CAPÍTULO 2
Por milagre da natureza, consegui um lugarzinho para me sentar durante o trajeto até a escola. E, por mais sorte ainda, consegui me sentar à janela do ônibus. Finalmente era sexta-feira. As crianças estavam uma loucura naquela semana, e aquele seria o dia de dar aula para a turma mais difícil de todas. A do Nono ano.
Era um tremendo pesadelo! Sério, eles estavam naquela fase da transição para a adolescência, a puberdade à flor da pele e a chatice padrão. Eu amava crianças e adorava dar aulas para elas, mas essa era a pior idade. Não sabia lidar muito bem com eles e eles sabiam disso. Acho que sentiam o cheiro do meu pavor sempre que eu entrava na sala. Igual cachorro que sente o cheiro de medo das pessoas, sabe?
O tempo estava relativamente fresco, beirando os 18°C, maravilha de clima. Como tinha minhas gordurinhas, eu não sentia tanto frio. Mas a galera do ônibus estava com blusa de frio e moletom. Alguns até com touca. Ainda estava bem escuro, então fechei os olhos.
Acordei sobressaltada e olhei para a janela. O ônibus parou para que os passageiros pudessem descer e continuei olhando para lá. Assustei quando eu percebi que: eu deveria descer nesse ponto.
– VAI DESCEEEEEER! – Levantei num pulo e fui em direção à porta, esbarrando em todo mundo. – Desculpa, desculpa. Foi mal!
O meu ponto de descida ficava em frente à escola. Ela era simplesmente enorme, atendendo alunos desde o maternal até o ensino médio. Tinha uma entrada linda com muitas flores e um jardim plantado pelos alunos do curto extensivo de biologia. O muro da escola fora criado pelos meus alunos, era meu orgulho sempre que eu chegava na escola, aquela pontinha de felicidade e motivação, todas as manhãs. Para entrar no prédio, tínhamos que passar por um portão e subir uma rampa de acesso até o térreo, que era onde ficavam as salas da direção, recepção e coordenação, e também a sala dos professores.
Me apressei porque avistei a mãe do Arthur, o aluno mais levado do Segundo Ano. Ela adorava pegar as professoras no portão e ter uma breve e particular reunião de pais. Ele era um aluno extremamente problemático e precisava muito de controle e suporte dos pais, algo que não recebia. Atravessei o portão na velocidade da luz.
– Bom dia, seu Leandro e Janaína. – Balancei a mão para o Segurança e a Inspetora da escola.
Subi a rampa que levava para a área principal do colégio e me direcionei até a sala dos professores, para um merecido café e para pegar a pasta de aulas. O local era enorme e muito bem decorado, no fundo da sala havia janelas enormes. Na lateral, havia os armários, computadores, sofás, várias mesas, um balcão com lanches e uma incrível e deliciosa máquina de café, daquelas de cápsulas. Ela sempre brilhava para mim quando eu chegava. Entrei, já coloquei minha bolsa no armário, peguei uma cápsula e fui direito pegar meu café. Eu não tinha nem ligado a máquina quando escutei uma voz rouca e brava.
– Bom dia, Fernanda. Virei e me deparei com a coordenadora, já de cara emburrada, me encarando.
– Quer um café também, Shirley? – Disse enquanto já pegava outro copo para ela.
– Não, só vim ver como estão as coisas por aqui. – Ela falou, ainda mais séria, se sequer fosse possível, e saiu da sala.
Respirei aliviada.
– O que você fez agora, dona Fernanda? – Cochichou a Bianca, professora de português.
– E eu lá sei. – Escorreguei na cadeira – Ela é doidinha. Vive implicando comigo. Deve ser inveja dos meus cabelos coloridos. – Dei uma leve batida de cabelo.
– Ah, mas se fosse só com você estava bom. – Ela riu da minha piada sem graça. – Esses dias ela implicou comigo por que eu estava sem maquiagem.
– Sério? – Voltei a rir – Ela mal consegue passar um rímel naqueles olhos cheios de rancor e ainda reclama.
Paaaaaaaaaaaaan. Escutei o sinal tocando, engoli meu café e levantei da cadeira.
– Reze por mim, Bi. – Joguei o copinho no lixo reciclável. – Preciso de muita sorte para aguentar essa turma.
– Hoje é Sexta-Feira 13 e, como você mesma diz, "Sextas 13 dão sorte" – Ela piscou um olho e sorriu.
SEXTA-FEIRA 13!
Eu havia me esquecido completamente! Naquele dia, Flávio e eu comemorávamos seis meses de namoro. Acho que depois do Anderson, esse foi o relacionamento mais longo que eu tive. Não acreditava em amor, e não queria acreditar. Mas aí conheci o Flá e tudo mudou. Eu não conseguia mais imaginar a minha vida sem ele. Estranho falar isso, mas era a verdade. Dava para sentir a bondade do seu coração, nunca havia conhecido alguém como ele. E, assim como eu, ele também teve a sua cota de péssimos relacionamentos. Acho que nos conhecemos para curar os nossos corações.
Entrei no estúdio de artes. Lá era o meu canto, me sentia em casa! Tinha mesas para os alunos, materiais diversos nos armários ao fundo da sala e uma mesa só para mim. Não tinha lousa, mas sim um projetor. Nunca fui o tipo de professora que queria que os alunos aprendessem a desenhar maravilhosamente bem, mas queria desenvolver a criatividade deles, isso era o que importava. Sentei-me à minha mesa e, enquanto meus alunos entravam, desenhei numa folha de sulfite um coração com um gatinho preto dentro. Peguei meu celular, fotografei e mandei para ele.
Eu: Feliz 6 meses. TE AMO. Desculpe não ter lembrado agora cedo. =(
Flá: FELIZ 6 MESES GATINHA. <3
Não tem problema, nos falamos mais tarde.
Te amo também.
E me enviou uma foto da pretinha.
Mais uma aula começou, e, como uma boa Sexta-Feira 13, o aluno mais problemático da turma faltou.
Obrigada por isso!
– Bom dia, turma. Hoje vamos trabalhar com aquarela, peguem os materiais no fundo da sala e não se esqueçam do avental. – Falei, séria, mas com um sorriso no rosto.
Enquanto eles buscavam o material, liguei o notebook e abri a apresentação que montei, para mostrar-lhes as técnicas de aquarela.
A turma estava super calma, consegui dar a aula tranquilamente. Eles compreenderam a técnica e estavam fazendo trabalhos incríveis. Não tivemos problemas, apenas algumas camisetas sujas, mas fazia parte. E passou rapidamente, só notei quando, depois de uma hora, o sinal tocou.
– Tchau, turma! Bom final de semana e até semana que vem. Não se esqueçam do trabalho, vai valer três pontos na média final. – Sorri sarcasticamente. Adorava colocar essas mãos para trabalhar.
Escutei um "ahh" coletivo e ri internamente. Às vezes eu conseguia ser um pouco maldosa.
– E não reclamem, eu sei que vocês gostaram da aula de hoje. – Pisquei para eles e pude escutar alguns risos. Sentei e comecei a guardar o meu material. Até que vi uma sombra na minha mesa.
– Professora Fernanda, pode me tirar uma dúvida? – E a voz suave do Rodrigo me perguntava algo.
– Claro, Ro, pode falar. – Sorri. Adorava aquele garoto, era muito esperto. Pena que tinha péssimos pais.
– Eu posso fazer o desenho que eu imaginar? – Me perguntou, acanhado.
– Claro que sim. Desde que você use a aquarela. Tudo bem?
– Tá bom! – Ele me deu um abraço e saiu correndo – Obrigada, professora.
Ele era um aluno carente, adorava abraços e era muito inteligente. Só queria uma desculpa para falar comigo. Terminei de arrumar a mesa e notei que a sala estava uma bagunça. Nota mental: semana que vem, ninguém sai até que arrumem tudo.
Resolvi arrumar a bagunça. A Julia, minha assistente, não tinha vindo e não era justo com a Regina, a moça que fazia a faxina na sala. E como naquele dia eu estava muito feliz, nem reclamei. E não valia a pena reclamar e estragar o dia.
Arrumei rapidinho e desci para a sala dos professores para tomar o meu segundo merecido café. Ser professora mudara muito a minha vida, e uma dessas mudanças foi pegar o gosto pelo café. Sempre achei exagerado a necessidade que meus pais e amigos sempre tiveram de tomar essa bebida, mas, com esses últimos anos trabalhando em escola, descobri o seu real valor. Até ganhei uma caneca do Flávio onde estava escrito "Eu <3 café!". Ele era engraçadinho e sempre me enchia o saco por isso. Mas o fiz ficar viciado em Starbucks, afinal, não tem como não se viciar nos cafés e em todas as outras bebidas deles. O brownie então.. Nossa. Ah, me deem um desconto, eu amo comida.
Cheguei na sala, coloquei minha bolsa na mesa e me direcionei à máquina de café.
– Fernanda? Chegou uma coisa para você.
Virei no susto. E vi a Dona Lurdes, a Recepcionista da escola, com um buquê de flores. Flores?
– Quê? – Indaguei, assustada e surpresa – Isso não pode ser para mim. É para mim mesmo?
– Só tem você aqui chamada.. Como é mesmo? – Pegou o cartão e leu em voz alta e com um sorriso sarcástico o nome destinatário. – Ah, "Para Fernanda, a garota de cabelos coloridos".
Peguei a carta com pressa e morrendo de vergonha.
– Ah, para com isso Dona Lurdes. – Corei e vi que ela estava rindo.
– O amor é lindo... – Me entregou o buquê e saiu cantarolando.
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Oie meus amores e amoras! Como estão?
Capítulo novo com um pouco (muito) atraso, mas espero que gostem. E hoje o capítulo é curtinho, mas foi escrito muito amor.
Espero que vocês estejam gostando e continuem acompanhando.
Se gostou deixa um comentário, seu voto e, podem me ajudem a divulgar? O próximo capítulo sai na próxima sexta, vou tentar publicar sempre às sextas. <3
Ah, queria falar do meu blog.
Ele tá de carinha nova e com umas ilustrações lindas feita por uma amiga.
Gostaram?
Beijos =****
E muito obrigada por terem lido até aqui, até a próxima sexta.
Revisão feita pela Naila Barboni, contato naila.barboni@gmail.com.