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By franchaels

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โœž ๐Ž๐๐€๐„. | All men are sinners, the fathers of the faith teach us. Em um tempo onde o ressentimento s... More

๐Ÿ—ก๏ธ | Of Bones and Embers.
GRAPHICS GALLERY.
โ™›. ๐Ÿฌ๐Ÿฌ๐Ÿฌ โ” PROLOGUE.
โ™ฑ ACT I โ”€โ”€โ”€ Before I Wake.
โ™›. ๐Ÿฌ๐Ÿฌ๐Ÿญ โ” BORN OF BRONZE.
โ™›. ๐Ÿฌ๐Ÿฌ๐Ÿฏ โ” DEAD IN HER EYES.

โ™›. ๐Ÿฌ๐Ÿฌ๐Ÿฎ โ” SWEET LIES.

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By franchaels

🐉. OF BONES AND EMBERS.
━━━ CHAPTER TWO:
DOCES MENTIRAS.

📍. Pedrarruna, 112 DC.

A garota não tinha um nome.

Quatro alvoradas e quatro noites antecederam seu nascimento, e ela ainda não tinha um nome.

Aos olhos de Rhea, ela era apenas sua doce garotinha, seu coração apertando dolorosamente em adoração com cada ínfima ação executada por um ser humano tão indefeso. Ela permanecia com os olhos fechados o tempo todo, o que a princípio a preocupou, embora Meistre Rainer tenha assegurado ser algo natural na primeira quinzena, tornando sua aflição atenuada pela eventualidade futura de criarem-se complicações severas que poderiam afetar seu bem-estar.

A dubiedade que a inquietava naquele momento era a contestável afirmação vinda de Daemon de que ele já os tinha visto. O príncipe dragão reiterou que eram violetas e pálidos. Iguais aos dele. E um sopro que ela sabia nascer de uma conduta pueril diferiu-se em sua índole de maneira inoportuna, parecido a um sussurro terrivelmente opressivo, a insegurança preservada em si triturando um espaço sobre sua confiança, modelada por ciúmes de que ela fosse muito ele. 

Ela logo percebeu que a menina, em aparência, era notoriamente valiriana. Sua filha tinha o cabelo do pai. E Rhea desconsiderava que eles pudessem vir a escurecer futuramente. Eram tão claros, que às vezes ela não tinha certeza se de fato estavam lá, a maciez entre seus dedos delgados sendo sua única evidência.

A criança era calma na maior parte do tempo, mas seu choro flutuava copiosamente ao sentir desconforto, o rostinho se enrugando e levando Rhea a se imaginar ociosa. Bons deuses, era como se ela mal pudesse confortar sua filha.

Ela pensou se deveria contatar a Daemon sobre o nome.

Todavia, ela nem ao menos sabia como ele sentia-se exatamente a respeito da criança; feliz, desapontado, ou alheio? Daemon não gostava dela e Rhea estava muito bem com isso. Ela também não gostava dele. Mas uma criança gerou-se dos dois e Rhea temia por ela, como o pai lidaria com ela.

Ao pensar ser a causa do remorso e ódio que o progenitor de sua criança poderia transitar à pequena, era o suficiente para sentir seu estômago afundar doentiamente. Sua filha não merecia ser tratada como inferior.

Rhea Royce honestamente pensou que talvez não deveria tê-la colocado no mundo.

Como ela lidaria com pais tão apáticos um para com o outro? Talvez, Daemon nem permanecesse em Pedrarruna por muito tempo, sua boa vontade em atender ao irmão dissecando rapidamente. Ou não, considerando que isso não seria vantajoso a ele.

Daemon poderia ir embora logo.

Ela não se importaria com isso.

Entretanto, novamente pensou na menina. Como sua filha iria reagir, à medida que crescia?

Quando Daemon ia, ele não voltava. A não ser por dever.

Uma criança tem os pensamentos nublados por inocência, como seus sobrinhos, embora fossem inteligentes o suficiente para notar quando algo estava errado. Sua filha observaria outros lidando com seus filhos e, porventura, a confrontaria sobre onde estava Daemon? As pessoas também falariam sobre, boatos transcendendo pelas paredes que não poderiam simplesmente ser controlados.

Rhea estava tão confusa.

A ideia de ser mãe já havia evaporado de seus pensamentos assim que o primeiro ano de seu casamento passou, maduro no início entre propostas insignes e podre no fim com uma realidade fria.

Ela assumiu o controle de seu castelo quando o tio morreu; morreu odiando seu marido. E ela já estava preparando o filho de sua irmã para assumir quando ela falecesse, ou na pior das hipóteses, estivesse inapta. Porém, agora, ela tinha uma filha. Sua filha. Sua herdeira.

Entretanto, ela não era só sua.

Era também uma princesa da Casa Targaryen.

Rhea puxou o canto de sua boca entre os dentes, tentando ao máximo respirar uniformemente. Uma alegoria enigmática para si mesma. Pensamentos fomentando em seu cérebro como uma roca engenhosa. Ela desejou que as coisas fossem mais fáceis.

Daemon Targaryen era para ela como uma língua estrangeira que nunca ouvira antes. Incompreensível. Afinal, Rhea quase não o conhecia. No início do casamento deles, com Daemon ainda no Vale mesmo contra sua vontade, ele passou seus dias voando com Caraxes, sumindo às vezes por dias ou então semanas. 

Mas era uma situação diferente agora.

Existia uma certeza indelével que os acorrentara para sempre um ao outro. Anulações seriam infindáveis com um casamento consumado, e as investidas gentis de seu cunhado a deixavam um tanto culpada, por conta dos infames boatos de que Daemon havia deitado-se com a princesa Rhaenyra.

Rhea piscou para o céu escuro, estrelas distantes brilhando palidamente diante seus olhos. O par de círculos castanho-avelã seguiram pelas enseadas pedregosas do norte da Baía dos Caranguejos, tão minúscula e impotente do alto de sua janela. Altos montes rochosos ladeando as encostas que sustentavam fendas de sáfaras estreitas e caiam ao mar debruçadas em ondas altas e silenciosas.

O embrulho em seus braços se remexeu e um sorriso involuntário ergueu-se no canto de seus lábios. Ela aninhou a bebê contra si, pressionando o manto que cobria o pequeno corpo entre as mãos quando ele se desajustou em consequência da brisa gelada e pequenos dedinhos emergiram, circulando com força seu indicador.

— Como você é forte, meu amor. — Sua garotinha soltou um murmúrio ansioso enquanto continuava a se movimentar, agarrando o ar ao redor delas ao tempo que seu peito subia e descia calmamente.

Havia uma familiaridade em seu rosto. O nariz, ela já o havia notado; idêntico ao dela. Parecia ser a única característica física que ambas compartilhavam.

E ela tinha força dos Royce.

Sua família carregava uma longa linhagem de heróis; histórias marcadas por seu sangue vivo e contadas sob o seio de mães para seus filhos. Era justo que sua filha, tão ausente de traços que se assemelhavam a ela, carregasse ao menos isso. Um nome de sua família materna. Algo que carregaria e a identificaria para sempre.

Daemon poderia querer um nome valiriano. Ela não se importaria se fosse seu desejo homenagear a boa rainha Alysanne, que sempre fora tão gentil com Rhea, ou sua mãe, a princesa Alyssa, que teve seu encontro com a morte prematura após o parto complicado do terceiro filho e não resistiu por muito tempo.

Mas a bebê já era tão Daemon.

Nomeá-la poderia ser algo dela. E uma coisa que lembrasse a metade de suas outras origens. Um nome dos primeiros homens. Um nome heróico. Hera.

— Hera. — Sua postura foi recalcitrante quando um sorriso amplo a presenteou em troca. — Você gostou?

Abaixando-se deliberadamente, seus lábios tocaram cuidadosamente a testa de Hera, seu coração suavizando as batidas no mesmo instante.

— Não vou deixar que ele a magoe. É uma promessa. — E suas palavras foram engolidas pelo vento, dirigidas a alguém que ainda não as compreendia, mas Rhea Royce nunca falou tão sério em toda sua vida.

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Rhea estava furiosa.

Uma sensação dolorida raspando no fundo de seu estômago, intensificada por seu puerpério. O parto era duro, mas o que vinha em sequência era ainda pior. Sua expressão constante comprimida em aflição, lacerações espontâneas em sua intimidade, secreções translúcidas excessivas e seios doloridos a maior parte do tempo.

O rosto de Rhea estava contorcido enquanto ela caminhava em direção aos aposentos de seu marido, passos estalados rangendo contra o piso.

Em um tempo onde seus olhos se alargavam sob uma perspectiva utópica e sorrisos doloridos ostentavam seu rosto, ela aspirou a ideia de casar-se com um príncipe. O sangue da velha Valíria, um longo ramo que perseguiu sussurros sobre os vínculos com dragões. No ventre de suas mães, eles formavam-se com escamas e cresciam asas— Rhea, uma vez, pensou se carregava uma magia tão profunda como aquela em sua gestação. Ela escutou diversas vezes em como os Targaryen não se adoeciam com facilidade, como se houvesse algo incinerando qualquer bactéria rastejando em suas veias.

Ela ainda não havia definido se acreditava ou não. Mas encontrava-se satisfeita e orgulhosa com sua própria linhagem mágica.

Quando ela parou em frente a entrada do aposento, não usou de sua polidez para bater à porta. Ela apenas a abriu e uma cabeça de fios claros se virou em sua direção.

Daemon não nivelou seu descontentamento quando notou quem era.

— Eu apreciaria se batesse na porta antes de entrar. — Sibilando, ele abandonou ao seu lado a longa lâmina delgada da Irmã Sombria, seus dedos dispersando-se da rocha que segurava e jogando-a no chão enquanto se acomodava em seu estofado próximo a janela triangular.

Seu aposento era o segundo maior do castelo, logo após o dela. O assoalho de mogno era forrado com tapetes myrianos em cores rubras e uma longa cama de dossel se afastava da sala de estar, esta que continha uma lareira formatada por um arco de ogiva e um altar afastado com esfinges valirianas. As tapeçarias eram antigas e com imagens referentes aos Primeiros Homens, o que ela sabia incomodar Daemon e lhe trazia um pouco de satisfação. O estofado que o homem estava acomodado possuía uma parquetada marrom vazia logo à frente.

— Perdoe a minha ausência de decoro, senhor marido. — Suas palavras não pareciam soar nenhum pouco arrependidas.

Daemon estava entediado. Claramente. Ele não tinha muito com o que se ocupar por ali. Ela precisaria sofrer um baque de insensatez antes que concedesse qualquer intervenção dele em seu poder político.

O que a trás aqui?

Ela respirou fundo, ainda meio incongruente. Entretanto, aquela pendência não deveria ser adiada. E Rhea estava tentando manter sua voz sem muitas exigências, além de sentir dor e incredulidade.

— Não farei rodeios, Daemon. Apenas escute dessa vez.

— Pois bem... — Ele incitou para que ela prosseguisse, despreocupadamente.

Inclinando-se pesadamente contra um dos pés, Rhea mais uma vez respirou fundo, preenchendo seus pulmões antes de soltar uma lufada trêmula quando um conjunto de palavras afoitas deslizaram por seus lábios.

— Aquele ovo chocou, Daemon. — De repente, seus olhos se alargaram e brilharam como pedras preciosas, e ele levantou-se de onde estava, mas ela prosseguiu. — E a minha filha estava dormindo quando isso aconteceu. Se continuasse com aquela sua ideia estúpida de deixá-lo no berço, ele poderia tê-la ferido.

O quê? — Seu rosto endureceu dessa vez. — Ele não iria machucá-la. Toda minha família é submetida a isso desde meus avós. E não se refira a tradição criada por Rhaena Targaryen como estúpida. — Ele praticamente cuspiu, aproximando-se dela. — Onde ele está?

— Você está realmente falando sério? Pedrarruna não é Porto Real ou Pedra do Dragão. Não temos um lugar para deixar aquela coisa. E pelo que eu bem me lembro, dragões precisam ser treinados. — Rhea ergueu o pescoço, crispando os lábios em uma linha reta. — E sugiro que nivele seu tom quando se dirigir a mim, já que eu ainda estou sendo condizente demais em aceitá-lo sob meu teto depois de suas ações. — Ela deu-lhe uma olhadela feia. — E aquelas coisas sentem fome, Daemon. Ele poderia muito bem tê-la machucado, sim, independente de seu critério desbaratinado.

Apenas a ideia revirava suas estranhas. Ela jogou o véu de cabelo que caiu por seu ombro pelas costelas e sentiu sua pele úmida através do amontoado de tecidos.

Suas trocas com Daemon nunca acabavam bem. Ocasionalmente, eles mal suportavam começar um diálogo sem insultar o outro. As palavras de Daemon sempre foram duras. Enquanto o rei Viserys depositava alguma fé no casamento deles, ela só podia pensar o quanto ele estava forçando um terrível engano ao crer que o retorno de Daemon poderia a beneficiar.

Então houve a noite de frustrações reprimidas sendo expostas e a vinda de sua filha.

Daemon emitiu uma risada sardônica, sua mão erguendo-se para esfregar a têmpora em um gesto despretensioso e desinteressado como ele sempre fazia.

— Então você deve começar a compreender que é o meu nome que ela carregará. São meus traços que ela carece e você não pode fazer nada em relação ao dragão. Ele chocou por ela e quando chegar a hora, ela irá domá-lo. — Um músculo pulsou em sua mandíbula quando ela tentou falar, mas Daemon prosseguiu, pegando a Irmã Negra encostada na poltrona e rodeando-a até chegar na porta, pousando a mão na maçaneta. — Envie uma carta ao meu irmão e solicite um Guardião de Dragão.

Ela mediu-o com um olhar antes de um dos cantos de seus lábios se repuxarem, desviando sua atenção para o tapete vinho.

— Ele é seu irmão. Tenho certeza que atenderia seu apelo primeiro.

Ela sabia que isso o atingiria, pois sua face tornou-se dura e sua boca torceu

Você sabe muito bem que...

— Nem o seu irmão, que sempre colocou-lhe sobre seus braços como uma mãe feroz suporta mais suas indiscrições. É por isso que foi exilado da corte, não? — A raiva tomou conta de suas palavras. Daemon, uma pessoa tão repleta de escuridão e luz que acabava-se em uma personalidade cinzenta. Esmorecido sua pessoa, e foi quando ela chegou a essa percepção, que parou de achar que o erro estava nela. — Eu vou escrever a ele, mas é porque prezo pelas pessoas que residem neste castelo. Não pense que pode exigir algo de mim quando permanece com esse teto sobre sua cabeça por minha benevolência.

Daemon não se enfureceu como ela pensou que ele faria, mas foi libertador dizer aquilo mesmo assim. Ele deu de ombros, ao invés.

— É ingenuidade sua, esposa, pensar que está fazendo qualquer generosidade. Anseio por livrar-me de um lugar tão enfadonho como este.

Ela não se importou. Nunca tentou dissuadi-lo a respeito de seus pensamentos intrincados de superioridade, não valia a pena.

— E, nesse embargo, continuar aqui é a única maneira que você tem de recuperar a confiança de Viserys.

No começo, ela tentou fazer a relação deles funcionar em sua mente, logo após o anúncio. Suas primas e tias asseguraram como ela era uma mocinha sortuda por se tornar uma princesa. Ela ficou feliz, é claro. Em breve, tornaria-se senhora de suas terras e seria esposa de um príncipe, tamanho poder que teria em suas mãos — ela sempre gostou de sentir sua vida firme sobre os pés. E era seu dever fazer aquilo funcionar. Suas septãs ensinaram-lhe a arte do bordado, dança e canto. Ela era magnífica em bordado.

Seu esforço e boa-fé foram-se perdendo. Daemon era desagradável. Rhea recordava-se quando até o próprio príncipe Baelon sentiu-se envergonhado pela ausência de respeito vinda do filho.

Com os anos se passando, ela finalmente definiu que tudo aquilo se ergueu entre as ambições de Daemon que o frustravam por ser valiriano e com ligações diretas ao trono, mas, de toda forma, ser apenas um consorte no Vale. Ela não estava disposta a crescê-lo em sua influência em Pedrarruna apenas para diluir seu ego enquanto ele a insultava.

O rosto dele permaneceu impassível. Ela percebeu o quanto o fato dela ler suas atitudes o incomodou pela maneira como uma veia saltou em seu pescoço. Olhando-a de cima abaixo com seus olhos violáceos, Daemon foi ardiloso o suficiente para não retrucá-la e dar-lhe mais armas contra si e preservar sua austeridade.

Abrindo as portas, ele saiu, deixando-a imensamente satisfeita.

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Com o passar do ciclos da lua, Rhea ponderou que talvez fosse mais fácil administrar uma região do que se ter um filho. Uma filha.

Ela sempre soube que não seria fácil. Quando o tio Yorbert tornou-a herdeira, muitos se opuseram contra a validação do quão ela era a melhor escolha para isso. Rhea não era um varão sadio, e ele ainda possuía outro sobrinho e o primo Gunthor — ainda que esse fosse um espírito desgovernado que não se via dono de nada. Mas tio Yorbert dispensou as ressalvas e educou a filha de seu irmão para um dia governar com tudo que ela precisava aprender, pouco antes de sua partida para tornar-se regente do Vale em nome de Jeyne Arryn.

Então quando seu primo Roderick trouxe-lhe aos seus ouvidos que muitos questionavam-se, agora que Rhea provou-se fértil, se engravidaria novamente. Ter um menino.

E era claro que não.

Não viria suceder e respeitava a si mesma e os votos que prestou diante a santidades, não traria uma criança bastarda ao mundo, não em respeito a Daemon — até porque ela duvidava que ele não houvesse várias espalhadas pela Baixada das Pulgas — mas sim por uma criança que viveria entre a inescrupulosidade com desonra e seria mal vista aos olhos de terceiros.

Sua septã sempre frisou que fornicação era um pecado gravíssimo. Ceder a tentação da carne e entristecer a Donzela que zelava por sua plenitude.

Ela deveria se comportar até mesmo na presença de seu marido quando eles estivessem produzindo um herdeiro, ela dizia. Rhea não questionou anteriormente, apesar de achar estranho e extremo; ela recebeu uma educação que seria direcionada para qualquer boa moça, embora agora, em sua maioridade, não podia deixar de achar tudo fastidioso e absurdo. Esses requisitos eram quase como os das Irmãs do Silêncio que prestavam sua vida aos votos que juravam aos Sete.

Rhea sabia que haviam pessoas além do Mar Estreito que viviam em situações piores e degradantes. Era por isso que nunca expôs o paradoxo no qual se sentia, possuía uma vida boa, mas quando viu o que teria de fazer para assegurar sua filha como sua herdeira — porque ela seria, mesmo com qualquer oposição — uma parte de si inflou como se estivesse envenenada.

Ela não tinha completado um dia de seu nome ainda.

Mas foi a maneira que Roderick e Rhea encontraram de calar os vassalos e concordaram em prometer a mão de Rowland e Hera para o outro. Casá-los. Seria bom ter o primo ao seu lado, que era tão Royce como ela e não levantaria nenhuma dúvida acerca de sua legitimidade — e ela também duvidava se Roderick não esteve tão aberto a concordar por interesse próprio.

Rhea, felizmente ou não, era a pessoa que sacrificaria os outros para manter os seus, e isso não era algo que a envergonhava.

E por sua sorte, ela estava preparada para a fúria de Daemon. Ela havia mandado um cavalariço buscá-lo em um bordel que ele passara a frequentar em Vila Gaivota — o que já seria o suficiente para irritá-lo —, pois ainda que não devesse satisfação sobre a educação de Hera, que, ele não parecia se importar, era mais fácil esclarecer as coisas antes que ele tentasse casá-la com alguém para trazê-lo próximo a linha de sucessão do trono mais uma vez.

Ela estava em sua sala privada, sentada em um divã de veludo borgonha enquanto trançava o cabelo da pequena Alyssa, seus dedos se enroscando e puxando os fios castanhos da menina que aguardava pacientemente a tia terminar, ao mesmo tempo que olhava para a bebê dormindo de maneira tranquila na cadeira de balanço rente a elas, encantada. A ama de leite folheava um livro de couro verde esmeralda, mas seus olhos continuavam atentos caso fosse necessária.

— William contou-me que eram horríveis, demônios, que não apiedavam-se nem ao menos de criancinhas. Possuíam espadas de gelo e sacrificavam pessoas, que o mundo nunca vira um inverno tão devastador. — Alyssa jazia de uma expressão doente quando virou-se abruptamente para ela, quase fazendo Rhea soltar seu cabelo. Seus olhos verdes estavam levemente arregalados. — Isso é verdade, senhora tia?

Rhea precisou conter o leve curvar de sua boca.

— Certamente, seu irmão está lhe informando apenas da parte mórbida. Já passaram-se milênios do que eles chamam de Longa Noite, mas lembre-se que houve um herói que derrotou os Outros.

Alyssa teceu os dedos das mãos dispostos ao colo, crispando os lábios antes de voltar seus olhos para frente e se acomodar.

— Não sei, tia. William estava me dizendo que um ladrão encontrado tentando fugir pela Baía dos Caranguejos será levado para a Muralha. Disse-me também que o homem gritou que preferia perder todos os dedos da mão ao invés de ter que ficar em um lugar como aquele. — Sua voz saiu em um murmúrio baixo e reprimido, que a fez limpar a garganta discretamente antes de prosseguir. — Porque alguns dos homens que partem para patrulhar nunca mais retornam.

Rhea arqueou a sobrancelha.

Ela cuidadosamente prendeu as duas madeixas trançadas de cada lado com um velho diadema de borboleta prateado, agitando seus fios ondulados que permaneceram estendidos por suas costas.

Ela olhou para a ama que encarava a menina com um olhar que transmitia a mesma coisa que se passava pela cabeça de Rhea, que ela não deveria dar tanta atenção a mitos e histórias que o irmão contava com o intuito de assustá-la.

Esticando-se para acariciar os pés miúdos da filha, tão alheia e inocente, gentilmente passou os dedos pelo cabelo da sobrinha quando sentou-se ereta.

— Minha querida, olhe para mim. — Ela sorriu para Alyssa quando a menina a encarou, piscando os olhos grandes e espantados. — Honestamente, não entendo como uma informação dessa estirpe chegou aos ouvidos do pequeno Gunthor.

— Ele afirmou ter escutado os cavaleiros conversando enquanto treinavam! — Ela exclamou, muito segura das palavras do irmão.

Rhea suspirou.

— As pessoas tendem a agravar fantasias tendenciosas, Alyssa. Você sabe que há um povo que habita Para Lá da Muralha, sim? Os selvagens. Eles não vivem em bons termos com os Homens da Patrulha, o que, bem, os faz serem intolerantes na presença do outro e naturalmente tão pouco gentil.

A menina semicerrou os olhos, tombando a cabeça levemente para o lado enquanto parecia avaliar a veracidade das palavras da tia.

— Então... É por causa disso que os patrulheiros não retornam?

Rhea acenou com a cabeça.

— Suponho que sim.

Alyssa encolheu os ombros, fungando.

— Ainda parece horrível para mim.

Antes que ela pudesse responder, a porta se abriu. Daemon, seguido do cavalariço, entrou no ambiente. O corpo de ombros largos do príncipe se esgueirou para dentro, a luz que perfurava as janelas iluminando seu rosto corado. Da bebida ou da viagem, ela não sabia. Escutando um rugido esganiçado paredes à fora, ela soube que Caraxes voaria pelo mar agora.

— Sissi, leve Alyssa e Hera ao jardim. Juntarei-me a vocês em breve. — A mulher de cabelos castanhos, quase ruivos, curvou-se respeitosamente.

Tirando Hera da cadeira de balanço e ajustando-a em seu braço, estendeu a mão para Alyssa. A menina intercalou seu olhar entre Rhea e Daemon, antes de segurá-la. Quando Sissi atravessou a soleira da porta, o olhar de Daemon se fixou nela. Mas não olhou uma vez para sua filha em seus braços, o que fez a senhora de Pedrarruna cerrar as mãos com a mandíbula endurecida.

No começo, Rhea sabe que Daemon deitou-se de fato com algumas mulheres, por sua frustração. Ela não se importou. Eventualmente ele parou, e passou a se empanturrar em bórdeis. "As mulheres do Vale são desinteressantes."

— Você pode se retirar também, Jasper. Obrigada pelos seus serviços. — Ela sorriu para o rapaz de cabelo amarelado, que as seguiu logo em seguida. — Entre, senhor marido. E feche a porta, por favor.

Daemon não protestou, mas percebeu pela forma como esfregou a testa que ele estava apático e enraivecido.

— Presumo que seja algo de extrema importância para mandar o rapaz me interromper.

Como sempre, ela não propôs intermediárias. Permanecendo sentada ainda no mesmo divã, apontou para o estofado que Sissi ocupara, tentando controlar seu temperamento para que aquilo acabasse logo.

— Sente-se, se quiser. Tenho uma proposta a apresentar.

— Não imagino que você possa negociar nada que me interesse. — Suas palavras eram claras demais para alguém que cheirava a bebida, mas foi bom saber que Daemon ainda permanecia lúcido.

— No último ano, a Triarquia recebeu o apoio de Dorne em sua incessante disputa territorial referente ao contestado Degraus, estou certa? — Daemon inclinou-se para frente, um pequeno sorriso brotando em seus lábios e um olhar irônico dando-lhe aval para progredir. — Nós dois sabemos bem que ainda que a palavra de seu irmão seja a sentença final, sua visita não será requisitada na capital por tempo indeterminado. Mas creio que ele esteja disposto a ceder seu retorno para voltar a lutar.

O sorriso de Daemon cresceu, como se estivesse se divertindo.

— E de que forma você pode me conceder isso?

— Julguei que sua compreensão seria instantânea. — Ele arqueou uma sobrancelha. — Mais do que provavelmente qualquer coisa que você tenha feito que levou o rei ao limite, através de missivas gentis, Majestade sempre queixou-se sobre a falta de responsabilidade com que você administra sobre seu casamento. Estou disposta a fomentar um ideal de que finalmente estamos em bons termos.

Eles não estavam. Não se falavam. Ela sabia que Daemon estava chegando ao limite e que lutar era o que o dispersava de seus pensamentos nada desanuviados. Tinha certeza que era sua inteligência e moderação que o faziam ainda permanecer no Vale com o pensamento de que qualquer atitude imprudente poderia distanciá-lo ainda mais do irmão. Ou de qualquer outra pessoa.

E seria melhor ele partir agora antes que Hera pudesse compreender seu desmazelo.

— Eu vou escrever a ele e afirmar sobre sua necessidade íntegra de assegurar o que conquistou. Seu irmão não irá duvidar.

Rhea sentia-se péssima por mentir para o rei Viserys, na verdade. Ele sempre mostrou-se preocupado com a sobrinha, enviando-lhe presentes, felicitando-a assim que soube do dragão eclodido e atendendo seu pedido sobre o treinador. Uma espécie de fosso pequeno fora construído a base de tijolos, repleto de paredes frias em uma das colinas de Pedrarruna, afastado da Baía e do castelo.

Daemon pareceu considerar por um momento. Seu olhar irônico antes preso nela virou-se para uma das paredes, não observando-a, mas como se estivesse conversando consigo mesmo. Ela esperou, controlando sua respiração e ouvindo o coração pulsar aceleradamente com um solavanco bruto.

Certo. Mas possuo uma última pergunta. 

— Sim? — Ela indagou, os dedos das mãos tremendo levemente. Ela engoliu em seco. — Diga, então.

— Quero que me dê sua certeza de que não usará o dragão para fins próprios. Você não possue sangue valiriano e terá sob julgo algo poderoso. — A sombra de perplexidade pairou sobre o rosto de Rhea. Tal consideração não passara por sua cabeça, afinal, estava disposta a esquecer sobre a fera que continha em seus limites territoriais. — Embora tenho conhecimento que sua palavra pode ser válida, ela entra em desacordo quando noto sua ociosidade para com ele.

Daemon. — Ela não costumava dizer o nome dele, mas a ofensa que sentiu criou raízes dentro de si. Ele parecia se importar mais com a fera do que com a filha. Rhea estancou um grito que queimava em sua garganta. — Parece que atrela sua impulsividade à mim. Eu não faria tal coisa, e a coroa é ciente sobre a existência dele. Sim, não oculto meu descontentamento, mas ele não será incomodado até que signifique alguma ameaça.

Daemon revirou os olhos.

— Então considero a voracidade de suas palavras como uma prova de boa fé.

— Tem minha palavra. — A mulher respondeu, notando o corpo que nem percebera tensionar ser sacudido por uma onda de alívio. Ela lambeu os lábios, sabendo que teria de dizer agora e mantendo a voz o mais perto de um tom casual que conseguiu. — Mas há algo que gostaria de informar.

— É claro que haveria uma condição envolvida nesta empreitada. Sou todo ouvidos. — Ele meneou a mão.

— Concordei com um acordo matrimonial entre Hera e meu sobrinho, Rowland. — De uma vez, ela disse.

Daemon levantou-se de supetão.

— O quê?

Sua expressão parecia ter endurecido quando suas mãos envolveram-se atrás do corpo, a Irmã Negra na bainha de suas vestes balançando com o movimento repentino.

Rhea não se abalou.

— Hera é minha herdeira. Casar-se com o primo, um Royce, fará com que não seja questionada.

Daemon praguejou.

— E você julga um menino como aquele digno o suficiente?

Ela se levantou também, seu queixo se erguendo quando olhou para ele.

— Não insulte meu sobrinho perante a mim, Daemon. Não possue direito para tal falta de respeito.

Ele balançou a cabeça, sua mão subindo e passando pela testa. Os pares de tom lilás a encararam através de cílios longos e claros com uma raiva mal contida, externando uma dúvida em seu julgamento e a expressão ríspida dilacerando sua beleza.

Ñuhus talus...— Ele exprimiu entre os lábios comprimidos. Rhea sabia o que era. Alto Valiriano. Mas o significado lhe era desconhecido. — Escreva ao meu irmão sobre o que me disse. Eu aceito. Não quer minha presença neste lugar mais uma vez, eu não me importo. Pelo contrário, desejo isso. — Um peso pareceu ter abandonado os ombros da mulher que segurou um suspiro aliviado, mas que escapou assim que saiu com a presença de Daemon invadindo seu espaço pessoal, as palavras seguintes saindo como sussurros de um decreto que a perturbou. — Mas saiba que o sangue da Valíria canta nas veias de Hera e aquele dragão é a prova disso. Tente fazê-la mundana e trancá-la aqui o quanto quiser, mas não irá funcionar por muito tempo. Ela não é feita para Pedrarruna, e, cara esposa, gostaria de estar aqui para quando ela perceber isso.

Eu odeio você.

Pareceu ser a única coisa que ela lembrou-se de dizer quando um choque de estupor paralisou-a em pé. Seus olhos castanhos se fecharam por um momento, sua língua pareceu pesada e a garganta doeu.

Daemon sorriu.

— Eu odeio você também, querida Vaca de Bronze.

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Quando Daemon Targaryen partiu dias depois após o envio da carta com o consentimento do irmão, montado sob o dorso escamado do Wyrm de Sangue, ele estava vazio por dentro.

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✦ créditos pra duda no pinterest pq isso aqui é muito bom, não aguentei KKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKK

GLOSSÁRIO!

Ñuhus talus — Minha Filha. não tenho certeza se tá 100% certinho, eu peguei de um diálogo em valiriano de uma cena descartada da série que a rhaenyra ia falar sobre a bebê visenya, que seria "ñuhus talus meres", (minha única filha) e dei uma pesquisada e provavelmente o meres ia ser referente ao único. 

E OI, GENTE! quanto tempo que eu não atualizava e peço mil perdões por isso :( em janeiro eu tava em uma era leitora e fiquei — muito — obcecada por todo shadowhunters chronicles e não consegui escrever como eu tinha planejado. agora em fevereiro foi um mês que eu também tive muitas crises de ansiedade e eu mal conseguia me concentrar pra qualquer coisa (ainda estou, mas seguimos firmes 💪🏻) por isso peço desculpas.

sobre esse capítulo, ele não saiu exatamente como eu imaginei, mas sabia que queria focar na rhea (mediante que o capítulo anterior foi no daemon) e gostei do resultado, até, hein

também queria dar alguma datas para melhor compreensão! (e porque a família royce no período jaehaerys i-viserys i-aegon iii é MUITO confusa

✦ a rhea era dois anos mais velha quando ela se casou com o daemon (18 e 16) o que a faz ter nascido em 79 DC. a irmã dela é nove anos mais nova, o que a faz ter nascido em 87 DC, e, como mencionado, casou com o primo delas que também é royce. coloquei a alyssa royce (que é uma das pretendes apresentadas pro aegon iii depois da dança) como filha da josselyn e roderick, além do sor willam que revoga seus direitos e se torna da guarda da rhaenyra futuramente. o gunthor vai ser aqueles parentes que ninguém vê — vibes alphard black de hp — e que prefere viajar, além de ser primo do yorbert (por isso não foi considerado como herdeiro na época que ele escolheu a rhea, o que também não é confirmado que ela seja sobrinha dele, foi só a forma mais fácil que eu achei de ajeitar essa bagunça de parentesco KKKKKKKKKKK) e por fim a josselyn e o roderick vão ter mais dois filhos, o rowland e o gawain. eu vou tentar fazer uma árvore genealógica mais detalhada e anexar no próximo capítulo!

as atualizações infelizmente vão continuar a serem esporádicas, então não posso dar uma data da próxima atualização :( mas não vou abandonar a fic! beijos e até o próximo 💓

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