Sam
Patrick franze o cenho assim que me vê seguir para meu lugar habitual. Não profiro palavra alguma, apenas ergo a mão em uma forma de cumprimento. Talvez, seja por isso que ele cutuca Cindy, que resolveu pintar novamente o cabelo, tirando o amarelo. Ou, sejam as minhas lágrimas que insistem em não me abandonar por instante algum.
- O que houve, criança? – pergunta-me preocupada Cindy, sentando-se ao meu lado e acariciando meu cabelo.
No lugar de palavras apenas um soluço sai quando abro a boca.
Ela se aproxima e me deixo deitar minha cabeça em seu ombro. Onde a intensidade das minhas lágrimas aumentam.
- Aqui! – Patrick deposita um copo d'água á minha frente.
- O-Obrigada, P-Patrick! – murmuro, bebendo um pouco.
- Só ponha pra fora, Sam – diz acariciando meu cabelo – Ponha pra fora – repete e volta para trás do balcão.
Um pequeno riso escapuli em meios as lágrimas. Tyler ganhou nossa aposta.
Patrick é realmente baixo. Até mesmo mais do que eu. Mas, por trás do balcão ele parece ser muito mais alto. Então, certamente é por isso que nunca sai de lá. Ele deve usar algum banquinho para lhe dar altura.
- Ele é baixinho! – sussurro.
- Sim, criança, ele é – concorda Cindy sorrindo – Devo chamar o Tyler? - oferece.
- Não! – sai quase como um grito. Levanto-me rapidamente – Não é necessário. Estou indo. Obrigada, Cindy! Obrigada, Patrick!
- Sam, volte aqui! – grita Cindy, mas já é tarde.
O primeiro pingo de chuva que ameaçou por toda a noite finalmente cai acertando-me em cheio. É uma solitária, grande e fria, quando a primeira vem com tudo em minha testa, mas ela não continua sozinha e é quase como as minhas lágrimas. Talvez seja o céu zombando de mim em toda a sua grandeza.
- Me solta! – grito e estapeio quando mais uma vez braços cobertos por jaqueta preta me tiram do chão – Jake, me deixa! Me deixa!
- Fique quieta! – esbraveja papai.
- Pai?
Libertando-me, me arrasta pelo cotovelo até seu próprio carro. Steve, seu motorista abre a porta traseira para mim e ele praticamente me joga lá. Leva muito para que eu não caia do banco.
- Pegue isso – estende-me um lenço que o motorista lhe passa – Aeroporto, Steve – ordena.
- Sim, senhor!
- O quê... O quê... Que merda é essa? – esbravejo irritada. Ele não tem esse direito. Seus olhos azuis transbordando algum sentimento indecifrável.
- Olha a boca. O irmão de Michael me ligou... Oh, Sam! – lamenta.
Pegando-me não só a mim como ao Steve de surpresa, ele me puxa em seus braços e me aperta. Só lembro uma vez de ter sido abraçada por ele. Foi na festa de Ano Novo do mesmo ano em que venci o câncer. Está tão atrás. Minha mente não tem reação e até mesmo a memória dos meus músculos falham. Não sei como agir. Do mesmo modo que não soube tempos atrás.
Finalmente ele me solta e sem jeito volto a meu lugar. Embora não chore, seus olhos estão marejados. Em silêncio tira sua jaqueta e a estende para mim. Aceito. Enfiando os braços, deixando-a ao contrário. Cobrindo minha barriga e não minhas costas.
- Eu te liguei – aponta – Liguei para todos. Até mesmo para aquele garoto com quem você está saindo – minha cabeça vira-se rapidamente. O que é isso? Ciúmes?
Quem é esse homem? E o que ele fez com meu negligente pai?
Morte!, lembra-me meu subconsciente. Estar à beira da morte faz coisas malucas com você e pessoas ao seu redor. Lembro de quando estava bem mau, até mesmo Monick, uma garota que não ia nenhum pouco com minha cara graças a encrenqueira da Molly veio me desejar boa sorte e dizer quanto Roger era idiota por ter terminado comigo no momento em que mais precisei.
Pensar nisso, me faz relembrar de como não fiquei totalmente com raiva dele. Qual é, o cara tem total direito de escolher o melhor para si. E foi bem difícil. Acho que se meus tios e primos não fossem da minha família e me amassem o suficiente teriam me deixado de lado no primeiro chilique que dei após a primeira quimioterapia. Depois a depressão. Só merdas.
- Ninguém me atendeu – diz furioso – Então, lembrei de como gosta daquele lugar – comenta mais para si.
Mais uma vez faço aquela coisa com a cabeça.
- Você lembra-se do Via Láctea? – pergunto, espantada e curiosa.
- Claro – responde ofendido.
- Nunca achei que realmente desse ouvido para as coisas que digo – murmuro entristecida.
- Sinto muito por isso, filha – pede, realmente parecendo sincero e arrependido.
Não sei de onde surge tão rápida e grande raiva.
- Sente? Até quando isso vai durar? Uma semana, um mês depois da minha morte? – esbravejo. Jogando para si sua jaqueta – Steve, pare o carro!
Ele olha para o homem ao meu lado e continua.
- Eu disse: Pare o carro!
- Cale a boca, Sam! Eu sei que você tem todo o direito de estar brava comigo, mas chega. E pare de agir e falar como se fosse morrer. Michael está nos esperando em São Francisco e mandei buscar Charlotte no Texas – esbraveja, as bochechas vermelhas.
Imaginei que ela estivesse bem mais longe.
- Chegamos, senhor! – avisa Steve. Estamos a poucos metros de seu helicóptero.
- Eu não quero!
- O que você não quer?
- Passar por tudo isso de novo. Me sentir um lixo. Descontar a minha dor nos outros. Fazer eles sofrerem. Você pode não lembrar como a cadela raivosa que eu agia, mas eu sim. E para quê? Eu vou morrer de todo jeito – digo, as malditas assumindo o controle novamente.
- Como você pode saber? Você tem que lutar. Sei que não por mim, mas pelos seus primos, seus tios, seus amigos. Faça pelo garoto. Eu sei que o ama, e pelo que notei ele também – diz, secando minhas lágrimas.
- Notou?
- Pode não parecer, mas mantenho um olho em você, senhorita. Espero que esteja se protegendo. Você dorme mais na casa dele, do que na sua própria cama – sorri. Fico vermelha.
- Espera. Você não tem nada haver com o estágio na editora, não é? – pergunto para mudar de assunto, mas também por curiosidade.
Seu rosto diz culpado.
- Não exatamente. Tenho uns conhecido por lá, mas Tom disse que você só conseguiria se fosse capaz.
- Mesmo? – aperto os olhos.
- Mesmo! – sorrir.
Posso me acostumar com ele desse jeito.
- E não mude de assunto – aperta meu nariz.
- Sim, estou.
- Maravilha! Sou jovem demais para ser avó. Venha.
Agarro sua mão estendida. O medo surgindo a todo vapor.
Tyler
- Deixa!
Peter impede que Phill e John me segurem quando começo a bater com muita força o taco de beisebol no Impala estúpido da Sam. Ela realmente gosta dele. Clang! Clang! Clang!, destruí-lo é a coisa mais importante no momento. Porque infernos ela me abandonou? Será que me acha fraco o suficiente? Eu seria forte por nós dois se necessário. Porra! Ela não tem direito nenhum de tomar decisões por mim.
Clang! Clang! Clang!
- Tyler!
Ignoro Cindy no topo das escadas para o Via Láctea. Até mesmo Patrick está lá, os olhos arregalados. Completamente assustado. Do que adianta eu conseguir tirá-lo de trás do balcão se Sam não está aqui para ver que eu ganhei a nossa aposta do ano passado. Ele foi à diversão de nosso primeiro encontro. Clang!
- Agora chega – diz Peter tomando o taco de minhas mãos e empurrando-me em direção a picape de Phill. Obedeço.
Como uma marionete.
Entre meu melhor amigo e John – que por algum motivo se sentou atrás. Vai ver ele pense que eu vá me jogar do carro em movimento – agarro a garrafa de uísque barato que me compraram a caminho do Café no instante que Cindy me ligou falando sobre a Sam. Burro. Deveria imaginar que ela iria pra lá, mesmo que por poucos minutos. Aí sim eu teria alguma chance de fazê-la ficar e lutar ao seu lado. O líquido não desce queimando ou ardendo como o esperado. É como se eu estivesse tão anestesiado por dentro como me sinto por fora.
Têm o mesmo efeito que água. Então querendo apagar e sufocar a dor que toma cada pedaço de mim, que encobre todos os centímetros do meu coração. Aumento a quantidade de goles e tomo a uma velocidade impressionante.
- Pega leve, cara! – diz John.
Olhando para ele percebo que minha visão está desfocada. Passando a mão em meus olhos, elas se molham. Porra! Eu ainda estou chorando.
Então, vendo a Sam sozinha e assustada aos planto não dou a mínima se estou chorando feito uma garotinha no banco de trás do carro com meus amigos. Que se foda tudo.
- Foda-se!
Votem, por favorzinho ☺️