Quando o amor é pra sempre: A...

By Strange-Boy

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Segundo volume de "Quando o amor é pra sempre", "A história de Gael" conta a história do filho adolescente de... More

[1] prólogo 🏫
[3] arcata court mall 🏬
[4] suco de laranja🍊
[5] parabéns, Chrissie 🎂
[6] o acordo 📝
[7] o incidente ⚠️
[8] os sobreviventes e o memorial ❤️‍🩹
[9] como um relâmpago ⚡
[10] revelações 📖
[11] sou um furacão 🌪️
[12] o circo 🎪
[13] entre o bem e o mal 😇😈
[14] se rendendo ao amor? ❤️
[15] contagem regressiva 🕗
[16] o baile de formatura 🕺

[2] o jogo de basquete 🏀

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By Strange-Boy

As aulas da manhã foram normais. Nada de especial aconteceu. Sempre o mesmo: Eu e Hans com a nossa cumplicidade, conversas jogadas fora e risos por motivos estúpidos, mas com ele qualquer bobeira se tornava engraçada. Caleb, junto de seus amigos Corey e Troye me fuzilavam com os olhos como de costume, e de vez em quando soltavam alguma indireta (ou direta) pra me ofender. 

Exceto quando me chamavam de nerd. Eu sorria torto por conta disso.

Também me chamavam de japa, ou japinha, o que não me atingia nem um pouco por mais que pudesse ter um sentido ofensivo. A primeira coisa que eu lembrava com isso, pra falar a verdade, era que esse era o apelido carinhoso que meu melhor amigo havia escolhido pra mim.

Na parte da tarde, me encontrei com Hans próximo ao colégio para irmos juntos para as aulas de basquete. 

Enquanto caminhávamos pra quadra, Hans estava me contando como foi o passeio com sua namorada, a Chrissie. 

— Ela cismou de andar aquele shopping inteiro. Nossa, eu juro que tô com os pés doendo até agora.

— Bom, mas é uma novidade na cidade, né, ainda mais por ser uma cidade pequena, qualquer coisa aqui vira novidade, dá um desconto. Deixa ela! 

— Mas te juro, foi o shopping todo. Ela quis entrar em tudo quanto é loja. — Hans bufou.

— E não foi bom o tempo que passou com ela, Hans? — fiz uma cara de desaprovação.

— Claro que foi! — ele sorriu. — Só isso já compensa!

— Então para de reclamar, chatão.

— A melhor parte foi quando a gente tomou sorvete e... Ah não. — o semblante feliz de Hans se transformou em espanto. — O que esses idiotas tão fazendo aqui?

Olhei para a direção do olhar dele e me deparei com o trio, é óbvio, nas arquibancadas da quadra de basquete. 

— Não acredito. Devem estar aqui só porque não tem nada melhor pra fazerem. Só vamos ignorar e pronto. — falei.

Hans suspirou e seguimos até a quadra.

— Prontos? Só faltavam vocês dois. — o professor acenou pra gente. — Ah, e agora os seus colegas Caleb, Corey e Troye fazem parte da equipe de basquete também. Vamos dar as boas vindas pra eles. 

— Como? — franzi o cenho.

Eu não acredito. Não estava acreditando nisso! Será que eu ia ser obrigado a sair do basquete? Que droga. Eu gosto tanto de basquete. 

— Algum problema? — Troye se posicionou na minha frente com seus braços cruzados. 

Troye e Corey não eram cobiçados atoa. Eram muito bonitos também. Troye tinha uma altura semelhante a de Hans e o cabelo preto, curto, mas todo bagunçado. Já Corey eu nem sabia, de fato, como era o seu cabelo. Isso porque ele sempre andava de toucas, com blusas e bermudas muito maiores que o seu corpo comportaria, num estilo bem skatista. Também pudera, vivia andando com o seu skate pra cima e pra baixo. Seus olhos eram verdes como um par de esmeraldas brilhantes. Seriam hipnotizadores se ele não fosse tão idiota.

— Tem sim, vocês adoram implicar com todo mundo. — eu respondi.

— Ah, seu fedelho, vê se abre esses olhos, não vai enxergar nada assim! — disse e puxou o canto dos seus olhos com os dedos indicadores. 

Não demorou alguns segundos para que muitas pessoas já começassem a rir e me subiu uma certa raiva. 

— Melhor não abrir os olhos não, Gael. — Hans disse, tentando retrucar a ofensa. — Caso contrário, você pode levar susto com a cara horrível desse aí. 

Eu não aguentei e tive que rir. Os risos voltaram, mas dessa vez estavam em maior quantidade. Até mesmo Corey e Caleb riram.

— Como é que é!? — Troye partiu enfezado pra cima de Hans.

— Ei, ei. — o professor o afastou com o braço. 

— Vamos resolver isso no jogo, vocês não querem jogar!? — Hans perguntou.

— Você tá me ameaçando? — Troye retrucou.

— Experimenta. — Hans piscou um olho. 

Começou um alto borburinho das pessoas nas arquibancadas, uma mistura de aplausos, risos e vaias. Óbvio que tinham os adoradores do trio, mas ao mesmo tempo eles tinham aqueles que os odiavam. 

O professor ordenou que os alunos que não estivessem uniformizados ainda fossem se trocar pra começarmos o jogo.

Obviamente os três ficaram num time oposto ao que eu e Hans fazemos parte.

E assim passamos horas da tarde jogando. Tive que aguentar ouvir as mesmas piadinhas de sempre daqueles três. Implicaram bastante com a gente, marcaram eu e Hans praticamente o jogo inteiro e eu me tremia de nervoso quando era Caleb perto de mim, alternando seu olhar penetrante entre meus olhos e a bola de basquete. 

No fim das contas, a equipe deles acabou ganhando da nossa.

Assim que começou a comemoração, estava explodindo de raiva e não quis ficar pra ouvir mais nada. Peguei minha mochila e andei apressadíssimo para o vestiário. 

Olhei para atrás quando ouvi Hans chamar meu nome, mas só sinalizei ele pra vir comigo mais rapidamente. 

— Eu sei que dá raiva, cara, mas é só um jogo. 

— É só um jogo, mas é contra aquele trio. — expliquei.

— Eu sei, mas releva. — Hans sorriu torto enquanto entrava em uma das partições dos chuveiros, tirando a roupa.

— Não dá não. — retruquei, também tirando a roupa rapidamente devido ao tamanho do meu ódio.

— Eu vou aproveitar o resto do dia com a Chrissie, rapidinho esqueço desses babacas aí. 

— Sorte sua que tem uma namorada pra aproveitar o dia assim. — liguei o chuveiro e senti aquela água gelada percorrendo meu corpo da cabeça aos pés. — Queria eu poder aproveitar o resto do dia pra esquecer disso tudo. Que ódio! Que inferno!

— Relaxa, cara, você anda muito estressado!

— Não me peça excessos.

Hans riu e continuamos tomando banho.

— Escuta, japa, precisamos ir em alguma festinha pra eu poder descolar um namoradinho pra você.

— Descolar? Alguém ainda usa essa palavra? — levantei minha sobrancelha e soltei um riso frouxo enquanto olhava pra ele.

— Eu uso, não ouviu?

— Idiota. — joguei água nele. — Um "namoradinho" não é tão simples assim de achar. Não é assim que acontece.

— Ué, tudo pode acontecer.

— Comigo? Tudo de ruim, só se for.

Fechei o chuveiro e peguei a toalha, me enxuguei rapidamente e já fui vestindo minha roupa. 

Hans fez o mesmo enquanto suspirou já impaciente com o meu estresse e viu que no momento já não tinha nenhum jeito para apaziguar essa situação. 

— Bom, cara, se você quiser, minha oferta está de pé, vamos ver algum dia pra gente sair assim e se distrair, no mínimo. Afinal, sou teu amigo ou não sou?

— Claro, né, Hans, é o único amigo que eu tenho aqui. — ergui minhas sobrancelhas pra ele enquanto terminava de calçar meu tênis.

— Ótimo. — ele terminou de vestir sua blusa. — Eu vou indo lá, tenho que encontrar com ela porque já passou até da hora.

— Aproveita. — sorri.

— Valeu. — ele se apressou pra sair.

— Ei, Hans.

— O quê? — ele se virou rapidamente.

— Obrigado por ter essa paciência comigo. — ri. — Você é o melhor amigo que já podia ter.

— Para de palhaçada e deixa de frescura. — ele riu torto e balançou a cabeça, saindo de vez do vestiário. 

Peguei minha mochila e caminhei pra saída também, mas alguns jogadores do time oposto entraram. Todos gritavam num tom tão alto que chegava a ser desconfortável, e assim que me viram começaram a me vaiar e me chamar de perdedor. Principalmente Corey e Troye. Caleb não estava com eles.

Eu juro que poderia bater em todo mundo com a raiva que eu estava sentindo, mas me controlei e só revirei os olhos, caminhando pra saída.

Conforme o som da algazarra ia ficando mais longe, eu cheguei na porta do vestiário, mas estava sendo barrada por Caleb. 

Ele estava encostado com o seu ombro no portal da saída, com uma perna em frente da outra e de braços cruzados, olhando pra mim com um semblante de deboche em seu rosto. 

— O que é que você quer? — perguntei, sem sentir absolutamente nada além de ódio naquele momento.

— Te parabenizar. 

— Ficou maluco!? — fiz uma cara de quem não estava entendendo nada. 

— Só porque quero te parabenizar? Ah, que isso, japinha.

Revirei os olhos e desviei o olhar.

— Me deixa passar, por favor.

— Mas nem quer saber o porquê dos parabéns?

— Não. — olhei sério pra ele.

— Que pena, vou dizer mesmo assim. — Caleb riu. — Por ser esse perdedor. Continua assim que vai ganhar o troféu de perdedor do ano, com certeza! Quem sabe seu amigo fique até no segundo lugar.

— Posso ter perdido pro seu time hoje, mas não sou perdedor. — fitei seus olhos enquanto falava e ele arqueou as sobrancelhas, sério. 

Avancei pra fora do vestiário e quase derrubei Caleb quando esbarrei forte em seu ombro ao passar por ele. Eu já havia pedido licença.

Não olhei pra trás, mas pude perceber de relance a sua expressão de suspresa. Ele não disse mais nada.

Sim, hoje eu estava com muita raiva. Eu já disse isso? Pois bem, era bom não testarem minha paciência. 

Havia combinado com o meu pai Scott dele me buscar hoje, já que ele havia tirado o dia de folga. Atendi a sua ligação no celular e fui encontrá-lo na entrada da escola. 

Entrei no carro. 

— Oi, filho. 

— Oi, pai. — bati a porta.

Coloquei meus fones de ouvido pra ouvir música no meu celular. 

— Ih... 

— O que foi? — olhei pra ele.

— Aconteceu alguma coisa hoje?

— Muitas coisas, mas nada demais. Só estou estressado. — virei a cabeça e a encostei na janela. 

— Hum... — saiu dirigindo. — Se quiser falar comigo sabe que estarei sempre aqui.

— Uhum. Obrigado, pai.

Percebi seu semblante de preocupação, mas que logo se transformou em um riso breve. 

— O que foi? — perguntei, ainda olhando lá pra fora do carro.

— Você é igualzinho ao seu outro pai. — ele disse enquanto saía com o carro para as ruas. 

— O que quer dizer com isso? — olhei pra ele curioso, abaixando mais ainda o volume da música. 

— Seu outro pai sempre teve um mundo só dele. Ele andava pra cima e pra baixo com aquele discman dele na época da escola. 

Discman? — ri. 

— É, ué, ou você acha que já tínhamos smartphones nos anos 80?

— Claro que não, é que eu não lembro direito do que é um Discman, embora eu já tivesse ouvido falar. — fiquei pensativo. 

— Era um aparelho onde você podia colocar seus CDs de música, um fone de ouvido e se fazer ouvindo qualquer música que você quisesse. 

— Ah, sim... — sorri levemente. 

— Acho que cada um tem sua maneira de se isolar do mundo. Todos nós precisamos desse momento de vez em quando.

— É sim.

— Era a música e os quadrinhos que ele adorava ler por horas.

— Eu não leio quadrinhos, mas leio livros.

— Você lê até bastante, filho. A música e os livros ajudam muito nisso de se isolar do mundo, né? — ele olhou pra mim.

— Com certeza. 

Percebi o esforço do meu pai pra puxar assunto comigo, ou então até me ajudar a me abrir com ele. 

Mas ficou um silêncio enquanto estávamos parados no sinal vermelho. 

— Pai.

— Hm? — murmurou sem deixar de se atentar ao sinal. 

— Por que você gostou tanto assim do meu outro pai?

— Ora... A gente não escolhe quem ama. 

— Como assim?

— É como se o coração escolhesse por você, sei lá. — ele riu. — O Harry sempre foi tão incrível. Eu o admirava tanto. Até hoje, óbvio. 

— Mas vocês não eram... Muito diferentes?

— A princípio sim. 

— Lembro que me contou como vocês dois se encontraram do nada naquela loja de quadrinhos. — ri. 

— É. — ele também riu. — Nenhum dos dois achou que o outro gostava de quadrinhos, e de videogame, e das mesmas músicas... Descobrimos com o tempo que combinávamos e muito um com o outro. Foi como ir cavando numa mina de tesouros e ir descobrindo cada jóia mais valiosa que a outra. 

— Pai, vocês são muito melosos, sabia?

— Sabia. — ele avançou com o carro após o sinal abrir.

— E bregas. Muito bregas também.

Ele fez um beicinho, ameaçando um choro falso.

— Mas eu amo isso. — completei com um sorriso. 

— Que bom. — sorriu de volta. — Sabe... Claro que também temos nossas diferenças, mas isso faz a gente se encaixar ainda mais.

— Claro. 

Logo depois chegamos em casa. 

— Sabe... — meu pai disse enquanto tirava o cinto. — A gente aproveitou o dia hoje pra chamar alguns colegas hoje pra jantar aqui. 

— É a Robin!? — exclamei com um enorme sorriso no rosto. Amava a Robin e estava com muitas saudades dela. 

— Não, filho... — ele soltou um riso. — Infelizmente não. 

— Ah...

— Mas um dia ela vem, prometo. São colegas de trabalho do seu outro pai, professores, que você ainda não conhece e nem eu. 

— Ah sim, legal. 

Saímos do carro e entramos em casa. Meu pai Harry havia chegado há pouco tempo da faculdade onde dava aula, todo apressado.

— Oi, meninos, preciso correr e ir preparando o jantar. — parou pra me dar um beijo na testa e um abraço forte. — Contou pro Gael?

— Contei sim. — meu pai Scott respondeu enquanto retribuiu o abraço e o beijo do meu outro pai.

— Que bom, logo logo eles chegam pro jantar. — meu pai Harry disse enquanto o beijo, para minha infelicidade, havia se transformado num beijo de língua.

— Gente, que nojo! Dá pra vocês fazerem isso no quarto!? — saí apressado ao subir as escadas enquanto balançava a cabeça.

Só ouvi eles rindo enquanto segui para o meu quarto. Larguei a mochila no chão e abri meu guarda roupa para escolher o que ia vestir para esse jantar.

Minhas roupas não eram muito simples. Tinham camisas estampadas de bandas de rock e coisas que muitas pessoas, principalmente as populares, considerariam estranhas. A cor que eu mais usava definitivamente era preto. Escolhi algo menos chamativo, mas ainda assim era uma camisa preta, e acabei optando por usar uma bermuda rosa. 

Por que tantas pessoas associavam o rosa a meninas e o azul a meninos? Sempre me perguntei isso e juro que até consigo entender um pouco, porque acabou virando um simbolismo, mas mesmo que seja assim, não quer dizer que o outro gênero não pode gostar da cor "oposta". 

Sempre gostei de preto e rosa.

Não foi atoa que pintei meu cabelo de rosa uma vez, talvez pintasse algum dia no futuro, mais uma vez. 

Não tirei as pulseiras que eu usava sempre, nem mesmo o meu cordão da sorte que estava sempre no meu pescoço, mas pra acompanhar, escolhi usar uma gargantilha prata e um brinco da mesma cor.

Me olhei no espelho e decidi que já estava pronto. 

Eu gostava de como estava vestido, o problema é o que as outras pessoas iam pensar. Eu só queria ser mais aceito, de alguma forma. Estava cansado de ser o garoto estranho que ninguém queria se aproximar ou conhecer melhor.

Deitei na cama pra continuar lendo por alguns minutos enquanto os colegas do meu pai não chegavam pro jantar. O tempo passou rápido.

— Filho, vamos? — meu pai Harry disse ao bater na porta do meu quarto.

— Eles chegaram? — perguntei, fechando o livro.

— Sim, o jantar já está pronto também.

Levantei a abri a porta. 

— Sei que tem vergonha de conhecer pessoas novas, mas vamos, está tudo bem. Eu vou descer com você. — ele estendeu seu braço esquerdo pra mim, esperando que eu o abraçasse de lado. 

— Tá bem. — sorri e correspondi ao abraço. 

Descemos juntos e abraçados de lado. O som do meu outro pai conversando com as visitas na mesa que ficava em uma parte da nossa sala ia chegando cada vez mais perto.

— Então... esse aqui é o nosso filho. — meu pai Harry me abraçou forte de lado.

Um casal se virou pra nós junto com uma garota que aparentava ter uma idade próxima a minha. 

O homem tinha um cabelo grisalho e lindos olhos azuis. A mulher tinha a pele negra, olhos castanhos que brilhavam ao me ver e usava um turbante de tom vermelho, combinando com o seu batom.

— Boa noite, Gael! — os dois falaram em uníssono. 

— Boa noite. — a menina também disse.

— Boa noite. — sorri levemente. 

Meu pai foi me conduzindo até a mesa, onde sei na cadeira que estava entre ele e meu outro pai. Do outro lado da mesa, estava na respectiva ordem: A mulher, a menina e o homem. 

— Essa é Aia, minha colega de trabalho lá da faculdade. — meu pai Harry começou a apresentar. — ela é professora de várias disciplinas. 

— Muito prazer. — eu disse acenando minha cabeça.

— Igualmente, Gael. Meu nome é Aia. — ela estendeu a mão pra mim. Eu a cumprimentei. 

— Sou o Esteban, Gael. Prazer. — foi a vez dele de estender a mão para eu também cumprimentá-lo. 

— Prazer.

— Vamos, filha. — Aia disse para a menina.

— Se apresente também. — Esteban continuou.

— Oi, meu nome é Ana. 

Ana era negra como sua mãe e possuía os olhos azuis do pai. Estava usando uma trança que caía pelo seu ombro direito. 

Ela não estendeu a mão, então eu também não o fiz.

— Muito prazer, Ana. 

Graças a Deus as apresentações já haviam terminado. Eu odeio ser o centro das atenções e só queria ficar quieto no meu canto enquanto jantava com eles, apesar de serem adoráveis. É só o meu jeito introvertido mesmo.

— Bom, como você já viu, essa é a família da Aia. — Harry sorriu.

— E falando em você, Aia... — meu pai Scott voltou a falar enquanto terminava de nos servir com o espagueti que meu outro pai havia cozinhado. — Nem terminamos de conversar sobre isso, você então tem bastante disciplina pros universitários?

— Nossa, nem me fala...

Aia continou a falar, mas minha atenção fugiu enquanto peguei o meu prato. Além disso, Ana havia me abordado.

— Você tem descendência japonesa? 

— Ah, na verdade meus pais biológicos eram japoneses. 

— Legal. E o que você faz de bom?

— Como assim?

— Da vida, ué. 

— Eu estudo, leio livros, escuto música...

— Só isso? 

— Calma, ainda não terminei... — já comecei a ficar frustrado. — Eu também jogo basquete e tênis.

— Nossa, que incrível. — ela falou em tom de deboche com um sorriso enquanto pegava no copo para beber um gole. — Você não sai com amigos ou algo do tipo?

— É bem difícil, na verdade eu só tenho um amigo e ele ainda namora.

— E você não namora?

— Não.

Os adultos estavam muito entretidos conversando enquanto eu e Ana continuávamos nessa conversa só de nós dois.

— Ai, Gael, você precisa fazer mais amizades, se divertir mais então! 

— É, talvez. — ri, sem graça e olhei pro prato. Pelo menos eu podia escapar um pouco dessa conversa enquanto comia. 

— Você é gótico? Estou vendo pela sua camisa preta, suas unhas pintadas de preto... Nem sabia que meninos estavam pintando as unhas agora. Talvez as pessoas tenham dificuldade de fazer amizade com você por causa dessas coisas. 

O que era isso? Um interrogatório? Uma entrevista onde alguém me imprensava contra a parede? Eu já não estava mais aguentando tanta pergunta indiscreta sobre mim. 

— Góticos não usam rosa. — apontei para a minha bermuda. 

— Sei lá, né, tem tantas variações hoje em dia. — ela deu de ombros e enrolou o macarrão no garfo.

— Ah, Gael. — Esteban me chamou. — Por que não conta pra gente o que você pensa em fazer quando for pra faculdade? Estava contando pros seus pais agora mesmo que a Ana pensa em ser professora assim como a mãe dela e o seu pai Harry. 

— Eu...

Tentei esboçar alguma coisa, mas não saia nada e ficou um silêncio horrível de desconfortável. Eu não havia pensado muito nisso, mas não fazia ideia do que cursar na faculdade.

— Algum problema, filho? — meu pai Harry perguntou ao me olhar preocupado.

— Eu acho que eu não tenho nada em mente até então.

— Ah, isso é normal. — Aia abanou o ar com sua mão direita. — Não se pressione, filho, um dia você vai descobrir o que gosta de fazer. 

Sorri torto e acenei positivamente com a cabeça. 

— É, acaba sendo muito cedo pra essas crianças decidirem essas coisas. — meu pai Scott disse em meio a um riso. 

— Sim, com certeza. Confio que logo seu filho vai acabar descobrindo algo também! 

Eles continuaram conversando entre si e Ana, pra minha infelicidade, fez mais uma pergunta. 

— É você ali naquela foto de cabelo rosa? — apontou para um porta retrato que estava em cima de uma cômoda atrás de mim. 

Me virei pra olhar. 

— Sim, sou eu, na época que meu cabelo era rosa sim.

— Você gosta de rosa mesmo, hein.

— Sim. — afirmei.

— Você não tinha medo de ninguém implicar com você por conta do seu cabelo com essa cor?

— Não. 

Ana suspirou e demos mais algumas garfadas no espagueti. Estava completamente desconfortável de estar ali na frente dela nessa entrevista que eu não havia pedido. O pior é que ela não se tocava, continuava a dar palpites sobre mim e a me questionar.

Ela estava me julgando, assim como muitas pessoas pareciam saber só fazer isso durante minha vida inteira. 

— Sabe, Gael, talvez seja esse mais um problema pelo qual você não consegue fazer amizades. Estou aqui puxando o maior assunto com você, e suas respostas são todas monossilábicas. 

Será que é porque eu não quero conversar com você?

Eu não gosto de pessoas inconvenientes. 

— Eu sempre fui muito extrovertida. — ela insistiu.

— Eu não.

— Vê se muda isso. É pra te fazer bem, você é um cara com um potencial legal, só precisa de um empurrãozinho pra mudar algumas coisas em você. — ela sorriu. 

Um cara com um potencial legal...

Eu arrastei minha cadeira pra trás e me levantei. Foi a minha reação. Não deu pra esconder. Com isso, todos pararam de conversar e olharam pra mim com uma certa surpresa em seus rostos.

— O que foi, Gael? — meu pai Scott perguntou. 

— Vocês podem me dar licença? É que eu preciso subir, já estou satisfeito e...

— Ele tá mentindo. — Ana disse. — Foi alguma coisa que eu comentei, Gael? Pode falar, não seja um fujão, nem um mentiroso.

— Ana! Que modos são esses!? — Aia elevou a voz para a filha. 

— Desculpa... Essa menina anda com uns modos... Não a criamos assim. — Esteban disse pros meus pais, todo sem graça. 

Acho que meus pais nem sabiam o que falar. 

— É que eu só estou dando umas dicas pro Gael pra ele ir ficando menos esquisito e mais amigável, sociável, coisas assim sabe?

Eu estava morto de vergonha. Olhei para o chão e suspirei, não estava sabendo o que fazer, como agir, o que fazer com os braços. 

— Ana, já chega, está destratando o seu colega. 

— Destratando como!? Ele deveria agradecer minha ajuda! — ela se levantou. — E ele nem é meu colega!

— Ana! — a mãe repreendeu novamente, mas nada parecia fazer efeito. 

— Eu quero ir embora. — Ana respondeu. — Estou esperando no carro. Boa noite a família e obrigada pelo jantar! — ela saiu andando depressa pra fora de casa. 

— Desculpe... Eu não sei nem o que dizer... — Esteban apoiou a mão na testa. 

— Eu nem sei por onde começar, mas essa menina precisa de modos, imensas desculpas a vocês, principalmente ao Gael. — ela olhou pra mim.

— Está tudo bem.

— Olha, não tem problema, vocês podem voltar aqui algum outro dia... — meu pai Harry comentou.

— Agora é melhor irmos embora, mas agradeço imensamente a sua hospitalidade, Harry... — Aia falava enquanto se levantava. 

— Boa noite, obrigado pela visita. — eu disse aos dois forçando um sorriso e subi apressadamente para o meu quarto. 

Sentei na minha cama e comecei a tirar meus acessórios. Tirei minha gargantilha, o meu brinco, a minha camisa preta... Eu queria me despir de mim! Queria simplesmente não ser mais eu!

Que raiva. Que ódio! 

Suspirei e aos poucos fui me acalmando, até de repente alguém bater na minha porta. 

— O que foi?

— Posso entrar? — meu pai Harry perguntou.

— Pai, talvez agora... Eu não sei.

— Filho, só quero conversar com você... Mas se quiser eu vou embora. 

Ele estava com uma carinha tão triste e preocupada que eu não podia dizer não de forma alguma. 

Meu pai Harry dizia que antigamente não precisava usar óculos sempre, mas hoje em dia precisa por conta da sua miopia. Isso fazia dele mais nerd ainda. 

Meu outro pai adorava. 

— Aquela garota foi muito sem noção, não acha? — ele se aproximou de mim e sentou do meu lado na ponta da cama. 

— Ah, pai. Talvez ela esteja certa.

— Nem um pouco!

— Eu sou um desastre. — respirei fundo, fechei meus olhos e abaixei minha cabeça. Estava me sentindo tão cansado.

— Ah, meu querido, não fala uma coisa dessas. — ele começou a fazer cafuné ao mesmo tempo que penteava meus cabelos. — Você é tão lindo e especial. Tava tão lindo hoje pro jantar. 

— Eu não sei. As pessoas parecem ter medo de mim, ou até me odiar. 

— Se fazem isso é porque são completamente estúpidos e preconceituosos. Não sabem o que estão perdendo de ter você como amigo. 

— Eu sou sempre o garoto estranho que não se encaixa em lugar nenhum. 

— Todo mundo tem um lugar pra se encaixar. — ele me deu um beijo na cabeça. — Só temos que achar onde pertencemos realmente. 

— Com todo o respeito, mas acho que pra você e o meu pai é fácil falar... Vocês tinham seus amigos, como por exemplo a Robin. 

— É fácil imaginar que era fácil. — ele riu. — Filho, eu também tinha muita dificuldades pra fazer amizades. Até eu encontrar o meu lugar, estar com as pessoas que me amavam e me aceitavam de verdade, também passei por uma jornada. Não é fácil. A vida não e fácil e a gente tem que batalhar muito nos nossos caminhos que temos pra trilhar, o importante é acreditar no seu coração e em quem você é de verdade. Você é forte, sempre batalhou muito na sua vida e sei que vai fazer isso até o fim. Sou seu pai, conheço você. Nunca use máscaras para agradar pessoas e atrair falsos amigos. Nunca deixe de ser quem você é.

Eu olhei sério pra ele. 

— Mesmo que isso faça de mim um garoto estranho?

— Podem usar os rótulos que quiserem. Você sempre vai ser o meu menino, com um coração gigante e personalidade única. Você é único. — ele me deu um beijo na bochecha.

— Ai, pai, tá bom, chega de beijo. — eu ri. 

— Pelo menos arranquei alguns risos seus, viu?

— É, eu sei. Você é muito bobo!

— Por falar em único, sabia que cada um de nós é um ser único mesmo com mais de sete bilhões de pessoas no planeta? 

— Ah, para. Tem pessoas que compartilham dos mesmos gostos, são parecidas fisicamente também e...

— É, mas ninguém vai ser exatamente como alguma outra pessoa em cada detalhe, gosto, medo, caráter, personalidade, objetivos, história de vida e zilhões de outras coisas. Gael, não existe e nunca existirá ninguém igual a você, ou igual a mim, ou igual ao seu outro pai. E é essa uma das coisas que nos faz indivíduos singulares, únicos, especiais. 

— Caramba, pai... — ele realmente me deixou surpreso de alguma forma. — Você tem mesmo razão.

De repente, levamos um susto quando um barulho alto veio da porta do quarto.

— Scott!? — meu pai exclamou. 

Ele havia tropeçado na porta, caiu sobre minha mochila e espalhou vários, vários papéis pelo quarto.

— Ai... — fez uma cara de dor. — Filho, me desculpa...

— Eu não acredito que você estava escutando a conversa atrás da porta. 

— E daí se eu estivesse? Por acaso vocês dois estão guardando segredos entre vocês, é? — olhava enfezado enquanto levantava do chão.

— Os anos passam, mas nada muda. — meu pai Harry riu. — Continua o mesmo bobalhão e desastrado de sempre...

— Quem é bobalhão? — meu pai Scott se jogou em cima de nós dois e começou a fazer cócegas na gente, e como sentíamos cócegas!

 De repente, uma energia alegre contagiou o quarto com as risadas altas que eu e meu pai Harry soltávamos. Eu não saberia dizer quem de nós dois sentia mais cócegas.

— Para! Já chega!

— Chega, pai, por favor! 

Ele parou de fazer cócegas, rindo e ofegante, deitando do meu outro lado. 

Sorri e olhei para os meus pais.

— Eu amo vocês. — eu disse.

— Também te amamos. 

— Também te amo, filho. 

Os abracei bem forte.

O que seria da minha vida sem eles dois? Sem Hans? Eram minha base. 

— Tudo o que o seu pai disse é verdade. — disse meu pai Scott, se referindo ao meu pai Harry.—Jamais poderia duvidar da minha confiança nele, há razão em tudo o que ele te disse. Você entendeu bem, filho?

— Entendi...

— Não importa o que aconteça, nunca deixe de gostar de ser quem você é. Nunca deixe de ser o Gael que tanto amamos. 

— Não há nada em você que mudaríamos, filho, nada. — meu pai Harry completou.

— E dessa mesma forma, também há de conhecer pessoas que não mudariam absolutamente nada em você. — meu pai Scott sorriu de orelha a orelha. 

Eu também sorri. 

Ficamos os três mais um tempo assim até trocarmos os nossos boa noite de sempre.

Eu não poderia pedir uma família melhor que essa. 

Embora tenha acontecido aquele jantar desastroso, nessa noite eu fui dormir feliz. 

"Não importa o que aconteça, nunca deixe de gostar de ser quem você é. Nunca deixe de ser o Gael que tanto amamos."

"Não há nada em você que mudaríamos, filho, nada."

"E dessa mesma forma, também há de conhecer pessoas que não mudariam absolutamente nada em você."

Pessoas que não mudariam absolutamente nada em mim...

É verdade...

Vocês e Hans não podem ser os únicos...

FIM DO CAPÍTULO

Em breve tem mais, espero que estejam gostando! <3














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