Os Contos Perdidos de Yuransh...

By RaelZavilah

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O dia é 6 de abril do ano 30. A lua brilhava intensamente sobre Jerusalém, porém, lá embaixo, a cidade estava... More

BOOK TRAILER
DOCUMENTO SELADOR
DOCUMENTO INTRODUTÓRIO
DOCUMENTO 001: A NOITE ESCURA
DOCUMENTO 002: A RESPONSABILIDADE DOS HOMENS
DOCUMENTO 003: A HORA DAS TREVAS
DOCUMENTO 004: A INJUSTIÇA É O MANTO SOBRE O QUAL O MAL FLORESCE
DOCUMENTO 005: LONGE DA SALVAÇÃO ESTÃO OS MEUS RUGIDOS
DOCUMENTO 007: FOGO NO CÉU
DOCUMENTO 008: A GRANDE NOTÍCIA
DOCUMENTO FINAL

DOCUMENTO 006: A VIGÍLIA

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By RaelZavilah

O lugar era iluminado, mas não tanto.

A única certeza era que eu estava lá, sentado ao redor de uma mesa baixa, em forma de um arco, rodeado por figuras que conhecia. Estranhamente, eu estava na mesma sala que havia presenciado o jantar da Páscoa judaica, enquanto acompanhava o que acontecia naquela sala superior da residência de propriedade de Eliyahu Markus,[1] pai do jovem Yohannan.

Eu me virei, observando os apóstolos que me cercavam, mas ao olhar para o outro lado senti meu coração desfibrilar juntamente com meus olhos, que encararam outros olhos, belos e vívidos olhos. Era Ele, bem ao meu lado, olhando para mim. Ele falava algo que não conseguia ouvir, tamanho o susto que tive. Voltando-se para o outro lado da mesa, continuou seu discurso enquanto eu tentava entender tudo aquilo. Eu estava ali, no lugar de um dos discípulos do Mestre, Yohannan ben Zad'yah. Mas como? Ao tentar organizar meus pensamentos consegui captar aos poucos o que o Mestre dizia.

-... Não deixeis que vossos corações se perturbem... Credes no Pai e continuai acreditando em mim também. Ainda que eu tenha que vos deixar, não estarei longe de vocês. Já vos falei do universo do meu Pai, no qual há muitos locais para permanecerem. Se isso não fosse verdade, eu não teria falado sobre eles tantas vezes. Vou voltar para esses mundos de luz, verdadeiras moradas nos Céus, para as quais algum dia vós também ireis ascender. Desses locais vim para este mundo, e agora chegou a hora em que devo retornar a essa verdadeira obra do meu Pai, estabelecida nos espaços que estão acima de vós.

- Mas Senhor... – O discípulo tentou contestar, mas o Mestre não permitiu.

- Se eu irei antes de vós para o Reino do meu Pai, certamente algum dia vocês também estarão comigo nesses mundos que foram preparados para os filhos mortais de Deus, projetados muito antes que este vosso mundo existisse. Tudo o que eu vos disse é verdadeiro e eterno, ainda que possais não o compreender totalmente. Eu vou para o Pai e, embora vós não possais seguir-me agora, mas certamente me seguireis nos tempos que estão por vir. – Quando o Mestre sentou-se, seu discípulo levantou-se, finalmente interrompendo-o.

- Mestre, não sabemos para onde tu estás indo, como podemos saber o caminho? – Depois de ouvir seu discípulo, Yehoshua prontamente lhe respondeu.

- Tauma,[2] eu sou o caminho, a verdade e a vida. Nenhum homem vai ao Pai a não ser por meu intermédio. Todos aqueles que encontram o Pai, primeiro encontraram a mim. Se me conhecerdes, vós conhecereis o caminho até o Pai. E vós me conheceis sem dúvida, pois vivestes comigo, sabem o que desejo, ainda mais neste momento, em que podeis me ver, ouvir e falar comigo.

Esse ensinamento, todavia, era profundo demais para muitos dos apóstolos, especialmente para um deles, que, depois de trocar algumas palavras com o companheiro do lado, levantou-se como Tauma.

- Mestre, mostra-nos o Pai, e tudo o que disseste ficará claro.

E depois de ter dito isso, Jesus lhe perguntou.

- Filipos,[3] por tanto tempo eu estive contigo e ainda sequer me conheces? De novo eu declaro: Aquele que me viu, terá visto o Pai. Como podes então me pedir: Mostra-nos o Pai? Não acreditas que eu estou no Pai e que o Pai está em mim? Acaso não vos ensinei que as palavras que falo não são minhas palavras, mas palavras do Pai? Eu falo pelo Pai e não por mim mesmo. Estou neste mundo para fazer a vontade do Pai, e foi o que eu fiz. O meu Pai reside em mim e trabalha por meu intermédio. Acreditai em mim quando eu digo que o Pai está em mim, e que eu estou no Pai; ou então acreditai em nome da própria vida que eu vivi – a obra.

- E como posso ter a certeza de que acredito em tudo isso?

- Tu começaste tua vida muito autoritário e intolerante, mas mudaste bastante desde que permitisse que eu fizesse descer o fogo da iluminação sobre as cabeças de descrentes impensados e ignorantes. E tu deves mudar ainda mais. Você se transformará em um verdadeiro discípulo do novo mandamento que eu vos dei esta noite. Dedica a tua vida a ensinar aos teus irmãos a amarem-se mutuamente, como eu os amei.

- Mas como posso aprender a amar mais os meus irmãos? – Eu permanecia com as lágrimas rolando pelo rosto, fitando o rosto do Mestre. Então ele me respondeu.

- Tu aprenderás a amar mais os teus irmãos quando conseguires aprender a amar mais o Pai no céu e após te haveres tornado realmente mais interessado no bem-estar deles. E todo esse interesse humano fica assegurado pela compaixão compreensiva, pelo serviço desinteressado e o perdão irrestrito. Esforça-te para conviver pacificamente junto com todos os homens, especialmente os teus amigos, na sua fraternidade e na fraternidade do Reino celeste.

Meus amigos... Meus irmãos de Ordem... Pensei. Onde eles estão? Por que eu estou aqui? Por que estou vendo as mesmas cenas que já havia presenciado antes de descer ao Gat-Semane? Gritei por meus amigos enquanto as vozes se misturavam. Para minha sorte, elas não demoraram a desaparecer, e tudo o que havia se tornado negro voltou a iluminar minha visão.

Acordei com Yameshi, Ozahrun e Patmah ao meu redor. Evidentemente estava sonhando. Mas aquele mar de olhos me deixou muito confuso. Minha cabeça ainda doía. A primeira lembrança que me veio foi de nosso desespero durante a pane, e agora estava ali. Não sabia o que de fato ocorrera, muito menos quanto tempo havia se passado. Sem falar que, agora estava preocupado com o destino de meu amigo e companheiro de Ordem.

- Onde está Yahron? – Perguntei, tentando me levantar do leito o qual flutuava no centro médico de nosso Cruzador.

- Está bem. Está descansando no apartamento ao lado. – A Sacerdotisa Patmah me respondeu.

- Quanto tempo...

- Tenha calma Sahbarus... O shabat judeu já passou. – Disse Yameshi, tentando me tranquilizar, mas eu estava agitado.

Colocando a mão sobre minha cabeça, ele induziu uma leve sedação no meu sistema nervoso, o que me permitiu ouvi-lo naquele momento tão conturbado.

- Após a morte de Mesha'al houve uma sibilação eletromagnética ao nosso redor, que provocou terremotos fortíssimos ao redor da cidade. Ainda estamos analisando as origens de tal alteração no campo magnético ao nosso redor, mas tenho certeza que foi obra dos Superiores.

- Não tivemos tempo de desligar os sistemas, nem de desconectá-los da rede de projeção dos Hohros. De alguma forma suas emanações de suas Mentes entraram na mesma frequência dessas emanações eletromagnéticas emitidas pelos Superiores.

- Existe alguma consequência para nós?

- Além do desmaio? Somente o que os habitantes desse mundo chamariam de experiência mística. – Meu companheiro brincou. – Acho que vocês de algum modo se conectaram a Eles, afinal, suas Mentes estavam diretamente ligadas às emanações que cercavam a colina. Não se esqueça que todo tipo de projeção que invade a Mente é real e palpável. Algo aconteceu ali, só não sabemos o que...

- E agora, o que faremos?

- Você, irá descansar. Precisaremos de todos os Sacerdotes para acompanhar o que irá acontecer nas próximas horas.

- Acompanhar o que? – Perguntei, ainda desnorteado.

- O que cada um de nós espera de nossas vidas. Continuar a existir após nossa morte. – Disse Yameshi, recordando das promessas feitas pelo Mestre aos seus discípulos.

* * *

Eu era teimoso mesmo, ainda mais em uma situação como aquela.

Horas a fio naquela cama se tornaram uma tortura para mim. Após checar os dados de meu quadro de saúde, forcei os robôs que nos acompanhavam no processo de recuperação a me liberarem daquele repouso. A última coisa que podia fazer naquele momento era esperar pelos próximos momentos deitado em um leito. Sem perder tempo, vesti minhas roupas e rumei para o centro de operações de nosso Cruzador.

Ao entrar na nossa ampla sala de monitoramento, dezenas de Sacerdotes registravam os dados colhidos em tempo real sobre a movimentação na cidade de Yerushalayim, enquanto outros se comunicavam com nossos companheiros na distante capital de nosso sistema e sede nossa Ordem, o planeta Nemashi. Entretanto, notei que nossa posição era outra, senão a periferia da região da cidade de Urim.[4] Sem perder tempo, questionei Yameshi sobre nosso estranho quadrante em Yuransha.

- O que estamos fazendo sobre Urim? Deveríamos estar em Yerushalayim.

- Calma Sahbarus. Você sabe o que aconteceu. Nossas bases e o Cruzador precisaram se retirar para evitar maiores avarias. Nossos sistemas elétricos entraram em colapso, e até a comunicação com Nemashi foi temporariamente cortada. Além do mais, não convém fazer outro aparecimento desnecessário sobre a cidade. A esta altitude estamos invisíveis aos olhos dos habitantes de Yuransha. Sabe que não trabalhamos assim. As Ordens dos Superiores foram claras e devemos obedecê-las para o bem deste planeta, bem como de nosso Universo Local. – Respondeu, em meio a um sorriso.

- Quais são nossas diretrizes agora? – Perguntei, tentando me informar qual seria minha missão naquele momento. Porém, não foi nosso Sumo Sacerdote que me respondeu, mas uma voz que surgiu gritando do início de nosso salão tecnológico.

- Como diria Mesha'al: Não se preocupe com o dia amanhã... Tem paciência e aprende a esperar o comportamento do tempo em nosso mundo! Só podemos esperar Sahbarus, foi a única coisa que os Superiores nos disseram.

- Você não devia estar em seu apartamento? – Perguntei-lhe, surpreso com aquilo, voltei-me para aquele homem que me olhava sorrindo.

- E você acha que iria perder o acontecimento mais importante da história de nosso Universo Local de Navadoh? – Disse, abrindo os braços.

Como um velho amigo que não via há muito tempo, apertei Yahron contra meu corpo, satisfeito de vê-lo são e salvo. Em sua cabeça, alguns medicamentos adesivos indicavam que ele sofrera algum tipo de pancada ao sermos pegos de surpresa por aquela onda eletromagnética.

Para sua sorte não parecia ser nada grave, senão, os droides do centro médico não o teriam liberado, assim como a mim. Definitivamente algo havia transformado meus companheiros. O antes pesado clima, que puxava nossa confiança mútua até o chão, junto com a gravidade do planeta, agora parecia ter se transformado em uma atmosfera de paz, digna do Santuário da Ordem, em Nemashi. Todos estavam cooperando como nunca. Irmãos que dias atrás eu tinha visto brigando por postos de trabalho e atribuições naquela missão, agora estavam trocando suas conclusões e se ajudando mutuamente nas consultas sobre os dados. Na verdade, tanto nós, como a sede da Ordem, estava sobrecarregada de informações que precisávamos organizar o mais rápido, e não era para menos. 

O Criador de nosso Universo Local havia nascido em um longínquo planeta, no setor mais obscuro da maior galáxia da região para cumprir com uma missão bastante particular: Viver a vida de suas criaturas, passando pelos seus mesmos sofrimentos e alegrias, dúvidas e certezas, de modo a adquirir a experiência necessária para ser um Governante consciente de tudo o que criou, e assim, administrar ainda mais sabiamente tudo o que havia projetado e construído, desde as grandes esferas cósmicas que nos rodeavam, até como orientar nossas consciências a evoluírem ainda mais. E nisso se resumiu sua missão que ele auto-outorgou após atingir sua maturidade: Ensinar a cada um de nós. Ensinar o melhor caminho para se viver, para evoluir, e para prosseguir na caminhada rumo ao verdadeiro Princípio de Tudo o que existe. Aquele ao qual chamava intimamente de Pai. 

O mais impressionante é que Ele decidira experimentar até mesmo a morte em sua face mais cruel, desumana e torturante possível. A morte era um verdadeiro mistério, até mesmo para o Criador, mas era preciso passar por isso também. Entendendo isso, eu pude compreender as verdadeiras intensões daquele magnífico Ser. Todavia, ainda faltava algo. Pela nossa Ciência, sabíamos que com a morte nossa Personalidade, nossa Alma, e, por fim, nossa Mente não se extinguia. Tudo era uma eterna progressão. Nossa realidade material, da qual fazíamos parte, era apenas uma verdadeira "escola básica" temporária, para em seguida entrarmos na "escola superior do Cosmos". Em resumo, o sentido da vida se baseava num único princípio, firmado até mesmo no mecanismo físico-biológico que nos cercava: Evoluir. Ou como Ele mesmo ensinava: Se tornar perfeito, assim como o Pai é perfeito. Então, a única coisa que podíamos esperar era que, assim como nós, Ele também Despertasse nos mundos superiores – como havia dito durante o jantar da Páscoa judaica. Assim, ele experimentaria todos os estágios da vida e da existência mortal.

Mas não estávamos falando de qualquer mortal nascido em um mundo evolucionário do tempo e do espaço. Era o Criador, Arquiteto e Governante de um Universo inteiro. A natureza de sua essência e constituição não era meramente material. Havia algo além daquilo. Uma poderosa essência que não éramos capazes de captar ou medir, afinal, isto é algo impossível. Ao mesmo tempo, Mesha'al era imanente e transcendental. Divino em sua origem, mas humano naquele momento no tempo e no espaço. Porém, era uma chance única que tínhamos. Precisávamos compreender. Precisávamos estudar. Precisávamos registrar a real natureza daquele fenômeno, o qual, todos nós experimentaríamos algum dia. A Ciência, mesmo limitada à evolução de nossa Mente dentro do espaço-tempo, continuava sendo, como eu costumava dizer, "O instrumento mais preciso para se conhecer a realidade de tudo o que nos cerca, enquanto nos revela por meio da surpresa do descobrir a sabedoria, a beleza e ação do Mayam'Horun".

Esses questionamentos rondaram nossas conversas durante toda a noite, de modo que não foi difícil se manter acordado após tanto tempo se revezando com meus companheiros para aquela missão. As horas de sono haviam sido poucas, mas a vontade de compreender todo esse mistério que nos cercava. O momento se aproximava, e no fundo sentia que algo estava errado. Esperávamos por um sinal, e ele não demoraria a chegar. O que não esperávamos era que ele viesse da forma mais inesperada possível.

[1] Elias Marcos.

[2] Nome hebraico de Tomé.

[3] Nome grego de Filipe.

[4] Ur, na Mesopotâmia.

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