Parada no jardim pude ver dois cavalos se aproximando, e chegando mais perto pude ver que eram duas pessoas caminhando em minha direção.
- Eles não podem nos ver. Não se preocupe.
Jenny disse. Eu nem percebi quando ela chegou.
- Como? - Perguntei assim que os dois estavam alguns metros de distância.
- Não importa quem esteja dentro da barreira, os olhos de fora não podem ver.
Dois cavalos passaram por mim como se eu não estivesse aqui e atravessaram as paredes do castelo como fantasmas.
- Como isso é possível? - Arregalei os olhos surpresa.
- A magia é capaz de muitas coisas.
- Mas se não conseguimos ver nada, então por que saiu da barreira mais cedo?
- Eu as vi quando voltei da minha caminhada. Não conseguiria entrar com as duas alí.
- Não faz sentido, mas tudo bem - eu ri.
- Os cavalos estão prontos e Minerva está na cozinha arrumando uma bolsa com comida.
- Não sei como agradecer por tudo - digo com sinceridade.
- Você não precisa me agradecer, só quero que você o traga de volta - diz em súplica.
- Eu o trarei - Prometi.
- Peguei algumas coisas que poderíamos precisar - disse Minerva, saindo e vindo em minha direção.
- Estarei aqui cuidando do castelo à espera dos três - disse com um sorriso.
- Voltaremos - eu prometo. - Vamos?
O sol ainda não tinha se posto, mas se quiséssemos chegar rapidamente ao nosso destino e sem preocupações, o melhor seria partir antes de escurecer. Eu não sabia quantos soldados estavam me procurando e a que distância eles estavam, então não consegui relaxar. Ambos os cavalos estavam selados, um com pêlo preto e outro com pêlo castanho claro. Escolhi a primeira opção, adorei a cor, sou apaixonada por cores escuras e foi isso que mais me chamou a atenção.
- Em que direção? - Pergunta já montada.
Toco o colar fechando os olhos à procura do laço, achando-o escondido e com sua luz agora mais forte. Sigo na direção indicada e o cavalo começa a correr entrando na floresta por uma pequena trilha.
Quando a noite está prestes a cair decido parar um pouco perto de um riacho. É claro que eu não estou cansada - dolorida com certeza - mas não poderia pensar o mesmo sobre um animal suportando meu peso por duas horas. Desmontei quando outro cavalo parou ao meu lado.
- Tudo bem? - Pergunta já no chão.
- Vamos deixar os cavalos descansarem um pouco, à noite não poderemos fazer isso. - digo o alisando.
Pego um pouco de água em minhas mãos e lavo meu rosto para tirar todo o suor. A água é corrente e penso duas vezes mas levo um pouco a boca. Se for para morrer não tem nada que eu possa fazer.
- Gostaria de algo para comer? - Ela perguntou, tirando a bolsa das costas.
Tirei uma maçã da bolsa e entreguei o cavalo ao meu lado. Procurei algo para comer e encontrei um bolinho com gosto um pouco salgado e com um toque de baunilha. Como olhando para a passagem - que nada mais é que árvores e mais árvores -, o céu está sem nuvens e o vento parado, o que torna tudo mais quente, por um lado é bom.
- Você ainda não percebeu para onde estamos indo - a olhei sem entender, esperando ela terminar - Para as muralhas Aylla, , estamos indo em direção ao reino dos humanos.
Olhei para o céu e percebi que a senhora Minerva estava certa, estávamos indo para o sul em direção à muralha mais alta do mundo.Tudo isso para se protegerem de nós, mal sabem eles, se os vampiros quisesse invadir isso já teria acontecido a muito tempo.
- Não percebi - estou falando a verdade.
- Será que aquela garota sabia? - Pensei na sua pergunta por um momento.
- Acho que não - digo inserta. Não tenho certeza, e principalmente eu não a conheço.
- Não sabemos quem ela é, talvez quando encontrarmos Atlas possamos resolver esse grande mistério.
Grunhi "sim" e me levantei, passando as mãos pela saia para remover a sujeira. Depois de descansar por um tempo, subimos no cavalo indo em direção às muralhas. Estou com medo por não saber o que irá acontecer
Fechei os olhos por um segundo só para curtir os sons da noite, minha audição estava mais aguçada e agora conseguia ouvir os sons de alguns animais ao longe, coelhos, corujas e até raposas.
Três dias de viagem e sem chegar a lugar algum. Meu corpo dói, foram horas em cima de um cavalo que mal consigo sentir minhas pernas. Paramos várias vezes para descansar, mas não adiantou muito, continuamos cansadas, tudo o que eu queria agora era uma cama e um bom banho.
O dia está indo embora, o céu está alaranjado e os pássaros indo para suas casas. O clima não está ruim, mas consigo sentir o cheiro da chuva se aproximando. Eu consigo sentir o cheiro de tudo ao meu redor, da terra e dos animais, não é forte mas ainda sim eu sinto. Hoje é finalmente o meu aniversário, o dia em que me tornarei uma vampira, não precisarei mais comer comidas humanas e nem dormir por muito tempo como eles. Hoje é o dia que eu entrarei meu companheiro custe o que custar.
- Estamos chegando - diz apontando para o horizonte.
A grande estrutura de pedra pode ser vista a uma distância grande. As paredes são de pedras e tem vários metros de altura.
Onde exatamente você está?
Fechei os olhos e as linhas douradas fluíram em direção à muralha. Sei que ele está em algum lugar ali, mas onde exatamente não sei. Tenho medo de como eu irei encontrá-lo, e se ele estiver na masmorra do rei? Como eu irei tirá-lo de lá? Não sei o que pensar sobre tudo isso. O que eu farei para entrar em um lugar em que todos caçam minha espécie? Minha mente está tão cheia de pensamentos que nem percebi quando Minerva parou ao meu lado.
- Quer dividir seus pensamentos? - sua voz doce é o que eu precisava para acalmar minha mente.
- Só estou preocupada - Sorrio - E ansiosa.
- Não é todo dia que isso acontece. Uma garota indo atrás do seu companheiro nas terras inimigas.
- Obrigada pelas palavras de ajuda - reviro os olhos.
Estou cansada, fisicamente e emocionalmente, e não tenho ideia do que o futuro reservava para mim, mas gosto de pensar que depois do nosso encontro seremos felizes para sempre em algum lugar distante. Mas a realidade não é essa, ele quer vingança e não irá desistir até conseguir isso.
- Estou com medo. - Confidencio - Do futuro. De tudo que vai acontecer.
- Não fique pensando muito nessas coisas querida. O futuro é algo imprevisível, nem os deuses o controlam. Às vezes manipulam um pouquinho para sair do jeito deles - Sorri dando de ombro.
- Me confortou muito agora - revirei os olhos sorrindo.
- Estou tentando dizer que não devemos nos preocupar com o futuro. Estamos nas mãos dos deuses e tudo o que acontecerá daqui para frente é porque eles querem assim.
- Eu sei - Murmuro olhando para o lado - Só que é quase impossível não imaginar como tudo será amanhã.
- Temos que planejar algo para conseguirmos entrar - muda de assunto.
A muralha está cada vez mais perto e em nenhum momento pensei em como passaríamos pelos portões. Essa é a hora para pensar em algo que não faça as duas serem mortas.
- Temos que entrar antes do anoitecer. Pelo menos seremos desconhecidas entrando a luz do dia.
- O que adianta? O sol já se pôs, então a claridade não ajudará em nada.
Antes que eu conseguisse responder avistei os portões. Tem uma grande fila de pessoas, carruagem e cavalos em frente aos pontos. Olho para senhora Minerva na esperança dela saber o que está acontecendo, mas ela parece não entender nada assim como eu.
- Devemos perguntar a alguém? - perguntei incerta.
- Vamos - diz seguindo na frente até o final da fila.
A distância de onde estamos até os portões não é tão grande, mas só os guardas falam tão baixo que não conseguimos escutar nada.
Uma mulher, com aparência cansada, que deve ter uns cinquenta anos está à nossa frente em uma carroça. Dentro tem caixas com vários vestidos, o que me dá ainda mais curiosidade para saber o que está acontecendo.
- Senhora - chamei sua atenção - Poderia me dizer o que está acontecendo? Por que tantas pessoas estão tentando entrar?
A senhora me olha com uma expressão de que não acredita em minha pergunta. Será que fiz algo de errado?
- Você não sabe? - neguei balançando a cabeça - Há séculos atrás o diabo veio a terra, e foi morto pelo rei da época. Todo ano fazemos uma festa para celebrar.
- Eles comemoram a morte dele, Aylla - diz Minerva olhando para mim. - Comemoram a morte de Atlas.
Essa última parte foi apenas um sussurro, mas ainda sim eu consegui ouvir. É um tanto estranho eu vim libertar Atlas justamente no dia em que comemoram a morte dele. Ainda em cima do cavalo me afasto da senhora e volto ao final da fila, bem atrás de Minerva.
- O que faremos para entrar? - pergunta.
- Para encontrar meu pai. Um caçador que nos abandonou em uma cabana no meio da floresta.
- Como consegue pensar tão rápido?
- Cresci mentido para os meus pais. - dei de ombro - Simples.
- Eles não foram bons pais.
- Não, não foram. O exército é o que o meu pai mais ama, já minha mãe só tem tempo para a rainha.
- Um dia eles vão perceber o que perderam.
- Não, eles não vão - digo por fim para acabar com esse assunto.
A fila foi diminuindo, a cada pessoa que entra eu fico ainda com mais medo. Os guardas estão perguntando nomes, onde moram e até o que vieram fazer em Arcádia, duas pessoas não conseguiram entrar e temo ser uma delas.
- Próximos! - Grita um guarda nos obrigando a nos aproximar - Nomes?
- Meu nome é Minerva e essa é minha filha Aylla - diz com nervosismo.
- Desçam do cavalo - ordena não deixando opção senão fazer o que mandou - O que as trazem à Arcádia?
- Viemos atrás do meu pai - eu disse me aproximando um pouco mais.
Uma mulher um pouco mais alta que eu e vestindo as mesmas roupas que os outros se aproxima e pega minha bolsa das mãos de Minerva.
- Não se importa se eu revistar vocês não é querida? - arregalo os olhos assustada, mas ainda sim, deixo ela se aproximar.
Suas mãos passam por todo meu corpo procurando qualquer outra coisa além da adaga. Vejo ela olhando para o meu pescoço e depois desvia para os meus olhos, sua mão puxa os dois cordões vendo do que se trata. O pequeno frasco de vidro é tirado de mim sem eu poder fazer nada. Mas o que eu faria? Lutaria com ela? Apenas seria morta.
- Veneno que mata vampiros? Onde conseguiu isso.
Pensa Aylla.
- Eu... eu... é do meu pai. Vim procurar por ele - falo ao outro guarda.
- Quem é seu pai?
- Eu não sei. Tudo o que minha mãe me contou é que ele é um caçador.
- Caçador? - pergunta se direcionando a Minerva agora.
- O nome dele é Boris. Ele não me falou muita coisa sobre ele, mas já faz semanas que ele não aparece em casa e estou preocupada - disse toda nervosa.
- De onde vieram? - suas sobrancelhas arqueadas me fazem duvidar se realmente ela está acreditando na história.
- Da floresta. Moramos em uma cabana um pouco distante. Ele sempre aparece duas vezes por semana, mas já faz tempo que ele não volta.
- Não sei se acredito em sua história, mas vamos tirar a prova agora. Kori - chama outro guarda - Espero que não se importe de fazer um pequeno teste.
- Teste? - Meu corpo treme de medo.
Pensei que eles não fariam. E agora? O que vai acontecer se eles nos testarem?
- Se não tem nada a esconder não vai se importar.
O garoto se aproxima e pega minha mão com brutalidade. Na outra mão ele tem uma adaga e vejo ele trazer ela até minha mão. O corte não é fundo, mas ainda sim, arde, quando o sangue aparece o garoto pega um pequeno frasco e derrama o líquido sobre a pequena abertura. Dói, mas ainda sim é suportável. O mesmo segura minha mão e vendo que nada aconteceu vai até Minerva e faz o mesmo processo. Nada acontece.
Não sei o que aquele líquido deveria fazer, mas a ferida aberta em nossas mãos é o que convence a mulher de que não somos seres sobrenaturais. Parece que o tão temido teste não serve para nada.
- Espero que encontrem a pessoa que procuram - Sorri com uma bondade fingida.
Puxando os cavalos e de mãos dadas passamos pelos portões. As ruas são longas e não parecem ter um fim, tão longas que mal consigo ver o castelo no horizonte. As casas são todas de pedras e algumas com mais de dois andares. Tudo é de pedra, o chão, os bancos, até os postes de luz.
- Para onde iremos agora? Perguntei olhando ao redor - Não posso ir atrás dele agora, vamos esperar anoitecer.
- Podemos procurar alguma estalagem.
- Não temos dinheiro - bufei. A ideia de uma cama agora parece tão tentadora.
- Podemos seguir o laço e esperar a hora certa para agir.
Seguindo seu conselho penso no laço e sigo na direção que ele aponta, que graças aos deuses é na mesma que todos estão indo, ainda não saímos da vista dos guardas e não podemos levantar suspeitas indo na direção contrária se nem conhecemos esse lugar