Apocalipse: A morte da Terra

By SimoneSMiranda

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A Terra está sendo atacada. Cidades ao redor do globo compartilham suas histórias, de vários pontos de vista... More

Pequim - Li Wei
Curitiba - Ana Oliveira
Ilha de Páscoa - Ariki Teriitehau
Himalaia - Pasang Lhambu / Aleksi Petrov
Osaka - Ikeda Ren
Paris - Antoine Bourgeoir
Cairo - Horus Moubarak

Nova Iorque - Emily Smith

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By SimoneSMiranda

A sala estava fria. Nela apenas uma mesa metálica e uma cadeira, onde Emily estava sentada. Ela nem se atreveu a encostar-se na mesa, ou senão congelaria ao mínimo toque. A luz branca, pendurada no teto, oscilava refletida no metal e manchava a parede cinza de branco. Havia muitos motivos para que ela se sentisse desconfortável e ansiosa, mas Emily não sentia nada.

Seus olhos, vidrados, encaravam o chão, fixos no nada. Seu corpo não mexia um centímetro sequer. Não fosse o ar esbranquiçado saindo de sua boca ao expirar, e o som dos seus batimentos cardíacos quase estourando seus tímpanos, ela mesma acreditaria que estava morta. No fundo, ela queria estar morta.

Morrer seria muito mais fácil do que ter que explicar o que havia visto, poucas horas atrás.

O policial que a encontrara em seu carro, cerca de cinco quadras dali, entrou subitamente na sala, batendo a porta atrás de si, fazendo Emily pular na cadeira, assustada, arregalando os olhos, voltando à realidade.

- Senhorita Smith, correto? Emily Smith? - perguntou o policial, colocando alguns papéis na mesa, encarando-a sem realmente prestar atenção nela.

- S-Sim... - ela respondeu. A garganta arranhou, seca.

O policial colocou um gravador em cima da mesa metálica, um equipamento antigo, talvez o único que estivesse funcionando no momento. Ele apertou o botão vermelho e começou a falar, o mais calmo que conseguia:

- Oficial Davis, Departamento de Polícia de Nova Iorque, 23º Distrito. Hoje, dia 17 de Janeiro, encontramos Emily Smith, em seu carro, na esquina da 3ª Avenida com a Rua 98, em estado de choque, após deslizar na neve e colidir com um poste. Após acalmá-la, a encaminhamos para a sala de interrogatório, onde nos encontramos agora. Por favor, senhorita Smith, você pode nos contar o que aconteceu antes de perder o controle do carro?

- S-Sim... - ela começou, limpando a garganta para tentar falar mais claramente. - Nós fomos ao mercado, eu e meu... namorado... amigo... é complicado... Eu não queria ter brigado com ele, meu Deus, eu não devia ter dito as coisas que disse a ele! - lágrimas pendiam em seus olhos, lembrando dos últimos momentos com o rapaz.

- Por favor, senhorita, atenha-se aos fatos importantes, sim? - ele pediu, impaciente, enquanto ela tentava limpar as lágrimas e acalmar-se.

- Ele entrou no mercadinho... - ela respirou fundo. - Eu não o vi depois disso. Parecia que o lugar todo estava vazio, exceto... Exceto pela moça loira na caminhonete rosa. Lembro de estar tão brava que falei para mim mesma: "Olha só, que perua ridícula! Loira, em uma picape rosa? Você não poderia escolher bijuterias e carros ainda mais chamativos que esse? Só pode ser uma idiota, que casou com um velho rico, deu o golpe do baú e agora desfila por aí, toda ridícula!" Aquele brilho todo, nas correntes e pulseiras, achei tão desnecessário... Por que nós julgamos as pessoas sem ao menos conhecê-las, não é?

- Senhorita, por favor... - o policial começou a ficar irritado.

- Desculpe, desculpe... Juro que é importante! - respirou fundo novamente. - Estávamos só nós duas ali, na rua deserta. Aquela é a rua principal, cheia de lojas em plena tarde, e não havia ninguém, nem uma alma viva. Eu não achei estranho, até eu ver aquilo vindo em meio à neve, pingando algo gosmento, pintando a neve de vermelho. Eu me escondi, me abaixei no chão do carro e esperei, até que ele lentamente chegou até nós.

- Ele? Era um homem?

- Sim, estava desfigurado, o cabelo cheio de falhas, caindo, sangue por todo lado, suas roupas rasgadas e... verde.

- Verde? Como assim verde?

- Verde, oras... A pele dele estava verde! Mas era estranho, como se sua pele de cor natural estivesse derretendo, desfazendo-se e pingando!

- Então, o sangue era dele.

- Não sei! Dele ou de outra pessoa, isso importa agora? - ela irritou-se, mas o policial consentiu e deixou que continuasse. - Pela janela consegui ver que ele foi direto para a caminhonete rosa, nem olhou para o meu carro. Mas a loira... não sei o que deu nela! Ela começou a gritar por socorro. "Me ajude. Me ajude.", era tudo o que ela falava. Ela não fugiu, não tentou sair do carro e correr, ela só gritava... "Me ajude.". O mais estranho é que ela não fugia dele, ela batia no vidro da janela pela qual ele a olhava. - Emily fitava o nada enquanto lembrava.

- Ele não a atacou?

- Não! Ele parecia não entender como abrir o carro, ou como ela havia entrado lá. Apenas virava a cabeça, confuso. Passaram-se vários minutos e ele andava ao redor do carro, analisando como entraria ou como tiraria ela de lá. Mais do que nunca julguei a pobre mulher pela idiotice. O que afinal ela estava fazendo? Ela não enxergava aquela coisa verde pingando pele derretida pelo lugar todo? E então, outra pessoa apareceu.

- Uma pessoa normal?

- Quem dera! Agora parecia ser uma fêmea. Ou o que um dia foi uma mulher, com o mesmo tom de pele verde, mas a pele normal dela já havia derretido toda. Talvez fosse essa coisa há mais tempo. Seu cabelo já tinha caído todo, estava careca. Minutos depois, mais dois se juntaram à eles, e quando se encontraram, a inteligência pareceu aumentar. De um segundo para o outro descobriram como alcançar a loira dentro da picape. Começaram a empurrar o carro e bater no vidro, até que, juntos, conseguiram virar o carro e arrebentar as janelas. A loira gritava sem parar, "me ajude", em um tom contínuo, mecânico, sem realmente parecer assustada.

- Então... ela não estava pedindo ajuda para que a salvassem dessas coisas, mas sim que as coisas a salvassem de dentro do carro? Não é possível! Você ainda deve estar em choque!

- Acredite em mim! Ela saiu da picape por uma das janelas quebradas, sem se importar com os cacos rasgando sua pele, eles a tocaram e, de repente, a pele dela também começou a derreter, seu cabelo cair e tornar-se verde! Eles a ajudaram, arrancando a pele antiga e jogando por todos os lados! Depois disso, os quatro saíram correndo e sumiram.

O policial a olhava debochado, sem acreditar muito no que ela estava falando.

- Eles jogaram a pele dela em cima do meu carro, ok? Eu vi partes daquela mulher, a mesma que eu tinha julgado e pensado ser uma perua ridícula naquela caminhonete rosa, escorrer pelo vidro, enquanto eu tentava conter meu choro, rezando para que eles não me transformassem naquela coisa verde também! Se você não acreditar em mim e ir atrás deles, se vocês deixarem eles vão transformar a cidade toda, quem sabe até o planeta todo! Por favor... - ela gaguejava, sem conseguir conter as lágrimas. - Por favor, eu imploro! Acredite em mim!

- Certo... - o policial fazia anotações em uma das folhas que havia colocado sobre a mesa. - Após testemunhar este... fato estranho... - anotou. - Você, senhorita Smith, dirigiu o carro até aqui, sem licença para tal, em um veículo que não era seu, e bateu em um poste, colocando em risco a vida de várias pessoas que transitavam na região, no momento da colisão. Esta é uma infração considerada gravíssima. Você ficará sob custódia aqui no distrito, poderá sair após o pagamento da fiança ou se concordar em prestar serviços comunitários. Caso negue, ficará presa por até 6 meses, contando que...

- Espere um minuto... - ela o interrompeu. - De tudo isso o que acabei de contar, a única informação que você, seu idiota incompetente, tirou foi de que eu dirigi o carro até aqui, sem carteira de motorista? É isso?

- Posso adicionar agressão moral, resistência à prisão, uso de drogas... O que mais você quer?

- Não! Não, não, não, não, NÃO! - gritou. - Como é possível!? Pode fazer qualquer teste toxicológico, eu estou limpa! Pelo amor de Deus! Eles vão ver as gravações deste interrogatório! Seus superiores vão ver que não resisti merda nenhuma!

- Você diz as gravações deste gravador sem fita ou daquela câmera desligada? Em quem eles vão acreditar? Em mim, oficial deste distrito há mais de 20 anos, ou você, que pode ter sido encontrada sob efeito de alucinógenos? Vamos, espertinha, me diga!

Ele apertou o botão do gravador, interrompendo a gravação, e começou a juntar os papéis da mesa. Com um meio sorriso no rosto, ele olha para Emily uma última vez.

- Quando a Terra estiver cheia de zumbis...

- Zumbis? Ha-ha, me poupe! - riu forçado.

- Quando a Terra estiver cheia de zumbis... - ela recomeçou. - Eu espero que você seja devorado, transformado, vire uma dessas coisas nojentas e viva a eternidade vagando pelo mundo, até que você apodreça, seu filho da puta! - ela pulou da cadeira, jogando-a longe, indo em direção ao policial para atacá-lo, mas ele fechou a porta antes que conseguisse alcançá-lo. - A Terra está sendo invadida! Todos nós vamos virar zumbis! Fujam! FUJAM!!!

****

- Aqui está Coronel. - o soldado entrega uma fita cassete para o superior, e lhe presta continência, retirando-se.

Em cima, uma etiqueta escrita à mão: "Nova Iorque - Emily Smith"

- O relato revela sobre um encontro nos arredores da cidade. A vítima conseguiu escapar e dirigiu até o centro de Manhattan, onde foi encontrada em choque após bater o carro. - explicou uma mulher fardada, ao seu lado.

- Precisamos tirar cada gota de informação que pudermos desse interrogatório. Ordene que Davis mantenha a vítima presa na delegacia, não importa a acusação. Precisamos encontrar alguma fraqueza, alguma vulnerabilidade, qualquer coisa! A sobrevivência da humanidade depende de nós e não sou eu quem vai ser lembrado por falhar!

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