Inefável

By malulysyk

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Blair Finnegan, caloura em Yale. Ela foi criada para continuar com o legado da família, com seu destino traça... More

Avisos
Dedicatória
Capítulo um - Um desconhecido
Capítulo dois - Fora da temporada
Capítulo três - Situação embaraçosa
Capítulo quatro - uma decisão
Capítulo cinco - Amigos?
Capítulo seis - Flertes sem segundas intenções
Capítulo sete - Sorria mais
Capítulo oito - Noite de karaokê
Capítulo nove - Primeiro abraço
Capítulo dez - Confusão de sentimentos
Capítulo onze - Estarei com você
Capítulo doze - Sei o que é amor
Capítulo treze - Todos temos cicatrizes
Capítulo quatorze - De qualquer jeito havia vencido
Capítulo quinze - Decepção
Capítulo dezesseis - Uma distração
Capítulo dezessete - seus sentimentos importam
Capítulo dezoito - uma mentira?
Capítulo dezenove - Uma surpresa
Capítulo vinte - nosso aniversário
Capítulo vinte e um - primeiro encontro
Capítulo vinte e dois - fim de um laço
Capítulo vinte e três - você é forte
Capítulo vinte e cinco - desencontros
Capítulo vinte e seis - alguns amores não foram feitos para terem final feliz
Capítulo vinte e sete - adeus?
Capítulo vinte e oito - inefável
Epílogo
Agradecimentos

Capítulo vinte e quatro - a verdade

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By malulysyk


Blair Finnegan

A neve cobria as ruas de Boston, os dias ficaram ainda mais frios e cinzentos. Os vidros da janela da sala estavam congelados, mas aqui dentro o aquecedor fazia seu trabalho deixando o cômodo quentinho.

Papai trouxe chocolate quente da cozinha, recém preparado por ele, com cinco marshmallows flutuando no líquido fumegante.

— Não coloquei canela no seu, eu sei que você não gosta muito.

Ele era o único que lembrava o quanto eu detestava canela, sempre achei um gosto muito forte que roubava o sabor de qualquer outro ingrediente.

— O senhor é o melhor!

Ele esboçou um sorriso com minha reação.

Dei um gole na bebida, o cheiro e o gosto de chocolate quente me lembravam de cobertores e lareira, se o inverno tivesse um sabor seria esse.

— Está delicioso como sempre. — elogiei deixando a xícara na mesinha de centro para me concentrar nos últimos enfeites da árvore de Natal.

Geralmente eu passava as festas de fim de ano em Seattle, mas não tinha mais sentido voltar para aquela cidade depois de tudo. Não falava com minha avó a tempos, na verdade desde o casamento de Juliette. Meu avô ainda ligava e depositava dinheiro na minha conta mesmo com minhas objeções.

Peguei da caixa de enfeites um anjo de vidro, a extremidade perto do chão já estava entulhada de penduricalhos. Então, levantei do carpete e analisei a árvore, ainda havia espaço no meio.

Meu pai também veio me ajudar a finalizar, deixando sua xícara ao lado da minha, era a primeira vez desde os meus doze anos que conseguimos decorar a árvore juntos, estava feliz por passar o Natal com meu pai. Pendurei o anjo em seu lugar, e vasculhei a caixa de papelão procurando sinos de plástico para colocar ao redor. Meu pai pegou uma das bolinhas vermelhas, mas parou em um movimento brusco, seu rosto ficou pálido de repente e ele levou a mão até a barriga.

— Pai!

Ele se apoiou na mesinha ao lado do sofá.

— Tudo bem? — perguntei parando de vasculhar a caixa e levantando para verificar meu pai. Ele andava evitando ficar em casa esses últimos dias, dizendo que estava cheio de trabalho de final de ano, ele geralmente fugia de tudo isso para ficar comigo o máximo que conseguia, mas parecia estar evitando minha companhia. Não tinha ligado muito para isso no começo, mas ele não parecia o mesmo há algum tempo. Tem dormido mais que o normal, a alimentação mudou radicalmente de hambúrguer para salada, isso era uma coisa boa, mas ele nunca comeria salada no almoço e no jantar se tudo estivesse bem. E agora parecia estar com dor, era a terceira vez da semana que ele passava mal, já tentei convencê-lo a ir ao médico, mas ele dizia que era só dor de estômago, que logo passaria.

— Eu estou bem, querida, é só alguma coisa que comi que não caiu bem. — a desculpa de sempre.

— Precisa ir ao médico, pai. — insisti novamente. Não descansaria enquanto ele não fosse em uma consulta.

Ele levantou uma das mão e fez um sinal de como se dissesse, "não é nada demais para requerer um médico".

Sempre teimoso.

— Pai...

— Eu estou bem, só preciso deitar um pouco.

Não tentei continuar discutindo, na segunda daria um jeito de marcar uma consulta e obrigá-lo a ir ver um médico, talvez o excesso de trabalho o estava afetando mais que o esperado.

O ajudei a subir as escadas até seu quarto, já passava das cinco da tarde, terminei de tomar meu chocolate quente, meu pai havia bebido apenas a metade do dele, joguei fora o restante do líquido em sua xícara e lavei a louça suja e decidi fazer uma sopa, Amber me ensinou alguns segredos culinários, uma sopa de legumes faria milagres com meu pai, e também ele merecia um bom jantar.

Fui até a geladeira pegar alguns dos ingredientes, coloquei a panela no fogo quando ouvi um estrondo vindo do andar de cima, como se algo caísse no chão, meu coração quase saiu pela boca.

— Pai? — gritei. Não obtive resposta. Desliguei o fogo, cruzando a sala indo em direção às escadas, a cada passo a madeira velha dos degraus rangiam, no compasso que meu coração continuava acelerado, com um pressentimento.

— Pai! Foi o senhor que fez o barulho? — perguntei andando pelo corredor até seu quarto. Bati de leve na porta, nada, nenhum um som. Ele não respondeu novamente.

Com a esperança de ele não ter respondido por estar dormindo, abri a porta. Minha mão paralisou na maçaneta quando a porta se escancarou e vi meu pai no chão.

Meu Deus.

Minhas pernas travadas finalmente voltaram a se movimentar.

— Pai? Pai! Pai?! — gritei correndo até ele. — Pai, fala comigo!

Ele não respondeu, não se moveu. Havia um frasco de remédio em sua mão. Será que tentou tomar para ajudar com a dor e desmaiou?

Seus óculos estavam quebrados ao seu lado. Tomei cuidado para verificar se não havia nenhum ferimento aberto por causa da queda. Não quis mexer demais, o recomendado era sempre deixar o paciente intocado para os paramédicos — mas isso era no caso de acidentes de carro, não tinha certeza se encaixava no quadro de meu pai. Não parecia haver nada, nem sangue ou hematoma evidente.

Não sabia exatamente o que fazer. Ligava para ambulância? Ou tentava colocá-lo no carro e o levava para hospital?

Não conseguiria levantá-lo sozinha. Merda. Merda.

Comecei a ficar desesperada, as lágrimas começaram a me impedir de raciocinar direito, mas era meu pai ali no chão, precisava me concentrar.

A primeira coisa que precisava fazer era encontrar um celular, mas não queria sair de perto dele.

— Tudo bem, pai, vai ficar tudo bem, vou ligar para a ambulância — minha voz mal saia por conta do choro preso em minha garganta. Eu precisava ser forte. Ele estava bem. Garanti para mim mesma, foi só um desmaio, a pressão deveria ter caído pela dor de estômago.

Meu celular ficou lá embaixo na mesa de centro da sala, mas o celular do meu pai provavelmente estava aqui em algum lugar do quarto. Sem sair do lado dele, passei os olhos ao redor, o encontrei na cômoda do outro lado. Levantei quase caindo pelo nervosismo, quase sai engatinhando pelo chão para alcançar o aparelho. Tentei fazer isso o mais rápido que podia.

Disquei o número da emergência às pressas, com as mãos trêmulas e mal conseguindo encontrar os números. Demorou alguns segundos até uma voz me atender.

Emergência, como posso ajudá-la?

— Meu pai, ele desmaiou, eu não sei o que fazer... — minha voz saiu toda atropelada e tremendo, não tinha certeza se a mulher do outro conseguiu entender.

Calma, precisamos que você se acalme e seja clara. O paciente apresentou algum sintoma durante o dia?

— Ele reclamou de dor de estômago.

Ela me pediu meu endereço, e para que eu mantivesse o foco que ambulância estaria a caminho.

Precisei sair de perto de meu pai para estar pronta quando a ambulância chegasse, o que demorou uns dez minutos que mais pareceram horas. Todos os procedimentos típicos foram feitos, eles verificaram os sinais vitais e o colocaram na maca. Nunca pensei que teria que ver meu pai saindo de casa desse jeito, ele era o homem com uma vitalidade impecável. Corria todas as manhãs antes do trabalho, apesar de sempre comer porcarias no jantar, ele mantinha seus exames de rotina em ordem, nunca nenhum de seus checapes deu alguma alteração.

☆☆☆☆☆

Hospitais sempre me deixaram apreensiva, a luz forte, as paredes brancas, as conversas difíceis sempre aconteciam nesse lugar.

Apesar da sala de espera estar quentinha, minha pele ainda se arrepiava por notícias de meu pai, ele ainda estava em observação na emergência, ninguém tinha vindo me dizer nada sobre seu estado e também não me deixavam passar dessa salinha minúscula que me causava claustrofobia.

Havia mais um casal de meia idade em um dos bancos, pelo que ouvi a filha deles sofreu um acidente de carro e teve que passar por uma cirurgia de emergência, a mãe chorava desesperada, entre as lágrimas haviam orações, era difícil olhar aquela cena e não se compadecer com a dor dela. Será que foi assim que minha avó ficou quando aconteceu com minha mãe?

Funguei tentando espantar as lágrimas. Peguei meu celular da bolsa, e fiquei encarando a tela desligada, não tinha a quem recorrer. Matt estava em Seattle com a família, meus avós não eram uma opção, mas a pessoa que eu mais queria nesse momento era Hunter, não nos falávamos a quase dois meses, e eu sentia falta dele todos os segundos desses longos dias. As lágrimas ameaçaram voltar e eu não as impedi dessa vez.

Se eu ligasse para ele, será que ele viria? Será que ele ficaria comigo?

Eu só queria alguém para segurar minha mão e dizer que ficaria tudo bem, que meu pai ficaria bem. Eu pegava o celular para ligar para Hunter umas duas vezes ao dia, apenas para escutar sua voz, só mais uma vez, mas desistia assim que encontrava seu nome nos contatos, ele queria um tempo e respeitaria seu pedido, por mais doloroso que fosse.

Guardei o celular novamente decidindo esperar por notícias de meu pai, sozinha.

Meus músculos estavam rígidos por conta do nervosismo e a ansiedade para saber como estava meu pai, já fazia quase uma hora sem nenhuma resposta.

Minha bunda começava a doer por ficar tanto tempo na mesma posição naqueles bancos duros do hospital, mas quem ligava para isso, eu só queria saber notícias, levantei e comecei a andar de um lado para o outro a fim de acalmar meus nervos.

Meu pai estava bem.

Meu pai estava bem.

Meu pai estava...

Meu mantra foi cortado pela figura do médico surgindo pela porta, era o mesmo homem de jaleco que nos recebeu na entrada da emergência de onde eu não podia passar, mas que ele prometeu que faria o melhor por meu pai.

Parei de andar de um lado para o outro e fui direto em sua direção. Minhas mãos estavam geladas, e minha boca seca, sedenta por qualquer coisa sobre o estado de meu pai, aquele aperto no peito igual o de mais cedo me incomodou mais uma vez, um pressentimento.

— Como ele está? — perguntei ansiosa e receosa.

O médico com sua postura impecável deu um meio sorriso, o que de certa forma acalmou meu coração.

— Ele está estável, acordou e nos contou informações valiosas para seu tratamento, aplicamos remédios para ajudar na dor. Provavelmente vai estar melhor para voltar para casa amanhã cedo.

Fechei os olhos respirando aliviada, foi um grande susto.

— Nesse estágio do câncer é comum as dores, infelizmente.

Meus olhos se abriram rapidamente, pensei que ele estivesse falando com outra pessoa, mas não, ele falava comigo. Câncer. Aquela palavra foi como uma pedrada forte.

— Can... câncer? — gaguejei quase sem conseguir dizer em voz alta. O médico me olhou como se estivesse confuso.

— Você não sabia? — as minhas lágrimas caindo foram a confirmação que ele precisava, ele me deu um tapinha no ombro como se estivesse se sentindo culpado de me contar sem nenhum cuidado.

— Seu pai não falou nada sobre você não saber, sinto muito.

E me deixou sozinha, em pedaços.

Fiquei paralisada, esperando alguém dizer que tudo não passava de uma brincadeira de mal gosto, mas ninguém veio. Perdi as forças caindo de joelhos no chão, chorando quase sem conseguir respirar.

Agora tudo fazia sentido, era por isso que estava me evitando a todo custo, para que eu não suspeitasse, a perda de peso, a comida saudável, as dores, tudo. A quanto tempo ele estava passando por isso sozinho? Por que ele não me contou?

Fechei os olhos me encolhendo no chão do hospital. Meu pai estava com câncer e não me contou. Chorar até soluçar foi inevitável.

Minha cabeça doía quando a enfermeira me permitiu ver meu pai, antes fui ao banheiro lavar o rosto, e tentar esconder os olhos inchados, não queria que ele percebesse que chorei. Tinha uma base perdida na bolsa, sem pincel, usei os dedos para espalhar o produto ao redor dos olhos para disfarçar a vermelhidão, chorar por trinta minutos não deixava o trabalho fácil, a cobertura da base não era muito boa. As lágrimas ainda insistentes estragavam o meu esforço ao tentar cobrir suas marcas. Então parei de tentar fazendo o possível.

Fui até o quarto para que meu pai foi transferido, haviam outros pacientes, ele estava na cama do canto esquerdo perto da janela. A enfermeira que estava no quarto disse que os remédios o fizeram dormir, e que ele descansará bem essa noite, de certa forma fiquei aliviada, pelo menos ele não veria minha cara de choro, apesar dos meus esforços para esconder.

— Oi, paizinho.

Sentei no banco que disponibilizaram perto da cama dele. As lágrimas voltando com tudo.

— Deveria ter me contado. — falei baixinho para não acordar ninguém. Quando chegamos ainda era dia, mas as noites frias de inverno já cobriram o sol faz tempo. Segurei sua mão. Ele ainda dormia. — Eu teria ficado do seu lado em cada etapa, não precisava ter suportado tudo sozinho.

Beijei sua mão, um pouco gelada.

— Não suportei, querida. — disse a voz suave e calma do meu pai, ele parecia um pouco sonolento, mas consciente.

— Seu amigo, Hunter, esteve comigo em muitas das etapas. — mais lágrimas. Então meu pai não passou por isso sozinho? — Ele sem querer acabou descobrindo, enquanto eu falava no telefone com a Miranda no apartamento de vocês, ele é um bom garoto, guardou o segredo mesmo relutante.

Não sabia o que dizer a ele, tudo que eu queria era que ele ficasse bem, e agradecer a Hunter por não deixá-lo sozinho, apesar de sentir uma pitada de raiva pelos dois terem mentido para mim, mas quem se importa com isso agora, meu pai era a parte mais importante da minha vida e estava com câncer.

Ele abriu um espaço na cama para que eu deitasse com ele, como fazia nas noites de tempestades quando eu era mais nova e acordava assustada com os raios e batia desesperada na porta de seu quarto subindo aos tropeços na cama. Meu pai me abraçou como se eu voltasse a ter oito anos, ele tinha cheiro de livros e baunilha, cheiro de pai, do melhor pai que uma garota poderia ter.

— Sinto muito, filha. Eu estava pensando no momento certo de te contar, queria passar esse último Natal como se não estivesse acontecendo nada... — ele fez uma pausa sua voz suave embargada. Escondi meu rosto com as mãos, chorando novamente.

— Você vai ficar bem, pai, eu sei disso. — murmurei, cheia de esperança.

— Não vou, querida. Tenho câncer terminal, filha. Mesmo que eu faça quimioterapia, talvez eu tenha menos de dois anos.

Tapei os ouvidos para não escutar, não, meu pai era o homem mais saudável da Terra, ele tinha que ver meu casamento e estar presente nos feriados quando eu tivesse filhos. Eu não podia perder ele também.

— Pai, por favor. Não.

— Sinto muito, filha, eu só quero passar o tempo que tenho com minha família, não quero ficar internado, e nem chorando, quero passar meus últimos momentos vendo você sorrindo. 

*Nota da autora: Desculpe a demora para a atualização. Sem dúvida esse capítulo foi um dos mais tristes do livro, fiquei receosa sobre minha escrita, mas espero que tenham gostado. 

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