17 hours (ShinKami)

By _rayhxx

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Hitoshi somente se sentia frustrado pelo pai não o deixar fazer coisas de um adolescente normal, como se ele... More

Prólogo
I
II
III
IV
V
VI
VII
IX
X
XI
XII
XIII
XIV
XV
XVI
XVII
XVIII
XIX
XX

VIII

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By _rayhxx

Sua vida parecia ainda mais sem sentido agora, como nunca jamais foi. Olhava triste para o pacote cinza e metálico em sua mão. Era relativamente pequeno, e poderia facilmente enfiar no bolso largo de sua calça social. O dia vinte e quatro de dezembro já havia sido riscado do calendário de seu quarto, e agora no dia vinte e sete, era enfim o momento que vestia uma gravata borboleta bem ajustada e destacada em vermelho, e roupas de grife o cobrindo em tons neutros de branco e preto. A energia do natal ainda enfeitava a cidade, e provavelmente iria durar até o final de ano. Conseguia ver de longe as luzes brancas e vermelhas se espalhando nas ruas decoradas de Tokyo, mas somente sentia vontade de fechar as cortinas mais uma vez.

Aquele com toda certeza era o natal mais triste de toda a sua vida.

Nevava levemente, mas ainda não chegava a cobrir as estradas nem levar à desmoronamentos. Era completamente normal. Mas claro, como sempre estaria animado com tão pouco, fazendo bonecos de neve, desenhando na areia branca e fofa e fazendo tudo que sempre desejou; mas claro que não estava nada normal. Não conseguiu pisar os pés lá fora desde a última vez que viu Hitoshi e decidiu negar o seu pedido, e provavelmente não sairia tão cedo por conta própria. Se sentia tão quebrado por dentro que não conseguia sentir alegria com nada, mesmo quando em algum momento já havia se sentido feliz apenas respirando o ar do jardim. Não sabia como ele estava, no momento não queria nem saber, se pudesse não lembraria nem ao menos seu nome.

— Denki? — uma voz doce surgiu de repente, o fazendo se ajeitar sentado na cama, escondendo o pacote atrás de si. Sua irmã o encarava com certa confusão, mas também havia um tom de preocupação na voz que lhe escapava — Você tá legal?

— Tô. — riu forçado e nervoso — Claro que tô.

— Hum. — ela desviou o olhar, já se preparando para sair. Reparou que ela usava um vestido longo e verde escuro, de um tom que se aproximava do verde floresta — O pai tá chamando a gente. Temos que ir.

Soltou um suspiro cansado, só assentindo para ela e vendo sua silhueta desaparecer, deixando a porta escancarada.

Como esperado, seu pai foi convidado para uma festa particular, que foi feita após os dias de natal, para não pegarem todo o feriado. Estava pronto justamente para isso, excepcionalmente arrumado como todo o resto de sua família, como sempre estiveram.

Se levantou com certa preguiça, percebendo que carregava em sua mão o embrulho prateado. Engoliu em seco enquanto o encarava, resolvendo, sem pensar muito, o colocar em seu bolso, como algum tipo de conforto diante do momento. Respirou fundo e trêmulo, relaxando enquanto dizia a si mesmo que seria só mais uma festa normal, com pessoas não tão normais assim, e com sua família mais bizarra do que qualquer outra coisa que já havia visto ou presenciado.

×××

O tintilar de cristais chiques ecoava por todo o enorme salão. Conversas paralelas — mas sussurrantes — também eram ouvidas, fora as risadas forçadas, claro. Denki estava na festa com a família, mas, como sempre, não conseguia se encaixar em nada. Aqueles lugares tinham determinadas regras, principalmente em uma ocasião como esta. Todos eram divididos em núcleos, que chegavam a ser pequenos ou maiores, mas sempre existiam. Tinha o dos maridos empresários, das mães de família, dos jovens que falavam sobre namorados ou namoradas, e assim se seguia. Sua família se destacava nos primeiros agrupamentos, mas nunca conseguiu encontrar alguém ali com quem pudesse conversar normalmente e por um longo tempo, já que costumavam ficar lá a noite inteira.

Todos os garotos falavam sobre as empresas de seus pais, ou como galantearão garotas que estavam bonitas e bem vestidas na festa, como se a única coisa que soubessem fazer era trabalhar e bajular mulheres sexy com fendas na coxa. Já as garotas nunca tinham algum assunto que realmente estivesse por dentro, por assim dizer; além, é claro, de não gostarem de rapazes que não flertassem com elas. Logo, não tinha ninguém para conversar ou passar o tempo. Tudo que poderia fazer era ficar na mesa com diversos aperitivos e bebidas, fora os que os garçons distribuíam pelas bandejas ao passar por todos.

Odiava aquele lugar, na verdade, só pela família estar reunida, sentia que poderia odiar tudo e qualquer coisa. Só queria ir embora o mais rápido possível. O tédio estava lhe dando sono, e a sensação de estar bocejando o tempo inteiro não era nada legal. Nenhum de seus amigos estavam on-line, e o Instagram chegava a ser chato de tanto que já o catucou.

Olhou em volta com uma expressão emburrada, tentando achar alguma coisa que lhe fizesse simplesmente fazer qualquer coisa. Observou então uma arcada que levava ao que parecia uma varanda. Pensou que ao menos poderia assistir o movimento fora dali, ou então observar as estrelas por tempo indeterminado. Era a única coisa que havia para fazer, afinal.

Passou discretamente por todos e ficou feliz ao ver que ninguém mais ocupava aquele espaço. Pelo menos não teria de ficar constrangido ao lado de um desconhecido. Mesmo querendo fechar as portas de vidro para ficar totalmente sozinho, não poderia o fazer, então só se jogou sobre a bancada da varanda, quase abraçando o parapeito enquanto escorregava para a frente, observando o jardim da mulher que morava ali. Era bonito, não tão colorido por flores diversificadas, mas com algo além de verde escuro que mais parecia preto sobre a escuridão da noite. Pontos vermelhos se destacavam, e também outros roxos e brancos. Eram rosas e orquídeas. Eram lindas de cima, imagina se estivesse de frente à elas...

Mas outra cor em particular lhe chamou mais a atenção, e prendeu seus olhos nela por vários minutos, enquanto pensava. Seu cabelo batia no rosto, mas nem assim fechava os olhos, encarando um amontoado de girassóis que percebeu quase virarem um tom de mostarda sobre quase nenhuma luz fora a
dos postes e os raios que saiam das janelas da casa.

As minhas flores favoritas são girassóis.

Franziu o cenho quando a frase de Hitoshi de repente apareceu em sua cabeça, e a mão foi automaticamente para o bolso da calça, pegando o embrulho que estava ali. Analisou o prateado metálico refletindo as luzes da festa.

Era o presente que daria para Shinsou de Natal.

Seu rosto se formou uma careta, pensando que já era tarde demais para entregar isso para ele, já que provavelmente havia estragado seu Natal e também já havia passado a data comemorativa. Provavelmente o arroxeado nunca mais iria querer olhar na sua cara... Sua única alternativa foi puxar o celular do bolso, indo para o Instagram e vendo que ele havia postado alguma coisa nos stories. Clicou sem tanta vontade, mas seus olhos encheram de água assim que viu ele tirar uma foto humorista de um aeroporto.

Já era. Hitoshi já estava indo para Kyoto, e nem ao menos conseguiu se despedir dele.

Abaixou o celular com a boca escancarada, uma expressão desolada, que não mostrava nem metade do que sentia por dentro naquele instante. Queria que o tempo acelerasse, até o dia em que Shinsou terminasse a faculdade e voltasse para Tokyo. Queria ele de volta, mais do que tudo.

— O que você está fazendo?

Seus olhos se arregalaram, ainda meio úmidos com um sinal de que provavelmente choraria. Se virou para a voz alheia, e foi pego no flagra pela — segunda — pior pessoa possível. Kiyoko estava com uma expressão dura, como sempre. As mãos viradas para a frente, de uma maneira formal, assim como o penteado em coque.

— Mãe... — sussurrou, escondendo o embrulho novamente no bolso, a vendo o encarar com as sobrancelhas arqueadas

— O que está fazendo aqui fora? — ela repetiu a pergunta, lhe fazendo desviar o olhar

— Ah, eu só tava olhando o jardim. — disse com um meio sorriso nervoso, vendo a mulher se aproximar

Ela ficou em silêncio, parando ao seu lado, em nenhum momento desde então lhe encarando. Parecia ocupada demais prestando atenção ao exterior. Suspirou, meio incomodado por ela estar ainda ao seu lado. Sua presença lhe assustava de uma forma que não sabia explicar. Não era como seu pai, mas chegava a ser tão rígida quanto, sempre exigindo o melhor. Nunca se lembrou de algum abraço, ou algum "eu te amo" saindo de sua boca. Era uma mulher de pedra, fria como gelo ardente, que queimava quando encostava nele por muito tempo.

— Por que está assim? — ela perguntou baixo, deixando Denki sem entender

— Perdão?

— Você está fazendo uma cara desagradável. — ela reparou, fazendo o Kaminari mais novo virar o rosto para o outro lado — O que houve?

— ...Aconteceram umas coisas. — disse, sem saber se era isso que ela queria que lhe falasse — Eu já resolvi tudo, mas... Ainda me sinto triste por isso.

Ela não mudou a expressão congelada, mas o loiro pôde perceber seu peito subir e descer devagar, como se respirasse fundo. Imaginou se sua fala havia a irritado ou desagradado, coisa que se confirmou quando ela abriu a boca.

— Está sendo medíocre. — quis revirar os olhos, mas se manteve quieto e imóvel, esperando o resto de suas palavras — Você não resolveu tudo, não se ainda está assim. Invés de ficar deprimido desta maneira, deveria erguer a cabeça e fazer jus ao seu sobrenome. Os Kaminari sempre fazem de tudo para conseguir o que querem, então aprenda logo a ser como um e resolva isso de uma vez.

Franziu o cenho e a encarou por alguns segundos. Suas palavras não o machucaram ou nada do tipo, não como achou que fariam. De certa forma, o impactaram. Ela estava certa; como poderia dizer que estava tudo esclarecido se nem ao menos se sentia bem com isso? Se nenhum dos dois se sentia? Talvez estivesse só sendo medroso, e aceitado tudo do jeito que está, ruim para ambos os lados.

Deveria ao menos se despedir dele. E foi com essa pretensão que se aproximou da mãe e deu-lhe um rápido abraço, ganhando um arfar assustado da mesma. Ela não reagiu, e quando a soltou estava com uma expressão pior que antes. Riu solto, e saiu da varanda, não sendo impedido. Sabia que, apesar de todo o jeito rígido e sem carinho que ela tinha, Kiyoko ainda tentava o mínimo pelos filhos, ainda que não demonstrasse.

Voou pelo salão, tentando não atrair tanta atenção. Olhou para os lados em busca de seu pai, e mordeu os lábios quando o viu do outro lado do salão, sentado em uma cadeira com outros senhores. Ficou o mais longe possível, passando pelas pessoas o mais rápido e ágil que podia, ainda tentando se esconder ao máximo. Sorriu enquanto chegava à porta, e passava discretamente entre a brecha aberta para quem chegava e saía.

Sempre foi tão fácil, mas sempre teve tanto medo de ser pego, que nunca ousou chegar perto da madeira gigante sem seus pais. Riu enquanto pensava naquilo, agora saindo do jardim com um grande sorriso no rosto. Ainda parou por um instante, ao lado dos girassóis que havia visto, escuros por conta da falta de luminosidade. Sorriu para eles, pegando o celular enquanto caminhava para fora dali mais uma vez. Passou a mão pelo bolso da calça, se certificando de que o presente ainda estava ali, abrindo o stories de Hitoshi de novo, vendo que o aeroporto onde ele estava ficava meio longe.

Deu um longo suspiro, sabendo que teria de caminhar alguns quilômetros.

×××

Hitoshi estava impaciente de esperar, mas sabia que precisava fazer aquilo, ficar parado por horas esperando seu vôo aparecer. Por sorte, havia trazido alguns livros consigo, e lia um parado, imóvel à minutos, ainda atento a cada avião que saia ou chegava.

— Sabe que avisarão quando seu vôo estiver pronto, não é? — Shota perguntou ao seu lado, mexendo no celular despreocupado, percebendo o filho olhar para outro pássaro gigante de metal

— Eu sei. — suspirou, se esticando sobre o assento, marcando a página e fechando o livro — Por que temos que vir tão cedo mesmo?

— Para nos certificarmos que você não perderá seu vôo.

— É claro que eu não vou perder o meu vôo, aviões só atrasam, não adiantam.

Shota suspirou, virando o rosto para encarar o emburrado do filho, que como sempre, não parecia nada contente fazia dias. Nem mesmo no natal ele ficou muito feliz, não como ficava normalmente. Não havia conversado com ele pois achava que provavelmente não iria lhe dar atenção, ou que era só mais um assunto bobo que logo se resolveria. Provavelmente estava enganado.

— O que aconteceu, Hitoshi? — ele pareceu confuso

— Quê?

— O que houve para você ficar assim, de mal humor? Eu sei que você é normalmente fechado, mas está bastante estressado esses dias.

Hitoshi desviou o olhar, apertando o cenho ainda mais.

— Aconteceram umas coisas, só. E eu estou... Meio triste com isso. — revelou, com poucas palavras, acenando negativamente em seguida — Mas não se preocupe, logo passa.

Aizawa sentia que ele provavelmente estava mentindo, ou enrolando. Mas também resolveu não o forçar a nada, seu filho já era grandinho, poderia resolver os próprios problemas sozinho. Se ele precisasse de alguma ajuda, sabia que o procuraria. Esperava que ao menos ele pudesse ficar bem o bastante para se cuidar. Morar sozinho pela primeira vez não era nada fácil, mas sempre estaria disposta a atender suas ligações para quando ele precisasse de algum conselho ou ajuda. Ainda assim, sabia que Shinsou se viraria bem, afinal, sempre o preparou para isso, para não ter problema quando crescesse.

Depois de mais longos minutos, com os dois em silêncio, esperando, um sinal tocou e uma voz robótica começou a ecoar dos auto-falantes. Era o vôo do arroxeado, finalmente. Percebeu ele ficar tenso e apressado enquanto ficava na fila do portal de embarque, com o moreno se despedindo dele antes de entrar no avião.

— Ligue quando chegar e caso precise de qualquer ajuda, tudo bem? — perguntou, ganhando um aceno positivo dele. Segurou seu rosto com as duas mãos e sorriu, repuxando os fios da barba — Eu te amo, filho. Se cuida enquanto estiver lá, certo?

O menor sorriu e concordou, ganhando um beijo na testa de seu pai, que lhe deu cócegas pela barba. Se despediu dele e internamente de outra pessoa, suspirou enquanto entrava e era atendido pelas aero-moças para achar seu assento.

Shota ficou para trás, observando tudo através das paredes de vidro, feliz por ver seu filho agir e seguir a vida como qualquer adulto, mas triste por vê-lo partir para tão longe, sem data para voltar. Sorriu por longos minutos, até ouvir passos apressados ao seu lado e virar o rosto para ver o que acontecia.

Um garoto jovem parou a alguns metros de distância, se aproximando do vidro e em seguida olhando para toda a sala, como se estivesse procurando alguém. Pareceu chateado, então, provavelmente não o havia encontrado. Ficou com uma expressão cabisbaixa, e olhou novamente para o vidro.

Por um momento ficou com pena, e resolveu se aproximar cautelosamente, ganhando a sua atenção quando já estava perto o suficiente.

— Está perdido? — perguntou do nada, o vendo engolir em seco e logo negar com a cabeça

— Não, eu só... Estava procurando alguém. — ele ergueu os olhos. Eram grandes e dourados — O senhor sabe se algum vôo para Kyoto já saiu?

Ficou incomodado por ser chamado de 'senhor', mesmo que fosse acostumado de certa forma por conta da escola. Realmente estava ficando velho.

— Sim. — concordou — Já se foi, quase agora.

— Ah... — ele pareceu mais triste do que antes, mas ainda assim sorriu pequeno, como forma de gratidão — Obrigada, senhor.

— Quem estava procurando? — acabou perguntando mais por curiosidade do que para ajudar, o vendo desviar o olhar

— Era... Um amigo bem próximo. — sorriu mais, fazendo as bochechas de ergueram — Ele viajou agora, e não tive tempo de me despedir dele.

— Entendo. — disse, engolindo em seco — Bem, de qualquer jeito, desculpe não conseguir ajudar.

— Ah, não. — ele riu, erguendo as mãos — O senhor me ajudou muito.  Mas bem, eu tenho que ir agora. Muito obrigado.

Somente mexeu a cabeça, e vendo sorrir uma última vez, mas franzindo o cenho ao ver seus olhos úmidos antes do garoto se virar para sair.

Pobre criança, pensou.

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