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Cinco meses depois.
Pessoas ao redor passam produtos em meu rosto, enquanto outras tratam de produzir o penteado que escolhi para esse dia imensamente especial.
No meio de todo o caos está minha miúda, mamando calmamente em meio seio, ignorando toda a bagunça que paira sobre nós.
— que tal irmos lá fora brincar? As priminhas já chegaram — minha mãe propôs em um tom animado.
Maria nem se deu o trabalho de responder. Suas perninhas balançam calmamente, e a mãozinha está grudada em meu hobby. Antes seus olhos estavam abertos, agora estão fechados, negando a todos a visão de suas íris azul.
— deixe, mamãe — pedi — ela não mama desde ontem, deve estar com fome e querendo alguma segurança.
Acariciei o rosto macio da menina, e ela abriu os olhos sorrindo. Me fazendo sorrir na mesma hora.
Os últimos dias foram uma bagunça de decisões, e minha criança esteve no meio de tudo ajudando as mamães nas escolhas e sugestões. Como uma verdadeira mocinha empenhada.
— tudo bem, eu vou ver como está tudo lá fora e volto pra te ajudar com o vestido.
Pensei muito antes de dizer sim ao pedido de noivado, porque não estamos juntas a tanto tempo, mas Sabina jogou muito sujo ao usar Sina em seu discurso. Em meio às lágrimas respondi, e depois tivemos uma manhã maravilhosa de comemoração.
— a mamãe te ama, sabia?
Lacrimejei só de lembrar de todas as suas fases, e de como essa princesa evoluiu como vampira.
As memórias dela reaprendendo a andar, dando passo miúdos com os braços erguidos buscando por equilíbrio. Eu e Sabina, uma de cada lado da sala, instigando nossa criança a andar. E todas as comemorações dela quando via que estava conseguindo, os olinhos brilhavam em orgulho.
Os banhos indo melhorando com o passar dos dias, os choros foram se tornando menores até sumirem por completo. Sua confiança em mim me enche de alegria, ser o porto seguro de uma criança tráz tanta emoção!
Lembro de chorar quando percebi que o pudor de Sina dentro do boxe era quase nulo, e de comemorar essa vitória com champanhe e uma noite de queijos, óbvio que nada disso foi pra criança.
Família, Sina conheceu a minha e virou parte dela no mesmo dia. Ela ama os avós, só menos que as primas Marisol e Analua, que se tornaram as melhores amigas dela. Hoje é quase impossível planejar uma festa do pijama sem chamar as "gêmeas", e eu amo tudo isso. Nossos eventos sempre são uma bagunça, mas uma muito gostosa cheia de amor.
As presas marcaram uma época muito maravilhosa, que, claro, trouxe muita dor, mas junto a ela vieram experiências, conforto, evoluções, aprendizados e uma nova fase.
A fase de descontrole por sangue, de esconder quaisquer ser vivo, de prender em casa pra evitar ataques desnecessários e de uma quarentena demorada procurando por atividades pra expulsar o tédio da criança, que fora proibida de sair do lar.
As fraldas me fizeram querer dar as primeiras palmadas em Sina, mas me segurei e lidei com elas de outra forma. Compramos um banquinho e pusemos no canto da sala, toda vez que Sina tirava a fralda escondido ela ia pro cantinho e ficava lá por longos minutos. Mas nossa menina aprendeu depois de defecar no próprio colchão duas vezes, e passou a nunca mais tirar as fraldas. Ponto pras mamães!
Agora temos uma menininha que, apesar de ainda aprontar muito, está acostumada com nosso mundo e as regras que nele existem.
— céus, minha irmã. Você está tão linda — a voz de Shivani soou emocionada — não, não chore.
Ela segurou meu rosto e secou a única lágrima que escorreu.
Shiv está deslumbrante, com uma maquiagem mais simples, mas que destaca todos os seus lindos pontos.
— estou tão chorona — resmunguei abanando, com as mãos, meus olhos úmidos.
— é normal! Está se casando — ela pegou minhas mãos e as beijou.
— viu Sina? — perguntei, tentando distrair minha mente com outra coisa.
— ela está uma princesa — ela sorriu orgulhosa.
— não está? Depois que eu a vi tive que pedir pra retocarem minha maquiagem.
— a coroa foi ideia de quem? — minha irmã brincou.
— dela mesma — respondi sorrindo — disse que só iria ajudar a mom dela com a roupa se pudesse usar uma coroa de princesa.
— ela é demais. Mas enfim, só vim pra dizer que tenho muito orgulho de ti, e que estarei torcendo pra que tudo dê certo.
— não! Se continuar eu vou voltar a chorar — neguei e Shivani riu, me chamando de boba.
— mamãe! Vamos logo, eu quero comer docinho — Sina apareceu no quarto com uma mamadeira cheia em mãos.
— docinho?
— prometi que ela poderia comer um, mas não passará disso, ok? — comecei respondendo minha irmã, depois parti pra criança — e quem te deixou sozinha com uma mamadeira cheia de sangue?
Com muita paciência conseguimos resignificar o objeto plástico, e hoje ele é de grande ajuda em nossas rotinas conturbadas.
— o vovô me deu pra eu tomar — ela explicou.
— não sozinha, meu amor. Seu vestido é branquinho, não pode manchar.
— eu cuido disso, vá por seu véu que nós duas estaremos te esperando aqui.
Minha irmã foi se sentar na cama e minha filha foi pro colo da tia pra tomar o sangue com toda a paciência do mundo. Eu ainda observei aquele momento incrível antes de ir colocar o véu com os profissionais.
Que sou sortuda eu descobri nos últimos meses, mas chega a ser estranho ser merecedora de uma mulher tão maravilhosa e tão digna.
Sabina me conquistou com sua proteção ávida, com seus diálogos emocionantes, com sua lasanha maravilhosa, com sua força e com seu carinho. Coisas contrárias aos meus pensamentos de primeira impressão quando a porta de sua, agora nossa, casa foi aberta, me revelando sua imagem fria e imponente.
Aquele sorrisinho de boas vindas me instigou, e agora estamos aqui, trocando alianças lindas em um altar.
No passado trocávamos mensagens, muitas delas, até que a revi. O momento não era maravilhoso, pois Sina estava passando mal de tanta dor, mas ainda sim a mulher deu um jeito de se aproximar de mim.
Eu a reprimi, lembro de fazer isso, e hoje sei que aquela repreensão não valeu de nada, a mulher conseguiu o que queria. Agora, me beijando não somente na frente de nossa filha, mas também de toda a minha família, que passou a também pertencer a ela.
Todas as crises de Sina serviram pra me mostrar que meu papel era estar ali, do lado daquela mulher perdida, que muita das vezes peguei chorando por não saber o que fazer. Quantas vezes não nos desesperamos juntas por algo tão bobo? Como, por exemplo, quando nossa Maria bateu a cabecinha ao cair, em uma tentativa falha de correr. Ser mãe no fundo é isso, mas é um isso que eu amo.
— eu te amo — sussurei em seu ouvido.
— eu te amo muito mais — ela me provocou, e voltou a me beijar.
— ei — ouvi e senti a barra do meu vestido sendo puxada.
Nossos convidados riram, e Sabina sorriu pegando a pequena ciumenta no colo. Nós duas beijamos suas bochechas conjuntamente, e a criança riu amando a atenção.
— mamãe, tem batom vermelho na sua boca — Sina zoou a mãe, que tentou se limpar.
— zoando a mamãe, sua sapeca? — perguntei — vou deixar várias marcas é na senhorita.
Ela gritou animada e foi pro chão tentar fugir. No meio da bagunça minhas sobrinhas se levantaram e foram atrás da loira.
— cuidado, meninas — Sabina tentou falar, mas as três miúdas já estavam longe.
— eu vou atrás delas — meu pai se levantou.
Antes dele sair de perto eu pude ver seus olhos cheios de lágrimas, e fiz biquinho encarando minha mãe.
— ele está sensível — ela respondeu e todos voltaram a rir.
— bom! Só vou me trocar, mas fiquem a vontade.
— com isso ela quis dizer, comam a vontade — Sabina traduziu.
Minha esposa me ajudou a chegar no quarto, pois o longo vestido vermelho tornava andar no gramado uma missão quase impossível.
— quer ajuda pra tirar ele também?
— não me atice agora! Pretendo guardar energias para nossa lua mel — falei e ouvi a mulher rir.
Trocamos nossas roupas formais por outras arrumadas, porém confortáveis. Só não abandonei meu salto preto, ele combina com o novo vestido e deixa minhas pernas muito bonitas.
Foi difícil recusar todas as bebidas alcoólicas que me ofereceram, mas além de recém casada sou mãe, e tenho uma criança pra amamentar.
— que meninas mais dançarinas! — comentei vendo as três na pista de dança.
— quanto que tá o show? — Sabina perguntou.
— assim ó — Lua ergueu a mãozinha com os cinco dedos levantados.
— cinco reais? — perguntei.
— cinco mil! — Sol explicou.
— que show caro.
— e eu sou a acessora tá, você que se vire pra pagar — minha cunhada disse.
— acho que vou ficar devendo — Sabina disse e eu ri.
— vai dar calote em três crianças inocentes?
— moooooom, não pode!
— se fosse mais barato eu pagava, tá caro demais — ela se abaixou.
— a gente pode negociar — Sina cruzou os braços, toda séria.
— qual sua proposta? — Hidalgo perguntou.
— cinco reais e mais um docinho. Pra cada!
— nem pensar — neguei, me envolvendo na negociação — nosso combinando foi um só e você já comeu.
— mas eu não sou sua filha agora, eu sou a dançarina — ela explicou.
— a gente também! — as gêmeas falaram em uníssono.
— não senhoras — neguei — vão brincar e esqueçam isso.
— eu vou pedir pra vovó! — minha filha disse ficando emburrada.
— Sina Sina — chamei sua atenção.
— se por qualquer coisa na boca a gente vai pro quarto e tu apanha — Sabina disse simples, bem baixinho, só pra mim e pra criança.
— manhêeee.
Peguei-a no colo e vi Maria levantar, chegando pertinho pra sussurrar novamente.
— se fizer birra já sabe né?
A menina ficou quietinha no meu colo, mas logo esqueceu o episódio e foi brincar com as primas.
— que mamãe má — abracei seu pescoço, erguendo o rosto, e senti ela beijar meu queixo.
— antes ser má aqui do que no hospital — ela brincou e eu ri concordando.
Fiz carinho nos fios loiros da criança que deitou preguiçosamente em minhas pernas, após recusar o fazer em duas cadeiras juntas.
As horas animadas de brincadeira e correria acabaram com nossa miúda, que faltou chorar de tanto sono.
A prima Marisol está igual no colo da mamãe Jô, mas Lua brinca com o avô pelo espaço.
— acho que nunca vi os pés dessa criança tão pretos — Sabina disse, voltando pra perto com a mochila infantil no ombro.
— ela foi quem mais aproveitou, está pulando desde que acordou.
— eu vivi o sufoco que foi pra parar quieta o vestir o vestido — ela disse e se sentou do meu lado.
— devíamos ter feito ela gastar energia ontem. Assim teríamos pelo menos um começo de noite tranquila.
— faz parte — Sabina sorriu e abriu a mochila.
Primeiro tirou dali uma fralda limpa, e logo depois o pacote de lenço umedecido. Por fim o trocador portátil, que arrumou, estrategicamente, em cima de uma cadeira qualquer.
Tirar a miúda manhosa do meu colo foi difícil, mas no fim venci o desafio e fiquei ali garantindo que ela não cairia. Deixando pra Sabina a parte chata de tirar a fralda suja, limpar toda a pele, e depois vestir a fralda limpa.
— tem o vestido que pediu pra eu por aqui também, quer trocar?
— pode ser, assim ela dorme mais confortável. Esse vestido é tão rodado que não sei como essa miúda conseguiu brincar tanto, achei que ela fosse pedir pra trocar logo no início da festa.
Esperei lágrimas, choros, e abraços apertados, mas ganhei um tchau único e um beijinho tímido na bochecha.
— só eu estive com a sensação de que seria uma despedida super movimentada? — Sabina perguntou, tirando uma mão do volante e pondo em minha coxa.
— pensei nisso agora, parece que somos substituíveis — brinquei e minha esposa riu.
— prefiro pensar que ela gostou da ideia de passar uns dias revezando entre a casa dos avós e das primas. .
— tenho é medo dessa menina sozinha com os avós.
— não pense nisso não, sua mãe prometeu que não faria nada.
Então partimos em direção ao aeroporto, rumo ao país que escolhemos pra passarmos nossas semanas em lua de mel.
■> Considerações finais
Não é que aconteceu o casório?
Deixo pra vocês imaginarem os detalhes da festa!