O Guardião

By JaqueBastos

595 5 2

Quarenta dias após a morte de seu marido, Julie Barenson recebe uma encomenda deixada por ele. Dentro da caix... More

Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 12
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Capítulo 36
Capítulo 37

Capítulo 20

13 0 0
By JaqueBastos

Mike chegou na hora marcada e Julie saiu, fechando a porta antes que Singer a seguisse. Notou que Mike estava usando calça social e blazer, e sorriu.

- Nossa! - exclamou. - Há duas noites seguidas você está muito elegante. Vou demorar um pouco a me acostumar com isso.

O comentário também valeria para ela mesma. Como na noite anterior, Julie usava um vestido leve que realçava sua silhueta. Pequenas argolas de ouro pendiam de suas orelhas e Mike notou um leve traço de perfume.

- Exagerei? - perguntou ele.

- De jeito nenhum - tranquilizou-o Julie, tocando em sua lapela. - Gostei do blazer. É novo?

- Não, já o tenho a algum tempo. Só não o usava muito.

- Pois deveria. Fica ótimo em você.

Mike ergueu os ombros e apontou para a picape antes que ela prolongasse o assunto.

- Então, podemos ir?

- Quando você quiser.

Quando Mike começou a se virar, Julie segurou o braço dele.

- Onde estão os Band-Aids?

- Eu os tirei. Meus dedos melhoraram.

- Já?

- O que posso dizer? Eu fico bom depressa.

Em pé na varanda, ela estendeu a mão como uma professora pedindo a um aluno que jogasse seu chiclete fora, e Mike mostrou os dedos.

- Ainda estão vermelhos. - Fez uma pausa antes de olhar para ele. - Você esfregou com muita força? Parece que alguns chegaram a sangrar.

- Mas já pararam - disse Mike.

- Meu Deus, se eu soubesse que você faria isso, não teria dito nada. Mas acho que sei como fazer com que melhorem.

- O quê?

Ela olhou para ele fixamente enquanto levava sua mão aos lábios e beijava seus dedos.

- Isto. O que acha? - perguntou ela sorrindo.

Mike pigarreou. Parece que estou ligado a um fio elétrico, pensou. Ou em pé num túnel de vento. Ou esquiando montanha abaixo. 

- Ótimo - conseguiu responder.


                                                                         ***

Eles jantaram no Landing, um restaurante à beira-mar no centro d Beaufort. Como na noite anterior, optaram por se sentar a uma mesa no terraço, de onde podiam ver os barcos chegando e partindo. No calçadão de tábuas, casais e famílias passeavam tomando sorvetes de casquinha ou carregando sacolas cheias de lembrancinhas.

Julie pôs seu guardanapo no colo e se inclinou para a frente.

- Ótima escolha, Mike. Adoro este lugar.

- Fico feliz em saber - disse ele, aliviado. - Também gosto, mas costumo vir para almoçar. Não janto aqui há algum tempo. Eu me sentiria estranho jantando sozinho.

- Podia convidar Henry.

- Sim - disse ele, assentindo. - Ou não.

- Você não gosta de sair com seu irmão?

- Passo o dia inteiro com ele. Seria como você sair com Mabel.

- Eu gosto de sair com Mabel.

- Ela não a insulta.

Julie sorriu e Mike pôs seu guardanapo no colo. Ela parecia relaxada e radiante com ele, totalmente à vontade.

- Como foi o almoço com Emma? - perguntou ele.

- Ah, foi divertido. É fácil conversar com ela.

- E comigo?

- Com você é diferente. Também é fácil conversar, mas de outro modo. Com ela posso falar de assuntos sobre os quais não posso falar com você.

- Como eu?

Julie o olhou com o ar travesso.

- É claro. qual é a graça de sair com alguém se você não pode conversar com ninguém sobre isso?

- O que você disse sobre mim? Espero que coisas boas.

- Não se preocupe. Só coisas boas.

Mike sorriu e pegou o cardápio.

- Gostaria de começar com uma garrafa de vinho? Talvez um Chardonnay? Eu estava pensando que um Kendall- Jackson cairia bem. É suave e acho o sabor de carvalho apropriado.

- Nossa! Estou impressionada. Não sabia que você entendia tanto de vinhos.

- Sou um homem de muitos talentos - admitiu ele, e Julie riu enquanto pegava o cardápio.

Eles comeram e beberam sem pressa, conversando e rindo, mal notando o  garçom andando rapidamente ao redor da mesa, recolhendo seus pratos. Quando estavam prontos para partir, o céu ficara repleto de estrelas.

Ainda havia muito movimento no calçadão, mas agora a multidão era mais jovem; pessoas na casa dos 20 ou 30 anos se apoiavam na balaustrada acima do mar e perambulavam pelos bares. A alguns passos dali havia dois restaurantes com terraços e, ambos, músicos preparavam seus equipamentos e afinavam pela última vez suas guitarras. Haviam chegado mais barcos do que cabiam no cais e, no espírito de sexta-feira à noite, os retardatários amarravam suas embarcações perto das que estavam próximas, até dúzia de barcos de formas e tamanhos diferentes se juntarem como uma comunidade flutuante. 

Cervejas e cigarros circulavam livremente, barcos balançavam quando usados como extensão de calçadas e pessoas eram forçadas a entabular conversas com estranhos que talvez nunca voltariam a ver, tudo em nome da diversão. 

Ao saírem do restaurante, Mike ofereceu a mão a Julie. Ela a pegou e começaram a andar pelo calçadão, seus sapatos batendo na madeira com um som como o de cascos de cavalo puxando carruagens. Mike sentiu o calor da mão dela irradiando pelo braço até o centro do seu peito.


                                                                     ***

Eles passearam mais uma hora em Beaufort, observando e conversando até Julie sentir os últimos traços de nervosismo desaparecerem por completo. Mike ainda segurava a sua mão, deslizando o polegar por ela de vez em quando. Compraram chocolates e caminharam descalços pelo parque até encontrarem um lugar para sentar e saboreá-lo. A lua estava alta e as estrelas tinham mudado de posição quando eles voltaram para o calçadão, ainda animado. Ondas preguiçosas batiam no paredão e o brilho branco do luar deslizava na água. Pararam mais uma vez num pub e se sentaram a uma mesa castigada pelo tempo, embaixo de um ventilador de teto que rangia. O cantor que estava se apresentando conhecia Mike e o cumprimentou com um movimento de cabeça. Mike pediu outra cerveja enquanto Julie tomava uma Coca Light.

Enquanto ouviam a música, Julie sentiu os olhos de Mike nela e se surpreendeu com quanto as coisa haviam mudado nos últimos dias. Com quanto ela havia mudado. E quanto ainda mudaria dali para a frente.

Era estranho você conhecer alguém há anos e ainda descobrir algo que nunca tinha notado. Apesar da luz fraca, ela viu traços de cinza nos cabelos perto das orelhas de Mike e uma pequena cicatriz sob a ruga em sua testa. Dias antes, diria que ele parecia estar na casa dos 20, mas agora conseguia ver marcas de expressão em suas faces e pés de galinha nos cantos dos olhos.

O músico começou outra canção e Mike se inclinou na direção dela.

- Jim e eu vínhamos muito aqui. Antes de você se mudar para a cidade. Sabia disso?

- Ele me contou. Disse que vocês vinham aqui para conhecer mulheres.

- Estávamos aqui quando ele me falou de você pela primeira vez.

- Aqui?

- Sim. Viemos no fim de semana depois que ele voltou de Daytona. Ele me contou sobre a garota que havia conhecido.

- O que ele disse?

- Que pagou seu café da manhã algumas vezes. E que você era bonita.

- Eu tinha uma péssima aparência.

- Ele não achava. Também disse que prometeu lhe arrumar um emprego e um lugar para ficar se você viesse para cá.

- Você achou que ele estivesse maluco?

- Claro. Principalmente porque não parava de falar de você.

- O que achou quando aceitei a proposta dele?

  - Que você também era maluca. Mas depois comecei a achar que era muito corajosa.

- Mentira.

- É claro que achei. É preciso coragem para mudar de vida como você fez.

- Eu não tinha escolha.

- Sempre se tem uma escolha. Só que algumas pessoas fazem a errada.

- Nossa, estamos filosofando hoje.

- Às vezes isso acontece depois de algumas cervejas.

A música parou e a conversa deles foi interrompida quando o cantor pousou sua guitarra e se aproximou da mesa para sussurrar algo no ouvido de Mike.

Julie se inclinou para a frente.

- O que houve? - perguntou.

O cantor ergueu os olhos.

- Ah, oi. Desculpe-me por interromper. Estou fazendo um intervalo e queria saber se Mike gostaria de dar uma palhinha em uma canção ou duas - disse.

Mike se virou na direção do palco e olhou para Julie antes de finalmente balançar a cabeça.

- Eu gostaria, mas estou acompanhado.

- Ah, vá em frente - insistiu Julie. - Eu ficarei bem.

- Tem certeza de que não se importa?

- De jeito nenhum. Além disso, está na sua cara que você quer ir.

Mike sorriu e pôs a garrafa sobre a mesa. Um minuto depois estava com a guitarra nas mãos  e dedilhava as cordas, afinando o instrumento. Olhou para Julie e piscou antes de arranhar os primeiros acordes. Demorou apenas um instante para todos reconhecerem a canção. Primeiro as pessoas bateram palmas e assobiaram; algumas vaiaram. Depois, para a surpresa de Julie, elas começaram a balançar suas cervejas seguindo o ritmo da música.

Mike havia escolhido uma canção que agradava ao público em noites de boemia, " American Pie", a eterna favorita das jukeboxes.

A voz dele era desafinada, Julie notou, mas esta noite, com esta multidão, isso não importava. As pessoas cantavam e se moviam ao seu ritmo, inclusive ela.

Quando Mike terminou, pousou a guitarra para receber uma bela rodada de aplausos e depois voltou para a mesa, lançando, aos que lhe davam tapinhas nas costas, um olhar que dizia: "Isso não foi nada".

Mike acabara de fazer com que uma noite realmente boa ficasse ainda melhor.

Pouco depois, quando estavam indo embora, ao atendente do bar os informou de que a conta deles já tinha sido paga.

- Deve ter sido alguns de seus fãs - disse Julie.


                                                                      ***

Durante a volta para casa, Julie estava surpresa com quanto a noite tinha sido divertida. Mike a levou até a porta e, ao se virar para ele, Julie viu que ele estava pensando em beijá-la, mas, depois do que acontecera na noite anterior, não sabia o que fazer. Julie o olhou, dando-lhe o consentimento oficial, mas Mike não entendeu o sinal e não se aproximou,

- Olhe, eu me diverti muito esta noite...

- Gostaria de entrar um pouco? - perguntou Julie, interrompendo-o. - Poderíamos assistir a um filme na TV.

- Não está muito tarde?

- Não para mim. Mas se você preferir ir...

- Não, eu adoraria.

Ela destrancou a porta e eles entraram. Singer estava esperando à entrada e os cumprimentou antes de ir para o lado de fora. Ele apontou o focinho para o ar, e latiu uma vez e então abaixou a cabeça para cheirar o quintal, como se satisfeito por não haver criaturas que precisassem ser caçadas. Um minuto depois, desapareceu nas sombras das árvores.

Lá dentro, Mike tirou sua jaqueta e a pendurou na cadeira reclinável. Julie foi até a cozinha e voltou com dois copos de água. Mike ainda estava em pé e ela apontou para o sofá. Sentaram-se um perto do outro, mas sem se tocar. Julie pegou o controle remoto e começou a passar os canais. Apesar de não terem encontrado um filme bom, estava passando um antigo episódio de I Love Lucy, ao qual assistiram, rindo. Depois assistiram a The Dick Van Dyke Show.

Quando o programa terminou, Singer havia voltado para a porta da frente e latia. Julie bocejou.

- acho que está na hora de ir - disse Mike, levantando-se. - Parece que você está ficando cansada.

Ela assentiu com a cabeça.

- Deixe-me acompanhá-lo até lá fora.

À porta, Mike girou e puxou a maçaneta. Singer passou por eles a caminho da sala e estar, como se também soubesse que era hora de ir para a cama.

Ao observar Mike vestindo o blazer, Julie pensou no fato de que ele era amigo dela havia anos e que dar um passo adiante poderia ser o fim de tudo isso. Valeria a pena arriscar?, perguntou-se. Não tinha certeza.

E beijar Mike seria como beijar um irmão?

Julie também não sabia.

Ainda assim, como uma jogadora diante de uma máquina caça-níqueis esperando que a próxima jogada mudasse sua vida para melhor, aproximou-se antes que perdesse a coragem. Pegou a mão de Mike e o puxou em sua direção, perto o suficiente para sentir o corpo dele junto ao seu. Ergueu os olhos para ele, inclinando ligeiramente a cabeça ao se mover para a frente. Mike, percebendo o que acontecia, mas ainda sem acreditar, inclinou a cabeça e fechou os olhos e seus rostos se aproximaram.

Na varanda, mariposas voavam ao redor da lâmpada, batendo nela como se tentasse atravessar o vidro. Uma coruja piou em uma árvore próxima.

Mike, contudo, não ouviu nada. Perdido no toque suave de Julie, teve certeza de uma coisa: no instante em que seus lábios se tocaram pela primeira vez, houve uma vibração quase elétrica que o fez acreditar que aquela sensação duraria para sempre.


                                                                            ***

Foi bom, pensou Julie. Melhor do que achei que seria. E definitivamente não foi como beijar um irmão.

Julie ainda estava pensando nisso quando ouviu Mike ligar o motor da picape e desaparecer na rua. Sorria e, quando esticou o braço para apagar a luz, viu Singer.

O cão a olhava com a cabeça inclinada e as orelhas erguidas, como se perguntasse: Eu acabei de ver o que achei que vi?

- O que foi? Nós nos beijamos.

Julie tirou os copos da mesa, ainda sentindo os olhos de Singer nela. Por algum motivo aquilo era quase como se ela fosse uma adolescente pega em flagra pelos pais.

- Até parecer que você nunca me viu beijar ninguém - prosseguiu Julie. 

Singer continuou a encará-la.

- Não é nada demais - disse, dirigindo-se à cozinha.

Pôs os copos na máquina de lavar louças e acendeu a luz acima da torneira. Quando se virou, viu uma sombra e pulou para trás antes de reconhecê-la.

Singer havia entrado na cozinha. Estava sentado perto do balcão, olhando-a com a mesma expressão. Julie pôs as mãos nos quadris.

- Quer parar de me olhar assim? E não fique me seguindo. Você me assustou. 

O cão finalmente desviou os olhos.

Assim é melhor, pensou Julie. Ela pegou um pano e começou a limpar o balcão, mas decidiu deixar a cozinha para o dia seguinte. Atirou o pano na pia e foi para o quarto, repassando as cenas da noite. Sentiu-se corar um pouco.

Afinal de contas, Mike beijava muito bem, concluiu.

Perdida em pensamentos, Julie mal notou os faróis de um carro vindo por sua rua normalmente tranquila e desacelerando ao passar pela casa dela.


                                                            ***

- Você está acordado? - perguntou Julie ao telefone na manhã seguinte.

Mike lutou com o lençol e se sentou na cama ao reconhecer a voz dela.

- Agora estou.

- Então vamos. O dia está passando. Levante, soldado.

Mike esfregou os olhos, pensando que ela devia estar acordada há horas.

- Do que você está falando?

- Do fim de semana. O que você planejou?

- Nada. Por quê?

- Levante-se e se vista. Eu estava pensando em irmos à praia. Vai ser um ótimo dia. Achei que podíamos levar Singer e deixá-lo correr um pouco. O que você acha?


                                                                    ***

Eles passaram o dia andando descalços na areia branca, jogando frisbee para Singer e sentados em toalhas vendo a espuma se agitar sobre as ondas. Compraram uma pizza para o almoço. Ficaram lá até o céu se tornar púrpura com o pôr do sol. Jantaram juntos e depois foram assistir a um filme. Mike deixou Julie escolher e não reclamou quando ela se decidiu por um romance água com açúcar. E quando Julie ficou com lágrimas nos olhos no meio do filme e se aconchegou a ele até o fim, ele esqueceu a crítica mordaz que estava preparando em sua mente. 

Era tarde quando voltaram para a casa de Julie e mais uma vez se beijaram na varanda. Dessa vez o beijo durou um pouco mais. Para Julie, foi ainda melhor. Para Mike, isso era possível ou necessário. 

Eles passaram o domingo na casa de Julie. Mike cortou a grama, aparou a sebe e cuidou das plantas no vaso. Depois entrou e começou a fazer os pequenos reparos necessários em casas antigas - martelou os pregos que haviam se soltado de algumas tábuas do chão de madeira de lei, lubrificou as fechaduras e pendurou uma nova luminária que Julie havia comprado para o banheiro meses antes.

Ela o observou trabalhando e mais uma vez notou como ele ficava bonito de jeans e era mais confiante ao fazer coisas desse tipo. Ao beijá-lo enquanto trabalhava, a expressão no rosto de Mike lhe disse exatamente como se sentia em relação a ela, e Julie percebeu que o que antes era perturbador agora era a reação pela qual ansiava.

Quando Mike foi embora, ela se encostou no lado de dentro da porta e fechou os olhos. Uau, pensou, sentindo-se como Mike se sentira duas noites antes.

Continue Reading

You'll Also Like

223K 5.1K 50
A simple girl who works for her boss as a personal assistant. Right, expect he is dangerous. She just doesn't know it. He's a mafia boss. He saves h...
10.2M 641K 168
What will happen when an innocent girl gets trapped in the clutches of a devil mafia? This is the story of Rishabh and Anokhi. Anokhi's life is as...
234K 2.6K 22
I have found an ideal life. I have a loving husband, no work and no danger. This is exactly what I wanted when I ran away and changed my identity. Bu...
198K 15.1K 47
[Under editing]* "Charche nashe ke chal rahe the main zikr teri aankhon ka kr aaya, jab baat sukoon ki chidi main baat...