Ano 1178, Inglaterra, reinado de Henrique II.
"There was a boy a very strange, enchanted boy, they said he wandered very far, over land and see, a little shy and sad of eye, but very wise was he, and them one day, a lucky day ,he pass my way, and them we spoke of many things, fools and kings, them he said to me,
the greatest thing we will ever learn is to love and love in return"
Nature Boy
Robert de Locksley acordou subitamente, a respiração entrecortada pelo terror desnorteante do pesadelo. Ele correra entre soldados em uma batalha, tentando salvar alguns como se fosse um médico. Podia sentir a sensação de frustração e impotência por toda aquela morte ao seu redor e a dor dos ferimentos em seu corpo!
Sentou-se devagar na cama, passando as mãos no rosto para afugentar as imagens que esvoaçavam em sua mente. Suas pálpebras estavam pesadas como se a areia fina daquela praia onde a terrível batalha acontecera ainda estivesse grudada nelas; sua visão se embaralhava, confusa. Ele estava ajoelhado na areia... lutando ou procurando soldado feridos para resgata-los.
Não... ele estava em um quarto, sentado em uma cama confortável entre almofadas e uma manta de lã... A luz fraca da manhã entrava através da estreita janela da parede de pedra e ele deitou-se novamente.
— Maldição! — murmurou sua imprecação favorita. Não estava no meio de uma guerra! Estava no castelo de Hastings. Infelizmente... "Este castelo maldito! ", pensou com revolta.
Uma enorme e antiga construção de janelas afuniladas, corredores escuros e estreitos como um labirinto interminável só podia mesmo causar pesadelos. Sua alma ainda não conseguira se libertar totalmente da sensação de opressão causada pelo sonho, e ele ficou deitado, piscando e olhando para o teto por alguns instantes, até que as lembranças começassem a se confundir, escorrendo gradualmente para o esquecimento.
Enfim, resolveu se levantar e jogou a manta de lã que o cobria para o lado e então ouviu um barulho de algo pesado batendo no chão. Um livro grosso caíra ao lado da cama e ele o resgatou, acariciando a capa de couro ornamentada com as letras douradas do título em latim, Gesta Francorum Jerusalem Expugnantium.
Dormira a noite passada lendo sobre a história das Cruzadas. Em 1099, um exército comandado por nobres cristãos haviam reconquistado Jerusalém, retomando-a dos muçulmanos, os infiéis, e banhado as ruas de sangue em um massacre brutal. Por isso tivera aquele pesadelo terrível! Mortes! Tantas mortes em nome de Cristo! Esfregou os olhos e balançou a cabeça, procurando esquecer aquilo de vez.
Não gostava de guerras... Na verdade, ele tinha dezesseis anos e ainda não havia participado de nenhuma, mas imaginava que não gostaria de estar em uma delas. Embora fosse sua obrigação treinar com as armas de batalha, a espada e a lança, pois seria sagrado como um cavaleiro em alguns anos, não apreciava justar ou lutar com a espada e fugia dos treinos sempre que possível. Provavelmente, não sobreviveria muito tempo em uma batalha de verdade...
Ele podia ler e escrever em diversas línguas e tinha estudado o Trivium e o Quadrivium* com seus tutores. Podia falar um bocado de tempo sobre a astronomia e os planetas, e outro bocado sobre aritmética e geometria. E também, filosofia... "Enfim, nada de realmente útil no meio de uma luta", concluiu com desânimo, após uma análise criteriosa de suas habilidades.
Então, lembrou-se subitamente do que o aguardava naquele dia e deu um tapa na própria testa com um grunhido de insatisfação. Amava as festas... Mas, não aquela festa! A maldita comemoração de noivado de Marion, sua irmã de criação e filha do conde de Fitzbur. Seu pai era vassalo dele, mas mesmo assim, teria que dar um jeito de escapar desta tarde entediante.
* Trivium: lógica, gramática e retórica. Quadrivium: aritmética, geometria, música, astronomia. Disciplinas básicas da educação medieval.
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