Amendoins, trovões, ovelhas e...

By SallyEsqueleto

1.1K 86 106

Esta é uma pequena coletânea de pequenos contos sobre Anya Forger, sua família e amigos. Alguns escondem uma... More

Capítulo 1 - O Diário de Damian Desmond
Capítulo 2 - O desejo de um espião
Capítulo 3 - Amor e Preconceito
Capítulo 5 - Eu te guardo no meu coração e você me guarda no seu
Capítulo 6 - Obcecados
Capítulo 7 - Bond e o tempo
Capítulo 8 - A Quimera, o Grifo e os passarinhos

Capítulo 4 - A Primeira Má

126 12 8
By SallyEsqueleto

Um par de mãos. Isso é tudo o que Anya se lembra.

Ou pelo menos é tudo o que ela quer se lembrar.


Flashes.


Como ela os odiava.

Ela conseguia evitá-los na maior parte do tempo, mas não quando algo – gatilhos –, desencadeavam aqueles flashes. Ela os evitava lendo a mente das outras pessoas quando estava acordada, se envolvendo nos segredos dos outros para esquecê-los, mas nada os impedia quando estava dormindo.

Como agora, por exemplo.

Anya estava deitada em sua cama, abraçada ao Sr. Quimera e Bond estava dormindo no tapete ao lado de sua cama. Era um sono inquieto, ela se remexia de um lado para o outro e o cobertor pendia para o chão. Ela murmurava coisas para pessoas invisíveis e agarrava o ar. Sua testa brilhava com suor e seu semblante era aflito.

Em seu sonho, ela estava novamente naquele lugar assustador. As pessoas não a chamavam pelo nome, os cientistas só se referiam a ela como "Cobaia 007". Não havia privacidade em seu "quarto", pois era monitorado por câmeras.

— Cobaia 007, é hora de estudar. – disse a voz ríspida de um dos homens que acompanhavam seu progresso.

— Anya não quer. – ela já podia sentir um bolo se formando na garganta de um jeito doloroso, ela sabia o que ele diria a seguir.

— Se não for agora, vai ficar sem jantar. – disse o homem cujo o rosto ela não conseguia mais se lembrar com clareza.

Ela chorava infeliz no sonho e lágrimas de verdade corriam em seu rosto.

Mas havia alguém ali que estava disposta a ajudar a pequena Anya. Ela não sabia seu nome, e de qualquer modo aquele não era mesmo seu nome verdadeiro, tampouco podia se lembrar de seu codinome. Mas lembrava com toda certeza que ela era... uma espiã!

Ela se lembrava de que aquela mulher lhe estendera as mãos para lhe passar algum conforto. Lembrava de ter lido na mente dela que sua missão ali era ajudá-la. Ela sabia que Anya lia mentes, então tomava um cuidado especial no que pensava quando estava próxima da menina.

Fora ela quem lhe dera o Sr. Quimera, quem lhe incentiva que estudasse para que não fosse punida. Fora ela quem bolara um plano para que ambas escapassem e para acabar com o projeto ilegal desenvolvido naquele laboratório subterrâneo e vil.

Anya estava assustada, ela era carregada no colo pela espiã, alarmes ecoavam tão forte nos corredores que somados a penumbra e as luzes vermelhas piscantes davam dor de cabeça e a deixavam desnorteada e com mais vontade chorar e tapar os ouvidos era inútil.

Fora naquele momento que ela leu a mente da mulher, quando por um instante ela baixara a guarda, vendo lembranças desagradáveis que passavam repetidamente na mente dela.

"O projeto está sendo cancelado". Ela vira o cientista chefe dar o anuncio a membros restritos da equipe. "A ordem é que todas as pesquisas sejam enviadas a... E tudo o que houver restado das experiências, mas eu me recuso a perder o trabalho da minha vida. Um investimento desses em humanos é caríssimo e, apesar da Cobaia 007 ainda apresentar falhas como o eclipse de suas habilidades na lua nova, a criança é o nosso melhor resultado depois de seis fracassos absolutos anteriores. Enviem os resultados falhos das pesquisas, guardem os resultados positivos do laboratório em... Destruam o resto das evidências e aprontem a cobaia, ela virá comigo. Nos reuniremos em dois dias no novo esconderijo".

Anya não estava desesperada até aquele momento, mas lá no fundo, ela já sabia o que tudo aquilo significava. Ela se agarrou com força ao Sr. Quimera e na blusa da mulher e escondeu seu rostinho ali. A mulher ofegava e estava suada, seu peito subia e descia muito rápido sem conseguir respirar direito. Se Anya ficasse ali seria levada pelos caras maus para continuar servindo de testes e ficar sem janta. Ou pior.

Morreria.

Como as outras seis cobaias anteriores.

A espiã havia mudado de planos, causara uma confusão, destruíra tudo o que pudera das pesquisas e agora estava retirando Anya dali sobre uma saraivada de balas, correndo antes que as portas automáticas de segurança máxima dos corredores se fechassem, liberando pequenos detonadores pelo caminho para garantir a elas alguma vantagem sobre os inimigos. Os detonadores faziam BUM! E emitiam muita luz e calor, deixando um cheiro estranho e queimado no ar que irritava o nariz.

Depois de muito correr, elas passaram pela última porta e o ar frio da noite atingiu Anya em cheio, trazendo algum alívio para o calor e para o medo. O cabelo castanho da mulher se soltara do penteado e escondia o rosto da menina. O vento carregava o cheiro de abetos e pinheiros por entre o cabelo dela, e Anya sentia um calor anormal na panturrilha direita, que estava dando a volta no tronco da mulher, que continuou correndo até ter uma certa distância do laboratório, na segurança da escuridão das árvores na orla da floresta.

A espiã estava cansada demais e acabou caindo de joelhos no chão. Tentando manter a voz firme:

— Anya... – disse ela, colocando a menina no chão. – Você é uma menina muito inteligente e preciso que você preste muita atenção em tudo o que eu disser. Siga essa trilha na floresta e não saia dela até encontrar um riacho. Quero que entre nele quando o encontrar, não fique com medo, ele é bem raso. Suba o rio, até achar uma das margens que tem o caminho de pedra. Continue nesse caminho até as pedras acabarem e então siga escondida pelas árvores e vai chegar em uma cidade. Peça ajuda da polícia, diga que mora na cidade vizinha e que se perdeu de seus pais.

— Você não vai com a Anya? – ela estava com medo e ficou ainda mais apreensiva pela falta de respostas. – Ma?

A mulher ficou em silêncio e as lágrimas dela caíram sobre o rosto da menina.

— Fuja na primeira oportunidade, Anya. – disse ela com a voz trêmula – Continue fugindo, invente histórias até estar em um lugar seguro. Você vai ser adotada por uma família e vai encontrar uma ma e um pa de verdade que te amem.

— Mas os caras maus...

— Nunca se esqueça: você não pode contar sobre os seus poderes para ninguém. Nunca. – ela abraçou a menina e lhe deu um beijo na testa. – Não tenha medo, Anya. Você tem que ir agora. – disse ela, com emoções de verdade na voz pela primeira vez desde que a conhecera, empurrando Anya na direção da trilha. – Eu cuido deles.

Anya olhou para trás ao ouvir aquilo, o que foi um erro. A espiã estava ferida no lado esquerdo acima do quadril e seu jaleco branco tinha uma mancha horrível e escura. Ela havia puxado uma arma com silenciador e atirava para algum lugar que Anya não quis olhar, na mão esquerda ela tinha um controle.

Anya correu ao reconhecer que era o controle de uma bomba. As árvores faziam um barulho assustador quando o vento batia nelas, mas Anya foi corajosa e agarrou com firmeza o Sr. Quimera. Em poucos minutos, ela ouviu um estrondo e uma explosão de fogo muito alta, a fez gritar de medo, tapando uma orelha com a mão e a outra com a pelúcia.

Corvos e outras aves voaram assustadas de seus ninhos, grasnando e fazendo uma cacofonia, fugindo para longe na mesma velocidade que as lebres selvagens e cervos. Anya chorava, mas correu como os animais até encontrar o rio. A lua era cheia e a ajudava a enxergar, o rio era raso e cheio de pedrinhas redondas no fundo que a faziam escorregar. Mais de uma vez ela caiu e a correnteza levara o Sr. Quimera, a fazendo correr até ele com medo de que o perdesse. Anya ainda soluçava por causa do choro e do medo, e ficou assustada quando percebeu que o frio da água era amenizado pelo calor da explosão.

Ela percebeu que se aproximava do laboratório em chamas dando a volta na colina e seus nervos gritavam para que ela fosse pelo caminho contrário, descendo o rio. Mas ao olhar para o Sr. Quimera, ela se lembrou da espiã. A ma fizera de tudo para mantê-la segura, inclusive ficar para trás e acabar com os caras maus. De alguma forma, ela sabia que nunca mais a veria e que estava sozinha agora. Ela havia lhe dado uma oportunidade de sobreviver e instruções, ela deveria segui-las.

Apesar de cansada e com frio da cintura para baixo, somado com o peso da subida e da água, Anya seguiu rio acima, carregando o Sr. Quimera como a espiã a havia carregado. Depois de um bom tempo, ela achou a margem de pedra e apesar de querer se esconder em um arbusto e dormir, ela continuou andando.

Apesar de exausta, ela continuou em frente para que ela e o Sr. Quimera pudessem continuar vivendo.

☙―――☙˚º˚❧―――❧

Dias se passaram, assim como algumas cidades que ficaram para trás e Anya aprendeu coisas úteis de verdade ao invés de linguagem clássica. Ela aprendeu que falar de maneira tão antiquada chamava atenção, então ela se esforçou para aprender como os outros falavam. Ela andou com um bando de crianças de rua por um tempo, aprendeu alguma coisa sobre furto, como fazer carinha fofa para conseguir comida, a identificar caras maus e foi quando estava prestes a se separar deles que um de seus companheiros fez uma observação interessante: as pessoas pareciam lixo quando vistas de algum lugar alto.

Anya sempre ia embora quando alguém começava a achá-la estranha, por medo de que descobrissem sobre seus poderes, então ela e o Sr. Quimera continuaram sua jornada juntos, até que se esquecesse de seu passado, até que odiasse estudar mais do que de costume e a não parecer muito esperta, sendo sua única lembrança o constante conselho do Sr. Quimera: nunca contar para ninguém sobre os seus poderes.

Nem para o pa e nem para a ma, que dormiam tranquilamente em seus quartos sem suspeitar de nada.


-----------------------------------------------------------

N. A.

Muitos anos depois, em algum momento do futuro, Anya descobriria que se tivesse descido o rio, teria chegado até Westalis e que seu sotaque e conhecimentos teriam chamado a atenção indesejada de autoridades. Ela observaria também como a espiã fora esperta ao mandá-la entrar no rio, pois os cães farejadores que cientistas e policiais certamente usaram não puderam seguir seu rastro, e que, embora tivessem procurado por ela rio acima, ela não deixara pegadas ao andar sobre as pedras por uma boa parte do caminho. Ela perceberia também que sacrifício que sua primeira ma fizera por ela ao detonar as bombas e um dia, ela própria se tornaria Quimera.

Continue Reading

You'll Also Like

6.7K 904 18
A vida não é um conto de fadas, e Louis sabe bem disso. Esperar que um príncipe encantado fosse salva-lo não era uma opção, porém tudo muda quando o...
1.3K 160 7
Em um mundo onde todos os mitos são reais, não seria diferente no Brasil. Os semideuses Brasileiros possuem um local seguro onde são livres das ameaç...
7.7K 297 12
Power Puff Girls cresceram e são adolescentes , agora para além de lidar com os vilões também têm de lidar com os problemas de todos os adolescentes...
828K 55.8K 63
Calíope, uma jovem italiana determinada a realizar seu sonho de viver em Nova York, é enviada para um intercâmbio na casa dos Smith, uma das famílias...