d o d i a: de todas as regras e conversas do capítulo, o que fez vocês ficarem mais intrigados?

Beijo procêis!

Não esqueçam de votar, comentar e compartilhar, como sempre <3

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