- Eu não acredito... _ Addison disse pausadamente enquanto olhava em volta do quarto do marido no hospital _ Você deixou a minha filha fazer tudo isso sozinha? _ perguntou olhando para o chefe de cirurgias do hospital.
Owen inclinou os lábios para baixo arqueando as sobrancelhas e levantou os ombros. Katie era como Amelia. Ela sabia argumentar, e ele nunca foi bom em dizer não para os pedidos de Amelia.
- Bom, algumas pesquisas dizem que faz bem para os pacientes se manterem conectados com...
- Pseudociência, Hunt! _ Addison exclamou, interrompendo o colega.
- O que você espera que uma garota de 11 anos possa encontrar na internet além dessas teorias? _ Owen perguntou seguindo a cunhada com os olhos enquanto ela andava pelo quarto _ Eu pensei que você sabia disso tudo.
- Não. Eu nem me dei conta de que ela estava trazendo essas coisas todas de casa _ ela respondeu _ Esse porta-retratos estava em cima da lareira e essa estatueta do Empire State Building...
- O Derek tinha em cima da mesa do consultório dele aqui _ Owen disse _ Eu acho que ele deixou no apartamento antes de voltar pra Nova York e a Amelia levou pra casa quando estava pronta.
- Fui eu que dei pra ele _ ela lembrou _ Foi um presente de casamento no nosso primeiro ano de casados. Nós adorávamos piqueniques no Empire State Building. Ele mandou eu pedir pra Savvy mandar de Nova York quando eu pedi pra ela mandar as minhas coisas. Eu nem podia imaginar que nós íamos morar em um trailer _ contou enquanto passava o dedo indicador pelos livros de neurocirurgia que estavam muito bem alinhados em uma prateleira _ Ela foi caprichosa em tudo _ disse _ Tudo, tudo, tudo o que Derek gosta está nesse quarto _ observou _ Bicicleta, ski, carros, baseball...
Estava impressionada. Achava bonito que Katie tivesse aquela ligação com o pai, mas se perguntava se ela agiria da mesma forma se fosse ela – Addison – no lugar dele.
- Você quer que eu mande tirar? _ Owen perguntou.
- Não. Claro que não. Ela vai ficar chateada se chegar aqui e estiver tudo como era antes. Deixa como está.
- O tempo passa e ela não perde as esperanças _ o médico comentou.
- Eu sei. Eu me preocupo com isso.
Addison parou de olhar os objetos e parou ao lado da cama do marido. Realmente não o via de perto há muito tempo e sentiu um arrepio ao encarar o rosto sereno dele mais uma vez. Os ferimentos que ela lembrava, já estavam cicatrizados e, apesar de saber que ele estava recebendo um bom tratamento no hospital, não pode deixar de notar mudanças em sua fisionomia. Levou uma das mãos à testa dele e começou a passar os dedos levemente pelo canto de seu rosto.
- Ele está abatido e está emagrecendo _ comentou sem tirar os olhos de Derek.
- É normal que ele vá perdendo peso aos poucos. As soluções nutritivas que ele recebe são o suficiente para manter os órgãos dele funcionando, mas não equivalem a uma refeição _ Owen comentou _ Além do mais, ele fica em repouso o tempo todo.
- Eu sei. Você poderia pedir para aumentar um pouco a dose e movimentarem mais o corpo dele? _ perguntou _ Eu nunca vi o Derek magro.
Ela não tinha esperança que aquilo fosse mudar o estado dele, mas não queria ver seu corpo definhando aos poucos.
- Ok.
Colocou uma mão sobre o peito do marido, fechou os olhos e ficou sentindo o coração batendo. Se lembrou da sensação que sentiu quando tentou desligar os aparelhos dele pela primeira vez. Ouvir o último suspiro, sentir o peito dele descendo como se ele tivesse liberado todo o sopro de vida que existia em seu corpo, foi a pior sensação que ela já havia experimentado na vida.
Ao longo de seus muitos anos de profissão, Addison já havia visto a morte de perto várias vezes. Desde criança, tinha noção de que os corpos sobre os quais os alunos de seu pai trabalhavam, eram pessoas mortas. Por mais que fosse impossível para ela imaginar aquelas pessoas com os olhos abertos, em pé, andando, respirando, uma dia, elas já estiveram vivas. Mais tarde, como estudante e profissional, frequentando salas de cirurgias, ela se acostumou a encarar a vida como algo passageiro. Era normal ver corações parando de bater, cérebros entrando em falência, o corpo humano chegar ao seu limite. Porém, nenhuma daquelas experiências foram suficientes para amenizar o trauma que foi sentir que uma pessoa tão próxima estava perdendo a vida diante de seus olhos.
Ela sentiu um nó na garganta e abriu os olhos imediatamente quando percebeu que se emocionaria se continuasse lembrando. Puxou a respiração lentamente e olhou para o cunhado, que continuava em silêncio às suas costas.
- Hunt, eu vim até aqui para pedir um favor pra você.
- Pode falar.
- É que eu ainda não transferi as minhas correspondências de Nova York pra cá e eu estou precisando de algumas revistas recentes de publicações em pesquisas neonatal. Eu gostaria que o hospital me emprestasse as últimas edições. Eu estou tentando fazer o meu trabalho a distância e está sendo um verdadeiro caos.
- Claro. Você pode falar direto com a nossa chefe do departamento de neonatal, que ela tem todas essas informações.
- Quem é? _ ela perguntou.
- Dra. Herman.
- Ah. Claro. Eu vou falar com ela.
Lembrava da médica.
- Eu preciso falar também com o dr. Nelson. Eu preciso que ele me dê um atestado de invalidez, para que eu possa assumir todas essas burocracias. Eu detesto burocracia.
- Você não é a única.
- Eu tenho que resolver tudo isso hoje, antes de buscar as meninas na escola. Eu espero que dê tempo!
- Você já pensou em ônibus escolar? _ Owen perguntou.
Addison não entendeu a pergunta.
- As escolas costumam ter ônibus escolar para as crianças que os pais não podem buscar todos os dias na saída _ ele explicou _ Eu acho que o filho da Bailey também estuda lá e ele vem no ônibus.
- Eu sei... _ ela disse _ Mas está tudo bem. Está tudo sob controle.
- Tem certeza?
- Sim.
Ela virou novamente para olhar o marido pela última vez, em seguida ajeitou a bolsa e saiu do quarto acompanhada pelo médico.
- Escuta, nós vamos fazer uma festinha de aniversário pra Ella no domingo lá em casa. Vai ser uma coisa simples _ comentou _ Eu convidei a Callie, Arizona, Mark...
- A Amelia comentou.
- Eu espero que vocês apareçam por lá.
- Com certeza nós vamos.
- Dra. Montgomery-Shepherd... _ Bailey cumprimentou quando passou por aquele corredor e viu que Addison estava lá.
- Ah! Bailey! _ Addison chamou _ Nós vamos fazer uma festinha de aniversário pra Ella lá me casa. Domingo. Você pode levar o seu filho?
- O Tuck? _ a médica perguntou.
- Sim. Eu queria que tivessem algumas crianças, mas a Ella me proibiu de convidar qualquer pessoa da escola dela, então eu estou tentando fazer uma coisa pequena para as pessoas mais próximas, mas eu gostaria que tivessem algumas crianças para que ela não fique deslocada. A filha do Noah certamente vai estar lá e eu pedi pra Katie convidar alguns colegas dela também.
- Ok. Eu vou levar o Tuck _ ela disse.
- Obrigada! _ Addison disse sorrindo _ Ele deve ter quase a idade da Ella mesmo.
- 6 anos.
- Eu lembro que ele nasceu pouco antes. A Ella está fazendo 5 anos.
- Ok. No domingo, então. Se eu não puder ir...
- Você pode deixar ele lá em casa que depois eu o levo ou peço pra Amy levar.
- Ok.
- Tudo certo. Eu tenho que ir... Melhor, eu tenho que procurar o dr. Nelson e depois procurar a dra. Herman.
- Ok.
Owen se afastou com Bailey, e Addison seguiu seu caminho. Estava andando pelos corredores do hospital quando foi parada por Amelia.
- Uma médica andando pelo hospital, só pode estar procurando trabalho _ a neurocirurgiã comentou caminhando ao lado da cunhada.
- Não. Eu já tenho trabalho suficiente lá em casa. Não é só porque eu estou há meses sem cortar ninguém que eu não tenho trabalho.
- Eu não sei como você está conseguindo.
- Eu estou procurando um dos médicos do seu departamento, dra. Shepherd. O dr. Nelson está por aí?
- O dr. Nelson? Você quer falar sobre o Derek? _ Amelia perguntou curiosa.
- É... Eu queria um atestado de invalidez para resolver os processos burocráticos da casa.
- Eu posso resolver isso pra você. Vamos até a minha sala, que eu te dou esse atestado em um minuto.
- Sério?
- Sim.
- Ah! Obrigada, Amy!
As duas seguiram juntas até o consultório de Amelia.
- E então? As meninas estão na escola? _ Amelia perguntou.
- Sim. Pelo menos até as 16:00 elas me dão um pouco de paz _ Addison respondeu _ Principalmente a Katie. Você viu o que ela fez lá no quarto do Derek?
- Eu vi. Eu pensei que você soubesse.
Addison levantou os ombros e entrou no consultório com a cunhada.
- A Ella me contou que ela vai fazer aulas de tênis _ Amelia comentou enquanto sentava para ligar o computador.
- Ela fez a primeira aula.
- E como foi? Ficou bonitinha com aquelas roupinhas?
- Ela deu uma raquetada em uma menina que estava sentada na arquibancada esperando a próxima aula começar.
Amelia arqueou as sobrancelhas e riu.
- Sabe como são essas primeiras aulas? A treinadora queria conhecer as limitações dela, então ficou jogando bolinhas para ela tentar pegar e uma delas foi em cima da menina, mas em vez de da Ella deixar a bolinha pra lá, ela correu para pegar, olhando pra bola e não se deu conta de que tinha alguém sentada na arquibancada.
Amelia gargalhou e continuou batendo os dedos no teclado do computador para digitar.
- Por favor, não comenta com ela. Ela ficou morrendo de vergonha. Não queria voltar para a segunda aula.
- Mas ela está gostando? _ Amelia perguntou.
- Está se divertindo.
- Mas ela foi para a segunda aula, então vai ficar tudo bem. Ela precisa de algo para se distrair, não é?
- Sim. Ela precisa. Mas ela é impaciente. Detesta começar as coisas. Quer começar sabendo tudo...
- Derek... _ Amelia lembrou.
- Exato! Mas eu espero que ela goste. No começo eu fiquei preocupada por causa da asma, mas ela não se cansa tanto.
- Addie, você trata asma como se fosse uma doença de outro mundo.
Ela estendeu o braço para tirar o papel da impressora, o colocou dentro de um dos envelopes com o logo do hospital e entregou à cunhada.
- Aqui.
- Obrigada, Amy.
- Escuta, eu tenho que comprar um presente pra Ella. O que você sugere?
- Eu não faço a mínima ideia. Ela vai gostar de qualquer coisa.
- É claro que ela vai gostar de qualquer coisa. Aquela menina é um anjo. Mas, sei lá, eu queria comprar alguma coisa que ela gostasse de verdade, algo que ela quisesse muito, sabe? O que ela tem pedido pra você? _ perguntou.
- Coisas que ela não pode ter. Um cachorro, um gato... Mas nem sonha em comprar um animal pra ela.
- Não. Eu não torturaria você dessa maneira _ Amelia disse entre risos.
- Ela gosta de assistir filmes antes de dormir, gosta de escutar histórias, está fascinada para descobrir se fadas realmente existem.
- Fadas?
- É. Ela deve ter assistido algum filme da Disney e morar no pântano não facilita _ Addison comentou _ Agora ela fica por horas lá no jardim, olhando as flores, os insetos... Ela tem algumas teorias mirabolantes. Você precisa ouvir.
- Ela é muito criativa, não é?
- Sim, ela é.
As duas ficaram em silêncio por alguns segundos, com sorrisos nos rostos.
- Deve ter herdado isso de você _ Addison comentou.
- De mim? Não. Eu sempre tive o pé no chão.
- Pé no chão? Você, Amy? _ Addison perguntou _ Eu me lembro de você falando sobre unicórnios com a mesma animação com a qual a Ella fala de fadas.
Amelia riu.
- No meu caso, eu era drogada _ respondeu sarcasticamente.
- Você era criança! _ Addison exclamou entre risos.
Elas continuaram rindo.
- É. Você tem razão. Ela pode parecer comigo nesse quesito, mas ela vai ser uma pessoa melhor que eu.
- Falando desse jeito fica parecendo que você é uma péssima pessoa, o que não é verdade _ Addison disse ajeitando a bolsa no ombro para levantar _ Bom, eu tenho que ir porque eu quero resolver isso antes de elas voltarem da escola.
- Ah, sim! Ok! Eu vou pensar em alguma coisa legal para comprar pra ela.
As duas se despediram e Addison saiu do consultório da cunhada com o envelope nas mãos. Caminhou sozinha pelos corredores do hospital e parou em frente ao elevador para apertar o botão ao lado da porta. Ficou aguardando.
Assim que a porta abriu e ela se deparou com a cena à sua frente, arqueou as sobrancelhas e abriu um sorriso leve e sarcástico. Entrou fingindo não se importar. Mark passou a mão no jaleco para alinhá-lo, enquanto Teddy passava o polegar nos lábios para limpar o batom vermelho borrado por conta do beijo que eles davam quando a porta se abriu. Ele estava um pouco envergonhado por ter sido flagrado, mas ainda assim agradecia aos céus por Addison ter sido a pessoa e não Miranda Bailey como da última vez.
- Addie, você lembra da Teddy? _ ele perguntou quebrando o silêncio.
Addison se sentia vingada por ter deixado Mark encabulado pela primeira vez depois de ter muitos seus momentos íntimos por anos interrompidos por ele. Virou e sorriu pra a colega.
- Tudo bem, Altman?
- Tudo bem, e você?
- Bem.
Todos ficaram em silêncio. Teddy trocou um rápido olhar com Mark.
- E as menina? _ perguntou para Addison.
- Elas estão na escola.
- Eu estou ansiosa para o jantar com elas hoje à noite.
- Ah! Addie, está tudo certo para elas irem com a gente hoje a noite? _ Mark perguntou.
- É hoje? _ Addison devolveu a pergunta com um pouco de confusão no tom de voz _ Desculpa, Mark. Eu tinha me esquecido completamente _ disse _ Mas sim. Claro. Você pode buscá-las a hora que você quiser. Elas vão adorar.
- Você poderia vim também _ Teddy sugeriu.
- Não. Divirtam-se vocês _ Addison disse _ Eu vou aproveitar que elas estão fora e vou adiantar um pouco do meu trabalho.
Ouviu-se um bipe no elevador, em seguida a porta se abriu.
- Bom, eu tenho que ir. Até mais tarde _ ela disse _ Tchau.
- Até mais.
Os três saíram do elevador e seguiram caminhos opostos.
***
- Ei, Katie, você quer fazer o debate comigo? _ Henry perguntou sentando ao lado da menina, que tinha os cabelos negros amarrados em um rabo de cavalo.
Ela estava ocupando uma mesa sozinha no refeitório da escola enquanto comia seu sanduiche.
- Eu estava pensando em fazer sozinha _ ela respondeu antes de tomar um gole no refrigerante.
Eles falavam sobre o trabalho de história.
- Mas é em dupla _ Henry lembrou.
- Eu sei.
Ele abriu a bolsa térmica ao seu lado e tirou de dentro, primeiramente um guardanapo de pano, que colocou sobre a mesa, em seguida um sanduíche natural, uma garrafa de suco e um recipiente com algumas frutas cortadas. Katie começou a mastigar cada vez mais devagar, arqueando as sobrancelhas para o almoço do colega.
- A sua mãe deve ser muito legal _ ele comentou.
- Por que...?
- Ela deixa você trazer coca-cola para a escola.
- Ela... Ela não cozinha _ Katie contou olhando para o lanche que comia no almoço _ Ela me dá dinheiro para comprar o que eu quiser.
- Legal.
- Sua mãe faz tudo isso? _ perguntou apontando para o almoço do colega.
- Minha mãe morreu há dois anos. Eu falei pra você _ ele disse.
- Ah! Eu esqueci. Desculpa.
- O meu pai que fez.
- Uau!
- Então? Você quer fazer o debate comigo? _ ele perguntou.
- Ok. Mas nós temos que nos reunir para dividir o trabalho.
- Pode ser lá em casa depois da escola. Eu volto de ônibus.
- Não pode ser hoje. Eu tenho um jantar pra ir _ ela disse _ Mas eu acho que a gente pode conversar sobre isso aqui na escola mesmo. Eu sempre tenho muitas coisas pra fazer fora.
- Sério?
- Humrum.
- Oi, Katie. Você quer fazer o debate comigo? _ Lisa perguntou sentando à mesa.
- Não.
E menina se surpreendeu com a resposta direta que recebeu e arqueou as sobrancelhas.
- Eu vou fazer com o Henry _ Katie completou antes de dar uma mordida no sanduiche.
- Henry? Porque você vai fazer com ele? _ Lisa perguntou.
- Eu estou aqui... _ Henry disse querendo se fazer notar.
- Porque ele pediu _ Katie disse _ Eu sinto muito, Lisa.
- Ok. Vou procurar outra pessoa.
A menina levantou e saiu de perto dos dois colegas de classe.
- Ei, você quer ir à uma festa lá na minha casa no domingo? _ Katie perguntou para o colega.
- Festa?
- É. Não é uma festa, mas a minha mãe pediu pra eu convidar você. É o aniversário da minha irmã.
- Aniversário da sua irmã?
- Sim. Você pode ir?
- Mas eu nem conheço a sua irmã _ ele disse.
- Mas ela também não conhece praticamente ninguém também. A minha mãe queria que algumas crianças fossem.
- Vou pedir pro meu pai.
- Obrigada.
Henry sorriu e os dois voltaram a comer.
- Você quer trocar a sua coca-cola por esse pote de frutas? _ ele perguntou.
- Não _ ela respondeu.
- Vai. Está tudo fresco.
Ela mexeu na mochila e jogou uma nota de 20 dólares na mesa.
- Compra uma pra você.
- A sua mãe dá tudo isso de dinheiro para você comer na escola? _ Henry perguntou.
Katie deu de ombros. Na verdade, aquela era apenas uma nota do troco do que ela havia comprado há alguns minutos. O menino pegou o dinheiro e foi comprar um refrigerante para ele também. Os dois almoçaram juntos, em seguida andaram pelo jardim da escola antes de voltarem para a aula.
- Quais as suas aulas agora?
- Ciências, biologia, artes plásticas...
- Artes plásticas? _ Henry perguntou curiosos.
- Eu sempre gostei de desenhar, tinha que escolher algumas disciplinas para preencher a minha grade.
- Eu sou do jornal da escola _ ele contou.
- Sério? _ ela perguntou.
- Sim. Você não quer conhecer?
- Não. Eu não me envolvo com essas coisas. Jornal da escola, grêmio estudantil, líder de torcida...
- Porque não?
- Não faz o meu tipo.
- Como você sabe? Você nunca participou.
- Qual é a sua função lá? _ ele perguntou.
- Fazer fotos.
- Você é o Colin Creevey deles! _ ela exclamou.
- Quem?
- Colin Creevey... Harry Potter... Você disse que gostava de ler. O que você tem lido ultimamente? _ ela perguntou.
- The fault in our stars, Twilight...
A campainha tocou alto e Katie franziu a testa até que o som parasse de soar.
- Você tem muito o que aprender comigo. Eu tenho que ir agora.
Se afastou do colega e foi para a sua próxima aula, que era frequentada por poucos alunos, mas todos que adoravam coisas estranhas como insetos e répteis. Além de adorarem o fato de que, na maioria das vezes, aquela aula era em laboratórios. Katie se matriculou porque, de alguma forma, se sentia confortável por saber alguma coisa de biologia – ao menos humana – devido ao fato de que seus pais eram médicos.
Ao fim do dia fez mais uma aula de ballet e se divertiu com as colegas. Como sempre, Morgan a encheu de elogios e fez comparações para que Lisa fosse mais como ela. A menina ficava sem jeito, mas sorriu de forma educada para a mãe da colega e andou até o vestiário para colocar um short jeans por cima do maiô, jogar a saia fina e a sapatilha em sua mochila, e finalmente sair para encontrar com a mãe e a irmã na quadra de tênis coberta.
- Oi, mãe.
- Oi, querida. Como foi a aula de ballet hoje? _ Addison perguntou.
- A mesma coisa de sempre _ ela respondeu sentando em um dos lugares da arquibancada _ Quer dizer... Foi legal até ter que encontrar com a mãe da Lisa. Ela é completamente louca! _ disse _ Porque ela não começa a fazer ballet, já que é o sonho dela, e deixa a filha dela em paz? Eu acho que se ela fosse a minha mãe, eu já teria morrido.
- Credo, filha. Não fala uma coisa dessa _ Addison disse.
- É verdade. Eu não ia ter saco pra isso não.
- Mãe só quer o melhor pro filho.
- Eu acho que ela quer o melhor pra ela.
Addison contraiu os lábios. Não podia julgar que Katie pensasse assim porque era a imagem que Morgan passava.
- Você lembra do jantar com o Mark e a namorada dele, não lembra?
- Lembro. É hoje, não é?
- Humrum. Eu já falei com a sua irmã, então depois daqui a gente vai lá pro hospital, pra você visitar o seu pai, assim a gente pode voltar pra casa mais cedo pra vocês fazerem o dever de casa e se arrumarem para o jantar.
- Ok _ Katie concordou com um sorriso no rosto.
Addison assentiu e voltou a olhar a aula de Ella, que corria na quadra para tentar pegar a bolinha que era lançada pra ela. Ela não acertava nenhuma.
- Katie, eu vi o que você fez lá no quarto do Derek _ Addison comentou.
- Você viu?
- Sim. Eu fui lá no hospital hoje e eu vi.
Katie ficou em silêncio, olhando para a irmã, esperando que a mãe começasse a lhe dar uma bronca por ter levado coisas para lá sem que ela tivesse percebido, mas Addison não fez aquilo.
- Então? O que você achou? _ perguntou virando o rosto para olhar para a mãe.
- Você fez um bom trabalho.
Ela se surpreendeu.
- Você acha?
- Claro. Parabéns.
A menina sorriu e voltou a olhar para a irmã, que corria na quadra.
- A Ella não acerta uma bola _ disse.
- Ela está aprendendo, não critica ela.
- Eu convidei o Henry para o aniversário dela no domingo.
- Henry?
- O garoto que eu falei que estuda comigo.
- Ah! Ele disse que vai? _ Addison perguntou.
- Ele vai pedir para o pai dele.
- Ótimo! Eu convidei o filho da Bailey, o Tuck. Você lembra dele?
- Mais ou menos.
- Ele deve ser um ano mais velho que a sua irmã.
- CORRE UM POUCO MAIS ELLA!!! _ Katie gritou.
- Katherine! Deixa a sua irmã _ Addison disse.
- Ela podia pegar ao menos uma bola.
Ella contraiu os lábios e revirou os olhos. Quando lhe foi lançada mais uma bola, ela deu tudo de si para correr e pegar a bolinha apenas para contrariar a irmã. Aquela ela conseguiu rebater, mas subiu além da rede de proteção e foi parar na outra quadra.
- Muito bem, Isabella!!! Você conseguiu pegar dessa vez, mas essa ia pra fora da quadra. Você não precisa se preocupar com as bolas que vão pra fora da quadra _ disse a treinadora.
- E nem precisa jogar a bola na outra quadra! _ Katie disse.
- Mãe...
- Katherine! _ Addison repreendeu entre dentes.
- Só estou falando.
- Eu não fico falando as coisas pra você na sua aula de ballet _ Ella cortou a irmã.
- Desculpa.
A partir daquele momento Katie se calou e assistiu os poucos minutos que restavam da aula da irmã.
- Eu sou péssima _ Ella reclamou enquanto a mãe guardava a raquete em uma bolsa apropriada.
- Realmente...
- Katie! _ Addison repreendeu _ Você está aprendendo, Ella. Quando as pessoas estão aprendendo é assim mesmo _ disse _ O seu pai tem uma cicatriz na testa dele, que ele me contou que ganhou quando estava aprendendo a andar de moto. Quando as pessoas estão aprendendo, elas erram, caem, se machucam...
- É _ Katie disse quando a mãe olhou pra ela _ Deve ser a mesma lógica do baseball. O papai sempre dizia que as pessoas têm que pensar no taco como se ele fizesse parte do corpo delas, não como se fosse um acessório.
Ella olhou para a irmã, com confusão no olhar.
- Você tem que pensar que a raquete é parte do seu corpo, sabe? Quando a bola vier pra você, você tem que sentir que vai pegar ela com as suas próprias mãos, como se a raquete fosse as suas mãos.
- Sua irmã tem razão. Vai ser mais fácil se você pensar assim _ Addison disse.
As três saíram juntas e caminharam até o carro.
Katie fez uma visita rápida para o pai. Apenas acariciou o rosto dele, deu um beijo na bochecha e disse que não poderia ficar muito, já que tinha que se adiantar fazendo o dever de casa para poder ir ao jantar com Mark e a namorada dele. Então voltaram pra casa e, após fazerem tudo o que tinham que fazer, se reuniram com a mãe para escolherem roupas para a noite.
Ella estava muito animada, mas a todo momento perguntava porque Addison não poderia ir com elas. Já estava imaginando o quanto seria desconfortável estar em um restaurante, com Mark, uma desconhecida, e sem a presença da mãe. Katie era a pessoa que costumava se dar bem com as outras pessoas, não ela.
Mark chegou animado as 17:00. Teddy estava sorridente e bonita. Katie lembrava pouco dela, mas Ella não lembrava nada. Em poucos minutos elas se despediram e deixaram Addison sozinha na casa silenciosa. Ela já estava acostumada a ficar sozinha o dia inteiro, mas de noite tudo parecia muito diferente. Pela primeira vez, desde que chegou em Seattle, sentiu medo por morar naquele lugar escuro, cercado de árvores, onde podia-se ouvir o barulho dos sapos que deveriam ter lá fora. Se lembrou de quando morou ali pela primeira vez com Derek e das vezes que chegava em casa primeiro que ele. Ficava imaginando que algo muito ruim poderia acontecer com ela naquele lugar e que, caso acontecesse, ninguém nunca a encontraria caso seu corpo fosse escondido na floresta. Porém, deveria admitir que naquela casa se sentia mais segura do que no trailer. Ela trancou todas as portas, ligou a TV da sala apenas para ter a sensação de que havia alguém falando, então andou até o escritório, onde ficou por horas se ocupando com o trabalho que tinha a fazer.
***
Mark sorria enquanto dirigia e ouvia a conversa entre Teddy e as meninas, que estavam sentadas no banco de trás. Ela parecia gostar muito de crianças e estava super empolgada enquanto Katie e Ella contavam sobre as coisas que gostavam de fazer.
- Então vocês duas vão ser atletas de alto rendimento quando crescerem? _ a moça perguntou _ Você sabia que os bailarinos profissionais ensaiam muitas horas por dia?
- Sim _ Katie respondeu _ Eles não podem passar nenhum dia sem ensaiar. Uma vez eu li uma entrevista de uma bailarina do Ballet Bolshoi e ela disse que cada dia sem ensaio significa dois dias retrocedidos.
- Nossa! Você ler entrevistas? _ Teddy perguntou surpresa _ Então você quer mesmo ser bailarina.
- Eu não sei. A minha... A Bizzy...
- A Bizzy é a avó dela _ Mark informou.
- Sim. A Bizzy me disse que é uma vida muito incerta, que nem sempre as pessoas, por melhores que sejam, tem sucesso, e quando tem, não são tão bem remuneradas quanto um médico cirurgião é.
- A sua avó quer que você seja uma médica cirurgiã? _ Teddy perguntou.
- Sim. Todo mundo na minha família é cirurgião.
- Seu pai, sua mãe...
- Minhas tias, meus avós... _ ela completou _ Quer dizer, a minha avó Carolyn era enfermeira e o meu outro avô, o que eu não conheci, o pai do meu pai, ele não era cirurgião.
- Não. Ele tinha uma loja _ Mark disse.
- Sim. O papai me contou _ Katie disse _ Mas na família da minha mãe, todos são cirurgiões.
- E essa sua outra avó, essa que quer que você seja cirurgiã, qual é o nome dela? Porque eu não estou lembrada de ter ouvido alguma vez.
- A Bizzy? Beatrice Bradford Forbes Montgomery _ Katie respondeu _ Mas ela não é cirurgiã. Ela... Eu não sei... Ela diz que na época dela, o pai dela não deixou que ela estudasse medicina, então ela fez faculdade de história da arte.
- Mas ela nem trabalha _ Ella comentou.
- É. Ela não trabalha... Quer dizer, ela ajuda em muitos projetos sociais _ disse Katie _ A minha mãe foi a primeira mulher na família Bradford Forbes a ser cirurgiã.
- Uau!
- E foi a única a ganhar um Harper Avery.
- É... Mas você não precisa se sentir pressionada a ser cirurgiã. As pessoas têm que fazer as coisas que elas amam _ Teddy comentou _ Pensa que a sua profissão, é a coisa que você vai fazer pelo resto da sua vida. Você tem que fazer algo que você ame. Sua mãe foi a primeira cirurgiã da sua família, mas você não precisa ser a segunda. Você pode ser a primeira bailarina.
- Eu não sei...
- E você? _ Teddy perguntou olhando para Ella _ Você é tão caladinha.
- Ela está fazendo aulas de tênis _ Katie respondeu antes que a irmã abrisse a boca.
- Ah! Eu tinha esquecido. O Mark me falou. Vocês são muito diferentes. De ballet para tênis são dois extremos diferentes.
- A Katie é uma força da natureza, como o Derek vivia dizendo _ Mark comentou _ Ele tinha orgulho de dizer como ela jogava baseball melhor que muito menino por aí. Eu tenho certeza que ele ia adorar saber que a Isabella está fazendo tênis.
- Ele gostava de tênis? _ Ella perguntou em uma voz fina.
- Seu pai gostava de todo tipo de esportes.
- Gosta _ Katie corrigiu _ Ele continua gostando.
Criou-se um clima tenso, mas não por muito tempo. Eles logo chegaram ao restaurante e ocuparam a mesa que estava reservada. Depois de se divertirem escolhendo os pedidos, ficaram conversando até que a comida chegasse. Teddy podia perceber que Mark estava contente. O lado familiar era algo que ela ainda não conhecia dele. Ele era bom em lidar com as crianças e às vezes parecia que tinha a idade delas.
- A mamãe parece a Rosetta, que é a fada jardineira _ Ella comentou depois de ter explicado para as pessoas sobre seu filme de fadas favorito _ O tio Mark parece com o Bolt, eu pareço a Silvermist, que é a fada das águas, e a Katie parece a Vidia, que é a fada mais veloz de todas.
- Eu não pareço a Vidia. Eu pareço a Silvermist _ Katie disse _ Ela tem os cabelos longos e você tem os cabelos mais curtos que o meu.
- A Vidia também tem os cabelos longos _ a menina argumentou.
- Mas eu pareço mais com a Silvermist.
- Mas já sou eu, Katie.
- Mas você nem parece com ela.
- Com quem eu pareço então? _ Ella perguntou.
- Com ninguém.
Mark se assustou com a forma fria como Katie tratava a irmã.
- Não! Eu pareço com a Silvermist e você parece com a Vidia! _ Ella disse.
- Você acha que eu sou má? _ Katie questionou a irmã.
- Às vezes.
Ele trocou um olhar com Teddy, como se perguntasse o que deveria fazer. Addison e Derek saberiam controlar aquela situação.
- E eu? Com quem eu pareço? _ ela perguntou.
- Você parece...
Ella pensou por alguns segundos.
- Você parece com a Rosetta! _ disse.
- Você disse que a Rosetta era a mamãe _ Katie lembrou, apenas para irritar a irmã porque ela não se importava mesmo com filme de fada.
- É mesmo. Então ela parece com a Tinkerbell, que é a fada operária.
- Ela não parece com a Tinkerbell _ Katie rebateu.
- Eu não sei... Então ela parece com quem?
Katie pensou por alguns segundos e levantou os ombros.
- Rainha Clarion?
- Sim! Você parece com a Rainha Clarion!!! _ Ella exclamou _ Então o tio Mark é o Lord Milori.
Eles não faziam ideia do que elas estavam falando, mas sorriram e pareceram empolgados por se parecerem com qualquer coisa que fizesse parte do universo delas.
- Sabe o que eu gostava quando eu tinha a idade de vocês? _ Teddy perguntou.
- Hum?
- De uma série inglesa que passava na BBC. Era sobre um cara que viajava no tempo e sempre levava uma menina com ele...
- Doctor Who? _ Katie perguntou.
- Sim! Doctor Who! Você conhece?
- A minha mãe também gostava! Ela tem uma TARDIS lá em casa.
- Lá em casa em Nova York _ Ella comentou.
- Essa história da TARDIS é engraçada _ Mark disse rindo.
- Por quê? _ Teddy perguntou.
- Você lembra do dia em que teve uma confusão lá na emergência por causa de um evento NERD em que as pessoas estavam, literalmente, se matando para conseguir alguns produtos raros? _ ele perguntou pra namorada.
Ela tentou lembrar.
- Tinha um garoto que perdeu uma orelha para conseguir comprar uma... TARDIS... É TARDIS que se chama?
- Sim _ Katie respondeu.
- Sim. Ele perdeu uma orelha no meio da confusão, mas conseguiu comprar essa coisa com o amigo dele. A maior preocupação dele, no hospital, não era a saúde dele. Era essa coisa.
- A TARDIS _ Katie disse.
- Sim. A TARDIS. Acontece que o custo do tratamento dele no hospital estava muito caro e, advinha o que o amigo dele fez?
- O quê? _ Teddy perguntou sorrindo.
- Ele vendeu a TARDIS para a Addison pelo preço do tratamento.
- Ah! Que legal...
- Legal? _ Mark perguntou _ O garoto preferia morrer ali, naquele momento, do que saber que não tinha mais aquela coisa.
Todos riram.
- A mamãe nunca contou isso _ Katie disse.
- Foi uma situação engraçada.
Se divertiram por mais alguns minutos, mas logo voltaram pra casa, onde contaram com empolgação como tinha sido o jantar. Mark tomava uma taça de vinho, apenas observando. Ele estava feliz por Teddy ter se dado tão bem com as meninas. Por mais que não quisesse, não poderia deixar de pensar que provavelmente Lexie não se sairia tão bem daquele jeito. Assim como Meredith Grey era com Derek, Lexie nunca manifestou interesse de se envolver com as pessoas de sua vida antes de Seattle.
- Mark, eu acho que a gente tem que ir _ ela disse colocando uma mão no joelho dele.
Já tinha terminado a taça. Só tinham ficado porque as meninas estavam animadas e Addison pediu.
- Porque vocês não dormem aqui? _ Isabella sugeriu.
Teddy riu, enquanto levantava. Mark acompanhou.
- A gente não pode. Mas nós podemos marcar outra coisa. O que você acha? _ sugeriu.
- Legal!
- Addison, elas são muito educadas. Parabéns _ Teddy disse olhando para a colega.
- Obrigada. Vocês vêm para o aniversário da Ella no domingo, não vêm?
- Sim _ Mark respondeu.
- Certo. Então a gente se ver no domingo.
- Tchau.
Eles saíram e depois de fechar a porta, Addison voltou para sentar ao lado das filhas.
- Vocês se divertiram? _ perguntou.
- Humrum.
- Ainda bem que vocês se comportaram de verdade e a Altman não falou aquilo só para ser educada, não é mesmo? _ perguntou sarcasticamente.
- Eu juro que nós nos comportamos _ Ella disse estendendo uma das mãos.
- E comeram bonitinho sem sujar nada?
- Sim.
- A gente não é mais criança, mãe _ Katie lembrou.
- Essas são as minhas garotas _ Addison disse dando um beijo no rosto de cada uma.
- Subam. Vão escovar os dentes e trocar de roupa para dormir.
As meninas obedeceram.
***
Os dias passaram muito rápido até que chegasse o domingo. Amelia tirou o dia inteiro de folga para ajudar a cunhada a arrumar a casa para o aniversário de Ella, que, como todos os dias, estava no jardim caçando fadas entre as flores coloridas.
- Katie, vai ver onde a sua irmã está. Eu tenho medo que ela se empolgue e entre nessa floresta.
Katie deixou o arranjo de flores que estava fazendo de lado e andou até uma das janelas grandes para ver que Ella continuava sentava na grama, brincando com as flores.
- Ela ainda está aqui.
- Certo.
- Eu acho que a Ella vai optar por aulas de biologia quando for para o Elementary. Você precisa ver como é a minha classe de biologia.
- O que tem a sua classe de biologia? _ Addison perguntou.
- Você nunca fez aula de biologia na escola? _ Amelia perguntou.
- Não no Elementary. Eu fiz quando era obrigatório no High School.
- São um bando de hippie, paz e amor, que adoram plantas e são vegetarianos porque não defendem os maus tratos aos animais _ Amelia lembrou.
Katie riu, concordando com a tia.
- Eu acho um pouco contraditório, porque eles adoram plantas, mas comem plantas porque são vegetarianos! _ Katie disse.
Amelia gargalhou com a teoria da sobrinha, mas tinha que concordar com ela.
- Katie, para de rir dos outros. Isso é feio, filha.
A menina estendeu as mãos no ar e voltou a arrumar as flores.
- Eu adoro festa de criança. Já chegaram os docinhos? _ Amelia perguntou.
- Já, mas você não vai chegar perto deles até chegar o horário.
Katie riu.
- Eu não comprei nenhum presente pra Ella _ comentou.
- Você não precisa _ disse Amelia.
- Mas todo mundo vai trazer presente.
- Você não vai trazer presente. Você já vai estar aqui _ Addison disse.
- Mas eu queria ter presente.
- Se você quiser, a gente pode dizer que o presente que eu comprei é meu e seu _ Amelia sugeriu.
- Mas o seu já é seu e do Owen.
- Mas pode ser meu, seu e do Owen.
- O que você comprou? _ Addison perguntou.
- É surpresa! Eu só vou entregar no final da festa _ ela respondeu com um sorriso no rosto.
- Se fosse pra não falar, você não deveria nem ter comentado _ Katie disse.
- Ai, que garota rabugenta! Eu só vou dizer que é uma coisa: é perfeito pra quem mora em um lugar como esse.
- Fala logo o que é! _ Katie pediu.
- Eu adoro quando você fica curiosa e impaciente.
A menina revirou os olhos.
- Exatamente como o Derek! Eu já sei de quem eu devo encher o saco agora que ele morreu...
Katie parou o que estava fazendo e deixou a rosa sobre a mesa de centro. Addison e Amelia trocaram um rápido olhar.
- Eu não quis dizer isso _ Amelia disse.
A menina levantou devagar.
- Katie...
- Eu vou ficar lá fora pegando outras flores.
- Desculpa, Katie.
Ela não respondeu e saiu de casa.
- Ela ligou o modo passiva-agressiva. Desculpa, Addie _ Amelia disse _ Eu e essa minha boca...
- Relaxa. Daqui a pouco ela volta e vai ficar tudo bem.
Depois de sair de casa, Katie caminhou até trailer do pai, que ficava há alguns metros da construção, e sentou na escada de metal que tinha em frente à pequena varanda alta e coberta. Por algum motivo Derek não quis de livrar dele. O arquiteto colocou alguns vasos de flores para dar uma utilidade no local. Ella estranhou em ver a irmã puxando uma flor e foi até lá, mas tropeçou quase a frente dela.
- Katie, o que você está fazendo?
- Nada... _ ela respondeu mexendo com as flores _ Eu acho que vou fazer um novo arranjo.
- Mas aquele que você fez está muito bonito.
- Eu não achei.
Katie levou algum tempo para escolher mais uma flor e Ella continuou observando.
- O que você estava fazendo? _ Katie perguntou.
- Procurando alguma fada jardineira, mas eu não encontrei nenhuma. Você já percebeu que hoje as nossas flores estão mais bonitas?
- Você acha?
Ella continuou observando a atenção com a qual a irmã selecionava as flores.
- Eu acho que elas não aparecem pra mim porque eu não sou muito boa nessas coisas _ a menina comentou _ Você é.
- Com essas coisas o quê?
- Colher flores, fazer arranjos...
- Estranho, porque você só faz desenho de florzinhas _ Katie disse olhando para outro vaso para conferir se tinha alguma flor que lhe interessava _ Mas é o seguinte: primeiro você precisa encontrar uma flor principal _ disse mostrando pra irmã a primeira flor que pegou _ Depois as outras flores só terão que combinar com a principal _ continuou enquanto selecionava novas flores _ Foi a Bizzy que me ensinou _ disse _ Assim... Você sabe essas rosinhas aqui? _ perguntou apontando para umas flores pequenas _ Se elas forem as principais, essas brancas pequenas vão combinar com ela.
- E essas aqui? _ Ella perguntou apontando para alguns buquês pequenos que estavam caídos no chão.
Eram amarelos e ela achava muito bonitos. Tinha separado para levar pra dentro.
- Essas não são flores, são folhas de ipê _ Katie disse _ Folhas também podem ser coloridas. Eu só fico em dúvida se elas fazem ou não fotossíntese. Você sabia que as folhas são verdes porque elas fazem fotossíntese? _ perguntou fazendo com que Ella ficasse observando com atenção _ Isso quer dizer que elas conseguem a energia da luz do sol. A gente consegue energia com os alimentos que consumimos, mas as árvores se alimentam de sol.
- Sério?
- Humrum.
- Legal. E o quê mais?
- Não sei. Eu só lembro dessa parte da aula.
- Qual é a aula?
- Biologia. Eletiva. Acho que você ia gostar.
- Eu também acho.
Katie voltou a ficar em silêncio, selecionando flores e formando um pequeno buquê. - E aí? Você acha que eu sou tão bonita quanto essas flores? _ perguntou olhando para a irmã e colocando o pequeno buquê ao lado de seu rosto.
Ella ficou sem saber o que responder. As flores combinavam com ela. Eram vermelhas e brancas. Katie tinha os lábios rosados que se destacam no contraste dos cabelos negros dela com a pele, então as flores também combinavam.
- Não sei, Katie. Você é bonita _ a menina respondeu.
- Sou? _ ela perguntou como se já soubesse a resposta.
- Sim. Você é tão legal, sabe quase tudo, sempre usa umas roupas tão bonitas e também é muito bonita _ Ella respondeu _ Comparada com você, eu não sou nada.
- Para com isso _ Katie disse tirando o sorriso do rosto.
- É verdade. Se você é a flor principal, eu sou só o complemento.
- Porque você está falando isso?
Ella não respondeu, apenas deu de ombros. Era óbvio que a irmã era melhor que ela em tudo.
- Bom... Na verdade eu não acho que você seja uma flor _ Katie disse da forma direta como ela costumava ser, fazendo com que a irmã arqueasse as sobrancelhas em confusão _ Você é um botão esperando florescer.
Ela não entendeu o comentário da irmã, mas imaginou que era algo negativo, afinal, ela nem era flor. Katie percebeu que a irmã não havia entendido, por isso, deixou as flores de lado, tirou uma das pulseiras que estavam em seu pulso e colocou no braço da irmã. Voltou às flores.
Ella olhou para a joia ainda mais confusa. A joia era muito delicada e tinha algumas flores de prata penduradas. Perguntou-se porque Katie tinha lhe dado aquilo. Ela nunca tinha lhe dado nenhum presente, principalmente com algo que fosse dela mesma.
- Porque você me deu essa pulseira? O que significa? _ questionou.
- É seu aniversário. É um presente.
Ella apertou os olhos.
- Significa que eu vou achar muito triste que você murche como um botão _ Katie completou.
- Como assim? _ ela perguntou, mas com vergonha e medo que a irmã pensasse que ela é lenta ou burra.
- Você não acha triste essas flores que não florescem? _ Katie perguntou _ Por exemplo... Essa aqui... _ disse pegando um botão que estava fixo na terra _ Ele poderia formar uma flor mais bonita que a principal, não é? Mas eu arranquei e agora ele não vai mais florescer.
Ella pensou por alguns segundos até que entendesse o que a irmã queria dizer. Sorriu.
- Obrigada, Katie.
- Vem. Vamos continuar colhendo.
Elas se divertiram fazendo buquês pequenos juntas, em seguida deitaram na grama e ficaram olhando para o céu. Katie pensou que fazia muito tempo que elas não tinham um momento juntas. Quando Ella era menor, ela gostava de brincar com ela. Às vezes sentia como se pudesse ensinar qualquer coisa pra ela. Lembrava que fazia ela sentar no chão da sala e ficava por horas brincando de escola enquanto os pais trabalhavam.
- Ainda bem que existe a gravidade _ comentou.
- O quê?
- A gravidade _ disse _ É como uma força que faz com que a gente continue grudado no chão. É como se tivesse algo no centro da Terra que segura a gente aqui.
- Não é um imã? _ Ella perguntou.
- Mais ou menos. É mais como uma energia que fica ligada o tempo todo.
- E se fosse desligado? Uma vez eu sonhei que eu voava pra fora do planeta _ a menina comentou.
- Sonhou? _ Katie perguntou levantando uma das sobrancelhas.
- Humrum. Eu acho que se eu flutuasse pra fora do planeta, eu seguraria em uma dessas árvores.
- Eu não acho que eu seguraria em nada _ Katie confessou _ Eu ia pra fora do planeta.
- Sério? _ Ella perguntou surpresa.
- Claro. Imagina quanta coisa maravilhosa existe no universo!
- Mas precisa de uma roupa especial para ir para o universo.
Katie deu de ombros. Nos sonhos tudo era possível.
- Você ia mesmo pra fora do planeta? _ Ella perguntou _ Não mora ninguém lá. Deve ser chato.
- Pelo menos lá não tem os nossos problemas.
Addison saiu de casa e se surpreendeu em ver as duas filhas deitadas no gramado. Aquela era a primeira vez que via as duas fazerem alguma coisa juntas. Sorriu para a cena e não quis interromper, mas lembrou que era Bizzy quem estava aguardando.
- ELLA!!! _ chamou fazendo com que as duas virassem o rosto _ Entra um minuto que a Bizzy está ao telefone querendo falar com você.
- A Bizzy? _ a menina perguntou franzindo a testa.
Addison fez a mesma expressão e assentiu. As duas levantaram e entraram. Katie sentou no chão, em frente à mesa de centro, para voltar a trabalhar nas flores que havia deixado de lado, enquanto Ella subia no sofá para começar a falar com a avó.
- Oi, vovó.
Addison apertou os olhos sabendo que a filha tomaria uma bronca por ter dito aquilo.
- Querida, você pode me chamar de Bizzy _ disse a voz do outro lado da linha, fingindo tranquilidade.
- Desculpa, v... Quer dizer... Bizzy.
- Como você está?
- Bem.
- Estão preparando uma festa pra você no seu aniversário?
- Humrum.
- E você ganhou algum presente?
- Não.
- Então eu vou dar o primeiro presente do dia pra você.
- Sério? _ a menina perguntou abrindo um sorriso no rosto.
- Sim.
- E cadê você?
- Não, querida. Eu não vou para a sua festa.
- Não?
- Não.
- Por quê?
- Por que... Eu tenho que fazer algumas coisas em Connecticut. Mas eu comprei um presente pra você e eu tenho certeza que você vai adorar.
- É uma bicicleta? _ Ella perguntou.
- Não. É muito mais caro que uma bicicleta.
- Um carro!!!
Addison arregalou os olhos, sem acreditar que Bizzy pudesse estar dando um carro de presente de aniversário para uma menina de 5 anos.
- Não. Também não é um carro _ Bizzy disse.
- E o que é então? _ Ella perguntou.
- Quando eu tinha a sua idade, o meu pai me deu o meu primeiro pônei de presente de aniversário _ Bizzy contou _ Cuando a sua mãe fez a sua idade, ela também ganhou o primeiro pônei nela. Quando a sua irmã fez a sua idade, eu também dei um pônei pra ela. E agora você está fazendo 5 anos de idade...
- Você vai me dar um cavalo de presente? _ Ella perguntou olhando para Addison, que logo percebeu que a filha não gostou do presente.
Addison fechou os olhos e apertou os lábios, lembrando daquele presente.
- Sim. Você não gostou?
- G-Gostei. Obrigada, vovó. Quer dizer... Bizzy.
- Quando você vier para Connecticut no natal, vai poder me mostrar tudo o que você já sabe.
- Nós vamos para Connecticut no natal? _ ela perguntou olhando pra mãe.
- Me dá o telefone _ Addison pediu em um sussurro.
- A mamãe quer falar com você.
- É claro que ela quer. Feliz aniversário, querida.
- Obrigada, Bizzy.
Addison pegou o telefone das mãos da filha, puxou a respiração e finalmente levou o aparelho ao ouvido.
- Você comprou um pônei pra ela? _ ela perguntou.
- Sim. Como manda a tradição na nossa família.
- Mas... A gente está morando em Seattle agora.
- Eu sei onde vocês vivem, mas eu não acho que vocês vão ficar aí pra sempre, vão? _ Bizzy perguntou.
- Eu não sei, mãe.
- Quando vocês vierem em Connecticut ela vai poder aprender a montar.
- Mãe, ela tem medo de cavalos.
- Por enquanto, é claro, mas eu tenho certeza que em pouco tempo ela vai estar tão animada quanto a Katherine ficou quando ganhou o dela.
- Na verdade... Ela não está. Eu acho que cavalos não são a praia dela.
- Apenas, estejam agradecidas pelo presente de 32 mil dólares. Eu tenho certeza que assim que ela perder o medo, ela vai ser uma ótima amazona.
- Ela está fazendo aulas de tênis.
- Mãe! _ Ella repreendeu entredentes.
- Está vendo... Exatamente como você _ Bizzy disse _ Você tem que pegar no pé dela pra fazer as coisas, porque você sempre foi de começar as coisas e não terminar.
- Como é que é?
- Você sabe que é verdade. Mas agora eu tenho que ir. Eu falo com você em outro momento.
Antes que Addison pudesse dizer qualquer coisa, Bizzy desligou o telefonema.
- Você tem um pônei que custou 32 mil dólares para a conta bancária da sua avó _ disse olhando para a caçula.
- Jesus! _ Amelia exclamou.
- Eu poderia comprar muitas, muitas coisas com esse dinheiro _ Isabella disse.
- Sim, você poderia _ Addison disse.
- Nós vamos para Connecticut no natal? _ Ella perguntou.
- Não, meu amor. É claro que nós não vamos.
- Porque nós nunca vamos para Connecticut no natal? _ Katie perguntou.
- Porque você detestaria ir para Connecticut no natal e nós amamos o natal, lembra?
- Você nunca aceita o convite da Bizzy para passar o natal em Connecticut.
- Confia em mim, você não ia gostar de passar o natal em Connecticut. Eu já passei muitos natais lá e posso garantir que você ia detestar.
Depois que tudo estava pronto, Addison ajudou as filhas a se arrumarem para a festa e logo os convidados foram chegando com seus presentes. Eram poucos. Primeiro foi Mark que chegou com Teddy, em seguida Noah, que chegou sozinho, deixando Addison surpresa, já que ela contava com a presença de Lisa.
- Ela não pode vir. A Morgan estava irreversível hoje dizendo que ela estava de castigo porque estava muito desatenta na aula de ballet de hoje.
- Hoje é domingo _ Addison disse.
Noah contraiu os lábios.
- Ela faz aulas de ballet no domingo? _ ela perguntou _ Tem algum dia em que ela fica de folga dessa tortura?
Ele não soube o que responder e se sentiu um pouco culpado.
- Desculpa, Noah. Eu não deveria ter falado desse jeito. É que hoje eu falei com a minha mãe e ela empurrou pra Ella um presente que ela não queria.
- Que presente?
- Um pônei que custou 32 mil dólares.
- Uau! A sua família tem dinheiro mesmo, hein?
- É. O que tem de dinheiro, falta de noção.
Callie e Arizona chegaram animadas, querendo animar Isabella, que estava sentada no sofá conversando com Mark e Teddy. Até aquele momento não havia aparecido nenhuma criança, até que a campainha tocou e Henry entrou com um embrulho nas mãos e uma moça jovem ao seu lado. Katie levantou para receber o colega, conhecer a irmã dele e levá-lo até Isabella para que ela recebesse o presente. A menina sorriu para o desconhecido, mas logo voltou a conversar com Mark.
- A sua casa é muito bonita _ Angela comentou olhando em volta _ Os seus pais devem ter muito dinheiro.
- Eles são médicos _ Katie respondeu.
- Sério? _ Henry perguntou _ O meu pai também é médico.
- Cirurgião?
- Digamos que sim, ele faz algumas cirurgias quando é preciso _ Angela respondeu pelo irmão _ Ele é obstetra, ajuda bebês nascerem.
- Eu sei o que é ser obstetra. A minha mãe é isso também _ Katie disse _ Ela também é cirurgiã neonatal, ginecologista...
- Uau! Vocês devem ter muito dinheiro mesmo _ a moça comentou mais uma vez.
- Ela é aquela ali _ disse apontando para Addison, que conversava com Amelia.
- E o seu pai? _ Henry perguntou deixando Katie sem jeito.
- O quê que tem ele?
- Quem é? _ o menino perguntou olhando em volta _ É aquele ali que está com a sua irmã? _ perguntou se referindo a Mark.
- N-Não. Ele... _ a menina engoliu em seco _ O meu pai não mora aqui com a gente _ respondeu.
- Os seus pais são separados? _ Angela perguntou.
- Não.
- Não? _ Henry questionou.
- Não. É que... Ele sofreu um acidente de carro e está em coma em um hospital.
Os dois abriram os lábios e ficaram surpresos.
- Oh! Sério? _ Henry perguntou mudando o tom.
Katie assentiu.
- Eu sinto muito. Ele vai ficar bem logo, você vai ver.
A menina sorriu sem jeito e assentiu. Ele era a primeira pessoa que dizia aquilo porque todas as outras acreditavam que Derek estava morto.
Bailey chegou com o filho e os dois se aproximaram de Ella para cumprimentá-la, mas Addison percebeu que a filha agradeceu com o mesmo semblante triste com o qual agradeceu a todos os outros convidados.
- A sua casa é a maior casa que eu já vi na minha vida! _ Tuck comentou olhando em volta.
- Eu também _ Ella disse.
- Porque vocês não vão brincar juntos? _ Arizona sugeriu _ Porque você não mostra a sua casa pro Tuck, Ella?
- Você pode? _ ele perguntou com empolgação.
Ella olhou pra mãe, que assentiu com um sorriso no rosto. Mesmo contra a sua vontade, a menina levantou.
- A gente pode fingir que é um castelo! _ o garoto exclamou.
- Essa é a sala _ Ella disse.
Ela começou a mostrar a sala, mas logo seguiu com ele pelos outros cômodos. O preferido de Tuck foi o escritório, que mais parecia uma sala de jogos ou uma biblioteca.
- A mamãe disse que você estuda na mesma escola que eu. Em que série você está? _ ele perguntou olhando as peças do tabuleiro de xadrez.
- Último ano do kindengarder e você?
- Primeiro ano do elementary _ ele respondeu _ A sua casa é muito legal! E esses carros aqui? _ perguntou se aproximando apressado das réplicas de carros que tinham na estante atrás da mesa de Derek.
- Não toca! _ ela pediu.
Tuck se assustou e olhou pra garota ao seu lado.
- É do meu pai. Ele não gosta que mexam _ Ella lembrou.
Não costumava lembrar muito sobre Derek, mas lembrava daquilo.
- A minha mãe me falou o que aconteceu com o seu pai. Ela chorava todos os dias _ Tuck comentou.
- A minha mãe chora também às vezes, mas ela acha que eu não vejo.
- Você chora? _ ele perguntou.
- No começo eu chorei, mas depois...
- Se fosse o meu pai, eu ia chorar também.
Ella ficou sem jeito.
- Você sabia que o seu pai salvou a vida no meu pai no mesmo dia que a sua mãe salvou a minha vida? _ ele perguntou.
- Sério?
- Humrum. A minha mãe me contou da aventura que aconteceu no meu nascimento. Chegou um paciente no hospital que tinha uma bomba dentro dele. Uma bomba de verdade! Que tinha um relógio, que estava contando contra o tempo. Mas a mamãe não sabia disso, ela estava esperando o meu pai chegar para eu nascer e a sua mãe era a médica dela.
- A minha mãe estava no mesmo lugar que a bomba? _ Ella perguntou assustada.
- Sim! Já pensou se a bomba explodisse? Todo mundo ia morrer.
Ella arregalou os olhos.
- E o seu pai também estava no hospital, mas em outro lugar. Enquanto o meu pai estava indo para o hospital, ele estava com tanta pressa, mas com tanta pressa, que ele bateu com o carro e chegou no mesmo hospital em que a minha mãe estava esperando. Mas ele estava dormindo e com um problema no cérebro. O seu pai levou ele para a sala de cirurgias e começou a operar o cérebro dele. E o relógio da bomba continuava contando _ Tuck contava empolgado _ Quando a minha mãe soube o que tinha acontecido com o meu pai e que tinha uma bomba no hospital, ela não queria mais que eu nascesse naquele dia, mas eu tinha que nascer. Então a sua mãe fez de tudo para salvar a minha vida, porque se eu não nascesse naquele dia, eu ia morrer. E o seu pai fez de tudo para salvar o meu pai.
- E ele conseguiu? _ Ella perguntou.
- Conseguiu.
- E a bomba?
- O esquadrão anti-bomba conseguiu desativar a tempo.
- Uau!
- Os pais são super-heróis. Igual o sr. e a sra. Incrível.
Ella sorriu.
- Você sabe jogar isso? _ ele perguntou apontando para o tabuleiro de xadrez.
- Não.
- Eu sei. Quer que eu ensine você?
Ella assentiu e eles se posicionaram ocupando, cada um, uma das extremidades do tabuleiro.
- Essas peças aqui são os peões, eles só andam pra frente. Esses aqui não os cavalos e eles só se movimentam fazendo um L assim... Um, dois, três... _ Tuck disse demonstrando _ Ou assim... Um, dois, três... Não tem como errar.
- Ok.
- Esse é o bispo e ele anda para os lados _ ele continuou demonstrando _ Essa é a torre, que anda assim e assim. E essa daqui é a rainha. Ela tem os movimentos da torre e do bispo, mas ela pode ir do começo ao fim do tabuleiro.
- Legal.
- Sim. E esse é o rei. Ele só se movimenta nesse espaço aqui. Sabe qual é o objetivo do jogo?
- Ganha quem tiver mais peças do outro? _ ela perguntou.
- Não. Ganha quem tiver o rei no tabuleiro. Você pode perder todas as suas peças, menos o rei.
- Não deveria ser a rainha? _ Ella perguntou.
- Por quê?
- Porque o rei deveria proteger a rainha.
- Nesse caso, a rainha protege o rei. Ela é a peça mais forte do tabuleiro.
- Igual a minha mãe _ a menina disse.
- Igual a minha mãe também _ Tuck disse _ Vamos começar?
- Ok.
- Eu começo _ Tuck disse movimentando a primeira peça _ Sua vez.
Ella movimentou um peão, mas o colocou no lugar da peça que o menino havia movimentado.
- Não. Você não pode movimentar assim. No primeiro movimento, você pode pular até duas casas, mas depois você só pode andar uma.
- Ok. Desculpa.
- Coloca aqui ou aqui.
Ella obedeceu. Os dois jogaram por alguns minutos, enquanto Addison conversava com os colegas na sala e Katie se divertia conversando com Henry. Estavam se divertindo jogando xadrez, ainda que Ella errasse na maioria das vezes, mas Addison entrou no escritório para chamá-los para cortar o bolo. Ella não queria, mas não teve como escapar. Enquanto todas as pessoas cantavam, a menina segurava um sorriso encabulado até que tivesse que apagar as cinco velinhas acesas em cima do bolo de chocolate.
Depois que todos foram embora, ela voltou a ficar triste e subiu para trocar de roupa e dormir. Addison sentou no sofá com Owen e Amelia.
- Não foi legal, não é? _ perguntou à cunhada _ Ela não gostou.
- Não foi como ela esperava, Addie. Mas pelo menos ela fez um amigo.
- O Tuck?
- Sim.
- É. Eu acho que eles se deram bem.
Os três ficaram em silêncio.
- Eu vou lá com ela levar o meu presente e já volto _ Amelia disse levantando.
- Amelia, não demora porque eu ainda tenho que pegar uns papéis que eu deixei no hospital _ Owen disse.
- Ok.
Ela subiu e procurou pela sobrinha no quarto dela, acreditando que ela já tivesse encontrado o presente, mas a menina não estava lá. Katie, que estava no quarto ao lado, sentada na cama, estranhou em ver a tia entrando.
- Katie, você sabe onde está a sua irmã?
- No quarto.
- Eu fui lá no quarto dela e ela não está.
- No quarto da mamãe.
- Ah, sim!
Ela saiu do quarto de Katie e andou até o de Addison, onde Ella já estava de pijama, escolhendo um filme na TV da mãe.
- A sua mãe tem razão, você gosta mesmo de assistir filmes, não é?
- Gosto.
- Você está feliz?
- Estou.
- E você já viu os presentes que você ganhou?
- Não. Amanhã eu vejo.
- Hum... Escuta, eu tenho um presente pra você e eu acho que esse você não vai querer esperar até amanhã pra ver não.
- Por quê?
- Porque você só pode usar de noite.
- É um pijama? _ Ella perguntou.
- Não. É uma coisa muito melhor do que um pijama. Pelo menos foi mais caro.
- Foi mais caro que o pônei que a minha avó comprou?
- Não. Mas eu garanto que você vai gostar mais.
- O que é?
- Vamos lá no seu quarto que eu vou mostrar pra você.
- No meu quarto?
- Humrum. Vamos lá.
Ella concordou e seguiu a tia até seu quarto.
- Eu estava esperando que você fosse descobrir quando viesse colocar o seu pijama.
- Eu durmo lá no quarto da mamãe.
Amelia apontou para a janela que estava aberta e as duas seguiram para lá. Havia uma pequena varanda em frente à janela de porta dupla de madeira. Ella arregalou os olhos e sorriu para o objeto negro que estava apontando para o céu.
- Isso é um...?
- Sim! É um telescópio! _ Amelia disse.
Ella continuou sorrindo, passando os dedos no objeto.
- O Owen configurou tudo. Dá uma olhada pra você conferir.
A menina se aproximou do local onde deveria colocar os olhos e abriu os lábios em surpresa.
- Uau!!! _ exclamou _ É a lua!
- Sim! É a lua!
- É tão diferente!
- Sim!!!
- É a lua, tia!!!
Amelia sorriu, sentindo vontade de chorar com a felicidade e a empolgação da sobrinha.
- É tão linda! _ Ella exclamou.
As duas ficaram em silêncio e Ella continuou por alguns minutos olhando no objeto. Depois que ela se afastou, jogou o corpo em cima de Amelia e a abraçou de forma apertada.
- Obrigada, obrigada, obrigada, obrigada, obrigada!!! Esse foi o melhor presente que eu já ganhei na minha vida!
- Você ainda vai ganhar muitos presentes bons na sua vida.
- Essa foi a pior festa de todos os tempos, mas esse foi o melhor presente.
- Ei, não fala assim. Você ainda vai frequentar muitas festas e vai ver que existem festas de adultos que são muito piores do que essa sua festinha aqui.
- Verdade?
- Juro. Eu mesma já fui em cada festa chata que você nem imagina. Festa de trabalho, então... Um horror.
Ella sorriu para a tia.
- Me diz. O que você desejou na hora de apagar as velinhas?
- Voltar pra minha casa em Nova York.
Amelia ficou em silêncio e acariciou a bochecha da sobrinha.
- Eu sei. Eu entendo você.
- Não, você não entende. Porque você tem amigos aqui e até a Katie tem.
- Mas você tem um novo amigo também. O Tuck, filho da dra. Bailey.
- A gente só jogou xadrez juntos.
- Esse é um bom começo.
- Eu não quero novos amigos, eu quero os meus amigos antigos! _ Ella exclamou com os olhos marejados de lágrimas.
Amelia contraiu os lábios, com pena da sobrinha e se aproximou dela para abraçá-la.
- Oh, meu amor... Eu tenho certeza que vai ficar tudo bem.
Ella começou a chorar baixinho com o rosto colado no corpo da tia e as duas ficaram naquela posição – com Amelia acariciando os cabelos da sobrinha com a porta dos dedos e olhando para o céu estrelado, se perguntando porque todo aquele sofrimento tinha que acontecer com aquela família.
O tempo passou e ela não sentiu. Quando deu por si, a menina já havia pegado sono e estava desacordada em seus braços. Colocou-a na cama, cobriu seu corpo com o cobertor vermelho que tinha alguns desenhos de corações brancos, e beijou o rosto dela.
- Amelia, já está na nossa hora _ Owen disse enquanto a esposa descia as escadas.
- Ela já está dormindo, Addie. Ela adorou o presente.
- Que bom. Ela falou alguma coisa sobre a festa?
- Não foi legal, não é? Isso todos nós já sabemos.
- Coitada da minha filha.
- Vai ficar tudo bem, Addie. Ela é criança, vai fazer novos amigos em breve e quando você ver... Vai ficar tudo bem.
Addison contraiu os lábios forçando um sorriso e logo se despediu da cunhada. Depois que eles saíram, ela subiu, foi até o quarto de Katie para lhe dar um beijo de boa noite, em seguida entrou em seu quarto e se surpreendeu em ver que Ella não estava dormindo na cama. Imediatamente se dirigiu até o quarto da menina e ficou surpresa em vê-la ocupando aquela cama pela primeira vez. Ela deveria estar cansada, por isso dormia de forma tão pesada. Addison se aproximou dela e lhe deu um beijo demorado na testa antes de voltar para o seu quarto.
Entrou lá sozinha pela primeira vez. Ficou por alguns minutos parada, em silêncio, olhando pra cama e imaginando que naquele momento Derek deveria estar sentado do lado esquerdo, vestindo um daqueles pijamas de calça confortável e camiseta branca que ele costumava usar, provavelmente segurando a revista médica cujo seu próprio rosto estampava a capa, somente para ficar falando pra ela que sua pesquisa sobre tratamento de pacientes com gliomas malignos inoperáveis estava ganhando destaque. Ele deveria estar muito contente e orgulhoso de si mesmo. Poderia ter preparado uma festa magnifica de aniversário pra Ella, que não precisaria de nenhuma criança para ser a melhor festa da vida dela, já que ele animaria tudo com a sua felicidade. Tudo deveria estar dando certo, todos eles deveriam estar felizes. Depois de colocar todos os presentes no quarto da caçula, Addison deveria entrar no banheiro para tomar um banho e relaxar. Derek se juntaria a ela no chuveiro, ou poderia simplesmente aguardá-la na cama e abraçá-la depois que ela deitasse ao seu lado usando uma camisola limpa e exalando o cheiro refrescante de seus cremes de banho.
Ela engoliu em seco e parou de imaginar. Melhor, parou de se iludir com algo que nunca aconteceria. Depois de tomar seu banho rápido, Addison deitou na cama sozinha pela primeira vez. Sentiu saudades da companhia de Ella e teve vontade de andar até o quarto da filha e acordá-la apenas para trocar de cama, mas não fez isso. Fechou os olhos e não os abriu até que pegasse no sono. Acordou desesperada depois de ouvir o grito desesperado de Ella no quarto ao lado.
- MÃÃÃÃE!!!
O corpo dela levantou imediatamente e ela se lembrou da última vez que ouviu Ella gritando daquela forma. Seu coração acelerou e ela teve medo de sair e encontrar novamente com a cena que encontrou da primeira vez.
- MÃÃÃÃÃE!!!
- Mãe, a Ella está gritando no quarto _ Katie disse abrindo a porta do quarto da mãe.
Aquilo tranquilizou Addison, que finalmente pode sair daquela posição para correr até o quarto da caçula, que estava sentada na cama com as pernas encolhidas.
- Filha... Calma... _ Addison disse sentando ao lado da menina, que abraçou sua cintura de imediato _ Calma... O que foi? Você teve um pesadelo?
- Eu não quero dormir aqui! Porque você me colocou para dormir aqui?
- Eu não coloquei você pra dormir aqui. Você que dormiu aqui enquanto estava conversando com a sua tia.
- Eu quero dormir com você _ a menina pediu em prantos.
- Ok, meu amor. Vem. Vem dormir na cama da mamãe.
Addison carregou a filha com dificuldade e levou-a para o quarto.
- Você me assustou _ Katie disse entrando em seu quarto.
Addison beijou o rosto da caçula e a colocou deitada em sua cama, em seguida deitou ao seu lado e a abraçou por trás.
- Shiii... Tudo bem... A mamãe está aqui com você agora... Desculpa por você ter se assustado.
Ella encolheu as pernas e foi se acalmando aos poucos a cada beijo que a mãe dava em seu rosto. Não demorou muito para que as duas voltassem a dormir. No dia seguinte teriam que acordar cedo para mais um dia de escola.
Assim que Addison estacionou o carro, Ella ficou enrolando para sair, até que a irmã se despedisse e finalmente saísse sozinha para adentrar a escola.
- Você está bem? Está sentindo alguma coisa? _ Addison perguntou, estranhando o desanimo da filha.
- Eu não estou feliz, mamãe.
- Filha... Você não está feliz?
- Não.
- Oh, meu amor! Escuta, o que a mamãe pode fazer pra você ficar feliz? Eu faço qualquer coisa.
- Eu quero ir pra casa.
- Mas, filha, você precisa ir pra escola. Logo logo você volta pra casa.
- Eu quero ir pra nossa casa de verdade.
Addison contraiu os lábios. Se aproximou para beijar sua bochecha.
- Meu amor...
- Eu não acho que as coisas vão melhorar _ a menina se adiantou.
- Não?
- Não.
Addison não soube o que dizer, então apenas continuou olhando para os olhinhos tristes da caçula.
- Não pensa assim. Vai pra escola e daqui a pouco a gente conversa sobre isso.
- Mas eu não estou com vontade de ir pra escola hoje.
- Querida...
- Você pode me levar lá no hospital para visitar o papai?
Addison se surpreendeu com o pedido e franziu a testa. Aquela era a primeira vez que Ella pedia para visitar o pai no hospital.
- Você quer visitar o seu pai?
- Humrum.
- Você sabe que a gente pode ir lá no hospital depois da escola. A sua irmã vai todos os dias.
- Mas ela não foi ontem.
- Não. Porque era a sua festa.
- Aquela festa foi uma droga.
- Não fala assim, Ella. Eu dei o melhor de mim para fazer uma festa legal pra você.
- Eu sei, mas... Não é que a festa estava chata, é que... _ tentou explicar, mas não sabia como _ Você em razão. Desculpa, mãe.
- Tudo bem você não ter gostado, filha. Você tem esse direito. Mas eu vi que você fez um novo amigo. O Tuck, não é? Vocês brincaram, ele ensinou você a jogar xadrez...
- Eu posso visitar o papai?
- Você pode. Você pode visitar o seu pai quando você quiser, Ella _ Addison disse.
- Então vamos.
- Depois da escola, filha.
- Mas eu quero ir agora.
- Porque você quer ir agora?
- Porque eu não quero ir lá com a Katie.
Addison estranhou.
- Você não quer ir lá com a Katie?
- Não.
- Por quê?
- Porque eu quero falar com o papai sozinha.
- Você quer falar com o seu pai?
- Humrum. Sem a Katie.
Addison puxou o ar e contraiu os lábios. Pensou por alguns segundos olhando pra frente e, depois de coçar a testa, olhou para a filha. Ella estava sendo seu único elo de sensatez naquela história toda. Não queria que ela começasse a se comportar como Katie.
- Ok. Eu vou levar você até o hospital agora e você não vai assistir aula hoje. Mas isso não vai ser algo frequente, está me ouvindo mocinha?
- Ok.
- Coloca o cinto novamente.
Ella obedeceu e Addison ligou o carro para tirá-lo da garagem.
- O filho da dra. Bailey disse que o papai salvou a vida do pai dele e você salvou a vida dele no dia em que tinha uma bomba dentro do hospital.
Addison franziu as sobrancelhas em surpresa, lembrando daquele dia.
- Sim. É verdade.
- E você ficou com medo?
- Um pouco. Você ainda não existia e a sua irmã tinha a sua idade. Eu acho que fiquei com mais medo de deixar ela sozinha, sabe?
- Se você morresse, eu não teria nascido.
- Não.
- E o papai teria morrido de qualquer jeito.
- Sim, o seu pai teria morrido junto comigo.
- E a Katie ia chorar muito.
- Sim, querida. Mas isso não aconteceu, então não vamos falar sobre isso.
- O Tuck disse que a mãe dele chorou muito depois que o papai morreu.
Addison não comentou nada, apenas engoliu em seco. Sabia que o sofrimento que a morte de Derek tinha causado era grande, mas nunca tinha parado pra pensar na verdadeira proporção daquilo. Ele não tinha só família; tinha amigos, colegas de trabalho, pessoas que o admiravam. Ela não tinha como consolar essas pessoas.
- É, filha. É assim mesmo quando a gente perde uma pessoa querida.
- Você também chora às vezes, não é?
A bochecha dela corou levemente e ela continuou olhando pra frente, mas tendo certeza que a filha continuava olhando pra ela.
- É. Às vezes eu sinto saudades do seu pai e eu choro.
- Eu estava com saudades do papai ontem. Eu queria que ele estivesse lá na festa.
Addison engoliu em seco. Não soube o que dizer.
- Olha o que a Katie me deu _ Ella disse estendendo o braço para a mãe ver a pulseira.
Ela desviou o olhar por alguns segundos.
- Lindo! Era dela? _ perguntou retoricamente.
Sabia que era dela. Bizzy tinha dado, se não lhe falhava a memória.
- Sim.
- É lindo.
- Ela disse que é porque ela não queria que eu morresse como um botão.
- Como assim?
- Porque ela disse que é triste quando um botão morre sem florescer.
Addison arqueou as sobrancelhas e assentiu para o pensamento da primogênita.
- Ela tem razão.
- Você acha que eu vou ser boa em andar a cavalo?
- Querida, você vai ser boa em tudo o que você quiser ser boa, ok? Você só precisa se esforçar um pouquinho. Sabe o que a Bizzy me dizia quando eu tinha a sua irmã e não conseguia subir em cima de um cavalo?
- Hum?
- Os seus objetivos não vão se realizar só porque você quer que eles se realizem. Se você não trabalhar duro, você nunca vai conseguir nada _ Addison disse, imitando a voz da mãe.
Ella ficou pensativa.
Quando finalmente Addison estacionou o carro no estacionamento aberto do hospital, as duas saíram e entraram no local para se irem até o quarto de Derek. Ao entrar, Ella também se surpreendeu em ver como tudo estava diferente. Não parecia um quarto de hospital. Addison colocou uma mão em seu ombro.
- Eu vou esperar você lá fora, ok?
A menina olhou para o pai e sentiu que não queria ficar sozinha. Ainda assim, não sabia o que a mãe pensaria sobre o que ela gostaria de fazer. Assentiu.
Addison saiu do quarto. Estava curiosa para saber o que Ella faria, então ficou parada em frente à porta, com os braços cruzados, olhando a filha pelo vidro.
Ella se aproximou do pai. Não sabia muito bem o que fazer, ou como Katie agia durante o tempo em que ficava lá com ele. Havia uma poltrona ao lado da cama, mas, ao contrário da irmã, ela não sentou e ficou em pé ao lado de Derek por alguns segundos. Fazia muito tempo que eles não se viam e ela sentia quase como se estivesse renovando em sua memória alguns traços do rosto do pai. Algo dentro de si, desejava muito que ele abrisse os olhos e falasse com ela naquele momento, apenas para que ela recordasse como era o tom da voz dele.
- Papai, ontem foi o meu aniversário _ ela finalmente conseguiu falar alguma coisa _ Você lembrou? Você pode me ouvir? _ perguntou aproximando o rosto do ouvido dele _ Papai...
Addison ouvia a voz da filha em um volume muito baixo através da porta e sentia seu coração apertar.
- Eu acho que foi o pior dia da minha vida, foi a pior festa de aniversário _ a menina confessou _ Não tinha nenhum amigo e a única pessoa da nossa família era a tia Amy e o tio Mark. Eu queria estar na nossa casa, com a vovó Carolyn fazendo bolo e chamar os meus amiguinhos da escola e da natação _ disse _ Você lembra que você fazia cookies de manhã.
Estava difícil pra Addison controlar a emoção.
- A mamãe disse uma vez que a gente só vai pra casa depois que a Katie ficar melhor e aceitar que você está morto, mas eu acho que ela não vai querer acreditar que você está morto enquanto você estiver respirando, então...
A menina se aproximou em mais um passo do pai e Addison sentiu seu coração apertar e seus olhos arregalarem ao imaginar que ela poderia desligar algum daqueles aparelhos ao redor da cama de Derek. Levou a mão à maçaneta da porta, para entrar e impedir, mas logo parou o movimentou quando viu que Ella apenas estava se aproximando mais do ouvido do pai.
- Morre de verdade _ ela pediu _ Por favor. Morre de verdade e para de respirar. Assim a gente vai poder voltar pra casa.
Ela fechou os olhos e sentiu um aperto muito forte em seu peito. Aquilo foi a coisa mais forte que já presenciou desde a morte do marido. Virou imediatamente com o semblante assustado, quando sentiu uma mão parando em seu ombro.
- Montgomery, graças a Deus que você está aqui! Você poderia ajudar em um caso de TTTS que nós acabamos de admitir?
- Eu não trabalho aqui _ Addison disse.
- Sim. Mas você é médica. Você é a melhor cirurgiã neonatal da América.
- Eu não sou.
- É uma das melhores. Você é a única pessoa em todo esse hospital que pode e sabe fazer esse procedimento. Por favor?
- Bailey... Eu não sei se eu...
A porta se abriu e Ella parou ao lado da mãe.
- Já, mãe.
- Ei, o Tuck falou de você o tempo inteiro depois da festinha de ontem _ Bailey disse _ Ele achou a casa de vocês a melhor coisa do mundo.
Addison forçou um sorriso no rosto.
- Eu preciso levar a Ella pra casa.
- Você não pode deixá-la na creche por algumas horas e nos ajudar?
- Transfere de hospital, Bailey. Eu não posso agora.
Bailey ficou boquiaberta, mas ela apenas se afastou com a filha ao seu lado.
- Então? O que você queria falar com o seu pai?
- Nada.
- Nada?
- É particular
- Oh! Ok.
As duas ficaram em silêncio, até entrarem novamente no carro.
- Mãe, eu posso pedir uma coisa pra você? _ Ella perguntou.
- Claro, filha.
- Não morre nunca?
Addison contraiu os lábios e aproximou o rosto para beijar a testa da filha.
- Eu vou fazer o meu melhor.
- Pra onde nós vamos agora? _ a menina perguntou.
- Nós vamos pra casa, abrir os seus presentes.