Depois que ela descobriu sobre a verdadeira identidade de Alfie Smith, chegou uma carta dele para ela poucos minutos depois. Ela sabia que ele não podia falar nada sobre sua identidade para ninguém, mesmo assim a omissão dele a deixou irritada e furiosa.
Quando leu o conteúdo da carta, riu com certo deboche. Assim que terminou de ler, fez questão de mandar a resposta rapidamente para ele, mandando-o ir para a sua casa fazer uma visita. Ansiava revê-lo e ouvir as explicações dele sobre tudo, ou quase tudo.
Charlotte esperava por George ansiosamente em sua casa, e apesar de ter jurado para si mesmo que o faria pagar por aquela mentira, sabia que não era culpa dele.
Colocou seu vestido rosa preferido e amarrou seu cabelo em um coque mal feito. Caminhou até a sala para tocar piano enquanto esperava por sua visita.
Quando Charlotte se sentia ansiosa ou estressada por alguma coisa, tocava uma música que a deixava um pouco mais calma e relaxada. Für Elise sempre transmitia a calma que ela precisava; não havia música comparada a aquela. As notas fluíam com rapidez, a melodia era doce e amável, coisa que ela adorava.
— Você raramente toca essa música. — o duque Harrison sentou-se ao sofá próximo do piano. — Toca apenas quando está ansiosa.
— Receberei uma visita. — Charlotte parou de tocar, e olhou para o pai. — Estou apenas passando o tempo.
— Por onde anda suas irmãs e a Srta. Marshall?
— Saíram antes do rei ir embora.
— Foram para a modista? — ele começou a rir.
— Como sempre. — retribuiu o sorriso. — E então, o que Sua Majestade queria aqui em casa?
— Nos convidar para o baile que irá fazer em honra do rei espanhol e sua família.
— Não poderia mandar um convite? Seria bem mais fácil.
— Como sempre, possui uma resposta na ponta da língua. — o duque a repreendeu com o olhar. — Isso não é nada educado.
— Eu bem sei meu pai. — Charlotte se levantou e olhou o jardim pela janela. — Mas acaba saindo algumas respostas uma vez ou outra.
— Pense antes de falar em certas situações minha filha. — o pai pôs a mão em seu ombro. — Vou viajar para Cambridgeshire, voltarei em breve. Preciso resolver algumas coisas pendentes em nossa propriedade. Avise para suas irmãs.
— Quando voltaremos para lá? — ela colocou sua mão sobre a dele. — O senhor sabe se a senhora Jasmine está em casa?
— Espero que em breve minha filha. Ainda não acho que seja o momento certo, a temporada não acabou. — suspirou. — Ela saiu há poucos minutos. Alguma coisa importante?
— Não. — deu de ombros.
— Esqueci-me de lhe perguntar, quem será a visita?
— Sr. Smith. — Charlotte virou-se para encarar o pai.
— Você tem certeza que quer continuar a ser amiga desse rapaz? — pegou suas mãos e apertou.
— Tenho. — deu um sorriso. — Ele é um ótimo cavalheiro.
— Nunca ouvi você falando isso de ninguém. Agora tenho que ir realmente. Não quero chegar muito tarde. — beijou a testa da filha. — Tenha um bom dia.
Ela observou seu pai sair da sala, e depois se virou para janela novamente. O jardim era algo que poderia ser observado por horas, principalmente onde ficavam as rosas, sua flor preferida.
Em breve o outono, inverno, as chuvas e os raios chegariam. Ela tinha medo de raios e trovões desde pequena. Seu pai e suas irmãs sempre ajudaram ela dormir nesses momentos, o que ela sempre agradeceu, pois eles não a criticavam por aquilo.
Avistou um cavalheiro no cavalo atravessando o portão da sua casa, e com certeza deveria ser o príncipe. Saiu da janela e caminhou até a porta principal, pois fazia questão de abrir a porta antes do mordomo.
Encostou seu ouvido na porta, ouvindo os passos vindos da escada, e assim que percebeu o quão ele estava próximo, abriu a porta antes dele bater.
— Meu Deus, estava me esperando na porta? — ele tinha uma expressão assustada no rosto.
— Sim, Vossa Alteza. — Charlotte fez um gesto com a mão para ele entrar. — A casa é sua, Alteza. — fez uma reverência exagerada e debochada.
— Como... — ficou sem palavras por alguns segundos. — Meu pai. — George deduziu.
— Entre.
— Charlotte, perdoe-me. — entrou na casa com certo receio. — Eu jamais quis mentir para você. Mas é conhecimento de todos que...
— Eu sei. — Charlotte riu debochadamente.
— Então por que diabos está agindo desta forma? — revirou os olhos.
— Eu simplesmente não sei! — respondeu frustrada.
— Ouça-me. — ele a pegou pelo braço e fitou seus olhos azuis que estavam com as pupilas dilatadas.
— Solte-me. — desvencilhou-se das mãos dele. — Eu vou lhe ouvir. Acompanhe-me.
— Senhorita Harrison, algum problema? — o mordomo se aproximou olhando para George com desconfiança.
— Não, está tudo bem. — virou-se para ele.
— Deseja que eu leve algo para o convidado?
— Sanduíches de pepino e chá para o jardim de inverno, por favor.
— Sim, senhorita.
O mordomo saiu, e Charlotte começou a andar e nem olhou para trás para ver se George acompanhava seus passos. Mas de qualquer forma, ela sentia sua presença perto dela, era algo impossível de não sentir.
Abriu a porta que dava para o jardim de inverno que sua mãe mandou construir. Sentou-se em um banco de madeira, e indicou com a mão para George sentar ao seu lado. Ele se sentou com certo receio, coisa que ela percebeu e deu um risinho, mesmo sem querer.
— Sempre fui escondido de tudo e todos, meu pai fez questão de fazer isso. Raras pessoas sabem quem eu sou. Sempre fui instruído para não revelar quem realmente sou. — George respirou fundo e a olhou. — As coisas estão começando a mudar agora. Fui a Espanha, a família real me conheceu. Meu pai me autorizou dizer quem eu sou realmente.
— Continue. — Charlotte cruzou as mãos sobre o colo.
— Finalmente estou livre para dizer quem realmente eu sou, senhorita Harrison. É libertador! Poderei seguir carreira militar em breve, como eu sempre quis, mas sempre fui proibido. O rei me privou de tantas coisas, que agora quero aproveitar o máximo possível.
Leila entrou com uma bandeja com um bule com chá e pequenos sanduíches de pepino. Colocou sobre uma pequena mesa de madeira próxima ao lugar que eles estavam sentados.
— Obrigada Leila.
Leila apenas assentiu com a cabeça e deu um sorriso malicioso.
— Minha amiga comentou que talvez irá se unir com a princesa Jade. Seu pai convidou o meu para um baile que vai acontecer em honra do rei espanhol.
George começou a comer os sanduíches e afirmou com a cabeça.
— Não estou sabendo do baile. — falou com a boca cheia.
— Coma, depois fale. — Charlotte riu. — Tenho certeza que recebeu educação.
Engoliu a comida que estava na boca.
— Absolutamente. Sobre Jade, não sei se fico feliz ou triste. — disse George.
— E por que não ficaria feliz? — engoliu em seco.
— Porque meu pai envolveu interesse político em toda essa situação. Eu não quero que ela seja usada de maneira alguma. Simplesmente é horrível pensar em Jade sendo uma moeda de troca entre grandes potências. Isso é completamente normal, não vai ser nem a primeira e nem última vez que vai acontecer esse tipo de situação. Porém, eu quero que seja diferente comigo.
— Você a ama? — Charlotte sussurrou.
George demorou a responder, e depois olhou para Charlotte.
— Eu gosto muito dela, mas amor... Ainda não sei lhe responder
— Precisa enfrentar essa situação. Seja sincero com ela sobre tudo isso. — Charlotte serviu chá para os dois.
— Obrigado. — pegou a xícara de chá.
— Por nada. — riu sem graça. — Juro que pensei em me vingar de você. Diversas formas, deixando bem claro. Depois pensei melhor e percebi que estaria sendo muito equivocada e errada com você.
— Quando não foi errada e equivocada comigo? — começou a rir.
— Realmente, ainda bem que reconhece. — ela deu uma pequena bofetada em seu braço. — Agora estou mais satisfeita. — Charlotte fechou os olhos com satisfação.
— Por ter esbofeteado meu braço? — perguntou em meio aos risos.
— É uma jovem implacável, senhorita Harrison.
— Eu sei disso, Vossa Alteza.
— Esses títulos ainda me deixam desconfortável. — ele virou o rosto.
— Não deveria. Acostume-se, em breve será conhecido por toda sociedade inglesa.
George se limitou apenas em revirar os olhos.
— Não revire os olhos para mim, Alteza.
— Prometa-me uma coisa. — George assumiu uma expressão mais séria.
— Dependendo do que seja, tudo bem. — deu de ombros.
— Que sempre será minha amiga, independente de qualquer. Pode me agredir, me ofender, eu não me importo. Quero sua amizade e compreensão.
— Prometo. — ela riu. — Agora vamos para a sala principal.
— O que vamos fazer na sala? — ele arqueou as sobrancelhas.
— Terá a honra de me ouvir tocar piano. — levantou-se do banco.
— O sonho da minha irmã é tocar piano. — levantou-se logo em seguida.
— Qual o motivo dela não tocar?
— Nenhum professor teve paciência de ensiná-la. Ela tenta todo dia, mas não consegue, e sei que ela fica triste com isso.
— Ela já tentou algum outro instrumento? — Charlotte saiu do jardim de inverno.
— Não.
— O problema já começa quando ela não tenta outros. Talvez ela não seja para o piano, e sim, para outro instrumento. Diga para ela tentar violino, é lindo e melodioso. Minha irmã, Scarlett, toca muito bem.
— Mas ela insiste no piano. — deu um sorriso torto e coçou a nuca.
— Eu irei ensiná-la piano.
— Sério? — George abriu um enorme sorriso.
— Melhor dizendo, falarei com papai, mas eu creio que ele não verá problema algum nisso.
— Ela ficará muito feliz.
— Espero que sim, mas não diga nada a princesa sem eu ter confirmação que poderei dar as aulas para ela. — Charlotte empurrou George para o sofá. — Alguma preferência de música?
— Moonlight Sonata.
— Aprecio essa música também.
Charlotte sentou-se ao piano e deslizou os dedos pelas teclas. Naquele momento ela tocou com toda sua alma e coração.
E não parava de pensar em uma coisa: Estaria ela interessada por George?