Eu gostava do meu cargo, ganhava super bem e o sr. Coleman era uma boa pessoa. Várias coisas passaram pela minha cabeça em questão de minutos e fiquei tentado demais.
– Senhor Williams, eu aceito o cargo, mas gostaria de preencher pessoalmente a minha função com o sr. Coleman, se o senhor permitir.
– Uma atitude muito admirável da sua parte. Inicie um processo de recrutamento junto ao RH da empresa e quando encontrar alguém para te substituir, assine sua promoção.
– Obrigado sr. Williams.
Bom, agora eu precisava encarar meu ainda atual chefe, desci e sabia exatamente o momento certo de falar com ele. Cada minuto do seu dia passava pelas minhas mãos.
Entrei em sua sala e ele estava sentado encarando a tela do computador concentrado. Fiquei uns 5 minutos em pé o observando enquanto ele trabalhava entre o que quer que fosse na tela, e algumas anotações e desenhos em sua mesa.
– Gabriel, vai falar algo ou só quer fazer parte da decoração do escritório? – Disse sem me olhar, ainda concentrado no computador.
– Eu gostaria de alguns minutos da sua atenção sr. Coleman, mas não queria te interromper, parece muito concentrado.
– Sente-se – Ele finalmente me encarou.
– Senhor Coleman, eu recebi uma promoção do sr. Williams para ser Assistente Executivo lá no 83. Gosto muito do meu emprego e não quero deixar qualquer um no meu lugar, vou cuidar pessoalmente da seleção da pessoa para me substituir.
– Parabéns pela promoção Gabriel – Disse ele sorrindo e eu fiquei meio sem ação.
– Não está bravo? – A pergunta saiu antes que eu pudesse pensar direito.
– Bravo? Não. Um pouco triste pois você foi o único que deu conta do serviço. Minha rotina é maluca demais e estamos juntos a um ano e meio.
– Dois, sr. Coleman, mas eu vou achar um candidato que não desista da função antes de três meses, pode deixar.
– Dois já? E deixe o sr. Coleman de lado, me chame de Ethan.
– Ok sr. Col... Ethan. Até eu achar alguém para me substituir ainda escolherei suas gravatas, não se preocupe.
Sai da sala aliviado, mas tinha uma coisa importante para fazer. Fui até o andar onde ficava o RH e conversei com uma das gerentes do setor.
A empresa funciona em vários setores e nosso escritório fica num grande arranha-céu em Manhattan. Os setores da empresa estão divididos em 8 andares do prédio.
Cada andar é ocupado por um ou mais setores da empresa, eu trabalhei no andar 37, estava no 44 e iria para o 83º onde ficavam os chefões da coisa. O RH funcionava no andar 25º andar junto com mais dois outros setores da empresa.
Foi um longo, muito longo processo seletivo, muitas pessoas queriam o cargo, mas não tinham a competência exigida ou não tinham aquele "espírito" sabe? Depois de quase 3 semanas finalmente achei uma candidata que provavelmente não fugiria.
Ainda passei uma semana com ela para lhe ensinar a sua nova rotina de vida, que seria basicamente orbitar o sr. Coleman. Com tudo devidamente providenciado eu finalmente começaria a trabalhar no 83º andar. No primeiro dia eu estava nervoso como nunca.
O 83º andar era um sonho, uma decoração de alto nível, tinha obras de arte que valiam milhares e milhares de dólares e eu teria minha própria sala! Ou quase isso para falar a verdade.
Logo na saída do elevador você está num grande hall com lindas peças de decoração, poltronas caras e confortáveis e um balcão com duas lindas recepcionistas. Elas mais parecem modelos do que qualquer outra coisa.
Atrás do balcão onde elas ficam, a parede é de vidro transparente e tem a minha "sala". Da minha mesa eu conseguia ver as duas navegando em redes sociais nos computadores que usavam.
Basicamente a função delas era receber as pessoas que vinham para as reuniões com os acionistas e receber e passar telefonemas. Já a minha, não sei nem por onde começar.
Eu era o responsável pelas agendas dos acionistas que mandavam na empresa, então eu passei de um para cinco sr. Colemans. A diferença é que eu não precisava escolher a gravata de nenhum deles.
Já tinham se passado 6 meses que eu estava na função e recebia muitos elogios por minha eficiência. Modéstia à parte, eu cumpro meu papel e meus patrões são muito generosos.
Eles vivem recebendo presentes de outros empresários, companhias e como eles são ricos e dificilmente aceitam alguma coisa, eu tenho uma coleção de vinhos de fazer inveja já. Eu só ligo para suas salas e falo a marca e a safra e quase sempre a resposta que ouço é "pode ficar".
Cheguei para trabalhar e uma das modelos, quer dizer, recepcionistas veio falar comigo. Seu nome é Natasha, linda, branca dos olhos azuis, cabelos negros, parece uma russa, mas apesar do nome é americana mesmo.
– Gab, você já soube do que aconteceu no 44? – No 83º todos me chamam de Gab incluindo meus chefes.
– Não, na verdade tem meses que eu não sei o que rola nessa empresa. O que foi?
– A Susy do RH disse que seu ex-chefe vai ser mandado embora.
– O sr. Coleman? Por quê?
– Falaram alguma coisa sobre vazamento de informações, espionagem industrial ou qualquer coisa do tipo.
– Com o sr. Coleman? Que absurdo, o homem vive em função do trabalho dele nessa empresa – Eu não podia acreditar.
– Hoje eu descubro mais informações e te falo.
– Por favor. Agora vamos trabalhar que o dia vai ser cheio, tenho uma lista de ligações que você e Jully vão precisar fazer pra mim enquanto eu faço outras. Esse evento de gala vai me levar a loucura.
Trabalhei o dia inteiro preocupado com o que Natasha disse sobre Ethan. Por outro lado, precisava me concentrar no evento daquela noite.
Grandes empresas sempre fazem muita caridade. Não é porque eles são pessoas de bom coração e querem ajudar ao próximo, mas é que isso reduz significativamente a carga tributária. No fim das contas sai mais barato ajudar alguém que pagar impostos.
Não éramos diferentes de ninguém nesse sentido e estava sendo organizado um baile de caridade para arrecadar fundos para um dos programas que a empresa desenvolve. Em várias partes da cidade existem locais onde oferecemos cursos de diversos tipos.
Um dos objetivos é dar qualificação profissional para jovens de bairros violentos, então temos esses centros em bairros de comunidades latinas, redutos de imigrantes e bairros de maioria negra com baixa renda. Além de tirar a molecada das ruas e possivelmente das gangues e tráfico a empresa caça novos talentos.
Muitos dos funcionários de diversos setores da empresa foram alunos desses centros e se destacaram tanto que a empresa os trouxe para serem funcionários. É uma coisa bacana.
Existe todo um trabalho social além do ensino técnico, então as crianças e jovens fazem reforço escolar, fazem refeições e é tudo e graça. Bem, de graça para eles e a empresa sempre faz essas arrecadações de dinheiro para poder manter todas as unidades abertas.
São 9 unidades espalhadas por toda a cidade e região metropolitana e o objetivo é abrir a 10º em Nova Jersey.
Eu estava supervisionando os preparativos para o baile e organizando agendas dos meus chefes. Fiquei no salão que foi reservado para o evento quase a tarde toda conferindo entregas, dando assistência a empresa que foi contratada para fazer aquilo tudo acontecer.
Nesse meio tempo eu ainda agendei de última hora uma ida ao salão de um cabelereiro celebridade para a esposa de um dos meus chefes, busquei o terno de outro na lavanderia e deixei em sua casa e me enfiei no meu melhor terno para estar lá caso eles precisassem de algo.
Fiquei orbitando o salão boa parte da noite, assisti de camarote os ricos e alguns famosos dançarem, comerem, tirarem fotos e assinarem gordos cheques para a caridade. A única caridade com a qual eu sonhava era a de alguém chegar e me dizer "Pode tirar os sapatos Gabriel". Sério, malditos sapatos desconfortáveis.
Quando o evento terminou por volta da 1 da manhã, e todos os meus chefes já tinham tomado o rumo de casa eu me permiti o mesmo. Arranquei os sapatos, entrei num táxi e fui.
O prédio que eu moro é pequeno, tem três andares, quatro apartamentos por andar e eu moro no 204. Com o paletó numa mão e os sapatos na outra subi as escadas e quando me viro no corredor tomei um susto!
Sentado na porta do meu apartamento estava o sr. Coleman. Ele estava desarrumado, sem um pé de sapato e parecia bastante bêbado. A princípio achei que estivesse desmaiado ou morto, corri em sua direção.
–Senhor Coleman – O chamei sem receber resposta – Ethan... Ethan!