Quando os Pássaros Pousam e O...

By JulieteVasconcelos

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O vento sopra as folhas do milharal levando para longe o fedor da carne pútrida, enquanto alguns pássaros sob... More

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VINTE E UM
Esclarecimentos e Agradecimentos

DEZESSETE

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By JulieteVasconcelos

Danna: Quando os Pássaros Pousam

Condado de Tulare, Califórnia

"Eu a encontrei... Estava tão... tão faminta e... suja! Nem parecia ser minha patroinha, dona Heloisa!" — A voz de Charles soava nítida, apesar da embriaguez.

"Quem não lembra de dona Heloisa? Ela era tão linda e... tão viva! Mas de repente a encontrei maltrapilha... Eu peguei dona Heloisa no colo e levei a coitada para a casa grande, deixei ela na cama do patrão... Ele chorava tanto naquele dia, estava tão triste e envergonhado... Até já tinha ouvido boatos sobre a fuga de dona Heloisa com o... Desculpe, o senhor sabe!"

"Naquele dia fui pra minha casa contente, com a certeza de que tinha salvado a vida de dona Heloisa... Mas eu não sabia ao certo... A salvei de quê? Há um tempo me pego pensando no que a deixou naquele estado... O que deu errado ao tentar fugir?" — Charles pigarreou.

"Bem, acabou que ela fugiu no outro dia... E eu não sei como ela conseguiu... Como é que dona Heloisa, fraca como estava, podia ter fugido? O senhor Craig disse que alguém a levou, mas... haviam muitos homens trabalhando e nenhum trairia o patrão, deixando que levassem sua senhora!"

O xerife se ajeitou na cadeira, cada vez mais interessado no desenrolar daquela história.

"O senhor Craig estava tão mal, tão abatido! Ele me fez prometer que jamais contaria que a vi no dia anterior e ainda mais sobre o estado em que estava. Ele estava envergonhado, porque o que dona Heloisa fez ao marido foi uma grande humilhação... Tive muita pena, tudo ia tão mal na vida do coitado... O senhor sabe... Aquele acidente tirou dele o movimento das pernas e a vida do seu menino, e depois... ela se foi, deixando o patrão sozinho naquela cadeira de rodas."

O xerife ouvia com uma expressão de incredulidade, suspeitando do rumo que aquele "depoimento" poderia tomar. Há muito desistira de descobrir com quem Charles conversava, pois notara que a gravação foi propositalmente editada, embora estivesse claro que o falecido estava a desabafar com um homem.

Nos minutos seguintes, Charles narrou com mais detalhes o dia em que encontrara Heloisa e o dia em que ela novamente fugira, de forma repetitiva, ficava claro ao xerife seu avançado estado de embriaguez, que começara a perder o interesse, deduzindo que toda gravação se resumiria àquilo.

"... penso que... só espero que ela esteja feliz onde estiver e que... pobre Antonella" — disse com a voz embargada pelo choro. "Ela não merecia o que fizeram com ela! Às vezes, quando fecho os olhos, eu vejo... nunca vou esquecer! E-ela não queria que eu a levasse para casa grande... Não sou louco! Senti que ela não queria, ela tinha... medo! Do que Antonella tinha medo? Eu não consigo entender..."

"Dona Heloisa estava no milharal, a senhorita Antonella também... estou sendo leviano, não estou?" — perguntou desesperado. "Não, não posso controlar meus pensamentos, são tão horríveis! Não tenho coragem de ir à casa grande, tenho evitado encarar o patrão... Não, não... eu só tenho medo que ele perceba que tipo de pensamentos tenho... Vou queimar no inferno por difamar um aleijado, um coitado que não tem ninguém pra olhar por ele!" — declarou num riso nervoso, enquanto o xerife ouvia tudo, aturdido, se recusando a acreditar no que aquelas palavras podiam significar.

O xerife logo deduziu que Charles, no ato daquele desabafo, deveria estar em choque pelos últimos acontecimentos, pois não via outra explicação.
Agora, tinha ainda mais curiosidade em descobrir quem fizera aquela gravação, quem conduzira aquela conversa e a enviara. A intenção de quem o fez estava muito clara, certamente acreditava que o fazendeiro Craig tinha alguma relação com a morte de Antonella, possivelmente com a de Charles e ainda com o sumiço de Heloisa, questionando a veracidade do que acontecera mais de dez anos atrás.

Os dias seguintes passaram rapidamente sem que o xerife descobrisse qualquer informação sobre quem enviou aquela correspondência anônima, assim como não sabia ainda em que ela seria útil na investigação, já que duvidava que o fazendeiro pudesse estar envolvido em qualquer crime.

Nada daquilo fazia sentido.

A investigação não os levara a nada, tudo o que tinha eram dois corpos e uma pequena população amedrontada, como se esperassem pelo aparecimento de mais um espantalho, onde se questionavam sobre quem seria a próxima vítima.

Ainda se falava naquelas terras sobre o fatídico dia em que Charles foi enterrado, onde todos se compadeceram do desespero da senhora Vivien e dos seus filhos.

Todos falavam ainda do demônio que estava à solta e que sequestrava pessoas de bem, os torturavam e os deixavam hasteados no milharal, assustando os pássaros e aterrorizando a todos.

Ninguém se sentia seguro, o pânico era geral.

O xerife soube por Craig que alguns de seus empregados se demitiram, aceitando trabalho nas fazendas vizinhas, enquanto os que ficaram, só o fizeram por precisarem em demasia dos seus salários, que Craig foi obrigado a aumentar para não perder ainda mais de seus homens.

Após o relato do fazendeiro, lembrando da misteriosa correspondência que recebeu, o xerife cogitou que alguém das redondezas estava tentando prejudicá-lo — além de o incriminar —, o que explicaria o fato dos corpos aparecerem nas terras de um aleijado, assim como o recebimento daquela gravação, que começava a ter certeza que foi fruto de manipulação — uma montagem! Isso fazia sentido, já que o bom fazendeiro tivera consideráveis perdas.

Agora o xerife mudava o foco da sua investigação. Deduziu que fosse briga de peixe grande, embora julgasse o alvo o mais frágil daquela região: o aleijado Craig.

Na tarde seguinte, Pierre alarmou-se ao ver o rosto do xerife empalidecer à sua frente, assumindo uma expressão de incredulidade e espanto. Deduziu que aquela ligação não só era muito importante, como portadora de uma notícia ruim.

Pierre aguardou, num misto de curiosidade e preocupação o término daquela ligação, onde há mais de vinte minutos o xerife ouvia alguém falar do outro lado da linha, se limitando a respostas monossilábicas em dadas ocasiões. Não saíra porque o xerife pediu para ele esperar, na certa não imaginava que fosse demorar tanto, e até parecia que se esquecera que seu subordinado estava ali.

O assunto era muito sério, não havia dúvidas sobre isso, não fosse assim, por que o FBI contataria sua partição?

Seria por causa do assassinato de Antonella? Ou por causa do assassinato de Charles? Por ambos? Pierre sabia que nenhuma outra ocorrência por essas terras justificaria aquela ligação.

— O que o agente do FBI disse? — indagou o assistente assim que o xerife encerrou a ligação.

— Você não vai acreditar, Pierre! — disse convicto.

— Tem a ver com as mortes no milharal? — perguntou curioso, ao que o xerife confirmou com a cabeça. — Eles te deram alguma informação?

— Na verdade... nos deram o nome do... assassino! — declarou atônito, se levantando.

— Tinham o DNA dele no sistema? — inquiriu, ao que o xerife gesticulou em negação. — Não descobriram a quem pertence o sêmen deixado no corpo dela? — insistiu.

— Não, não precisam! — respondeu andando de um lado para outro.

— Então? — perguntou confuso. — E por que o FBI se envolveu nesses casos?

— Quando Antonella passou pela autópsia, tiraram de dentro da barriga dela uma grande quantidade de palha...

— Sim?

— No meio da palha encontraram alguns... alguns pelos...

— Do assassino? — Pierre perguntou ainda mais curioso.

— Não. Examinaram os pelos e puxaram o DNA no sistema, encontraram, pertence a um cirurgião famoso que desapareceu há mais de dez anos em Sacramento.

— E em que isso nos dá o nome do assassino? — perguntou confuso.

— Não há nenhum tipo de registro de que esse cirurgião tenha vindo alguma vez para cá... Ele foi trazido!

— Não estou conseguindo acompanhar...

— Esse cirurgião foi o responsável pela cirurgia do... do senhor Craig, foi quem o operou depois do acidente. Não existe outra razão para encontrarem DNA desse homem por aqui, entende?

— Espera, está dizendo que esse fazendeiro o matou porque o culpa por ter ficado na cadeira de rodas?

— Talvez...

— Talvez?

— No prontuário do senhor Craig foi registrado que a cirurgia foi um sucesso, que não houve grandes danos...

— Mas como? Ele está entravado numa cadeira de rodas! — lembrou incrédulo.

— Meu Deus! Tudo que o Charles disse naquela gravação... agora faz sentido! Você a ouviu, Pierre?

— Sim, mas ele estava bêbado e em choque, como o senhor mesmo disse!

— Eu estava errado, Pierre! Estava errado! — falou exaltado esmurrando sua mesa. — Deus! Heloisa nunca fugiu! Jacob não a levou para lugar nenhum! Esse médico da cidade... Antonella... Charles... e só Deus sabe mais quem! Ele os matou, matou todos! — dizia cada vez mais exaltado. — Nos fez de idiota por todos esses anos, Pierre! — declarou encarando o rapaz, que também estava boquiaberto.

— O que faremos agora? — perguntou após um breve silêncio. — Vamos prendê-lo?

— Não — respondeu balançando a cabeça. — O FBI está assumindo, não podemos fazer nada até que os agentes federais cheguem aqui.

— Quando chegam?

— Segundo o agente, em dois dias no máximo!

— O que faremos até lá? — perguntou, mas o xerife não respondeu. — Senhor, o que faremos até que o FBI chegue?

— Rezar... rezar para que aquele demônio não cruze meu caminho, porque se eu o ver, eu mesmo o mato! — declarou enfurecido, ao que Pierre o encarou com ar de aprovação.

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