– Louis, sua panela está pegando fogo! - Liam exclamou, fazendo com que Tomlinson tirasse sua atenção da porta por onde Harry havia acabado de sair e desligasse com pressa a boca onde, segundos antes, uma carne estava sendo flambada de modo completamente acidental e desnecessário.
– Merda - ele murmurou, se preparando para começar tudo de novo.
Sua noite estava sendo caótica e era tudo culpa dos seus instintos protetores, que afloravam de forma exagerada quando algo parecia fora de lugar com seu namorado. Era o caso atual, já que Styles tinha voltado calado do seu primeiro dia de aula na faculdade e não parecia disposto a falar sobre o problema.
Uma semana antes, quando os dois foram juntos até uma papelaria e gastaram uma pequena fortuna em materiais escolares, tudo parecia bem. O cacheado insistiu que só precisava de um caderno e algumas canetas, mas o outro conseguia enxergar o brilho nos olhos verdes enquanto eles paravam em todo tipo de coisa, desde lápis decorados até uma mochila fofa com estampa de gatinhos. No fim das contas, levou um pouco de tudo e não aceitou protestos sobre isso.
As coisas ainda estavam bem quando, naquela manhã, o mais velho estacionou seu carro na porta da universidade que Harry frequentaria e lhe deu um beijo de boa sorte. É claro que o cacheado estava um pouco nervoso, seria sua primeira experiência com ensino superior e uma chance que nunca achou que teria quando ainda vagava sem rumo pelas ruas de Londres, lutando para sobreviver um dia de cada vez, mas sua empolgação era grande o suficiente para sobrepor a ansiedade que era de praxe para aquele momento.
Foi por isso, pela alegria pura que viu na expressão do namorado mais cedo, que Louis não entendeu o desânimo que a tinha tomado quando se encontraram novamente, no começo do turno do mais novo. Ele fez perguntas, é claro, mas não conseguiu nada além de respostas vagas e mentirosas como "é impressão sua" ou "está tudo ótimo".
Gostaria de ter insistido, investigado um pouco mais, mas ainda tinha um restaurante para comandar e, por isso, resolveu retomar o assunto mais tarde, quando os dois estivessem livres de suas obrigações. O seu cérebro não pareceu ter entendido o recado, no entanto, já que se manteve naquela discussão enquanto deveria estar prestando atenção nas facas e panelas à sua frente. No fim das contas, foi um milagre que o lugar ainda estivesse de pé quando os clientes da última mesa saíram pela porta da frente.
Frustrado, Tomlinson arrancou a dolma que usava - suja por causa de um descuido com molho mais cedo - e esperou batendo os pés até que Harry o encontrou no estacionamento, como fazia depois de todos os serviços. Sem dizer uma palavra, abriu a porta do carona para que Styles entrasse no carro e depois deu a volta para fazer o mesmo, tentando descobrir a melhor forma de acabar com a tensão que preenchia o veículo enquanto ligava o motor e o tirava da sua vaga de costume.
Dirigiu no modo automático, se dando conta de para onde ia só quando pegou uma saída familiar. O mais novo, que continuava perdido em seus próprios pensamentos, também notou a mudança de planos e aprofundou o seu cenho já franzido.
– Onde vamos? - perguntou confuso, mesmo que suspeitasse da resposta - Louis, eu tenho aula cedinho amanhã.
– Vai ser rápido - garantiu, tirando os olhos da via para encarar o namorado por alguns segundos e levando uma das mãos até a sua coxa, onde deixou um aperto reconfortante - Por favor.
– Tudo bem... - suspirou e fechou os olhos, relaxando com aquele pequeno contato.
Vinte minutos depois, estavam no mirante que havia se tornado especial para seu relacionamento, sentados lado a lado em cima do capô e olhando de cima para a cidade, que sempre parecia menos intimidante daquele ângulo. Tomlinson - que tinha aprendido a ter um cobertor no carro para momentos como aquele - os aconchegou com a ajuda do tecido e esperou, sempre paciente e disposto a seguir o ritmo do mais novo.
– Não foi tudo bem - Harry disse finalmente, quebrando o que já eram alguns minutos de quietude - Hoje, na faculdade, não foi tudo bem.
– Você quer falar sobre? - propôs enquanto o trazia para mais perto, querendo mais que tudo resolver qualquer que fosse o problema enfrentado pelo seu garoto.
– Eu estava animado quando cheguei, procurei pela sala da minha primeira aula e me sentei em uma das primeiras cadeiras - contou em voz baixa, mas audível graças ao ambiente pacífico em que se encontravam - Isso até que o professor abriu a boca e começou a falar em grego.
– Oi? - murmurou em dúvida.
– E sabe a pior parte? - continuou com seu raciocínio - É que todos pareciam entender aquele idioma. Bom, menos eu.
– Meu amor, eu não estou...
– Foi uma péssima ideia, Lou - deu de ombros, soando quase derrotado - Meus colegas são mais inteligentes que eu, eles tiveram aulas em boas escolas e conseguem acompanhar o que está sendo ensinado. Eu não chego nem perto, é humilhante.
O constrangimento na voz de Harry fez com que o coração de Louis diminuísse de tamanho da mesma forma que uma esponja faz quando está seca. Para o chef, o rapaz ao seu lado era o mais brilhante do mundo e não ser capaz de fazê-lo acreditar nisso trazia consigo um sentimento de impotência que o imobilizou, ainda que apenas por alguns segundos.
Apesar disso, sabia que não era a prioridade ali e, por isso, respirou fundo, pedindo aos céus por sabedoria na escolha das palavras que sairiam da sua boca nos próximos minutos.
– Cachinhos, ninguém nasce sabendo - tentou manter um tom calmante, mesmo que seu interior estivesse desmoronando - Você fez a mesma prova que todos os seus companheiros de curso fizeram e está com eles na sala de aula porque foi aprovado nela - em uma posição incrível, diga-se de passagem.
– Não é o bastante - sussurrou - Eles tem discussões sobre livros escritos por pessoas das quais nunca ouvi falar e conversam usando palavras tão difíceis que, em três ocasiões diferentes, eu precisei procurá-las no meu celular. Não sou bom o bastante para uma faculdade, Lou, vai ser melhor se eu aceitar isso.
– Quer saber um segredo? - perguntou com um sorriso travesso - Isso não importa.
– Lou... - tentou negar, mas não teve chance.
– Não, me escuta - pediu com um pouco mais de firmeza - Qual é o seu sonho? Por que escolheu esse curso?
– Quero ensinar crianças - respondeu com as bochechas coradas, pelo frio e pelo seu desejo.
– E você vai ser ótimo nisso, Harry - virou um pouco o corpo para que pudesse falar olhando nos olhos verdes que tanto amava - Quando o dia chegar e você tiver sua própria sala de aula, então os pequenos não vão estar interessados nos livros que você leu ou se usa palavras difíceis. Eles vão querer que conte histórias sobre princesas e que faça bagunça enquanto molda suas mentes infantis.
– E até lá? - insistiu - Como vou chegar nesse momento se não consigo acompanhar uma única aula na faculdade?
– Você vai estudar - disse simplesmente - Nós vamos. Você é inteligente, meu amor. Aprendeu o conteúdo para o vestibular e vai aprender o que precisar para as outras provas. Se for preciso, nós vamos ficar acordados durante a noite e ler todos esses livros chatos dos quais eu com certeza nunca ouvi falar.
– Lou, não quero te incomodar com isso - negou levemente.
– Eu não quero que você se assuste com o que eu vou dizer, mas quero um futuro do seu lado, Hazz - disse enquanto segurava seu rosto com as duas mãos - Quero uma vida feliz com você, em todas as áreas possíveis. Te ajudar a chegar no lugar dos seus sonhos não é um incômodo, é um passo em direção a tudo que eu espero viver com você.
– Jesus, eu te amo muito - riu um pouco, completamente encantado com a sorte que tinha por ter Louis ao seu lado.
Nunca foi uma pessoa de muitas expectativas, não podia se dar ao luxo de tal coisa, mas o mais velho com certeza ia além das fantasias que jamais ousou ter. Se sentia capaz de tudo com ele por perto e, se isso fosse uma ilusão, então gostaria de viver nela por todo o tempo possível.
– Eu te amo mais, cachinhos - retribuiu a declaração e acrescentou um selinho ao pacote - Te amo demais e parte do motivo é a sua mente brilhante. Confia em mim, você é capaz de mais do que pensa.
– Foi só um primeiro dia ruim? - o questionou com um pouco mais de esperança.
– Só um primeiro dia ruim - confirmou e o beijou novamente, dessa vez de forma profunda.
Não ficaram muito tempo por ali, Harry realmente tinha aula no dia seguinte, mas continuaram com o que faziam no apartamento do cacheado, que suspirou feliz ao ser embalado pelos braços do namorado e sentir todo o peso daquele dia finalmente deixar seu corpo.
Na manhã seguinte, ganhou um copo enorme de café e uma conversa motivacional - além de vários beijinhos - antes de enfrentar novamente o local que, com sorte, frequentaria pelos próximos anos.
As coisas não melhoraram magicamente, ele ainda se sentia atrasado e tinha dificuldade para acompanhar algumas das suas aulas, mas não deixou que isso o abatesse. Não passaria por aquilo sozinho e tinha ao seu lado algo melhor do que todo o conhecimento do mundo, uma pessoa que o apoiava e amava genuinamente.