Futuro Conquistado #2 (Ficção...

Por EltonMoraes

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Desfecho da duologia iniciada em "Futuro Renegado". "Sacrifícios são feitos de escolhas". Após os acontecimen... Más

VOCÊ SABE PELO QUE LUTA?
PARTE 1: CONSEQUÊNCIAS
Capítulo 1: Natanel
Capítulo 2: Mirian
Capítulo 3: Ranna
Capítulo 4: Natanael
Capítulo 5: Mirian
Capítulo 6: Ranna
Capítulo 7: Natanael
Capítulo 8: Mirian
Capítulo 9: Ranna
Capítulo 10: Natanael
Capítulo 11: Mirian
Capítulo 12: Ranna
Capítulo 13: Natanael
Capítulo 14: Mirian
Capítulo 15: Ranna
Capítulo 16: Natanael
Capítulo 17: Mirian
Capítulo 18: Ranna
Capítulo 19: Natanael
Capítulo 20: Mirian
Capítulo 21: Ranna
Capítulo 22: Natanael
Capítulo 23: Mirian
Capítulo 24: Ranna
Capítulo 25: Natanael
Capítulo 26: Mirian
Capítulo 27: Ranna
Capítulo 28: Natanael
Capítulo 29: Mirian
Capítulo 30: Ranna
Interlúdio I: Sandra
Interlúdio II: Sandra
PARTE 2: FUTURO
Capítulo 31: Natanael
Capítulo 32: Mirian
Capítulo 33: Ranna
Capítulo 34: Natanael
Capítulo 36: Ranna
Capítulo 37: Natanael
Capítulo 38: Mirian
Capítulo 39: Ranna
Capítulo 40: Natanael
Capítulo 41: Mirian
Capítulo 42: Ranna
Capítulo 43: Natanael
Capítulo 44: Mirian
Capítulo 45: Ranna
Capítulo 46: Natanael
Capítulo 47: Mirian
Capítulo 48: Ranna
Capítulo 49: Natanael
Capítulo 50: Mirian
Capítulo 51: Ranna
Capítulo 52: Natanael
Capítulo 53: Mirian
Capítulo 54: Ranna
Capítulo 55: Natanael
Capítulo 56: Mirian
Capítulo 57: Ranna
Epílogo
Extra

Capítulo 35: Mirian

27 3 49
Por EltonMoraes

AGENTES NADA ESPECIAIS


...esvai.

É o primeiro pensamento que tenho ao abrir os olhos, sentindo como se todo o meu corpo fosse feito de névoa. O teto sobre mim é de um vidro grosso e inquebrável. O mesmo se repete em torno quando mexo o pescoço — o que causa uma baita dor de cabeça, inclusive.

Chiando, sento-me e uma exclamação quase faz meus tímpanos estourarem:

— Mirian! — Viro-me para Lya, do outro lado do vidro, as mãos apoiadas no vidro, como Eric fez ao esperar que eu repetisse o gesto. — Como você está? O que aconteceu?

Gente, desde quando a ruiva faz tantas perguntas?

— Primeiramente, oi — sussurro. Inspiro com força, minha mente voltando a se reordenar. A dor ainda está aqui, mas pelo menos está diminuindo. — Eu tô bem, na medida do possível, e não tenho certeza do que aconteceu.

— Como não? Oh, espera, fizeram lavagem cerebral em você?

— Quê? Não... se bem que uma seria bem-vinda — suspiro. — Eu vi Eric e Maxwell.

Lya pisca mais que o necessário e me encara como se eu estivesse louca.

Talvez eu esteja mesmo.

— Onde? — sua voz soa quase desesperada, mas há algo mais, há raiva. — Eles estão aqui?

— Se eu não tiver viajado na maionese, estão em outro laboratório como esse. E também descobri umas coisinhas que farão você cair de costas.

— Nada me faz cair de costas — retruca, fazendo-me sorrir.

Ainda um pouco confusa, pergunto para Lya quanto tempo fiquei desacordada e ela me conta que desde que Samuel me trouxe, pela manhã. Segundo a última visita de um enfermeiro, há cerca de uma hora, já está noite — o que me leva ao fato de que estive desmaiada o dia todo. A última coisa que lembro é de estar falando com James, me despedir de Eric e puff, adeus consciência. Eu achei que estava morrendo. Talvez eu quisesse estar. Mas a realidade é outra e não sei se sou capaz de lidar com ela, de lidar com meus poderes incontroláveis. O que está acontecendo comigo?

Ok, Mirian, não se desespere, você já estava ciente de que as coisas estavam estranhas antes. Apenas adicione uma coisinha a mais nessa mistura, ok? Ok.

— Eu estou com medo, Lya — solto de súbito, assustando-a. Ela se escora no vidro, fitando-me de esguelha. — Se eu não estiver doida e eu conversei com James...

— Espera, você falou com ele?

Assinto com um movimento sutil de cabeça.

— Durante meu teste eu projetei minha imagem consciente e não consegui mais voltar pro meu corpo. Então fui atrás dele, achando que estava prestes a morrer. Ele me contou algumas coisas, não sei quanto disso é verdade, mas... — viro-me para encará-la — se forem reais, ele sabe tudo sobre nós, sobre a sociedade. Nós não temos como escapar de suas garras.

— Mirian, eu não sei o que ele te contou, mas não podemos desistir! — exclama. — Nós viemos até aqui, nunca é tarde para continuar tentando.

— Eu tô com medo, Lya, pela primeira vez!

— Eu não entendo...

— EU QUASE MORRI! — grito, descontrolada.

A ruiva se espanta e se silencia.

Ergo-me, caminhando até o outro lado da cela. Apoio as mãos no vidro, os braços esticados, cabeça baixa. O rosto mergulhado entre os fios encaracolados. Inspiro fundo, forçando minha razão e emoção a se colocarem em seus devidos lugares. Ok, Mirian, você está surtando, relaxa. Talvez Lya esteja certa, nunca é tarde para continuar tentando, mas como saber se tudo isso que estamos fazendo ou o que iremos fazer não foi ou será premeditado?

Volto-me para a ruivinha e me aproximo, sentando-me em minha cama.

— Certo, precisamos fazer alguma coisa que eles não tenham planejado. Algo muito além do que imaginavam.

Ela pisca e sorri.

— Gosto dessa Mirian.

— Eu sei, você tem que ver o que ela é capaz de fazer entre quatro paredes.

Lya ri, encarando-me com certa doçura. Ficar confinada muda as pessoas, né nom?

— Não me provoque.

— Por que, está com medo de se render aos meus encantos? — retruco.

Os olhos dourados da ruiva me analisam por um curto espaço de tempo antes de desviarem. Foi tempo suficiente para encontrar ali algo como... dúvida?

— Sem chances — digo, chamando sua atenção. — Você não está questionando sua sexualidade, está?

— Não! Claro que não! É só que... — revira os olhos, levantando-se. Anda em círculos pelo seu cubículo, o que quase me deixa tonta. — Porra, Mirian, eu não sei mais o que é sentir atração, não sei mais o que é sentir carne na carne e... bem, você é a coisa mais próxima de mim.

Arqueio as sobrancelhas. Eu nunca vi Lya tão fragilizada dessa forma. Não só pela falta de sexo, mas é algo a mais... seus sentimentos estão gritando nessas poucas palavras. Eles clamam por atenção. E ser uma de nós torna a vida bem complicada, afinal, muitas vezes nos abstemos de nos envolver com alguém por medo de fazê-la sofrer, caso não voltemos.

Ok, não foi bem o meu caso, já que me envolvi com dois, olha só. Tudo bem que Eric é um Caçador como eu, então nós meio que estamos no mesmo barco. Mas Rita, a coisa é diferente. O dia em que a vi em meio aos pacientes, tão prestativa e forte ao encarar as dúvidas, ameaças, mortes... e ao mesmo tempo tão frágil dentro de si mesma... Isso me chamou atenção, isso fez eu me aproximar em minhas folgas. Ela me mostrou o que realmente sente e a quão grata é por tudo que fizemos no último ano. E sou ainda mais grata por permitir que eu desencavasse uma Rita que gosta da vida, que, mesmo com as dores, não deixa de sobreviver... porque é isso o que fazemos diariamente.

Mas agora, olhando para Lya, vejo que ela vem podando suas vivências, até demais. Nós já passamos fins de semana juntas, conversando, vendo filme ou caçando renegados, e eu acreditei que isso era vida para ela. E talvez eu esteja certa, mas ainda falta algo para fazê-la transbordar. Lorenzo, lembro-me. Existe ele em sua vida, mas não de forma física, de forma carnal... Pode parecer bobagem, gente, mas o corpo também sente nossos problemas emocionais e, volta ou outra, precisa de uma manutenção.

— Você está carente, deve ser isso — constato. A ruiva volve para mim, a tez franzida. — Há quanto tempo você está sem... — gesticulo.

— Ahn... dois anos? — estala a língua.

— Explicado.

Lya suspira, voltando a se sentar na cama, frustrada.

— Você acha que é só isso mesmo?

— Eu não tenho que achar nada, Lya, é você quem deve ter uma resposta. Mas, olhe, independente do que você se der conta, eu estarei aqui por você, como sempre. Confesso que eu amaria ver você dando uns pegas nas minas, também — rio, fazendo-a me acompanhar —, porém, existem momentos em que estamos confusos, e é normal. Você tem vivido comigo tanto tempo que... bem, pode ter ficado confusa. Talvez se você experimentar, descubra.

— Mas isso já não me classificaria...?

— Lya, experimentar não define ninguém! Orientação sexual é como você se sente, muito além de se relacionar com o mesmo sexo, e isso só você pode definir.

Solta o ar dos pulmões, anuindo.

— Tanto tempo vivendo entre os LGBTs e ainda assim não aprendi tudo o que deveria — resfolega.

— Miga, tem coisa que até eu ainda não entendo!

Rimos as duas, unidas por essa conversa cheia de questionamentos internos. No fim, eu a entendo, porque me descobri mais ou menos da mesma forma. Eu achava errado — melhor dizendo, meu pai achava errado e eu reproduzia —, mas me dei conta de que o feminino me atraia tanto quanto o masculino. Reprimindo esse desejo, eu só sofri, questionando-me diariamente o que era certo e errado. Eu achava correto me permitir, mas a religião dizia o contrário. Até me entregar a uma colega de faculdade e descobrir que eu não precisava ter medo do que eu era, do que eu sou, porque essa mistura doida é o que ajuda a me formar.

E eu tenho orgulho de ser quem me tornei simplesmente por não me deixar derrubar pelo machismo e doutrinas que me foram impostas a vida toda. Afinal, até onde um livro e uma ideologia antigos devem afetar nossa vida, pensamentos e desejos?

Abruptamente, um alarme começa a soar, pegando-nos desprevenidas. De pé, troco um olhar com Lya, ativada no modo atenta. Seja lá o que estiver acontecendo, o som não me parece ser de uma visitinha dos presidentes. A confirmação vem quando ouço barulho de tiros, abafados pela porta do laboratório. Então cai um silêncio mórbido e, CABUM, a entrada é arrancada das dobradiças e reduzida a uma obra de arte contorcida e pós-moderna.

Lya e eu nos jogamos contra o vidro quando vimos quem acaba de entrar. Com as mãos ainda em chamas e um sorriso malicioso nos lábios, questiona:

— Cheguei numa hora ruim?

É Eric!

*

Assim que as portas das celas se abrem, lanço-me nos braços do homem, que retribui com um aperto aconchegante. Sinto cada pedacinho de seu corpo no meu e isso é suficiente para saber que estou cem por cento viva. Nossos lábios se grudam em um beijo cinematográfico, alucinante. Solto-o e me viro para Lya, que está com uma sobrancelha erguida e, sorrindo, tomo seu rosto entre as mãos e puxo contra o meu em um beijo de parar a rua.

— Wow! — ouço o Faísca logo atrás de mim.

Afasto-me de Lya apenas para vê-la ficar da cor do próprio cabelo, olhos esbugalhados.

— Espero que tenha sua resposta — sorrio.

Ela engole em seco, ainda calada. Será que eu a fiz entrar em choque?

— Espera, Lya...

— Não pergunte — rebate ela, vincando a testa para ele, que simplesmente ergue as mãos, rendido. — Então, como você...?

— Sandra.

— Oi? — perguntamos em uníssono.

— Sandra veio nos libertar — conta Eric, guiando-nos para fora daqui. — Ela soltou Max e eu, e partiu atrás de James.

— Como ela descobriu nossa localização? — indaga uma ruiva intrigada.

Eric dá de ombros.

— Isso só ela poderá nos responder.

— Parados, ou atiramos! — grita um guarda assim que saímos do laboratório. Olho em volta e percebo que estamos cercados, tanto pelo corredor a nossa direita e esquerda, quanto pelo da frente.

— Eu odeio esses caras — murmura Lya, entredentes.

— Como nos velhos tempos? — insinua Eric.

Dou um passo atrás, percebendo o olhar de meus parceiros se aquecerem como muitas vezes vi.

— Como nos velhos tempos — concorda a ruiva, já erguendo os braços como se sacasse duas pistolas das cinturas, atingindo metade dos homens a frente e todos do lado direito. Sem ficar nada atrás, Eric lança chamas na outra metade a frente e nos homens à esquerda, fazendo-os se debater enquanto o fogo se alimenta de suas roupas e pele. — É isso aí, Faísca! — Os dois dão um high five, fazendo-me rir.

Com os guardas no chão, pulamos alguns caras e disparamos pelo corredor da frente. Enquanto isso, as luzes se apagam em toda a instalação e Eric acende uma das mãos, jogando luz suficientes para nos guiar.

— Max deve ter cuidado disso — fala ele, virando em outro corredor, e para de repente. Choco-me em suas costas largas, quase me queimando com seu fogo.

(Sim, é uma frase de duplo sentido).

À nossa frente, está ninguém menos que James e, sob a força de seus braços, nossa Chefe de Operações: Sandra.

— Ora, ora, se não são meus renegados favoritos? — diz o homem com um sorriso largo no rosto. Seus olhos se fixam nos meus, revelando, rapidamente, certo transtorno. — Então você está viva.

Sorrio de canto.

— Vivinha da silva.

— É uma pena, Mirian, porque isso significa que terei que te matar. Ou melhor, terei que matar todos vocês!

Eric e Lya dão um passo à frente, prontos para atacar.

— Você não vai fazer isso, James — Sandra sibila, para meu espanto, esfregando-se nele.

— E por que não? — ele a questiona, rígido.

Sandra sorri, os lábios vermelhos pelo batom chamativo.

— Porque não é o que deseja — a voz soando sensual na mesma medida que seu corpo o atiça. — Você sabe que precisa de nós, você sabe que somos importantes e que se nos matar só vai gerar mais revolta e, pela primeira vez, colocará aqueles que controlou contra você.

— Ninguém precisa saber da verdade.

— Mas questionamentos virão — sussurra, remexendo-se sob a pressão bem mais leve de James. Ela solta uma piscadela para mim e, num movimento, se vira para ele, apertando-lhe o pescoço com a mão direita enquanto a esquerda está em um lugar mais abaixo. Enquanto fala, o que mais imagino é ela sorrindo, feito uma cobra prestes a dar o bote: — E você não precisa mais se preocupar com questionamentos, você não precisa se preocupar com nada, nunca precisou, não é mesmo? Mesmo seus deveres foram colocados sobre as costas de outros da sua família, de algum outro Treze. Você nunca se importou, de fato, com o que acontece com as pessoas, não é?

— Por que eu me importaria com a escória do mundo? Os humanos só sabem odiar, matar, destruir. Por que acha que fazemos tudo isso? Para o bem!

— Para seu próprio bem! Vocês descobriram formas de viver mais tempo, não foi? — Quando James assente, Sandra continua: — É por isso a redução populacional, não é apenas por quererem preservar a natureza, mas é para preservar a vida de vocês, ter um local onde viver. A redução serve para salvar os "melhores", certo?

— Certo.

— Então por que eu não deveria lhe matar, James?

Os olhos do homem esbugalham.

— Porque eu sou a verdade, eu sou tudo o que há a ser seguido!

Ouço um risinho manso, carregado de malícia, vindo de Sandra.

— Nós não precisamos seguir alguém que pensa em si mesmo, que abandonou os valores que realmente importam. — Num rosnado, ela sentencia: — Eu vou te libertar desse mal — e o beija.

Os olhos do homem se arregalam ainda mais, como se a qualquer momento fossem cair dar órbitas e sair rolando pelo chão. Sob a parca luz projetada por Eric, vejo a pele de James secar e, lentamente, tornar-se translúcida. Seu cabelo grisalho embranquece por completo, alguns fios caem, seu corpo sacoleja e, por fim, é solto por Sandra. Ela se vira para nós no momento que o cadáver do Treze se estatela no chão.

— Hm, delícia — comenta ela, limpando o canto dos lábios. Incrivelmente, o batom está intacto.

— Você matou um d'Os Treze? — questiona Eric, espantado.

— Já foi tarde — replica Lya, avançando em direção a Sandra. — Como nos achou?

— Tenho meus contatos — esquiva-se nossa Chefe. — Além do mais, não temos tempo para conversas aqui. — Ajeita a franja e se vira, guiando-nos pelo corredor.

Passo pelo corpo de James, num misto de emoções que não sei exatamente como lidar. Eu não tinha nenhum carinho pelo homem, contudo, também não tinha raiva. Ele me fizera temê-lo e, quem sabe, isso seja pior que sentir ira.

Claramente, mais guardas aparecem no caminho, mas nada que Lya e Eric não deem conta. Os dois nem falam quando estão em ação, isso não é necessário, basta um olhar para que ambos compreendam o que o outro está pensando. Isso seria assustador se eu não soubesse que trabalham juntos desde uma missão em Curitiba, há dois anos.

Inclusive, foi por causa dela que conheci ele. Faísca se aproximou de mim quando entrei para os Caçadores e, com todo aquele calor, foi inevitável não ceder aos desejos.

— Existe coisa mais ultrapassada do que guardas armados que sabem não terem chances de nos deter? — ouço Eric questionar.

— Os drones — responde Lya e ambos riem.

Piada interna que desconheço.

Guiados por Sandra, subimos uma escada diferente da qual fomos trazidas, anteriormente, e, deslocando uma espécie de tampa no teto, desembocamos no meio do jardim da Casa Branca. Abro a boca, estupefata, mas logo preciso me recompor, pois vários soldados surgem da construção, atirando em nossa direção. Lya se adianta, protegendo-nos com um campo de força.

— Sandra, seja lá qual for seu plano, é melhor pôr em prática, agora! — exclama a ruiva.

— Ele já está em prática — responde a Chefe.

Então, de súbito, um barulho de rajadas a laser chama nossa atenção. Em questão de segundos, os seguranças da Casa estão no chão, fumegando. No ar, uma camuflagem se desfaz, revelando um jato que se aproxima e desce o suficiente para permitir nossa entrada pela escotilha.

— Mas e Maxwell? — questiona Eric, preocupado.

— Oi, gente! — responde o próprio, da entrada do avião. — Se eu fosse vocês, andava logo!

Sorrio, contagiada por um entusiasmo que sentia falta. Sem dizer mais nada, corro e, ao adentrar o jato, lanço-me nos braços de Max, feliz por saber que está bem. Repito o gesto com Sandra, que antes não tivera oportunidade. Ela sorri e se coloca na posição de piloto. A escotilha se fecha e, camuflando-se, o avião toma impulso novamente, lançando-se no ar enquanto nos prendemos aos bancos.

— Está todo mundo bem? — Sandra pergunta da cabine.

Todos dissemos um sonoro "sim", mas, mesmo depois de termos "ganhado", ninguém diz mais nada. É como se, subitamente, seus sapatos ou chinelos se tornassem muito mais importantes do que conversar. Abraçada de lado com Eric, eu não preciso de muita coisa, entretanto me preocupa o que está se passando na cabeça dos outros.

Principalmente na de Sandra, que veio nos buscar, e de Lya, que provavelmente questiona esse resgate.

*

— Acho que Sandra fez justamente algo que Os Treze não previam — comento ao me aproximar de Lya.

Sentada em um tronco caído, a ruiva parece distante, perdida. Estamos em algum lugar do México, no meio do nada. Sandra nos garantiu que Os Treze não podem nos localizar porque 1) o jato é do mesmo modelo do que Lya e eu pegamos "emprestado" e 2) todos os sinais dos nossos chips estão sendo embaralhados por alguém de confiança no Brasil. E advinha quem senão o próprio Lorenzo?

Acho que por isso Lya está tão estranha e solitária neste momento.

Deixo o ar escapar em um silvo e me sento ao seu lado.

— Eu estou me sentindo traída — desembucha, a voz seca como a areia que pisamos.

— Ele ajudou a nos salvar, Lya.

— Mas por que ele nunca me contou que conhecia Sandra?

— Por não ser a coisa mais importante do mundo? — Ela suspira, encarando-me com olhos apertados. Sabendo que minhas chances são parcas, ainda assim tento: — Olha, ele trabalhou em nome da Resistência antes, provavelmente com o aval de seu pai. Além do mais, não podemos ficar uns contra os outros agora, ok? Pensa comigo: o que ele fez, e que nem foi por si só, ajudou a salvar nossas vidas. Isso só mostra que ele se importa conosco. E o que Sandra fez para despistar Danilo, tornando-nos inimigas públicas, assim como Nate... não foi fácil para ela, você ouviu ela contando!

A expressão de Lya suaviza, contudo, sinto que algo ainda a está incomodando.

— Isso tudo pode ser verdade, mas Sandra não contou tudo.

— Ainda não — concordo, pegando sua mão repousada sobre a coxa. Ela não faz menção de se afastar. — Acho que ela está buscando um jeito mais fácil, talvez as coisas estejam piores do que imaginamos.

Ela consente, por fim, para meu alívio.

Antes que o silêncio constrangedor que se forma entre a gente fique ainda pior, Max vem ao nosso encalço, chamando-nos para uma reunião com Sandrona. Lya não se demora e vai em frente, pisando duro, enquanto o rapaz me acompanha, logo atrás. Ele me cutuca, sorrindo feito uma besta.

— Então quer dizer que você deu um amasso em Lya, hã?

— O quê? Como...? Aff, foi só um beijo, ok?

Ele dá de ombros.

— Eric me contou. Não sei se devia ter comentado, mas é que, bi, é a Lya! Quem diria?

Balanço a cabeça.

— Foi eu quem a beijou. E foi coisa de momento, só isso, não vai se repetir.

Acho.

O Eletricista me lança um olhar de esguelha, dando o papo por finalizado assim que passamos pela fogueira e adentramos o jato.

Eu devo ter esquecido de mencionar que é madrugada, comemos umas rações que Sandra trouxe e nos banhamos em um rio aqui perto. Deu para tirar o suor e a poeira, mas nada substitui um bom banho de meia-hora!

Mesmos cansados, todos estão sentados e de olhos bem abertos quando entramos, aguardando o que nossa chefe tem a dizer. Sento ao lado de Eric e pego sua mão, esperando Sandroca dar uns três suspiros seguidos antes de começar:

— Obrigada por aguardarem tanto. Acho que todos nós temos o direito de saber o que está acontecendo e, principalmente, o que aconteceu com vocês.

— Nós fomos feitos de cobaia, de novo — replica Lya —, isso que aconteceu.

— O que eles fizeram? — direciona a pergunta para Eric e Max.

— Eles testaram a extensão de nossos poderes — responde o primeiro, apertando meus dedos. — Disseram que serviríamos para uma coisa especial quando juntassem nossas habilidades.

Franzo o cenho.

— Eles estavam tentando juntar seus poderes?

— Diziam que, como somos "os mais fortes" — complementa Maxwell — e nossas habilidades são "especiais", queriam testar como funcionavam juntas e o que poderiam gerar.

— E descobriram? — questiona Sandra.

— A gente não — responde Eric. — Mas nos sentíamos esgotados a cada fim de sessão, como se nos sugassem.

— A gente tinha que ficar de pé em umas espécies de tablado — explica o negro, gesticulando —, presos a eles, tendo de descarregar energia em pilares, como os das dobras, sabe?

— Essa era a coisa especial? — pergunto.

— Não — nega Faísca —, esse era o meio pelo qual chegariam a tal coisa especial.

Com a mão no queixo, Sandra troca o peso de um pé para o outro e analisa a situação. Inspira com força e se dirige ao computador de bordo, perto de Lya. Ela mexe em alguns arquivos e suspira.

— Eu não consegui com James o que eles estavam pesquisando sobre vocês, mas consegui algumas informações que farão vocês se arrepiarem.

— Nada pode ser pior do que ser uma inimiga pública — resmunga a ruiva, o que faz nossa chefe apertar os lábios, tensa.

Dou um cutucão em minha amiga, que me encara com desgosto. Pelo menos volta a prestar atenção em nossa chefe.

— Ok, gente, isso será bem difícil de ver — retoma ela —, porém, ainda não é a pior parte — e aperta na tela. Luzes azuladas ganham o centro da nave, revelando a foto de Sandra antes que palavras se formem logo abaixo. Palavras essas que me assustam.


SANDRA FERRAZ, 24 anos

Codinome: SD-17

Agente duplo em serviço


Agente duplo em serviço.

Isso é suficiente para, em um piscar de olhos, a Chefe voar contra a parede de metal atrás de si. Lya se ergue, o rosto transformado em uma máscara de ira, olhos faiscantes. Para piorar, sinto a mão de Eric esquentar em contato com a minha, fazendo eu me afastar para evitar uma queimadura. Max, apesar da tez franzida, parece mais como se estivesse triste do que realmente bravo.

E eu, bem, eu não sei o que sentir.

— Você é mesmo uma víbora, não é?! — grita a ruiva, aproximando-se, enquanto sufoca Sandra com a força da mente. — E ainda tem a cara de pau de nos mostrar isso? Por quê? Você mandou nossa localização para soldados e eles estão vindo te salvar, é? ME CONTA!

O rosto da Chefe de Operações está ficando roxo e nada de coerente escapa de sua garganta. É então que me dou conta de uma coisa:

— Lya, solte ela, é a prima de Natanael.

— Não, Mirian, ela merece isso.

— Deixe ela se explicar! — exclamo.

A ruiva treme, posso ver pelo braço erguido em direção a Sandra. Ela está lutando contra minhas palavras, mesmo sabendo que estou certa, por isso forço:

— LYA, SOLTE ELA!

E a morena despenca rumo ao chão, tossindo loucamente.

— Nunca mais fale assim comigo! — exclama a ruiva.

— Enquanto você não retomar a razão, eu falo! — retruco, vestindo uma seriedade que não me é característica, mas que é completamente necessária.

— Mi... Mirian — Sandra me chama. Passo por Lya e vou até a Chefe, abaixando-me ao lado dela, que ainda respira com dificuldade. — Os outros... arquivos.

Anuo e vou até o computador. Paro diante da tela, sentindo meu queixo chegar ao chão quando dou de cara com os documentos abertos. Ou eu bati a cabeça na fuga ou eu tô é muito louca, porque o que vejo não pode ser verdade, pode? Desorientada, aciono todas as fotos, que são projetadas uma a uma ao lado da Sandra holográfica. Lentamente, Lya, Eric e Max arregalam os olhos, pasmados.

— Isso não... — A ruiva se volta para Sandra, que se põe de pé. — Isso é algum tipo de jogo?

Estática toma conta do ar, fazendo o holograma tremeluzir. Seja por causa de Max, seja por Lya, acredito que o avião pode explodir a qualquer momento com todos nós dentro.

— Não — revela a Chefe de Operações, esfregando o pescoço —, esses são os arquivos que consegui com James, pouco antes de matá-lo. São confidenciais e cem por cento reais.

— Não sei vocês, mas eu estou arrepiada até onde achei que não seria possível — digo, encarando minha foto projetada...

Assim como as imagens de Lya, Max, Eric, Natanael, Carlo, Ranna, Henrique, Iorran e Aurora. Todas com nome, idade, um código específico e a famigerada legenda:

Agente duplo em serviço

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