Terceiro Croqui [DEGUSTAÇÃO]

By LineCunha

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Antonella Sánchez sempre colocou a carreira em primeiro lugar, mas por algum motivo misterioso sua última col... More

AVISOS E PLAYLISTS
DREAMCAST (Opcional)
EPÍGRAFE
PRÓLOGO
UNO | Fiasco
DOS | Bem-vindo, Verão
TRES | Sorte
CINCO | Feito à Mão
SEIS | Praga de Padre
SIETE | Criação do Mundo
OCHO | Sem Preço
VERITY ESPANHA | Inimigas?
NUEVE | Sonho
DIEZ | Culpa de Ibiza
ONCE | Cores
DOCE | Fênix
AVISO DE RETIRADA

CUATRO | Sex on The Beach

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By LineCunha

A N T O N E L L A

— Você vai voltar logo mesmo? — Lola, minha irmã caçula, me disse assim que liguei para ela a fim de avisar que eu já tinha chegado no hotel. — Queria passar mais tempo com você. Você não tem tido muito tempo pra gente sair e...

Meu coração derreteu um pouco.

— Juro que vai ser rápido, só preciso resolver algumas coisas, tanto que eu nem vim com a minha assistente. Podemos sair quando eu voltar, acho que consigo um fim de semana de folga. Vai ser como nos velhos tempos.

Aproximei-me da janela e olhei para o céu cinza. Ibiza tinha cerca de 40 dias de chuva ao longo do ano e, de alguma forma, eu consegui a proeza de chegar em um deles.

— Promete?

— Prometo, amorzinho. Como estão as coisas?

Senti um sorriso do outro lado da linha. Ela havia desistido de Engenharia Ambiental para entrar em Biologia. No fim das contas, ela estava mais interessada em animais do que em projetar coisas.

— Bem, acho. Só estou um pouco cansada — bocejou. — E a mãe anda meio esquisita.

Uma luzinha de alerta se acendeu no meu cérebro.

— Esquisita como? — Minha voz tranquila pouco deixou escapar o sobressalto que o meu coração deu, gelado de medo.

Ela suspirou.

— Ah, sei lá. Você a conhece.

Bem demais.

— Mas ela está bem? — perguntei para confirmar, pronta para pegar o primeiro voo para Madrid que eu visse.

— Sim, está tudo ok.

Meus ombros caíram em alívio.

— Certo — Meu notebook, já ligado em cima da cama, começou a alertar o começo de uma videochamada. Droga, eu tinha me esquecido completamente. — Linda, tenho que desligar. Tenho uma reunião agora.

— Ah — Sua voz soou um pouco desanimada. — Tudo bem. A gente se fala depois?

— Claro. Se cuida.

— Você também. Beijo, beijo.

Desliguei o celular e me sentei na cama, exausta.

Precisei de um tempo respirando antes de começar a reunião.

🍍🍍🍍

— Ella, como você está com isso tudo? — A voz rouca de Iliana me interrompeu depois do meu longo monólogo sobre como eu odiava Guillermo, a filha dele, a Medinaceli e tudo o que tinha a ver com os dois. Inclinei a cabeça, confusa.

— Hm, bem?!

Ela estreitou os olhos castanhos do jeitinho que fazia quando não acreditava nem um pouco em mim. Havia começado como uma chamada de vídeo para acertamos os detalhes do seu vestido de noiva, mas de alguma forma a minha melhor amiga desviou o foco para mim e começou a me arrancar coisas de maneira desenfreada. Eu tendia a me esquecer de como era fácil falar com Lia.

— Tem certeza? Você tem se alimentado bem, voltou a desmaiar? — O sotaque mexicano arrastou-se dentro de suas palavras. — Você tá conseguindo dormir, bebé? Eu sei que você sempre teve insônia, mas preciso saber se não tem nada fora do normal.

Dei um sorriso relaxado.

— Tudo na mais absoluta normalidade, prometo. E sem nenhum desmaio.

Ela sorriu de um jeito que não chegou aos olhos, ainda preocupada. Mondragón estava em sua casa em Los Angeles, usando seus óculos de grau e com o cabelo longo preso em um coque que deixava alguns de seus cachos grossos e escuros caírem sobre seu rosto sem maquiagem. Também podia ver que ela estava usando uma blusa de crochê colorida que obviamente havia sido feita pela sua noiva, Belladonna, que era uma idosa presa no corpo de uma patricinha de vinte e seis anos — apesar de ela dizer desde abril que tinha 27 —, obcecada por fofoca, gatos, linhas e tons pasteis.

Apesar de ter 42 anos, Iliana parecia ter menos, principalmente depois que ela voltou a atuar. Eu ainda via um pouco de peso em seus olhos castanhos — tão intensos que me deixavam um pouco inquieta — e nas expressões em seu rosto cor-de-oliva, mas era inegável o quanto ela estava feliz apesar de tudo. Sacudi os pensamentos para fora da minha cabeça antes que eu entrasse em um campo perigoso, na parte em que eu me sentia culpada por não ter sido capaz de cuidar dela como ela sempre cuidou de mim.

— Antonella, você tem certeza de que não quer vir pra cá? — Lia sugeriu. — Eu sei que L.A não é o nosso lugar preferido no mundo e que Playa del Carmen é mil vezes melhor, mas eu fico preocupada em te deixar sozinha quando você claramente não está muito bem. Tenho as gravações, mas a Bella vai ficar alguns dias por aqui e não se importaria em ter companhia pra procurar pautas com ela. Não nos vemos desde fevereiro, estou com saudade.

Eu queria dizer que preferia não atrapalhar, mas me limitei a sacudir a cabeça.

— Tenho muita coisa pra cuidar aqui, Lia, mas agradeço o convite.

Ela inclinou a cabeça.

— Eu sempre tenho tempo pra você. Você sabe disso, não sabe?

Assenti. Droga de vencedora de dois Oscars. Eu odiava como aquela peituda ecológica sabia ler as minhas expressões.

— Sei.

Ela ajeitou os óculos no rosto e respirou fundo.

— E sobre os vestidos... — começou e eu já sabia exatamente onde ela estava tentando chegar.

— Não, não. Não ouse terminar a frase.

— Antonella, você não precisa.

Fiz uma careta.

— Mas eu quero, você é a minha melhor amiga e eu adoro aquela desmiolada — brinquei. — Eu acompanhei a história de vocês inteira, eu nunca deixaria outra pessoa fazer os vestidos no meu lugar. Vocês merecem o melhor e eu sei que o melhor só vai sair se tiver nas minhas mãos.

Iliana esfregou as têmporas.

— Você é doida. Vai ser muito cansativo.

— Eu dou conta — Dei de ombros. — Me tirar isso é a mesma coisa que tirar doce de criança, tirar seus peitos da boca da Belladonna etc. Mas quem pode culpar a menina? Eu também jamais largaria seus peitos.

Ela riu.

— Idiota.

— Às suas ordens — Sorri. — Enfim, os vestidos são responsabilidade minha. Considere-os como meu presente de casamento. Se a Lynster falir, eu vou ficar pobre e não vou poder dar outra coisa pra vocês. A menos, é claro, que vocês me aceitem como oferenda na lua-de-mel. Eu faço esse sacrifício de ser jantada pelas duas, sem problemas.

— Eu não vou te comer, Antonella. Sinto muito. Se eu não comi até hoje é porque não vai mais rolar.

— Droga.

— Você supera.

Eu pensei em perguntá-la como alguém superaria nunca ser sua sobremesa. A mulher era uma das atrizes mais desejadas da indústria, pelo amor de Deus.

— E a Bella?

Lia suspirou.

— Ela também não vai te com...

Eu a interrompi.

— Não, criatura. Eu perguntei como ela tá. Você tá ficando lerda igual a ela ou já é a idade batendo?

Ela fez cara de brava.

— Vai começar?

— Já comecei.

Lia sacudiu a cabeça.

— Ela está bem pros padrões Belladonna. Meio surtada por causa do casamento, mas bem, acho que a mãe dela está pior porque está organizando. Ah, e ela amou as roupas que você mandou pras gatinhas. A Sunny ficou uma fofa e a Tequila detestou, acho que ela sentiu o seu cheiro de colonizadora.

Revirei os olhos.

— E a da Flora, serviu bem?

Iliana sorriu.

— Sim, eu te mando foto depois. A Flora está com a Belladonna em NY, não tenho tido muito tempo para dar atenção e achei melhor assim. Vou pedir pra Bella tirar.

Torcendo para que ela não percebesse que eu estava deliberadamente tentando manter o assunto nelas, continuei:

— Ela aceitou o emprego de editora-chefe?

Iliana negou.

— Ela prefere as coisas como estão agora. Recebeu outras propostas de emprego por causa do Pulitzer, mas ela gosta de ser freelancer e diz que tem mais flexibilidade para viajar — O anel floral de noivado cintilou em seu dedo. — Se fosse por minha causa eu daria um sacode, mas como eu sei que não é e... bom, é o que ela quer e ela está feliz assim. Respeito as escolhas dela.

Os cantos dos meus lábios se levantaram com leveza.

— Jesus, como vocês são gays. Me dá vontade de vomitar.

Lia apoiou o rosto nas mãos.

— Mas e você, sem ninguém no radar?

Dei um riso sem graça.

— Não tenho tempo pra isso, Lia.

— Sempre existe tempo para... — Ela fez um gesto obsceno com as mãos e eu corei um pouco. — Depois eu que sou a latina puritana. Ninguém mesmo?

— Ninguém.

Mondragón estalou alguns dedos.

— Talvez isso mude aí em Ibiza. Você está com cara de quem precisa se divertir um pouco.

— Não vou me divertir nada porque é uma viagem rápida — argumentei. — Só vim buscar a filhotinha do demônio e volto.

Uma de suas sobrancelhas se ergueu. Ela sabia que eu amava Ibiza.

— Filhotinha do demônio, é? Cuidado pra não se queimar. Já viu alguma foto dela?

Pigarreei.

— Já — Não me alonguei no assunto. — Bom, preciso arrumar as minhas coisas para sair. Diga para a Bella marcar um horário comigo também, tenho que saber quais são as ideias dela para o vestido. E daqui a um tempinho vocês vão precisar vir para provarem e eu fazer os ajustes, mas não se preocupem com isso ainda porque eu nem comecei.

Iliana assentiu.

— Obrigada por tudo, Ella — E sua voz tinha tanto amor e gratidão que eu senti um nó na garganta.

Era eu quem deveria estar dizendo isso.

— De nada, gostosa. Você merece.

— Me mantenha informada — pediu. — E vai dar tudo certo com a filhotinha do demônio, você vai ver.

Ri.

— Pode deixar. Amo você, Lia.

Ela sorriu.

— Também te amo muito, Ella. Se cuida.

Desliguei a videochamada e soltei o ar bem devagar.

Só conseguia torcer para Iliana estar certa.

🍍🍍🍍

No fim da tarde, fui obrigada a aceitar que a chuva não passaria. Bufando de irritação, olhei pela milésima vez o endereço onde eu encontraria Amaya — que por sinal nem sabia que eu estava indo — e retoquei o batom. Decidi ir pelo básico; blazer preto oversized, calças da mesma cor, uma blusa de seda bordô com decote em V e scarpins. Não usei sombra nos olhos, apenas rímel, um pouco de blush e, na boca, vermelho-sangue que deixava meus lábios mais cheios. Meu cabelo estava solto, caindo delicadamente um pouco acima dos meus seios.

Espirrei perfume em locais estratégicos, coloquei meus brincos e peguei o carro alugado. O tempo estava tão feio que eu sequer conseguia admirar a paisagem da ilha. Não era a minha primeira vez em Ibiza, claro, mas fazia uns sete anos desde que pisei pela última vez lá — e eu não tinha pegado um dia de chuva sequer. Pelo menos eu iria embora em breve, se isso era algum consolo.

Segundo o demônio, eu encontraria sua filha em um bar em San Carlo, um povoado situado no nordeste de Ibiza. Estranhei a escolha do local; não era bem uma parte badalada da ilha, mas eu não era ninguém para julgar. Dirigi até lá sem música, ouvindo apenas as gotas de chuva caírem sobre os vidros do carro enquanto os para-brisas limpavam a minha visão. Estava quase no modo automático, sem ansiedade, sem apreensão, só... nada.

Desejei estar com a minha assistente. Pelo menos teria alguém tagarelando ao meu lado. Eu estava acostumada a estar sozinha, mas ainda assim...

Coloquei os meus saltos de volta e desci do veículo, sem me dar o trabalho de pegar o meu guarda-chuva antes de entrar no bar.

Era pequeno, estava quase vazio — as pessoas tendiam a fugir da chuva — e bem iluminado. Sentei-me na bancada e pedi um drink, meus olhos analisando as tatuagens do bartender sem pressa. Ele não era de se jogar fora.

Tirei o meu blazer e o coloquei no meu colo. O bartender sorriu e eu me inclinei em sua direção para pegar a minha bebida, evidenciando o meu decote.

— Dia difícil? — perguntou.

Dei de ombros e levei a boca até o canudinho.

— Muitos dias difíceis.

— Você vai precisar de mais desses, então — apontou com o queixo para o meu copo.

Ah, mas eu ia mesmo.

Observei o ambiente enquanto a tempestade continuava a cair, mexendo a cabeça suavemente no ritmo que a música tocava. Não sei quanto tempo fiquei lá, esperando ver qualquer mulher remotamente parecida com a que Guillermo tinha me mostrado, mas em algum momento eu precisei ir ao banheiro.

Lavei as mãos e, do lado de fora, começou a tocar Maria Maria. Retoquei o batom vermelho de novo e saí do toalete.

Foi só então que eu a vi.

Ela era alta, tinha a pele dourada pelo sol, segurava uma long neck e estava completamente molhada pela chuva que caía do lado de fora, dançando suavemente ao som da música. O cabelo castanho oscilava em leves ondas que paravam na metade de suas costas nuas. Usava uma blusa branca de alças, sem sutiã por baixo, o que deixava o contorno dos piercings em seus mamilos bem evidente. Sua regata subia um pouco conforme ela se movimentava, evidenciando a marquinha de biquini que contornava seus seios, a cintura fina, o umbigo e, mais para baixo, o desenho arredondado de seus quadris. Ela sorria, os olhos fechados e perdidos no próprio mundinho. Sua saia era midi, laranja e fluida. Nos pés, um par de all stars brancos, mas ela se comportava como se estivesse com os mesmos saltos que eu usava.

Ela ergueu os braços, seus movimentos eram tão delicados que, de repente, eu senti como se estivesse flutuando. Trovejou do lado de fora, no entanto ela não se assustou nem mesmo com o relâmpago prateado que a iluminou. Seu rosto tinha o formato de um diamante; maxilar marcado, boca carnuda nos pontos certos, nariz arrebitado. Ao contrário do pai, Amaya Medinaceli não parecia a vilã de um desenho animado.

Parecia só... outra coisa.

Ela bebeu um gole de cerveja enquanto rebolava devagar; mesmo o bar estando vazio, ela irradiava tanto que de repente pareceu ficar lotado, o ar faltando, sufocando, e nem mesmo as gotas do temporal seriam capazes de refrescar. As estrelas pareceram tremular com a expectativa.

E com o mesmo movimento suave com que o sol nascia, suas pálpebras se abriram para encontrarem os meus olhos hesitantes. A luz amarelada a atingiu em um movimento calculado pelo universo e meu ar se perdeu em algum lugar entre o céu e o inferno, frio e calor, sobriedade e delírio. As batidas do meu coração se desaceleraram como se eu estivesse diante da paz que busquei por tanto tempo.

Sob a luz artificial, seus olhos passaram de castanhos para dourados como a aurora vista do mar. A mesma luz que deixava as árvores mais verdes, as frutas mais doces e a vida mais colorida. Ela continuou a me olhar com as pupilas ligeiramente dilatadas e os lábios entreabertos, suspensos, esperando, e o amanhecer encontrou o fim da tarde. O ânimo do início colidiu com o cansaço da noite que estava por vir.

Eu soube de imediato que havia sido uma péssima ideia aceitar desenhar a maldita coleção com ela. Nunca daria certo. Éramos momentos diferentes, hora errada, lugar errado. Mesmo assim, ali estava ela.

Ali estava eu.

Desviei o olhar, voltei para o meu lugar e cruzei as pernas, tomando um gole da minha bebida em seguida. Tirei o meu celular do bolso e me perguntei se não pararia de chover nunca. Lá fora, abafado pela música que morria lentamente para dar lugar a outra, houve outro trovão. Contive um sorriso irônico. Eu trouxe chuva para Ibiza.

Tentei não pensar em Amaya.

Deus do céu, era melhor eu só voltar para Madrid e trabalhar com aquele corno mesmo. Eu só precisava me esforçar muito para não meter a mão na cara dele, porém não devia ser tão difícil assim. Tá, eu bati em um padre e ele me amaldiçoou, mas até aí tudo bem porque o padre em questão não prestou queixa. Eu não podia garantir que Guillermo Medinaceli não me denunciaria.

Aquele estrupício dos infernos adoraria me ver presa.

A ideia caiu sobre a minha cabeça antes que eu pudesse contê-la. E se tudo estivesse dando errado justamente porque eu bati em um padre e ele me amaldiçoou? Praga de padre funciona?

Ah, não. Eu não queria ter que me confessar de novo. Puta que pariu. Chamei o bartender e tentei desviar os pensamentos para algo mais útil, como o fato de que eu tinha que falar com Amaya. Ela provavelmente já estava ciente do acordo, então eu tinha que me apresentar como diretora criativa da Lynster e...

— Um Sex on The Beach, por favor — pedi.

Senti um movimento ao meu lado e me virei pronta para dar no pé caso fosse um homem interessado. Eu agradecia muito a preferência, mas não estava muito a fim no momento. Assim que olhei, entretanto, me deparei com Amaya.

Abri a boca pronta para me apresentar, mas ela foi mais rápida.

— A bebida ou comigo? — Deu uma piscadela. — É por minha conta nos dois casos.

Dei um sorriso de canto. Ah, então a preciosa filha de Guillermo Medinaceli era sáfica. Interessante. Sua cerveja estava terminada e ela sorria em minha direção. De perto, pude reparar que ela tinha algumas sardas que se misturavam à cor de seu nariz e bochechas.

— Ousado da sua parte achar que eu gosto de mulheres — respondi com indiferença.

— Uma garota precisa tentar a sorte — Sua voz era ligeiramente rouca e tinha sotaque do sul da Espanha. Sevilha, talvez.

— Não vai conseguir.

Ela sorriu.

— Ainda é de graça ter esperança. Qual é seu nome?

Olhei para o seu pulso. Ela estava com uma pulseira de berloques, mas tinha somente um nela: uma câmera. Ergui o olhar de volta e toquei a beirada do meu copo, alisando-a com delicadeza.

— Antonella — Dei uma pausa. — Não deveria estar atrás de alguém da sua idade?

— Nem se eu quisesse.

Escondi um sorriso com um gole.

— E você tem... Hmm, 27? Não é tanto — arriscou.

— Trinta e cinco em dezembro — Virei-me para ela, finalmente a encarando de frente. Apoiei o cotovelo na bancada e deixei meu olhar descer de maneira preguiçosa até a sua boca bem desenhada. De fato, uma visão agradável, porém trabalho era trabalho. — Mas agradeço por me dar 27.

Ela lambeu o lábio inferior.

— Tenho vinte e seis.

— Bom pra você.

Seus olhos se desviaram para a tatuagem de manequim no meu antebraço.

— Você é modelo? — inquiriu.

Neguei com a cabeça.

— Um pouco mais complicada que uma.

— E mais bonita, também.

Misericórdia, a menina era direta. Seus lábios prenderam a minha atenção de novo; ela tinha o sorriso largo e o arco do cupido bem delineado. Permiti o meu olhar a descer um pouco mais, para as pintas que ela tinha no pescoço, as alças finíssimas de sua regata e a marca do seu bronzeado. Quando olhei para o seu rosto de novo, ela estava com o sorriso de quem me pegou no flagra.

— Não está nem um pouco curiosa para saber como é beijar uma mulher? — indagou.

Desviei o olhar.

— Não — respondi. E, considerando que eu era pansexual, não curiosa, eu não estava mentindo. Eu já tinha beijado mulheres o bastante para considerar a minha curiosidade sanada. Os cantos dos meus lábios se curvaram em um sorriso. — Nem um pingo de curiosidade.

— E você continua conversando comigo — observou.

Inclinei-me em sua direção, perto o bastante para sentir o seu perfume. Era doce e fresco; ela cheirava a manga rosa e mais algo que não consegui identificar. Seus olhos desceram até o meu colo por um momento, bem onde o decote em V da minha blusa aparecia. Assim que seu olhar encontrou o meu, eu o sustentei para mostrar que eu tinha visto o que ela fez.

Amaya corou.

— Tenho outros interesses relacionados a você, Amaya — pronunciei devagar. — Não acho que o seu pai gostaria de saber o que você quer fazer comigo.

Tão rápido quanto havia aparecido, a cor de seu rosto sumiu. Ela se afastou de supetão e eu tomei um gole da minha bebida, completamente tranquila conforme a sua ficha caía e a sua expressão ficava lívida.

Ela olhou para a tatuagem de manequim de novo, de repente entendendo-a.

— Você é a diretora criativa da...

Dei um sorriso malicioso.

— Sou.

Ela arregalou os olhos.

— Ah, não — gaguejou. — Você não é um velho.

Ergui as sobrancelhas, confusa. Eu esperava ouvir tudo, menos isso.

— Obrigada?

Ela se levantou e passou os dedos por entre o cabelo molhado. Respirou fundo uma, duas, três vezes, e se virou para mim mais uma vez. Estava com a cara de quem tinha visto um fantasma.

Eu sabia que eu era meio branca, mas não era pra tanto.

— Puta que pariu — praguejou.

Tirei o meu celular do bolso calmamente.

— Você quer um velho? — ofereci, empática. — Eu conheço alguns, posso fazer umas ligações.

Ela bufou, impaciente.

— Você tá zoando com a minha cara? Eu não quero um velho.

— Parece que quer — Minha expressão cintilou em malícia. — Que tal um calvo?

— Eu não...

— Ah, prefere com cabelo. Tudo bem, também não curto carecas.

— Eu não quero velho nenhum!

Tive que me esforçar muito para não começar a rir. Puxei o ar com força. Ok, era trabalho, era trabalho...

— Velha, por outro lado... — Não resisti. A piada tinha vindo prontinha, era só tirar da embalagem.

Ela ficou tão vermelha que achei que o rosto dela fosse cair.

— Puta merda, eu me odeio — resmungou, pigarreando em seguida.

— Não se odeie — sugeri.

— Ah, obrigada. Agora eu magicamente parei de me odiar.

Dei de ombros.

— De nada. Passado o mal-entendido, nosso voo de volta para Madrid está marcado para amanhã e podemos começar a trabalhar na segunda — Ergui os olhos para ela. — Amaya, sente-se, por favor. É uma conversa que eu gostaria de ter sentada.

Ela não deu sinal algum de que me obedeceria.

— Eu não vou voltar para Madrid, estou de férias — cruzou os braços.

Suspirei.

— Surpresa, as férias acabaram. Hora de trabalhar, você já descansou o bastante.

Ela revirou os olhos e eu tentei não demonstrar impaciência. Definitivamente não queria trabalhar com ela.

— Já disse, não vou voltar. Eu sou adulta, meu pai não decide por mim.

Inclinei a cabeça.

— Desta vez ele decidiu.

Suas mãos se agitaram.

— Eu não vou — repetiu. — Como você me achou, aliás? Você estava me seguindo?

Abri a boca para responder, mas ela continuou:

Você me seguiu! — enfatizou. — Não acredito que o meu pai mandou uma perua maníaca atrás de mim. Não, não. Não é possível.

Maníaca tudo bem, agora perua?

— Você me chamou do quê? — murmurei numa falsa calma.

A calma antes de explodir.

— Eu vou matar aquele desgraçado. Eu disse que não ia desenhar nada. Quanto ele te pagou, hein?

— Repita o que você falou — Minha voz se sobressaiu à sua ao mesmo tempo que eu me levantava, meus saltos altos fazendo com que eu me erguesse alguns centímetros acima dela. — Anda.

Ela engoliu a seco.

— Foi o que pensei — Minha voz saiu séria, autoritária. — É isso o que você faz, recua quando encontra alguém à altura. Eu não estou nem aí se você estava de férias ou se está pegando todo mundo que respira em Ibiza, a única coisa com que me importo é se você vai fazer o seu trabalho e se vai fazê-lo bem, porque ao contrário de você, algumas pessoas não nasceram com tudo na mão. A minha parte já está cumprida, estou num lugar onde eu nem queria estar e com alguém que eu não queria sequer conhecer. Ao contrário do que o que o seu papai te levou a acreditar, nem tudo é do jeito que você quer e o mundo não gira em torno do seu umbigo. Você pode espernear o quanto quiser, mas eu não estou nem aí. Já lidei com garotas como você muitas vezes e posso dizer que isso não me assusta nem um pouco, minha vida é um pouco mais real do que chorar porque não vou ficar em Ibiza.

A boca dela se abriu como se ela fosse dizer algo, mas não saiu som algum dali.

— Nos vemos amanhã, princesa. Espero que isso esfrie a sua cabeça.

Peguei o meu Sex on The Beach e derramei sobre seu cabelo com toda a serenidade do mundo, como se estivesse falando do clima. Ela arfou num misto de raiva e surpresa.

— O q-que...

— Isso é para você nunca mais me chamar de perua — Olhei para o bartender, que estava chocado. — Tenha uma boa-noite.

Passei o cartão e saí do bar sem olhar para trás.

A chuva me acompanhou o caminho todo até o hotel.

*****************************************

ANTES DE TUDO: VOTEM E COMENTEM.

E VEIO AÍ!!! O QUE ACHARAM?

O que será que acontece agora?

Eu ainda to rindo, desculpa kkkkkkkkkkkkkk. Nos vemos em breve e obrigada pelos 14k <3

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