12 dias até minha morte

By faehrin

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Você já imaginou saber o dia de sua própria morte? É assim que começa a história de Lucas: um garoto de 16 an... More

Prólogo
Dia 1
Dia 2
Dia 3
Dia 3.5
Dia 4
Dia 5 ou algo assim
Dia 6
Domingo a noite.
Dia 7
Dia 7, noite.
Dia 8
Dia 10
Dia 11.
Dia 12.
Dia 13.

Dia 9

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By faehrin

BOM DIA DIÁRIO!!!

Nossa, estou me sentindo MUITO BEM!!

Por mais que tenha dormido no máximo três horas, meu corpo parece disposto como nunca!

Acho que esse é o resultado de ter um dia bom, não é?

Inclusive, acabei escrevendo muito pouco sobre minha noite de ontem, não é? Sobre sentimentos, pensamentos, expectativas e tudo mais...

Perdão diário, mas eu realmente estava bem cansado, e, além do mais, uma vez só não mata, não é?

Na verdade, falando sobre sentimentos, tem bastante coisa passando pela minha cabeça agora, por mais que ontem tenha sido um dia incrível, algumas coisas me fizeram pensar bastante. Principalmente agora que acordei.

O principal é, como sempre, o problema da morte. Toda vez que acordo, sinto algo diferente em relação ao meu futuro. Nos primeiros dias do diário, apenas pensar na morte em si me deixava bastante ansioso, nervoso sobre o fato de nunca mais ver a Letícia e meus pais, mas, à medida que as coisas aconteciam e os momentos passavam, a confusão e angústia que sentia ficavam menos recorrentes. Claro, eu ainda tenho minhas inseguranças em relação à este futuro maldito. Mas, ainda sim, quando começo a lembrar destes últimos 9 dias, me parece que meu fim foi o que realmente me incentivou a começar.

Eu sei que palavras assim são clichês e cafonas, mas é a verdade. Pensando no passado, a única forma que eu encontrei de flertar e começar algo com a Letícia foi passando pelo desespero de ter pouco tempo.

Sonhei com isso essa noite, e até agora não saiu da minha cabeça.

Sabe, quando tudo acabar, espero que as palavras deste diário incentivem alguém a continuar.

O tempo é muito curto para todos. Sejamos sinceros, 70/80 anos, que é a média que vivemos, é muito pouco. Pode parecer bastante, mas, tire um tempo para pensar, quão rápido foram os anos que te levaram até o momento de ler este diário? Quem sabe quão rápido os próximos vão passar!

O tempo é curto para todos, então tentem aproveitar isso ao máximo. Assim como eu, façam uma história no meio em que vivem. Todos são especiais. Todos somos os protagonistas.

Uau, me senti um filósofo bem importante agora!

Desculpem pelo momento FilosoLucas, mas precisava escrever o que estava passando pela minha cabeça. Como eu disse, vai que eu acabo ajudando alguém, no futuro?

Enfim. Dia 9 de 12, vamos fazer valer a pena!

Pensei em algumas coisas para o dia de hoje!

Em primeiro lugar, vou tentar priorizar a felicidade da Let o dia todo! Pensei em matar a escola (De novo né, não vou fazer o Enem de qualquer jeito!) e irmos até a biblioteca pública, procurar por respostas em livros antigos e coisas do tipo. E, de tarde, pensei que seria legal visitar o parque de diversões! Imagina que lindo deve ser o pôr do sol visto pela roda gigante! Definitivamente é uma boa ideia!

E, em segundo, pensar em mim. Sabe, não quero ser otimista demais, mas a Let mencionou estar perto de achar respostas na biblioteca. Quem sabe eu encontre algo que realmente possa me ajudar?! Afinal, viver ainda é uma ótima opção!

Portanto, com os objetivos já traçados e detalhados, acho mais que justo já começar a trabalhar!

No momento, eu tenho que tentar convencer meus pais (que, por sinal, ainda não acordaram. Talvez eu tenha acordado cedo demais...).

Bem, vou agilizar tudo o que posso e ir pondo a mesa, tenho certeza que assim eu consigo convencer meus pais de não ir à escola

8:53 da manhã, escola.

Cara, eu odeio minha vida.

Não é possível que eu esteja nessa PRISÃO faltando 4 dias para morrer! QUE ÓDIO!

Olá querido leitor, aconteceu algumas coisas nesse meio tempo, e eu tenho certeza que você está confuso. Relaxem, vou explicar como vim parar nesse manicômio.

Quando meus pais acordaram, não muito depois da mesa estar posta, eles já começaram a suspeitar que eu queria alguma coisa (fala sério, não posso nem fazer um agrado?).

— Não, nem venha com essa Lucas — disse meu pai, logo ao abrir a porta, com um rosto sonolento, mas estressado — Você não vai tentar convencer a gente a não te dar uma bronca, mesmo que tenha feito panquecas tão lindas!

— Quê? Como assim, porque vocês me dariam uma bronca? — Questionei, sem entender nada que estava acontecendo. Minha mãe passava por trás do meu pai, com uma expressão ainda mais furiosa.

— Não se faz de bobo. Seu boletim chegou! Fala sério, 5 em matemática? A prova valia 100!

Eita.

Eu tinha me esquecido totalmente desse maldito boletim escolar. Vamos ser sinceros, que escola no século XXI iria mandar o boletim por caixa de correio? Pois é, a minha manda.

Não sou muito bom com matemática como vocês podem ver, mas dessa vez eu realmente não estudei. Essa prova foi dois dias antes de começar a escrever no diário, então vocês podem imaginar que eu não estava muito focado em quantas bananas o Seu Daniel iria comprar na feira se a promoção fosse de 19%.

— Ehh, ops... — Sussurrei, entendendo a besteira que eu tinha feito. Meus pais eram bem claros comigo no caso escolar:

Posso fazer a festa, matar aula, o que quiser. Só não posso tirar notas muito baixas, já que eles matavam e tiravam notas altas. Pais nerds e descolados, a pior junção de todas.

— Ops nada! A gente deixa você fazer o que quiser e é assim que você retribui?! — Retrucou meu pai, com uma panqueca na boca, que fazia ele falar engraçado.

— Foi mal! Eu estava com outras coisas na cabeça esses dias, não consegui focar muito bem...

— Outras coisas na cabeça? Só se for vento! 5 de 100 Lucas, você errou até seu nome! — Contestou meu pai, ainda falando engraçado.

Admito que "errar até meu nome" foi um pouco engraçado naquela hora, mas resisti o suficiente para não soltar nenhum arzinho diferente.

— Ainda não pensamos em um bom castigo! Mas, quando pensarmos, você tá ferrado! — Disse minha mãe, encarando as panquecas.

Ok, eu entendo. Dessa vez eu tinha feito uma cagada das grandes. Mas, a pior delas, viria a seguir:

Sem pensar, tentando evitar ficar de castigo em casa pelo resto dos meus 4 dias de vida, retruquei.

— Me deixa de castigo de não ir na escola então! Eu tenho um encontro com a Let hoje de manhã, não posso perder... Vai, por favor! — Falei, rápido e ofegante, sem lembrar que eles ainda não tinham pensado no castigo.

Os dois se entreolharam, voltaram os olhos pra mim, para eles de novo, sorriram, e disseram, juntos:

— Tá aí seu castigo! Sem sair com a Letícia hoje de manhã! Se quiser, saia de tarde, mas vai ter que perder seu encontro super importante agora cedo!

E, em seguida, os dois deram um "high-five", gritando "Somos pais malvados! Isso aí!"

Fala sério, olha o quão burro eu fui! Não tem nem defesa! Agora eu entendi o 5 em matemática...

Enfim, como agora eu era obrigado a ir à escola (pelo menos só pela parte da manhã), pedi aos meus que, pelo menos, deixassem eu passar na casa da Let para irmos juntos.

Logos depois de perguntar, os dois me encararam por alguns segundos, e depois disseram:

— Hum, tudo bem, mas vamos ligar na escola para saber se você está em sala! — Exclamou minha mãe, que parecia orgulhosa por ter formulado um castigo (graças a minha idiotice).

E assim, tive que tomar meu café da manhã, arrumar minhas coisas e colocar o uniforme escolar com aqueles dois doidos me observando.

E, finalmente, sai da porta de casa, suspirando e pensando no que podia fazer com a Let agora de tarde, já que meus planos para a manhã tinham sido destruídos pela matemática.

Chegando na porta da casa da Let, comecei a bater palmas e assobiar algumas vezes (a casa dela não tem campainha), e, de primeira, ninguém me respondeu.

Então, resolvi apelar para o bom e velho berro.

— LETÍCIA! CADÊ TU MUIÉ! — Gritei, com todo o ar de meus pulmões, e logo a porta foi atendida, seguida de sussurros como "quem em sã consciência grita na porta das pessoas logo de manhã?".

E, para minha surpresa, não foi a Let que atendeu.

— Bom dia Lucas! Isso lá é hora para ficar berrando na porta de casa? — Questionou a mãe de Letícia, com um sorriso harmonioso, mas não muito amigável.

A mãe é um tanto diferente da Letícia. Seus cabelos são bastante lisos, não cacheados como os dela, seus olhos um pouco mais voltados para cores verdes, e sua sobrancelha um pouco mais grossa . Além disso, seu rosto é um pouco mais fino, com o maxilar bem marcado. Pensando bem, acho que a Let puxou muito mais o seu pai, que é a cara dela!

— Ah, o-oie Tia, tudo bem? — É costume chamar ela de tia tá? Por mais que eu quisesse muito chamar de sogra... — Perdão pela gritaria, eu bati umas palmas mas achei que ninguém tinha escutado...

— Bem, os gritos eu tenho certeza que escutei! Deixe isso para lá, quer falar com a Let? Ela está terminando de se arrumar para ir fazer aquele trabalho, pode esperar aqui dentro se preferir.

— Ah não,'magina', eu espero aqui for... Espera, trabalho? — Questionei, confuso. Será que tinha mais alguma coisa da escola para infernizar meu resto de vida?

— O trabalho de vocês, ué! Aquele de história! Inclusive, como vai a pesquisa? — Indagou, com uma feição curiosa, enquanto encostava a cabeça no batente da porta.

— A pesquisa? — Perguntei, rapidamente entendendo o que seria "a pesquisa" — Oh, claro, a pesquisa! Ela vai bem, inclusive, íamos estudar um pouco na biblioteca da cidade, sabe? Pegar algumas coisas que são complicadas de encontrar na internet e tudo mais, mas meus pais me deixaram de castigo e não vou conseguir ir...

— Ah, entendi! Castigo? O que você andou aprontando hein Lucas? — Questionou com um tom irônico, enquanto me encarava sorrindo.

— Fui meio mal na prova de matemática. Sabe como é, não tenho muita facilidade. Mas, mudando de assunto, tenho certeza que você vai amar o trabalho no final! — Exclamei, sem sequer saber sobre qual seria o tópico que a Lê teria inventado.

— Eu sei que vou amar, vocês dois trabalham muito bem juntos! E sei que você sempre quer deixar tudo perfeito para a Let. — Debochou, enquanto erguia as sobrancelhas duas vezes, com um rosto curioso.

Não faço ideia do que esse rosto quis dizer, mas foi intimidador na hora.

Antes que minhas bochechas pudessem corar por conta da frase "Quer deixar tudo perfeito...", Letícia apareceu na porta, vestindo um moletom azul escrito "New York" e uma calça jeans preta, com uma tiara no cabelo, e dois brincos com o formato da lua. Fala sério, quem no mundo consegue ser tão linda assim? Só minha mulher mesmo!

— Oie Lucas, bom dia! Olha só, nem tá parecendo um urubu no uniforme da escola, quem diria! — Exclamou, ironicamente, enquanto penteava a parte de baixo do cabelo com uma escova circular e sorria.

— Bom dia Let! Eu nunca pareço um urubu, no máximo você se assemelha à uma ratazana! — Brinquei, contribuindo o sorriso.

— Ouvi você falando que seus pais te deixaram de castigo — Disse, olhando para a mãe em seguida — Eu nunca tirei nota ruim em matemática viu mãe?!

— Eu sei disso cabeçuda — Afirmou a mãe da Let, com uma feição de dúvida — Mas tira notas horríveis em geografia. Lembra daquele 11?

— Há, pelo menos ela tirou algo maior que 10! — Contestei, sorrindo e dando risadas. Letícia e suas mãe também riram.

— Até mais meu bebezinho! — Exclamou a mãe, abraçando Let pelas costas.

— Mãe! Bebezinho?! Sério? — Debateu Let, que corava o rosto, enquanto escondia os olhos com a mão direita.

— Só porque seu namoradinho está aqui eu não posso me despedir da minha filhota?

E agora, os dois estavam vermelhos como tomate. Namoradinho? Eu? Minha sogra me chamou de namoradinho da Letícia? Aí, eu estava prestes a desmaiar...

Comecei a viajar para outro mundo, enquanto as duas discutiam.

— Tchau mãe, até mais tarde! Vem Lucas. — Disse, ainda mais vermelha e envergonhada, Letícia, enquanto segurava minha mão esquerda e me puxava com força suficiente para arrancar meu braço todo.

— A-Até mais tia! — Acenei, ainda bobo e atordoado.

Andamos até um pouco antes da esquina mais próxima, ainda sem conversar, um pouco envergonhados com o assunto, até que decidi quebrar o gelo.

— Namoradinho foi sacanagem...

— Não foi! Fala sério, tinha um milhão de formas dela se dirigir a você! — Exclamou, batendo o pé no chão, agora vermelha de raiva.

Sabe aquela coisa de flertar com os olhos e tudo mais, que eu mencionei no outro dia? Então, acho que estou começando a me soltar mais nessa coisa de flerte, já que, sem nem pensar, respondi:

— Bem, eu gosto desse apelido. Vá dizer que não gosta? — Brinquei, enquanto olhava, sorrindo, com olhos curiosos, tentando manter um olhar mais "atraente".

Acho que ela não esperava essa resposta, ainda mais vinda de mim. Ela virou o rosto, espantada, com as bochechas mais coradas que nunca, e um sorriso bobo que deixava seu rosto mil vezes mais fofo.

— E-eu, sabe, quer dizer, assim... Vamos mudar de assunto?! Poxa, não consigo responder isso. — Disse, baixinho, ao mesmo tempo que eu ria e levava minhas mãos à sua cabeça, fazendo um leve cascudo.

— Tudo bem, tudo bem! — Afirmei, ainda rindo — Sobre a biblioteca, qual seu plano?

— Ah, sim, verdade! Olha, eu procurei bastante ontem, mas talvez eu estivesse pesquisando sobre os tópicos errados.

— Como assim?

— Eu procurei livros de filósofos, físicos e médicos, sobre qualquer tópico relacionado à morte. Não encontrei nada sobre alguém que sabia do dia da própria morte, pelo menos não do jeito que você descreve.

— Viu, eu procurei bastante também! Nunca achei nada!

— Aí que tá! Talvez, eu e você pensemos em algo muito específico, voltado para o que a gente acha que é! Mas, pensa comigo...

— Hum — Não entendia muito bem o quê estava rolando, mas fingi estar acompanhando.

— Olha, e se pesquisarmos sobre tempo?

— Tempo?!

— Tempo! Pensa só, todo nosso problema agora se baseia em tempo! É nosso maior inimigo, certo? Então, já que não encontramos resposta na morte, vamos procurá-la no futuro!

— Isso foi muito filosófico, tá? Tudo bem, acho uma boa pesquisar sobre o tempo. Quem sabe você está certa...

— Eu sempre estou certa! — Afirmou, me dando um abraço forte, acariciando meus cabelos com a mão esquerda — Eu vou achar um jeito viu! Tá tudo bem!

Mesmo sem falar nada, parece que ela me conhece bem demais, não é? A confusão na minha cabeça não era visível, mas reconhecível a qualquer um que tentasse um pouco. Pelo visto, ela tentou. E muito.

Continuamos no abraço por mais alguns segundos, até que tivemos de nos despedir. Combinamos de nos encontrar na sorveteria de sempre às duas da tarde, e assim, seguimos nosso caminho. Ela indo para a direita e eu para a esquerda.

Logo em seguida, andei mais alguns passos e finalmente cheguei no hospício de menores.

Entrei, tive minha primeira aula e agora estou escrevendo tudo que posso na segunda, que é Matemática, inclusive.

Já que está tudo atualizado, vou parar de escrever um pouco e tentar me entreter com alguma outra coisa. Minha mão está doendo demais, credo! Até já, diário!

13:21 da tarde, em casa.

Eu simplesmente detesto a escola e os psicopatas que a frequentam.

Quando bateu o horário do intervalo, fui até meu armário trocar alguns livros para a próxima aula. E, como eu estou vivendo um filme americano, assim que terminei e bati o armário, lá estava Gabriel, sorrindo maleficamente. Minha espinha inteira gelou.

— Eai bonitão! Senti sua falta aqui na escola, por onde você estava? Não vai me dizer que sumiu com a Lelê de novo?!

Lelê? Antes era Lê, agora foi para Lelê? Nem para apelidos o cara consegue usar um neurônio!

Falo isso brincando, porque na hora estava prestes a fazer xixi nas calças. Eu queria muito estar brincando, mas eu realmente precisava ir ao banheiro. Quem não fica nervoso com um marombeiro e sua manada te encarando?

— Oi Gabriel. Olha, eu estou um pouco ocupado, quem sabe depois eu te respondo! — Exclamei, engolindo seco, enquanto virava de costas, começando a andar.

No mesmo instante, Cayo apareceu na minha frente, sorrindo de forma maléfica, como quem diz "te peguei".

— Acho que não viu Luquinhas. Não avisei para você ficar longe da Lê?! — Contestou, me virando com as mãos.

Sendo sincero, dessa vez eu não ganhei aquele pico absurdo de coragem que tive da última vez. Acho que não está na própria casa dá uma enfraquecida no psicológico, né?

Mas, ainda sim, por mais que não tenha tido a maior coragem do mundo, falar da Let assim me irritava demais. Fala sério, o cara simplesmente acha que é dono dela!

— De novo esse discurso? Fala sério cara, falar isso não faz com que ela goste de você. — Retruquei, sem pensar que poderia levar um soco. Mas ainda acho que foi a melhor resposta.

— Você é abusado, né? Vamos ver se tem toda essa coragem quando eu te esmigalhar! — Exclamou, enquanto me segurava pela gola da camisa com força, fazendo meu pescoço arder.

Esmigalhar? Meu Deus ele realmente não sabe escolher verbos.

Tentando pensar no melhor jeito de fugir o mais rápido possível dali, retruquei:

— Quem sabe você não diz isso 'pro' diretor atrás de você? — Apontei para suas costas, mesmo que não tivesse nenhum diretor ali.

Quando ele e seus amigos olharam para trás, Gabriel acabou me soltando, com medo do diretor realmente estar ali, que foi a oportunidade perfeita para desaparecer por completo.

Acelerei como um foguete, passando por Cayo, que também acabou se distraindo, correndo na direção da minha sala.

Os idiotas, ao perceberem que o diretor não estava ali, correram logo atrás, com Gabriel gritando:

— VOLTA AQUI OTÁRIO! QUERO VER ME ENGANAR DE NOVO!

— Não obrigado!! — Berrei de volta, entrando na minha sala. Por sorte, o próximo professor já estava lá dentro, então os bovinos sequer tiveram coragem de me seguir até lá. Playboys só são corajosos quando não tem ninguém que possa enfrentá- los frente a frente.

Enfim, pelos próximos quatro horários, fiquei preso dentro de sala, junto aos professores. Por sorte, todos os profs entravam adiantados, então consegui ficar acompanhado de autoridades até a hora do almoço.

Aí que a coisa pegou.

Eu já sabia que eu estaria morto se saísse normalmente pelo pátio. Ainda mais agora que tinha conseguido fugir de Gabriel pela segunda vez. A terceira, com certeza não rolaria.

Enquanto todos da sala arrumavam as coisas para sair, e eu sofria pelos socos que ainda não tinha levado, uma pessoinha peculiar, vestida em um casaco preto enorme, entrou na sala.

— Hey, Lucas — sussurrou a figura misteriosa, coberta pelo capuz, se aproximando — Eu fiquei sabendo que o Gabriel tá te esperando lá fora! Quer uma ajudinha?

Eu já tinha ouvido aquela voz, só não conseguia me lembrar da onde.

— É, parece que eu to morto mesmo — retruquei, brincando com a pessoa desconhecida — Como você poderia me ajudar? Aliás, quem é você??

— Sou eu cabeça oca! — A figura xingou, enquanto tirava o casaco. Agora eu lembrava de quem era aquela voz: Sofia! Logo ela me salvando, de novo! — Pega esse casaco e cobre a cabeça, deve ficar grande em você também.

— Sofia? Cara, você aparece em umas horas aleatórias, sabia? — Brinquei, enquanto pegava o casaco — Porque você tem um casaco desse tamanho?

— Eu uso cobertor para dormir na aula! Veste logo, se demorar muito eles vão vir aqui buscar você!

— Tá bom, tá bom! — Vesti o casaco, que realmente tinha ficado grande em mim — Valeu, você vai salvar a minha pele!

Realmente, aquele casaco poderia me salvar de uma boa surra. Não tinha como não estar feliz e agradecido.

— Por nada! Vê se não estraga esse casaco hein?! Me devolve quando conseguir...

— Não vou estragar! Obrigado demais! — Agradeci, abraçando-a. Talvez essa não tenha sido a minha melhor escolha, mas foi o que deu na cabeça na hora da emoção. Ela retrucou o abraço, envergonhada.

Peguei minhas coisas o mais rápido que pude e acelerei até a porta. Mas, antes de sair, lembrei— me de perguntar:

— Aliás, mais uma coisa! O que rolou entre você e a Let? — Questionei, curioso demais!

— Como homens são lerdos viu! Vai embora logo, vai garoto! — Exclamou, com um tom raivoso na voz.

Fala sério, esse assunto já estava me deixando maluco, só queria saber uma resposta sólida! Porque essas duas não respondiam algo concreto?!

Enfim, como esperado, DEU CERTO! Passei, um tanto longe, pelo grupo de Gabriel, e eles sequer perceberam que era eu! A Sofia me salvou demais cara, não sei nem como agradecê-la de novo depois!

Corri até minha casa, tirei o casaco e, finalmente, aqui estou! Nossa, que dia corrido de hospício! Quer dizer, escola!

Agora, vou me arrumar para encontrar a Ler às duas da tarde! Mal posso esperar para contar tudinho para a Let!

19:53, Casa.

Olha, esse final de tarde não foi nem um pouco como eu esperava, mas foi... bom?

Cheguei na sorveteria e Let já estava lá, sentada, me esperando.

Nos cumprimentamos, felizes, e logo sentei ao seu lado, pronto para contar as novidades.

Mas, antes que pudesse começar, Let me interrompeu:

— Eu achei MUITA coisa, mas acho que devíamos ir conversar em outro lugar. Quero comer algum lanchinho e tomar um café, mas esse raio de sorveteria tem um café detestável! — Exclamou, fazendo uma expressão de nojo.

— Verdade, lembra do dia que fomos provar e você quase engasgou de tão ruim? — Respondi, sorrindo — Eu conheço uma boa cafeteria lá no centro, daquelas tradicionais, sabe? Vamos lá?

— Simbora! Quem chegar primeiro ganha! — Afirmou, sem nem saber onde era a cafeteria, e começou a correr na direção do centro.

Sem nem contestar, levantei-me e corri logo atrás. Ultrapassei-a, e, depois de uns cinco minutos correndo, chegamos na porta da cafeteria.

— Ganhei! — Exclamei, sem fôlego.

— Aff, vamos entrar! Agora fiquei com mais fome ainda!

Entramos. A cafeteria era uma daquelas bem tradicionais: mesinhas de madeira escura, algumas plantinhas espalhadas aqui e ali, um balcão grande, com cafeteiras e expositores de comida, e alguns desenhos de café, livros e outras coisas "cult" nas paredes.

Let pediu dois cookies de baunilha com um café macchiato, e sentou-se na mesa mais próxima da janela. Já eu, pedi um cappuccino e um pão de queijo, e fiz o mesmo.

Então, fui eu que comecei a contar, já que ela estava com a boca cheia com metade de um cookie.

Atualizei-a sobre tudo do Gabriel. Tinha me esquecido de contar sobre aquele incidente na minha casa (aquele que eu acabei me escondendo no banheiro químico), então aproveitei para contextualizar tudo à partir disso. Contei sobre hoje, sobre tudo que ele tinha dito e também um pouco sobre Sofia ter me ajudado, sem contar que abracei-a para não morrer 3 dias mais cedo.

— Esse Gabriel é maluco! — Exclamou, surpresa por tudo que eu tinha contado — Quem ele pensa que é para te falar isso tudo?!

— Quem ele pensa que é para falar isso tudo sobre você! Você faz o que quer, quem é aquele imbecil para te chamar de Lê?

Com um rosto ainda mais surpreso, Let sorriu, me olhando de forma carinhosa.

— Ownt, você sentiu ciúmes de mim? — Questionou, com um tom de flerte na voz, enquanto apoiava a cabeça na mão direita.

— Hã, sim, quer dizer, talvez, mas, é que, isso.. — Travei envergonhado, ao mesmo tempo que corava pela forma que ela havia dito isso, abaixando para tomar meu café.

— Falando em ciúmes, então foi a Sofia que te ajudou a fugir? — Questionou, me encarando, enquanto tomava seu macchiato, mudando TOTALMENTE o rumo da conversa — Ela tem te visto bastante né?

Travei ainda mais, sem saber o que responder, e ela continuou.

— Dessa vez passa, já que ela te ajudou. Mas na próxima, eu vou rosnar para ela! — Afirmou, fingindo um rosnado, voltando ao tom engraçado e simpático da conversa. Sério, ela é mestre em colocar e tirar climas estranhos.

Dei risadas tímidas, com medo de outra mudança brusca de assunto. Que, por acaso, veio:

— Então, eu ainda vou cobrar o Gabriel por isso, mas precisamos mudar de assunto rapidinho. Já era tarde, e hoje meu pai mandou voltar mais cedo. Ele quer fazer um jantar em família ou algo assim.

— Tudo bem! É sobre os achados da biblioteca? — Questionei, curioso.

— Sim, eu achei muita coisa! Procurei em um banco de livros, artigos científicos, dossiês, tudo que se pode imaginar! Achei uma frase muito bonita de Tolkien, que diz "Tudo o que precisamos decidir é o que fazer com o tempo que nos é dado". Não ajuda muito na situação atual, mas acho que seria importante para ti neste momento.

— Saquei, vou anotar mentalmente! — Brinquei, sorrindo — Continue.

— Beleza! Achei algumas coisas que falava sobre como a velocidade afeta o espaço tempo, coisas sobre o tempo ser relativo, teorias de viagem no tempo e tudo mais. Mas o mais interessante fo..

E, de repente, ela parou de falar. Como se tivesse lembrado de alguma coisa.

— Let? O mais interessante foi... — Repeti, esperando que ela terminasse a frase.

— Hã? Ah, nada. Eu ia dizer que foi uma frase de... de... de Einstein! Mas lembrei que não era esse o tópico da conversa.

Isso estava muito estranho. Ela CLARAMENTE não queria falar de Einstein, e também estava muito animada para dizer algo, mas parecia que alguma coisa a impedia. E, realmente, eu não sei dizer o quê.

— Tá tudo bem esquisita? — Perguntei, brincando, tentando melhorar o clima da conversa.

— Tá sim. Eu só me lembrei que não encontrei nada que poderia te ajudar. Desculpa Luquinhas.

Que mentira! Ela NUNCA estaria tão animada durante toda a conversa sem ter descoberto algo que me ajudasse! Agora, eu tinha certeza que ela escondia alguma coisa.

— Olha, eu sei que você encontrou algo. Eu te conheço. — Disse, baixinho, enquanto segurava sua mão — Tá tudo bem, não vou perguntar o quê é, deve ter um motivo para você estar se escondendo. Pode ser que você não tenha achado tudo, ou que ainda não tenha certeza, sei lá, mas tem um motivo. Mas eu quero que você me diga depois viu?!

Ela me olhou, com os olhos úmidos e compreensivos, e respondeu:

— Tudo bem! Eu vou te ajudar, tá? Tenho certeza que vou!

— Eu sei! E, se não conseguir, tá tudo bem. Meus últimos dias foram os mais felizes da minha vida.

Levantou-se, e me abraçou. Apoiou meu corpo em seu tórax, enquanto deitava sua cabeça por cima da minha.

— Meus dias com você também foram os melhores da minha vida! — Disse, baixinho, enquanto beijava minha cabeça e acariciava meus cabelos.

Ficamos alguns segundos abraçados, até que ela se afastou, dizendo:

— Eu tenho que ir para casa agora, Luquinhas! Até amanhã! Vamos aproveitar o dia todo juntos, tudo bem?

— Ah, tudo bem! Amanhã, pensei em irmos no parque de diversões, que tal?

— Acho perfeito! E, de manhã, podemos andar de bicicleta ou algo do tipo!

— Sim! Até amanhã então, minha rainha!

— Até amanhã, meu rei!

Nossa é muito brega falar assim mas EU AMO AÍ MEU DEUS DO CÉU!!!

Voltei para casa (depois de pagar a conta que ela tinha deixado só para mim) com um sorriso de orelha à orelha!

Por mais que aquela coisa de esconder algo de mim me preocupe, confio o suficiente na Let para ter certeza que ela sabe o que está fazendo!

Cheguei em casa, deitei no sofá e relembrei o dia todo. Que dia corrido!!

Mas, acima de tudo, foi um dia bom! Conversar com a Let o dia todo na cafeteria é simplesmente INCRÍVEL!

Ah, além do mais, fugir do Gabriel me deixa com um pouco de ego inflado. Afinal, ele pode ter músculos, mas eu tenho mais de dois neurônios!

Enfim, como a Let disse que iria ter um jantar de família agora à noite, fiquei com o resto da noite toda livre! Acho que vou ver um filme com meus pais e ir dormir. Eles merecem um pouco de atenção também, e faz tempo que não vejo algo com eles. Eles vão ficar bem animados e felizes!

Então, essa é a última vez que eu escrevo hoje! Já estou com a mão cansada, meu Deus, escrever demais dá uma câimbra que vocês não imaginam!

Acho que hoje foi um dos poucos dias que estou com zero preocupação para o dia seguinte. Por mais que o Gabriel ainda aparente querer me assassinar, acho que a Let pode resolver isso tudo num piscar de olhos!

E, além do mais, já tenho tudo marcado com a Let amanhã, e acho que meu castigo já acabou (Pelo menos eu espero. Mas, conhecendo esses dois, com certeza já acabou).

Sendo sincero, para terminar o dia de hoje com chave de ouro, nenhuma dessas coisas que mencionei é o que realmente me deixou tão calmo.

A Let esconder algo de mim, e depois falar que "vai conseguir me ajudar", me mostra uma só coisa.

Ela sabe um jeito que pode me ajudar!

Pela primeira vez, em muitos anos, eu tenho orgulho e capacidade de que:

Talvez, eu não morra no final!

Quem sabe o destino não será tão mal comigo? Quem sabe o destino me enviou a Let para me ajudar com minha morte, para que fiquemos, para sempre, juntos?!

Pela primeira vez, amigos leitores, eu tenho esperança!

COMO EU AMO A LETÍCIA!

COMO EU AMO VIVER! 

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