Vozes do Coração • Jegulus/St...

By artmalfoy

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Regulus Black, filho do Ministro da Magia, é designado para representar os bruxos na assinatura de um históri... More

1. O Filho do Ministro da Magia

2. Jatinhos Particulares e Politicagem

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By artmalfoy

Regulus abraçava o próprio corpo esguio, tentando se proteger das rajadas de vento intensas do aeroporto de Dublin, na Irlanda. Carros de segurança e patrulhas terrestres em jipes o circulavam, e naquele pequeno momento agradeceu a Merlin por não ter de ouvir aquela cacofonia horrorosa de motores, gritos e maquinário aéreo.

Dizer que estava irritado era um eufemismo.

Não pudera nem ao menor ir até ali de vassoura, tendo de enfrentar horas torturantes de viagem de carro. Aquelas máquinas enormes que soltavam uma fumaça preta asfixiante andavam a uma velocidade extremamente lenta, e para piorar todo o cenário que já era lamentável, o congestionamento perto do aeroporto estava terrível. James dirigira, as mãos estrangulando o volante com tamanha intensidade que poderia arrancá-lo fora. O homem estava de terno, óculos escuros e tinha uma arma na cintura. Regulus o ignorou completamente durante todas as excruciantes horas que passaram em silêncio, no carro. Às vezes, podia sentir os olhos devastadores de Potter o observando pelo retrovisor, e seu pescoço esquentava-se. Vieram com uma escolta de dois carros a frente, dois atrás e duas motocicletas da polícia local.

A imprensa trouxa fora avisada por alguma fonte anônima onde estaria o garoto, e parte do aeroporto havia sido isolada dos fotógrafos e jornalistas.

Desde a quebra do sigilo mágico e a exposição bruxa aos olhos e julgamentos do planeta, Regulus havia se tornado uma espécie de celebridade. Sendo o filho mais novo do Ministro da Magia e envolvido diretamente nas negociações e acordos diplomáticos, sempre existia atenção exagerada sobre ele e sua vida. Nas poucas vezes que se permitiu sair para passear na cidade grande após a eleição de seu pai, seu rosto aparecera em noticiários como o The Guardian e a BBC, e revistas adolescentes o colocavam em matérias como: O que o bruxinho Regulus Black procura em uma namorada? Confira se você tem uma chance!

Ridículo. Tudo aquilo era ridículo e vazio de propósito.

Finalmente, James desceu as escadas do pequeno avião e sinalizou para Black que ele podia subir. Havia entrado antes com as malas para fazer uma varredura do local, a procura de potenciais ameaças contra Regulus. O sonserino estava achando aquilo tudo um grande exagero. Ele era só uma pessoa como qualquer outra, por Deus. Não era importante o suficiente para alguém o querer morto.

O jatinho enviado por Ronald Reagan era espalhafatoso, até mesmo para o presidente dos Estados Unidos da América. O avião possuía sala de estar, bar, quarto com cama de casal, dois banheiros e uma pequena sala de jogos – com sinuca e xadrez. Um apartamento de luxo voador, Regulus pensou. Quem dera as vassouras pudessem comportar aquele tipo de mordomia.

O piloto e o copiloto faziam parte do Serviço Secreto dos Estados Unidos, e eram dois sujeitinhos mal encarados que mal deixaram Abraxas e sua equipe se acomodarem antes de iniciarem o processo de partida.

Onde se sentou, afastado de todos os outros, Regulus tirou os sapatos e colocou os pés descalços contra o carpete do avião. Ele sentiu as máquinas e turbinas girando em alta velocidade, a vibração do motor e o aumento de temperatura do maquinário. Até mesmo pôde notar quando as asas foram reajustadas para ampliar o arrasto aerodinâmico, cortando o vento. A pressão sobre seu peito cresceu conforme o avião ganhava velocidade, e ele soltou um suspiro trêmulo quando os trens de pouso deixaram de tocar o chão. Ao olhar pelas janelas, as nuvens se assemelhavam a flocos gigantes de algodão doce, e a Irlanda inteira parecia pequenininha, tão pequenininha que poderia caber na palma de sua mão aberta.

Alguém se sentou na cadeira estofada a frente do Black, e ele se assustou com a movimentação, virando-se instintivamente. Era Potter.

O segurança encarou os pés descalços de Regulus com certo fascínio e curiosidade, depois o rosto do rapaz. Sua boca se moveu.

— Ainda gosta de voar?

O Black contorceu sua expressão em retalhação. Não queria contato com aquele homem.

— Principalmente quando não há ninguém para me incomodar.

O sonserino ergueu o queixo de maneira petulante, e o maxilar de James se repuxou em resposta. Perfeito, pensou. Se eu o irritar o suficiente, talvez ele saia daqui.

— Percebo que você ainda tem aquele senso de humor peculiar.

— Pelo menos tenho um senso de humor. — Desceu os olhos diretamente para o peito do grifinório. — Sua gravata está torta.

Os lábios do segurança tremeram como se ele tivesse bufado, e Regulus segurou uma risada, mordendo o interior das bochechas com força enquanto Potter ajeitava e alisava suas roupas. Linhas de expressão que pareciam aspas se formavam ao redor dos lábios carnudos conforme James dizia:

— Nunca mais nos vimos.

— Uma benção disfarçada. — Regulus forçou seu coração a se acalmar, estava explodindo alucinadamente na garganta. — Está incluído em seu contrato de trabalho tentar puxar assunto comigo?

Potter correu os longos dedos de sua mão enorme - como podia ter mãos tão grandes? - pelas madeixas castanhas em sua cabeça. Os fios do cabelo pareciam pintados um a um, tonalidades de marrom, caramelo e dourado mesclando-se perfeitamente. Seus olhos escureceram, e a espinha de Regulus gelou de cima a baixo. — Cuidado, Black. Fui contratado por seu pai para te proteger. Seria lamentável se, acidentalmente, você saísse voando por esta janela.

Ah, aquele era James Potter que Regulus já conhecia muito bem.

— Se eu tiver de passar mais um minuto nesta conversa, talvez você nem precise se dar o trabalho de cometer o crime. Eu mesmo me jogarei daqui de cima. — Entortou a cabeça, deixando seus cabelos pretos cobrirem um dos olhos cinzas. Parecia um anjo.
— O que você quer?

James abriu um pouco as pernas para se acomodar na cadeira. As bochechas de Regulus esquentaram por alguma razão.

— Leu as orientações que te passei e decorou o itinerário?

Regulus colocou as mãos sobre o rosto e ensaiou sua melhor expressão de confusão, formando um biquinho sarcástico nos lábios:

— Que itinerário?

— Pare de brincar comigo.

Black se jogou contra o assento, afundando-se no acolchoado macio. Somente aquela poltrona devia custar em média uns duzentos mil dólares americanos, e ele poderia aproveitar a mordomia, servir-se de um bom champagne e ignorar a missão que o aguardava do outro lado do oceano. Mas, é claro, James não deixaria que relaxasse por um segundo que fosse.

— Sim, Potter, eu li sua lista de regrinhas estúpidas. Pode me deixar em paz?

— Repita.

— O quê?

— Repita as regrinhas estúpidas para mim.

O pomo de adão de James subiu e desceu conforme ele dizia aquilo, e o sonserino imaginou qual seria o tom de sua voz. Quando era criança e a época de chuvas atingia seu lado do continente, a devastação o apavorava tanto que ele fazia xixi na cama. Sirius trocava os lençóis, ajudava o irmãozinho a se vestir e deixava que dormisse com ele. Os trovões ecoavam pela mansão Black e faziam os tímpanos doerem, e o pequeno Regulus só conseguia pensar que aquela era a fúria dos deuses.

Naquele momento, imaginava que a voz de James era divinamente furiosa, salpicada da eletricidade das tempestades. Grossa, grave e poderosa. Letalmente calma.

O sonserino levantou as mãos e usou a linguagem de sinais:

"Não aceitar me encontrar sozinho com ninguém. Sempre exigir um código pré estabelecido antes de abrir a porta do quarto de hotel. Ao entrar em uma sala, procurar pelas saídas primeiro. Não aceitar bebidas que não estejam lacradas. Se referir aos membros da equipe de segurança apenas pelo codinome, seguir o plano de evacuação e toda essa baboseira que uma criança de dois anos saberia. Me diga; você realmente teve treinamento ou só está copiando esses filmes ruins de espionagem que passam na televisão?"

Ele acabou, entrelaçando os dedos das próprias mãos e sorrindo convencido. Obviamente, James não havia entendido nada, mas essa era exatamente a intenção.

Ao menos fiz o que ele pediu.

No entanto, a reação do Potter não foi a que ele esperava. O segurança entortou a cabeça, deixando um pequeno sorriso repuxar seus lábios, e ajeitou os óculos com a ponta do dedo indicador. O que ele disse quase fez o coração do Black parar de bater dentro do peito.

— Só para a sua informação, esses filmes ruins de espionagem serão considerados clássicos um dia. E você esqueceu uma regra.

Regulus sentiu a temperatura de seu corpo cair em cinco graus e a pele empalidecer a ponto de ficar translúcida. James havia entendido o que ele havia sinalizado? Como podia saber linguagem de sinais?

"Desde quando você sabe...."

As mãos de Black amoleceram quando o grifinório se inclinou para a frente, diminuindo a distância entre eles. Aquele avião de repente pareceu minúsculo. Suas grandes mãos se movimentaram com clareza, e o que ele sinalizou fez com que uma vertigem sobrenatural tomasse conta dos sentidos do de olhos cinzentos.

"Última regra: Não confie em ninguém."

Regulus engoliu em seco, e a ponta de seus dedinhos dos pés congelaram. O estofado subitamente não estava mais tão confortável, pinicando-o embaixo das coxas. Ele trouxe suas pernas para perto do peito, e o avião chacoalhou um pouco devido a turbulência. Lá fora, estava escurecendo. O voo duraria aproximadamente nove horas, então passariam a noite inteira cruzando o oceano atlântico. Seus olhos passaram rapidamente pela equipe de segurança de Abraxas: seis homens, metade dormindo, dois lendo revistas e um se segurando às bordas de sua cadeira para não vomitar. O Malfoy se servia de um copo de whiskey, o líquido viscoso e alaranjado descendo por sua garganta. A expressão no rosto não revelava nada.

Do outro lado do corredor, dois agentes do Serviço Secreto, com seus rádios pendurados na cintura, conversavam discretamente. Um deles lançou o olhar na direção de Regulus, que desviou rapidamente sua atenção para não ser notado.

Respondeu, sem usar a voz:

"O que você quer dizer com isso?"

"Quero dizer que isso não me parece uma simples viagem diplomática."

James estava sério. De onde Regulus se encolhia, dava para enxergar o contorno da pistola que tinha presa á cintura. O olhar que eles trocaram pareceu ligá-los num fio condutor de pensamentos, e eles convergiram e comunicaram-se de maneira tão clara naquele instante que o Black moveu as mãos instintivamente:

"O Voto Perpétuo."

O aceno de Potter foi rápido.

"Tiraram nossa magia e nossas varinhas, a única força que temos contra suas armas e tecnologia. Estamos indo para o território deles, no avião deles, sob suas condições."

Regulus captou uma micro expressão facial de preocupação no rosto de James, que logo vestiu novamente uma máscara de inexpressividade.

"Acha que pode ser uma armadilha?", perguntou. E com a pergunta veio o enjoo violento.

"Não necessariamente. Mas estão nos colocando em risco de propósito. Sabem que esse Acordo é muito importante para que fizéssemos qualquer coisa que o colocasse sob risco de ser cancelado. Não usaríamos magia em hipótese alguma, a menos que tivéssemos de nos defender."

Um dos agentes do Serviço Secreto os encarava enquanto comunicavam-se em linguagem de sinais. Os dígitos de Regulus amoleceram diante do escrutínio, e ele não soube exatamente o que fazer para disfarçar.

James fingiu amarrar os cadarços de seu sapato social e olhou sutilmente para trás, percebendo a atenção que estavam chamando. Ele pigarreou, olhando para o irmão de seu melhor amigo e dizendo:

— Vamos jogar xadrez. Quero ver se você é inteligente mesmo ou apenas finge muito bem.

O Black olhou dele para os dois homens. Levou uma das mãos até os cabelos e enrolou uma mecha no dedo indicador, aparentando normalidade.

— Potter, você tem certeza? Não quero que se sinta tão humilhado após minha vitória que o único alívio de seu sofrimento seja pular do avião. Levariam dias para que as equipes de busca encontrassem seu corpo no mar e, sinceramente, eu me sentiria muito culpado. Tão culpado que nem conseguiria dormir a noite.

Os olhos de James faiscaram, mas ele entrou no jogo que estavam fazendo. Se inclinou sobre a cadeira do Black e disse, bem devagar:

Palestrinha.

Regulus se levantou de seu assento, ainda sem os sapatos.

— Vou vencer em três movimentos.

Prove.

Eles desceram as escadas até a sala de jogos do jatinho, afastando-se de todos os olhares e ouvidos duvidosos ali presentes. Sua provocação ensaiada parecera suficiente para que ninguém os seguisse até lá mas, mesmo assim, James fechou a porta após passarem.

Regulus odiava ficar sozinho em ambientes pequenos com outras pessoas. Em especial aquela. Ele pegou o tabuleiro de xadrez e posicionou as peças rapidamente, sentindo a textura dos peões nas mãos. Era um tabuleiro maciço de metal, e as peças estavam geladas e pesadas ao toque.

Antes de ficar doente, Black fazia parte da associação de xadrez bruxo de Hogwarts, e competia junto a um time de sonserinos chamado Serpentes Mestres. Ganharam dois torneios seguidos e, após seu diagnóstico e perda total da capacidade auditiva, se tornara muito difícil para o garoto competir em equipe. Após sua saída, o time nunca mais ganhou um torneio. Ele fez a gentileza de deixar que James começasse, com as peças brancas. O grifinório se sentou, olhou para trás desconfiadamente e moveu o peão.

— Potter...— Regulus começou a dizer, mas o mais alto levou os dedos até a própria boca, pedindo silêncio. Não queria que ninguém os escutasse conversando.

Black moveu seu peão central numa abertura agressiva, e depois sinalizou com as mãos.

"Não confia em Abraxas?"

James retrucou na mesma moeda.

"Você confia?"

Pergunta justa.

"O meu pai confia nele, logo minha opinião sobre o Malfoy é irrelevante. Se ele foi enviado aqui para ajudar a me proteger, então suponho que o fará sem hesitar."

James moveu seu cavalo para proteger o peão sob ataque.

"Regulus, acha mesmo que Abraxas está aqui para te proteger?"

O Black encarou a disposição de peças sobre o tabuleiro; um campo de batalha que se movia em sintonia para proteger o Rei, dispostos a se sacrificar por aquele objetivo. Pensou em como seu pai havia sido tão insistente para que participasse mais nas atividades diplomáticas com os Estados Unidos, como não hesitara antes de designar o filho para aquela Conferência. Tudo era muito esquisito.

Porém, o mais estranho de todas aquelas anormalidades era a presença de James Potter naquele cenário político. Ele era como um girassol em um cemitério; destoava completamente. Grande amigo de Sirius e conhecido por ser um poderoso bruxo e soldado, havia se alistado nas forças armadas e abandonado o mundo da magia desde a formatura. Estivera o mais longe possível de qualquer coisa que remetesse ao Ministério da Magia, Hogwarts ou feitiços. O Profeta Diário teorizava nas matérias de fofoca que o homem jamais voltaria, assumindo uma vida completamente trouxa pelo resto de seus dias. E, subitamente, James voltara de seu paradeiro desconhecido a pedido de Orion para proteger Regulus. Não fazia sentido.

E a maneira como estava fazendo Black questionar e desconfiar de todos a sua volta, até mesmo dos aliados de seu pai...ele não gostava. Não gostava nem um pouco. Parecia que queria manipulá-lo, assim como fizera com Sirius para que saísse de casa.

Moveu uma peça do tabuleiro e sinalizou, com os dedos tremendo:

"Não vou cair em seu joguinho, Potter. Faça seu trabalho como meu pai lhe ordenou, pegue o dinheiro e suma. Sua presença e as coisas que está dizendo não têm lógica alguma para mim. Estou aqui para assinar uma droga de um papel, nada mais. Fique longe do meu caminho, evite que eu leve um tiro e logo poderemos seguir nossos rumos. Pare de tentar enfiar ideias na minha cabeça."

James bateu com os punhos fechados na mesa, fazendo o tabuleiro tremer e um dos peões cair e rolar para longe. Suas bochechas estavam vermelhas de raiva.

— Será que, uma vez na sua vida, você pode pensar por si mesmo e não como a marionete de seu pai?

O estômago do Sonserino se embrulhou diante das palavras, cada uma delas parecendo facas afiadas o apunhalando brutalmente. Seus lábios tremeram, implorando por uma réplica, mas nada ele disse. Apenas se levantou da mesa, a expressão fechada. Nem sabia por que havia ido até ali com James, deixado que infiltrasse desconfianças em sua cabeça...merda.

O segurança percebeu que havia cometido um erro no momento em que o leve brilho nos olhos acizentados de Regulus desapareceu. Ergueu as sobrancelhas, balançando a cabeça freneticamente. Seus olhos estavam manchados pela culpa e arrependimento; mas já era tarde. A hemorragia causada por suas palavras se espalhou por toda a parte, manchando a sala de vermelho vivo.

"Eu não...Regulus, me desculpe. Tudo o que estou tentando dizer é que você não deve confiar nas pessoas erradas."

E em quem devo depositar minha confiança? — Os olhos cinzentos do Black o fitaram com desgosto do alto da cabeça a ponta dos pés. — Você?

A dor de cabeça que se instaurou por toda a extensão de seu crânio o fez ver estrelas por trás dos olhos, e por um momento desejou que o avião despencasse e afundasse no oceano gelado e tranquilo com todos eles dentro. As malditas enxaquecas. Porra.

Não me perturbe até esse avião pousar. — Estendeu um dedo delicado e derrubou o Rei Branco de Potter, que permanecia parado em meio a sala, respirando. Seu peito subia e descia rapidamente. — Xeque-mate, aliás.

[...]

O outono caía bem a Washington. As árvores moviam-se numa música silenciosa de vento e chuva, cada uma das folhas pendendo como pingentes dos galhos úmidos parecendo constelações de estrelas de cinco pontas, e o cheiro de terra molhada inebriou as narinas de Regulus, fazendo-o se sentir confortado apesar do sentimento pesado em seu coração.

Desde que perdera um dos sentidos, os outros se aguçaram substancialmente. Black sentia cheiros, via cores, saboreava gostos e o tato podia captar texturas específicas que antes não conseguia. Era como se seu corpo estivesse tentando compensar a falta de algo pela abundância de outro, e aquilo o tornava uma pessoa única e sensível ao mundo e a natureza ao seu redor. Aquele planeta respirava. E ele era lindo, e grande, e naquele momento era todo dele. Haviam dias tão difíceis que ele se limitava a apenas se deitar nos jardins da mansão Black e deixar que a grama pinicasse suas costas, torcendo para que mãos surgissem debaixo da terra e o puxassem pra dentro, o fundissem ao centro gravitacional do mundo, e ele seria tudo e nada ao mesmo tempo.

Aquele era um dos dias difíceis.

Seu hotel ficava há dez minutos da Cúpula do Capitólio, que era uma das estruturas mais reconhecíveis de Washington. O Congresso Nacional se reunia naquele edifício, e o Black não podia acreditar que seria ele a pisar lá dentro e assinar um Acordo que mudaria o mundo para sempre. Logo ele, um jovem de vinte anos, perdido e assustado e totalmente despreparado para lidar com pessoas, principalmente políticos de meia idade com complexos de Deus e disfunção erétil.

Seu quarto era espaçoso o suficiente para comportar toda a comitiva bruxa. Dividido entre a cama enorme, o banheiro e uma área de lazer, era muito mais que ele merecia ou precisava. Mas seu pai insistira em reservar aquele hotel, o mais caro da Capital. Além daqueles cômodos, havia uma porta branca de carvalho que ligava seus aposentos diretamente a outro quarto. Que era o de James.

Saber que Potter dormiria há uma distância máxima de quinze metros dele o apavorava um pouco, mas o lado bom era que poderia entrar sorrateiramente durante a noite e sufoca-lo com o travesseiro caso sentisse vontade.

— Isso é mesmo necessário? — Perguntou Regulus, bocejando.

James vasculhava cada centímetro do quarto, desde as colchas até o estofado da poltrona e até mesmo dentro do reservatório de água da privada. Dois seguranças de Abraxas estavam posicionados no corredor, e passariam a noite inteira lá de vigia. Aquilo tudo era demais.

"Sim", sinalizou Potter enquanto passava as mãos sob as superfícies lisas da madeira das mesas de cabeceira, procurando por sabe-se lá Deus o quê.

O Sonserino se apoiou contra a parede, cruzando os braços e observando.

— Tomara que tenha uma bomba aí e você a ative acidentalmente e nos mande pelos ares. Será lindo quando nossos restos mortais mancharem esses lençóis; uma bela pintura rupestre contemporânea.

James endireitou a coluna. Ele estava apenas com a camisa social e a calça, sem o blaser do paletó. A costura se repuxou sob a tensão dos músculos fortes, e através do tecido branco Regulus pôde ver uma tatuagem em suas costas. Mas não conseguia distinguir as formas para saber o que era. A pistola no coldre refletiu a luz das lâmpadas quando Potter se virou para fitar o garoto.

— Que cena maravilhosa você acaba que plantar em minha cabeça bem antes de eu dormir.

— Disponha. — James entrou no banheiro e abriu os armários, cheirando e vasculhando os sabonetes e loções disponíveis para uso dos hóspedes. — Potter, eu quero tomar banho.

O grifinório o fitou através do espelho, olhos cansados e cabelo meio bagunçado destoando do ambiente clinicamente arrumado.

— Ninguém está te impedindo.

— Quero tomar banho sozinho.

James pareceu engolir uma risada, fechando as gavetas e erguendo os braços em sinal de rendição. Depois, falou:

"Já acabei. Se precisar de algo, me acorde"

Os dedos dele se moviam com segurança e agilidade, e Regulus não pôde deixar de se perguntar quando, como ou por quê Potter havia aprendido linguagem de sinais. Como podia se comunicar tão bem, como era ele dentre todas as pessoas do mundo com quem Regulus se comunicava naquela linguagem, além de sua fonoaudióloga. Ninguém mais no mundo bruxo - e até mesmo o trouxa - se dignava a se adaptar às condições dele.

Foda-se. Deve ser obrigatório no exército aprender ASL. Não me importo. Isso não é relevante.

"Não vou precisar", respondeu, e não olhou para trás para ver o segurança indo embora.

[...]

O itinerário aconteceria da seguinte maneira: No primeiro dia, fariam uma visita privada a Casa Branca. O presidente e o governador estariam lá com suas famílias, e fariam um tour privado pela propriedade, sorrindo para as câmeras posicionadas estrategicamente nos jardins. No segundo dia, Regulus participaria da reinauguração de uma biblioteca pública local - seu pai havia insistido no feito, alegando que deveriam demonstrar ao povo americano que estavam envolvidos e se importavam com sua comunidade e nação, mesmo que fosse uma mentira. No terceiro e último dia, Regulus subiria ao palco no Capitólio, sendo televisionado ao país inteiro, faria um discurso inspirador, apertaria meia dúzia de mãos suadas e assinaria o documento. Fim.

Parecia fácil e rápido, mas no fundo o Black preferir sofrer tortura medieval. Açoitamento em praça pública ou guilhotina, tanto faz. Qualquer coisa era melhor que política.

Ele estava caminhando com Abraxas, dois seguranças de sua equipe e James pelos jardins da Casa Branca. Tinham sido levados de carro até a entrada, passado por três verificações de segurança diferentes; sendo elas uma revista do carro, uma revista física e inapropriada e um pequeno questionário padrão do Serviço Secreto - se estavam com armas, se portavam drogas, etc. A pistola de James e os cigarros do Malfoy foram confiscados, e Regulus tossiu para disfarçar a risada diante das expressões desagradáveis de ambos.

A mansão se erguia soberana diante deles. Pilastras perfeitamente brancas e simétricas separadas entre si por centímetros exatos e precisos; janelas de vidro fosco blindado com grossas cortinas verdes; grama perfeitamente aparada e hidratada; chafarizes extravagantes e a bandeira dos Estados Unidos no topo do edifício, ricocheteando em resposta ao vento fustigante...tudo compunha o retrato de uma nação forte, que exigia respeito mesmo que ele não fosse genuíno. Toda aquela beleza e cuidado gritava em seus rostos: Tenha medo de nós. Tenha medo de nosso dinheiro e armas. Tenha medo de nosso poder bélico. Nos tema e nos ame ao mesmo tempo, e se tiver sorte gostaremos o suficiente de você para que ganhe um lugar em nosso círculo íntimo.

James reparou que haviam soldados armados com rifles de longo alcance no parapeito do prédio, patrulhando o perímetro e se certificando de que não haviam elementos suspeitos nos arredores do pátio exterior. Ele odiava estar sem sua arma. Sentia-se quase nu quando não detinha de nenhum material para se defender.

— Ela parecia bem maior na televisão. — Potter disse, sem pensar, se referindo a Casa Branca. Quando não obteve resposta, percebeu que Regulus estava distraído por uma borboleta azul que passou voando por ele, bagunçando seus cabelos negros. Nem olhava na direção de James. O estômago do segurança deu uma cambalhota.

De repente, os olhos cinzentos e tempestuosos se voltaram para ele. Regulus era um garoto naturalmente sério, mas quando olhava para Potter sua expressão esfriava em quinze graus. Uma severidade cruel tomava suas feições jovens, como se ele quisesse que James sentisse por telepatia todo o seu desprezo.

"Ela parece bem maior na televisão", Black sinalizou para ele. O segurança se espantou, porque era exatamente o que havia dito nem um minuto antes. Regulus indicou a entrada com a cabeça, já aberta e com uma comitiva de empregados os aguardando. "O que devo esperar desse encontro, Potter?"

Abraxas os encarou de canto de olho, e James achou melhor responder em voz alta para que Malfoy não pensasse que diziam algo a respeito dele. O velho tinha uma síndrome latente de perseguição, pois se achava muito mais importante que realmente era.

— Você não disse que tinha lido meu itinerário?

— Disse que li, não que me importei suficiente para memoriza-lo.

Regulus era petulante. As pessoas mais calmas do mundo eram levadas para avaliação psiquiátrica após passarem alguns minutos com ele. Era quase como se o garoto usasse aquele comportamento reativo e hostil como um sistema automático de defesa. James reuniu todo seu autocontrole que adquiriu de seus anos nas Forças Armadas.

— Tomaremos café, discutiremos alguns detalhes sobre a reunião no Capitólio e fingiremos que gostamos uns dos outros quando na verdade nos odiamos.

Resumiu, simplesmente. Regulus soprou uma mecha negra e espessa de cabelo para longe dos olhos impressionantes.

— Isso é um encontro com o presidente dos Estados Unidos ou um jantar com a minha família?

Potter conteve a vontade de entreter aquela piada com uma tosse, e eles seguiram adiante com as formalidades. Por dentro, a Casa Branca era ainda mais impressionante. Tapeçarias europeias importadas e artigos históricos que datavam de mais de mil anos de idade recobriam as paredes e adornavam as mesinhas de centro das centenas de salas de reuniões. As empregadas ofereceram água a eles, que prontamente aceitaram. James pegou o copo antes que os dedos de Regulus o alcançassem, sutilmente analisando o líquido antes de entregá-lo ao Black.

Recebeu uma sobrancelha arqueada em contrapartida. Conforme eram guiados pela Equipe Presidencial entre os amplos corredores, Black disse a ele:

"O que foi, acha que alguém aqui tentaria me envenenar?"

James estalou a língua no céu da boca.

"Se você morrer, não serei pago. É apenas uma precaução."

"Seu canalha interesseiro."

Junto a equipe do Presidente e empregados, haviam chamado um intérprete para Regulus. O homem era um senhorzinho muito simpático que falava em ASL e Libras, e James se surpreendeu quando o filho do Ministro da Magia cumprimentou-o com um sorriso carinhoso nos lábios e deixou que o homem fizesse seu trabalho, apesar dos bruxos ali saberem que o garoto não precisava de tal serviço.

Foram apresentados aos principais aposentos da Casa Branca, lendários por sua singularidade. Passaram pelo Salão Oval, - onde o presidente trabalhava - escritórios, salas de Conferência e áreas de trabalho para a equipe do Serviço Secreto e por três distintos cômodos usados para jantares e encontros oficiais: O salão azul, verde e vermelho. Era neste último que viram o grande banquete sobre uma mesa longa de madeira maciça e pés de ouro, e o Presidente Reagan já estava lá junto ao governador de Washington, John Spellman.

Alguns outros assessores e funcionários dos Chefes de Estado circulavam pelo salão, comendo e conversando entre si. As famílias de ambos também marcaram presença, crianças correndo atrás umas das outras e balançando brinquedos de pelúcia, rindo e empurrando-se numa inocência que só as pequenas almas ainda detinham naqueles tempos.

Os bruxos se destacaram imediatamente, devido às suas vestes extremamente formais e clássicas. Usavam sobretudos grossos e escuros, com os cabelos penteados ordenadamente para trás. James estava com um terno comum aos chefes de segurança, porém era Regulus quem chamava toda a atenção.

Usava uma calça social preta que se agarrava a cintura fina e descia em um corte reto até os pés de coturnos. Um suéter creme fino e delicado deixava a mostra o pescoço pálido e, por cima de tudo, vestia um casaco de couro caramelizado. Não se parecia em nada com um jovem diplomata, e sim com um modelo recém contratado da Calvin Klein. Orion havia orientado-o terminantemente a se vestir a caráter para a ocasião, com os ternos mais elegantes e caros que o dinheiro podia comprar. Mas Regulus não gostava de seguir regras. Principalmente sobre sua aparência.

Os olhares de todas as mulheres do recinto estavam sobre ele, e aquilo não pareceu abalar Black. Na verdade, ele nem notava o poder que tinha sobre um ambiente somente ao entrar nele. Como se subitamente fosse o sol, e todas as pessoas orbitassem ao seu redor. Caminharam calmamente até o homem mais importante daquela sala, e Regulus estendeu uma mão firme, apesar de seu interior rugir de medo e nervosismo.

— Senhor presidente.

O 40° presidente dos Estados Unidos da América apertou sua mão com gentileza, um sorriso caloroso cobrindo as faces enrugadas pela idade avançada.

— Regulus Black, a celebridade do mundo bruxo. — Falou o homem, calorosamente. James apenas permanecia em silêncio. Abraxas nervosamente alisava as vestes e ajeitava os cabelos. — Sua viagem correu bem?

O intérprete estava entre eles, sinalizando o que Reagan dizia para Regulus, e o garoto esperava pacientemente que terminasse para responder ao presidente. Era muito bondoso de sua parte, considerando que Black podia ler os lábios de todas as pessoas daquele salão, até daquelas que não falavam inglês. O sonserino não gostava de fazer alguém se sentir inútil ou dispensar trabalhadores honestos. Podia ser um garoto mimado, arrogante e presunçoso, mas aquele era um princípio do qual não abria mão.

— Maravilhosamente bem, senhor. Obrigado pelo jatinho que enviou para nos buscar, é definitivamente um ótimo avião. Poderia passar um mês inteiro lá e ainda não teria aproveitado tudo o que tem a oferecer.

James franziu as sobrancelhas e intensificou sua máscara de seriedade para não reagir a maneira como Regulus estava falando naquele momento. Para quem o conhecia, era robótico e artificial. Mas todo o resto do salão pareciam encantados com seus bons modos e carisma.

— Ah, não se preocupe. Eu o tenho há dois anos e ainda não consegui aproveitá-lo como gostaria. Aquele avião é o dinheiro público mais bem gasto de meu governo.

O governador Spellman se intrometeu na conversa, batendo com o punho fechado contra o ombro do presidente como se fossem grandes amigos. Ele tinha duas falhas proeminentes de uma calvície que logo se expandiria para toda a cabeça nas duas extremidades da testa, que brilhava de suor. Sua boca se repuxou num sorriso amarelo, e disse:

— Para que servem os impostos se não para bancar nossos luxos, não é mesmo? — Risadinhas baixas puderam ser ouvidas.

— Para coisas menos importantes, como saúde e educação, eu suponho. — Black não sorria. O sarcasmo em sua voz era nítido, mesmo que não tivesse tomado a decisão consciente de ser irônico. Sua expressão se tornou afiada, como se tivesse muitas opiniões sobre aquele comentário e nenhuma fosse positiva.

Reagan pôde notar a mudança sútil no ar, com seu afiado senso político que podia captar um momento ruim há quilômetros de distância. Tentando aliviar a tensão, acenou com a cabeça para os outros bruxos ali presentes. — E quem trouxe com você?

Regulus pigarreou, piscando algumas vezes para se concentrar no que estava fazendo e no papel que tinha de desempenhar. Apontou para Abraxas e seus homens.

— Estes são Abraxas Malfoy e seus assistentes, funcionários de confiança de meu pai que conheço desde que nasci. E este, — Indicou James com o dedão da mão, dando um sorriso de dentes retos e branquinhos.— É James Potter, meu Elfo Doméstico.

O presidente olhou para o segurança de cima a baixo, erguendo as sobrancelhas e parecendo genuinamente confuso. Já o Grifinório contemplava maneiras diferentes de esganar Regulus.

— Não é grande demais para ser um elfo?

— Ele está brincando, senhor Presidente. — James engoliu em seco todos os insultos que gostaria de proferir, ajeitando os óculos e apertando a mão estendida para ele. — Sou o segurança designado para impedir que ele faça alguma besteira.

Ronald deu uma gargalhada, batendo com a mão livre na coxa como se aquela brincadeira fosse a mais divertida que ele já presenciara. Depois, indicou a mesa farta de alimentos e aperitivos com a cabeça.

— Bom, é um prazer conhecer todos vocês. Uma pena que seu pai não tenha conseguido vir para a Conferência. Desejo melhoras em sua recuperação.

Regulus franziu as sobrancelhas, completamente perdido. Por um momento, até julgou que havia lido os lábios errado.

— Recuperação...?

O presidente pegou uma taça de champagne e se serviu de um gole generoso. Apenas a garrafa daquela bebida devia custar o valor de uma casa com garagem e piscina.

— Recebi uma carta de Orion duas semanas atrás dizendo que estava lutando contra uma forte pneumonia e não poderia comparecer ao evento. Ele ainda está doente?

Naquele milissegundo que teve para decidir como prosseguir, Regulus olhou para James. O rosto do segurança estava impassível e calmo, mas os olhos brilharam quando cruzaram seus olhares. Uma mensagem implícita pairou no ar, um fio de energia que os conectava a nível celular, e os olhos castanhos-amarelados do Potter gritavam para ele: minta.

— Está acamado, infelizmente. Mas com mais alguns dias de repouso, temos certeza de que ficará novo em folha.

A inverdade deslizou pela língua do garoto como uma canção de ninar, e pareceu satisfazer o Chefe de Estado a sua frente. Recebeu dois tapinhas no ombro.

— Que bom. — Indicou a mesa cheia de aperitivos com a cabeça grisalha. — Sintam-se à vontade, comam e bebam alguma coisa. Depois iremos para o salão Oval tratar de seu discurso, e tiraremos as fotos nos jardins.

O governador e presidente finalmente se afastaram para conversar com assessores e preencher seus copos com mais champagne fresco. A cabeça de Regulus trabalhava a uma velocidade tão impressionante que quase entrou em dobra quântica, causando uma laceração no tecido do espaço-tempo.

Seu pai não estava doente. Por que havia mentido ao presidente? Por que escolheu mandar o filho aos Estados Unidos e assinar aquela merda de Acordo quando ele mesmo poderia ter vindo? Abraxas sabia dos motivos que levaram àquela decisão?

Logo Orion, que amava atenção e holofotes, propositalmente os desviara a Regulus. Não fazia sentido algum. E James deve ter notado a confusão no rosto do bruxo mais novo, pois sinalizou para ele em advertência:

"Foco. Você tem trabalho a fazer; depois pense nisso."

O garoto concordou com a cabeça e se serviu de uma taça de vinho tinto.

[...]

O segundo dia de viagem fora tranquilo, assim como o primeiro. Foram até a reinauguração da Martin Luther King Jr. Memorial, a principal biblioteca pública de Washington D.C. A presença de Regulus no evento causou um alvoroço de garotas adolescentes pedindo autógrafos e usando camisetas com o rosto dele, e o Black tentou muito parecer neutro diante daquilo, mas estava envergonhado.

A biblioteca era bonita. Um edifício alto de quatro andares envidraçadas, cercado por um belo jardim e com obras de arte penduradas nas paredes, cheio de jovens universitários carregando livros pesados sob os braços e senhorinhas gentis ajeitando móveis e prateleiras. Foi reinaugurada com um belo laço vermelho que o Sonserino teve a honra de cortar com uma tesoura de prata. As pessoas sorriram, aplaudiram e centenas de fotos foram tiradas.

Quando estavam indo embora, uma garotinha da multidão que não devia ter mais de cinco anos conseguiu passar pelas barreiras da segurança e se agarrou a perna de Regulus, impedindo que ele fosse. Abraxas e seus seguranças a puxaram dele, agarrando pelas roupas numa tentativa de desvencilhar suas mãozinhas do bruxo.

Regulus Black, aquele que sempre estava de cara fechada e odiava a humanidade como um todo, aquele que caçoava de seus superiores, desrespeitava todas as regras a si impostas e que torcia para que uma bomba atômica os dizimasse do planeta, fez algo que surpreendeu James. Ele exigiu que Abraxas e seus homens tirassem as mãos dela, se abaixou e pegou a garotinha no colo. Seus longos dígitos secaram as lágrimas no rostinho gordinho, e a menininha pediu um autógrafo a ele num caderninho rosa com estampa de borboletas que levava consigo. Regulus pacientemente assinou o caderno da menininha e a entregou de volta ao colo da mãe, que estava na plateia, constrangida e pedindo centenas de desculpas.

— Não se preocupe. — Assegurou. — Foi um prazer conhecê-la, mocinha. — Ele disse a menininha, apertando a mãozinha pequena em despedida.

Abraxas ficou uma fera depois daquilo. Deu um sermão demorado no bruxo, dizendo que ele não podia se arriscar daquela maneira, que terroristas podiam usar crianças para atacá-lo, que as normas de segurança existiam por uma razão. Também chamou o garoto de mimado e inconsequente. E Potter sabia que o Malfoy, apesar de ser um idiota, estava certo. Sabia que devia estar igualmente puto. Mas por algum motivo que o transcendia, não conseguiu se irritar.

— Não vai brigar comigo também? — Provocou Regulus, minutos depois, enquanto se dirigiam de limousine de volta ao hotel.

— Você quer que eu brigue? — Retrucou, sustentando o olhar frio.

Regulus não disse absolutamente nada.

Finalmente, o dia do fechamento do Tratado chegou. Estava mais frio que o normal, e a pele branquinha como a neve de Regulus se arrepiou quando espiou pela janela naquela manhã.

Não admitiria, mas estava muito nervoso. Suas mãos tremiam tanto que não era capaz de segurar uma caneta direito. Ele havia chutado o canto dos pés de sua cama duas vezes andando de um lado para o outro, quase quebrando os dedinhos. Enquanto pulava em um pé só e xingava de dor, James entrou no quarto. A cena inteira foi cômica e constrangedora.

Todos os bruxos da comitiva estavam vestidos com paletós finos e elegantes. Regulus escolhera um terno. A camisa social branca revestida por um colete verde justo realçava a finura de sua cintura, e as calças e o blaser igualmente verdes o davam um aspecto aristocrático. Black parecia um príncipe.

Relia pela milionésima vez seu discurso, sentindo o tremor das rodas do carro blindado sobre o asfalto e se perguntando se o peso que sentia na barriga era uma úlcera ou medo. James estava sentado na frente dele, olhos focados e expressão séria. Ele também escolhera um terno, porém vermelho escuro. As coxas grossas e torneadas caiam bem com o corte de alfaiataria da calça. Era um homem elegante, apesar de bruto.

Suas mãos grandes e firmes se moveram quando finalmente o filho do Ministro da Magia lhe dirigiu a atenção.

"Calma", pediu o segurança.

Regulus revirou os olhos, batendo o pé no chão do carro freneticamente. A ponta da caneta estava toda mordida.

"Eu estou calmo."

O carro fez uma curva acentuada a direita, e já podiam discernir a Cúpula do Capitólio entre os prédios altos. O policiamento naquela área estava denso, milhares de viaturas policiais estacionadas em ambos lados das ruas, formando um corredor seguro para que os carros Oficiais do governo pudessem atravessar.

"Consigo sentir seu nervosismo no ar. Está me sufocando."

Regulus deu um sorrisinho irônico que faria qualquer outra pessoa desviar o olhar para o chão.

"Que bom."

Voltou a ler o papel em suas mãos. O pergaminho estava lotado de anotações, - nas laterais, acima e abaixo - bem como riscos e correções que o sonserino fizera com a caneta. Parecia um cenário de guerra, apesar da letra do Black ser bela. Inconscientemente, ele levou a caneta de volta aos lábios para mordê-la, e James a arrancou de sua mão antes que tivesse chance.

"Regulus, você já leu esse discurso tantas vezes que poderia dita-lo de trás para a frente. Chega."

Regulus estava furioso. Suas bochechas e nariz assumiram um tom escarlate, e os olhos cinzentos faiscaram. Com uma calma letal, disse.

"Devo lembrá-lo que você trabalha para mim..."

James guardou a caneta no bolso frontal do terno, sorrindo minimamente.

"Eu trabalho para o seu pai. E, como segurança, meu papel é protegê-lo dos outros mas também de si mesmo. Você não pode ter um colapso nervoso, Black. O que está pensando?"

Por um minuto inteiro, eles apenas se encararam. Nenhum dos dois cederia naquela questão. Regulus só não o socou no rosto pois não queria machucar suas belas e delicadas mãos.

"Pare de fingir que se importa. É um péssimo ator."

Antes que James pudesse contra-argumentar aquela provocação, uma voz velha e ranzinza ao seu lado se fez presente, mais venenosa que nunca:

— O que as pessoas no Congresso vão pensar se os virem falando em linguagem de sinais o tempo todo? Têm noção do quão desrespeitoso isso irá parecer?  — Abraxas vestia uma máscara de descontentamento que desfigurava seu rosto. Regulus não entendeu o que o bruxo havia dito, e Potter agradeceu a Merlin por aquilo. O garoto não precisava de mais uma pessoa tornando sua vida mais difícil que ela já era.

— Não vejo como isso pode ser problema seu. — James respondeu, disfarçadamente, para que Regulus não notasse. Mas o olhar que dirigiu a Abraxas foi suficiente para que o homem perdesse as palavras que estavam na ponta de sua língua. O Malfoy gaguejou pateticamente, se decidindo prudentemente a calar a boca.

O carro parou e eles respiraram fundo antes de descerem.

O Capitólio era o local onde os membros do Congresso se reuniam para realizar sessões legislativas, debater leis, propor legislação, discutir questões políticas e representar os interesses de seus constituintes. Era um símbolo importante da democracia americana e um marco histórico significativo, e naquele momento estava um caos.

Um paredão se formara dos dois lados da entrada com escadaria de mármore; cercado por repórteres, câmeras enormes, garotas histéricas, apoiadores e críticos do governo. Cartazes eram levantados, gritos entoados e a atmosfera era de tensão. A cavalaria da polícia havia sido chamada, O Serviço Secreto se dividiu entre uma equipe terrestre e uma aérea, e os batalhões de segurança dos diversos Chefes de Estado ali presentes se organizaram como puderam para proteger seus devidos contratantes. Regulus era a pessoa menos importante ali em termos de dinheiro e influência, mas a mais famosa. Todos estavam ali por causa dele; para conhecê-lo e estudá-lo de perto. O Acordo que assinariam era apenas um detalhe.

"Este é o evento mais protegido da história desse país..."

"Metade da população americana não se sente confortável em manter relações diplomáticas com bruxos..."

James, enquanto escoltava seu protegido para dentro, ouvia os jornalistas falando com as câmeras e segurando microfones pretos gigantes de diferentes emissoras. Flashes repetidos e cliques de câmeras interrompiam sua linha de pensamento, e ficou aliviado quando finalmente adentraram o edifício e as portas se fecharam atrás das costas.

Os minutos ali passaram depressa. O primeiro ministro da Inglaterra, Canadá e França estavam ali. Governadores de vários estados do Centro-Oeste e sul dos EUA também, bem como o presidente do Brasil. Esses eram somente os grandes líderes que Regulus reconhecia de cabeça; haviam muitos outros.

Ele apenas se embrenhava na multidão, apertava mãos e respondia perguntas ridículas sobre o mundo bruxo. Ignorava a maioria, alegando estar com pressa e que poderiam conversar em outro momento - quando, na verdade, nunca mais se veriam novamente. Black era muito bom com política; era evasivo e carismático, controlava as pessoas e as conversas que tinha, possuía uma lábia surpreendente para uma pessoa tão jovem. James até ficaria impressionado se não estivesse tão preocupado em garantir a segurança do garoto.

Contara o número de saídas da Cúpula – Seis – e de agentes de segurança – Incontáveis. O teto era abobadado e dava quase a impressão de que estavam em uma Igreja Católica. Potter circulou pelo limitado número de jornalistas que obtiveram a permissão de televisionar o evento. Tinham apenas câmeras e equipamentos de som; nenhum sinal de armas.

O presidente Reagan deu início a sessão quando todos eles se sentaram diante do palco improvisado. Regulus escondia muito bem seu pânico, mas James percebeu as mãos do mais baixo tremendo levemente, junto a espasmos esporádicos em suas sobrancelhas. Abraxas e os outros dois agentes bruxos se sentaram logo atrás, sob a orientação de James de monitorarem as janelas e qualquer movimentação suspeita. Tudo corria perfeitamente bem. Tão bem que...

— Está muito calmo. — Regulus sussurrou para Potter, controlando o tom de voz com base nas vibrações de suas cordas vocais. Eles trocaram um olhar rápido enquanto Reagan discursava sobre os feitos extraordinários de seu governo - ou seja, se gabava.

— É isso o que me preocupa. — James respondeu, movendo os lábios lentamente.

Reagan endireitou os ombros e se aproximou do microfone, pigarreando.

— É em nome do desenvolvimento e da evolução conjunta de nossas potências que convido Regulus Black, representante do Ministério da Magia de Londres, para subir ao palco.

Regulus sentiu as paredes tremerem pelos aplausos, e se levantou sem pressa. Seus batimentos cardíacos estavam insanos dentro do peito; tão insanos que poderia morrer ali mesmo de infarto e estragar o dia de toda aquela gente. Seria até engraçado.

Não soube de onde tirou forças, mas conseguiu chegar em frente ao microfone, em cima do palco. As cadeiras estavam lotadas; milhares de pares de olhos de diferentes formatos e cores o encarando, esperando que começasse. O intérprete que chamaram em seu primeiro dia de viagem não estava presente, e aquilo o enfureceu um pouco. Os Estados Unidos eram uma nação extremamente populosa, e não havia ninguém ali além dele para traduzir o que era falado. Quantas pessoas surdas viviam naquele estado? Ou melhor, naquele país? Era como se sua deficiência fosse invisível, como se ele tivesse de se adaptar ao mundo daqueles que ainda podiam ouvir, como se ele tivesse de se contentar com um sistema que sistematicamente o oprimia e fazia da sua vida muito mais difícil que já era.

Como um ato individual de resistência, decidiu que faria aquele discurso tanto em linguagem de sinais como em alto e bom som. Suspirou, molhando os lábios e erguendo as mãos ao mesmo tempo.

— Caros Presidente Reagan, colegas bruxos e demais Chefes de Estado presentes aqui hoje, é uma grande honra e privilégio fazer parte deste projeto.

"Hoje, em nome do Ministério da Magia de Londres e da Nova Escócia e em prol de um futuro sustentável, aceitamos com gratidão este momento histórico de cooperação entre bruxos e humanos. Ao assinar este termo de colaboração para o fornecimento de energia renovável, reconhecemos a importância de unir nossas habilidades mágicas e tecnologia para enfrentar os desafios energéticos que afetam ambos os nossos mundos.

Nossos conhecimentos se entrelaçarão, impulsionando uma nova era de energia limpa e renovável. Este compromisso não apenas fortalecerá nossas sociedades, mas também respeitará o equilíbrio entre a magia, a ciência e a natureza.

Que esta parceria seja um exemplo brilhante de como a colaboração transcende fronteiras, supera diferenças e molda um futuro onde nossas habilidades conjuntas desencadeiam o poder da sustentabilidade. Unidos, podemos criar um legado duradouro para as gerações futuras.

Obrigado."

Terminou, aliviado. As câmeras estavam apontadas para ele, e muitos pareciam contentes e inspirados pelas palavras. Regulus não havia gaguejado nem uma vez sequer. Era impressionante o quanto conseguia se sair bem mesmo em situações de pressão.

Ronald Reagan apertou sua mão e eles sorriram para as câmeras. Foi o mais velho quem pegou a caneta e assinou o Tratado primeiro. Era um documento simples de apenas duas páginas; mas que mudaria todo o resto do mundo bruxo como ele era conhecido. Mais aplausos foram ouvidos, e o presidente estava prestes a entregar a caneta nas mãos de Regulus quando alguma coisa aconteceu.

Um clarão forte invadiu o salão, impossibilitando Black de enxergar qualquer coisa a frente dele. O mundo foi arrancado debaixo de seus pés, e o bruxo se sentiu flutuando em uma imensidão de nada. Um nada infinito, branco e que consumia tudo pelo caminho.

Sentiu um forte baque na lateral do quadril; uma rajada forte de vento quente como numa explosão, e seu corpo voou uns três metros para trás, batendo contra uma estrutura sólida que julgava ser uma parede. A cabeça doeu pela pancada, e o pânico começou a crescer em ondas famintas dentro de sua mente. Espalmou as mãos no chão, mas não conseguiu se levantar. As pernas tremiam tanto que não assimilavam força suficiente para movê-lo. Estava mole e indefeso.

O chão reverberava pelos sons de passos correndo, portas batendo e vidro estilhaçando. Se Regulus ouvisse, ele ouviria os gritos desesperados. Ouviria os tiros que se seguiram, cadeiras caindo e os choros. Mas ele estava completamente isolado naquele canto, lutando apenas para sobreviver e se recompor.

Um líquido quente desceu pelo rosto e pescoço, e nem precisou pensar muito a respeito para entender que era seu próprio sangue. E também sabia que não era a única parte de seu corpo que estava ferida. Respirou uma, duas, três vezes. Precisava ficar calmo, porra.

A fumaça branca se dispersou o suficiente para que pudesse ver o que estava há poucos metros de si, igualmente estirado no chão.

Um corpo.

Os olhos sem vida estavam vidrados e brilhantes, parte do rosto queimado e desfigurado congelado para sempre no tempo. Encarando Black até mesmo após a vida abandoná-lo, era Reagan.

A porra do presidente dos Estados Unidos, agora um cadáver sujando de sangue arterial todo o chão de madeira.

Passos velozes se aproximaram, e Regulus não teve tempo de reagir quando foi agarrado por mãos brutas e ásperas, puxando-o para cima pelo colarinho da camisa. Um homem fardado da cabeça aos pés com aparatos militares; facas de combate e colete, bem como um fuzil e uma pistola e uma máscara de gás; de um metro e oitenta de altura e uma expressão insana de raiva no rosto apertou seu pescoço com tanta força que o ar se extinguiu dos pulmões do Sonserino. Com seus braços fracos, ele estapeou e arranhou, mesmo quando o peito começou a doer e os músculos amolecerem. E aquela pequena parte de sua mente que permanecia racional diante do desespero dizia: lute, lute com tudo o que você tem.

Estava sufocando. Não podia acreditar que morreria daquele jeito: estrangulado por um brutamontes num dia qualquer. Ele só tinha vinte anos. Nunca tinha se apaixonado, ou feito algo verdadeiramente importante com sua vida. Não tinha visto Sirius uma última vez, nem lido aquele livro de suspense em sua estante.

Morrer aos vinte era como pausar um filme quando ele estava prestes a revelar o grande plot-twist.

Pontinhos pretos de inconsciência salpicaram por trás das orbes de Regulus quando a cabeça daquele homem foi aberta por uma bala. Foi rápida e veloz, atravessando de ponta a ponta. O projétil passou a um centímetro da orelha de Regulus, fazendo a carne queimar um pouco. O sangue daquele idiota espirrou nos olhos e rosto de Black, e a mão em seu pescoço se afrouxou e os dois caíram no chão feito sacos de batatas. O filho da puta estava morto.

Por trás do homem, James Potter segurava a pistola estendida na mão firme. Uma sútil linha de fumaça saía do cano devido ao calor do tiro, e sua expressão era impassível, como se não ligasse que tinha acabado de matar alguém. Em um segundo, estava no chão ao lado de Regulus, analisando seus ferimentos.

— Merda. — Xingou, avaliando a gravidade do corte na cabeça de Black, que ainda sangrava bastante. — Consegue correr?

— A-aquele homem tentou me matar. — Sentia que podia vomitar a qualquer momento. Seu pescoço latejava de dor. As mãos fortes e quentes de James agarraram seus ombros e chacoalharam. — Ele tentou...

— Regulus, se você não se levantar agora, nós dois vamos morrer.

Aquelas palavras foram suficientes para que engolisse todo o pânico e temor. Uma sirene começou a tocar em algum lugar, e luzes rotativas vermelhas das saídas de emergência piscavam repetidamente, transformando todo o ambiente num cenário de guerra. Respirou fundo, compartimentando sua mente o máximo que podia diante das circunstâncias. Calma. Foco. Respire.

— Sim. Sim, e-eu consigo correr.

James pegou a pistola, recarregou o pente rapidamente e a destravou. Um projétil usado caiu num baque seco no chão, e ele estava focado. Olhou para Regulus uma última vez.

— Vou tirar a gente daqui.


— {...}—

Notas da autora:

A fanfic finalmente começou :) Agora o bicho vai pegar.

Vocês já têm suas teorias sobre o que está acontecendo?

Eu amo o Regulus rabugento, gente. Ele é um doce, mas MUITO difícil de lidar.

E o James de segurança gostoso bem peituda metida KKKKKKK é uma das minhas versões favoritas dele.

Me perguntaram as alturas deles nos comentários do capítulo anterior, então lá vai: James tem 1.90 de altura e o Regulus tem 1.73

FONTE: NÃO FOI PRECISO! EU QUERO ASSIM.

Até o próximo capítulo!

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