Remember ◆ Snupin

By FadaDoCafe

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Hogwarts parecia abraçar o térreo da solidão e melancolia que o dia pedia. Como se nem toda a magia e ancestr... More

What haunt us

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By FadaDoCafe

Hogwarts estava mórbida.

Os candelabros enfeitiçados mal iluminavam os corredores, poucos alunos vagavam por ali, a maioria já em seus salões comunais, ou no grande salão aproveitando os últimos minutos do jantar.

Remus Lupin sentia uma leve dor de cabeça e uma enorme fadiga causada pelo dia agitado, seu corpo doía e o que mais desejava era um banho quente e paz. Hoje era um dia penoso no qual tinha que se fazer forte, uma data na qual ele facilmente dormiria durante sua duração inteira para fugir de forma sábia. Sua vontade no geral era de chorar feito bebê, mas era um adulto, não uma criança desamparada, não poderia agir dessa forma.

Por isso ele caminhava em passos lentos e longos pelos corredores úmidos e precariamente iluminados das masmorras, sentindo o cálido frio da umidade, combinava com seu humor, constatou com amargor ao observar as rochas sombrias e a mísera iluminação esverdeada que entrava refletindo o lago.

O lobisomem passou pelo quadro do salão comunal usando seu título de professor, o que seu adolescente interior amava fazer, afinal fora um maroto, ter acesso livre ao comunal da sonserina era extasiante mesmo sendo mais velho. O moreno recebeu muitos olhares desconfiados e até mesmo atravessados em sua direção, houve cumprimentos, afinal elegância era algo que cercava a casa das cobras.

Era quase cômico como a Sonserina desconfiava até da própria sombra, mas tinha um peso na lealdade quase inquebrável, por isso Remus resolveu sabiamente ignorar os murmúrios, e até mesmo os possíveis riscos de ser pego em alguma brincadeira. No geral, ele era o único do corpo docente que não caía em pegadinhas, sempre as achando, revelando-as no maior tom de esnobe. Remus Lupin cresceu com Sirius Black e James Potter, junto deles aprontou mais por Hogwarts do que aquelas crianças poderiam imaginar, fazê-lo cair em alguma traquinagem não seria apenas difícil, como honroso.

— Professor Lupin! — Uma menina usando o uniforme todo desleixado se pôs na sua frente. — O que o senhor faz por aqui? Digo, não que não possa, apenas-

— Só preciso falar com o professor Snape, não precisam ficar nervosos.

— Na verdade, é exatamente por isso que estamos nervosos — a garota murmurou, mordendo o lábio por fim. Remus ergueu a sobrancelha. — Veja, eu acho melhor o senhor falar com o Professor Snape amanhã — aconselhou. — Ele falou que não receberia visita nem se fosse a rainha, e ele não estava amistoso.

— Snape não é amistoso, no geral.

— Sabemos. — Ela riu. — Mas, sério, hoje ele está impossível, e já foi para o seu escritório e eu agradeceria se não fosse perturbá-lo para ele não perturbar a gente — ela choramingou..

Lupin sorriu mesmo querendo revirar os olhos, tão Severus.

— Correrei o risco, obrigado mesmo assim... — Tentou lembrar o nome da menina.

— Sarah.

— Certo, obrigado, Sarah. — Tocou no ombro dela ao passar do seu lado. — E não se preocupe sobre ele perturbar vocês.

Lupin voltou a caminhar e apenas ouviu um suspiro provavelmente vindo da aluna, resolvendo por fim ser incisivo e rápido ao falar com o diretor da sonserina. Não gostaria de mais problemas e dor de cabeça do que já possuía, e Severus conseguia, com maestria, tirá-lo do eixo quando esforçado, o que comumente era, e se até mesmo com seus protegidos alunos ele estava sendo infeliz, quem dirá consigo.

— Snape, Minerva pediu para, ah-

Remus se calou ao entrar no escritório do professor, sem bater, e vê-lo em uma meia luz. Severus estava sentado sobre sua mesa que continha apenas uma tábua de frios e duas garrafas de vinho.

— Boa noite para você também, Lupin.

— Hum, eu não queria atrapalhar, a diretora Minerva pediu para avisá-lo sobre o discurso de homenagem amanhã.

— Certo, hoje o luto e amanhã comemoramos — o homem respondeu amargo, deboche pingando os lábios.

— Está piegas? — A provocação saiu antes mesmo de sentir a frase se formando em sua mente.

— O suficiente para fugir dos meus alunos e vir beber durante a semana. — Snape arqueou a sobrancelha em deboche, arrancando um sorriso fino de Remus, que não esperava a resposta franca e até leviana.

— Eu pretendia me afundar em Firewhiskey, mas infelizmente ministro o primeiro horário dos calouros da lufa-lufa — Lupin lamentou, se escorando no batente da porta.

— Meus pêsames.

— Eles não são tão ruins.

— De fato. — O sonserino bebeu mais um gole farto da taça. — São horripilantes.

— São novos, nós também éramos energéticos nessa idade. — Estalou a língua no céu da boca, a defesa era uma meia verdade, aquela turma era péssima mesmo, mas não deixaria Snape sair como certo ao julgar os alunos de uma casa rival.

— Fale por você e seus amigos grifinórios.

— Eu lembro de um certo sonserino bem empolgado e animadinho com as aulas de magia, principalmente se envolvessem duelos e poções — Remos ditou em tom de deboche, arrancando um bufar junto de um revirar de olhos de Snape.

— Tolice!

— Você era fofo, todo sabichão e fazendo drama com sua capa. — Lupin ergueu as mãos no ar as abrindo e fechando como se apertasse algo, esse algo em sua mente eram as bochechas gorduchas do pequeno Severus, ele que não usasse de legilimência agora.

— Está engraçadinho hoje.

— Ao menos tentando, falava sério sobre o firewhiskey. — Fez uma careta franzindo o nariz, como gostaria de afogar as mágoas em álcool.

— Não sei sobre se afogar, mas talvez uma taça de vinho não o mate-

— Está me chamando para beber contigo, Severus? — interrompeu um tanto em choque.

— Talvez. — Severus pegou sua varinha transfigurando um dos itens da sua mesa em uma nova taça, a servindo em seguida.

— Não me farei de rogado — o grifinório respondeu ao adentrar o escritório, sentando na cadeira à frente de Severus, o homem deu um sorriso fino. —  Não sou muito bom nisso, afinal.

— Mantenha a boa educação e as vestes, Lupin. No mínimo — o homem de cabelos negros satirizou antes de beber um bom gole do líquido alcoólico.

— Você entendeu, Severus — Remus respondeu resignado com as bochechas rosadas, o que fez Snape sorrir com deboche para aquilo, a última vez que vira Remus corado fora na adolescência. — Crueldade.

Ambos sorriram cúmplices antes de beberem o conteúdo de suas taças ao mesmo tempo. O silêncio que recaiu não era confortável, tal qual não era cômodo, porém ele era moldável, como se encaixasse na dor singular de cada um deles, se moldando ao redor dos dois homens, apertando os peitos e trazendo uma dor ímpar aos âmagos.

A penumbra se alojou sobre os homens, ambos presos em suas próprias mentes conturbadas e culposas, trazendo à tona as razões das tendências alcoólicas e melancólicas daquela noite em especial.

— Um galeão por seus pensamentos. — Remus resolveu cortar o silêncio e sua linha de raciocínio antes que acabasse chorando em frente ao homem, seria humilhante.

— Dobre a oferta.

— Lembre-se que sou professor como você. — Tentou brincar ao mencionar os salários, mas Snape não esboçou reação alguma.

— Não sei se deseja meus pensamentos, Lupin. — O sonserino lambeu o lábio que continha um pouco de vinho, deixando a taça na mesa.

— Tente. — O lobisomem cruzou as pernas, usando seu joelho superior como apoio, pendeu o braço, coluna ereta e olhar fixo no bruxo na sua frente.

— Certo. Vejamos... — Snape iniciou a fala baixo, parecia preso em seu próprio mártir de pensamentos. — Muitas vezes me pego lembrando de Lily, de nossa amizade, momentos juntos e de como me via perdidamente apaixonado nela, eu digo com tranquilidade que meu eu adolecente faria até mesmo poesia sobre seus olhos e cabelos.

— Esse não é um pensamento tão incomum, dado a data — Remus falou amargo.

— Agora entra a parte que talvez não queira ouvir, afinal todos sabem que fui perdidamente apaixonado nela, ou pelo menos eu achava que era. Creio que nunca desejei Lily. — Havia um sorriso quase cínico, como se o homem se divertisse com a constatação ao mesmo passo que a odiasse. Severus segurou a taça de forma elegante, bebericando, Lupin não conseguia ter resposta para a revelação. — Posso afirmar com veemência que a amei de corpo e alma, mas dado isso posso falar que amo magia de corpo e alma, a grande diferença era que eu a quis para mim. Diferente de James que provavelmente sonhava com o primeiro beijo que daria em "seu lírio", o máximo que cheguei a almejar foi eu e ela decorando uma casa juntos, nunca de forma minimamente sexual, carnal e tátil, além da amizade. Engraçado, não?

— Não exatamente. — O homem se arrumou na cadeira um tanto desconfortável.

— Pensando agora, de forma racional, eu a amava muito, mas principalmente amava estar com ela, sua companhia e bom humor, sua maneira de ver o mundo era incrível. Mais que isso, amava como ela fazia eu me sentir mais do que sou, como me via. — Snape possuía um sorriso melancólico nos lábios enquanto fitava a taça de vinho entre seus dedos esguios. — Ela me dizia que eu era um ótimo bruxo, que minhas habilidades em poções eram surreais. Lily dizia antes de virmos a Hogwarts que não importava nossas casas, seríamos amigos até a morte, na verdade ela me fez prometer, juramos um ao outro isso. É lamentável pensar que essa foi a única promessa que não cumprimos no meio de tantas pequenas juras infantis.

O silêncio ficou denso, quase cortante. Remus engoliu em seco, sem entender ao certo seu papel naquela sala, seria ouvir Severus? Falar das suas próprias dores? Na realidade, ele gostaria de desabafar com o homem? De certo Severus era um dos poucos que entenderiam sua dor de forma mais crua.

O dia havia sido suficientemente sofrido para pressionar sua mente com tantas indagações.

— É por tudo isso que lhe disse nesse falatório, e por conhecê-la, que eu só me permito ser o velho amargurado que sofre pela perda dela uma vez ao ano, em seu aniversário de morte — concluiu, levantando o olhar para o outro professor.

Remus assentiu com a nova informação como se levasse uma bofetada, finalmente entendendo o desabafo.

— Quando notou tudo isso?

— Logo quando Lilian casou com James.

— E nunca disse isso para ela? — Lupin arregalou de leve os olhos cor de mel.

— O que eu diria? — Riu baixo. — "Sabe, Lilian, toda a implicância com James, me afastar de você com suposto ciúmes e tudo que coloquei a culpa no meu coração partido, na verdade era meu ego e meu medo de mudanças, perdão o inconveniente."

Remus não se conteve, rindo alto da fala.

— Fale sério, Severus!

— Certo, certo. — Ele riu de leve. — Lilian sabia que eu era membro da ordem, sabia que eu era agente duplo, e eu devo ter comentado como na realidade eu poderia não ser tão perdidamente apaixonado nela, ou falei que havia superado a paixão de adolescente, serve?

— Terá que servir, não há como mudar — Lupin respondeu ainda em tom de brincadeira, mas seu olhar era dolorido, como se ardesse apenas de comentar sobre o tema.

— De fato. — Snape lhe lançou um sorriso solícito.

— Odeio essa data, gostaria de ser mais brando sobre os sentimentos ruins que vêm, afinal Harry precisa de mim nesses momentos. Mas...

Remus respirou fundo, apreciando que Snape enchia novamente sua própria taça e colocava para si também. Degustou um gole, amando o sabor das uvas fermentadas. Talvez ele precisasse falar tanto quanto Severus. Talvez fosse uma boa ideia desabafar.

— Mas, não tem como você ser positivo sobre esse dia do ano. Seria estranho, melhor, seria um traço de sociopatia se conseguisse — Severus falou, endossando as emoções do outro, como se validasse os sentimentos ruins.

— De fato, seria estranho pôr um sorriso no rosto no aniversário de morte da sua melhor amiga, junto do seu melhor amigo que ainda por cima era marido dela e deixou um filho pequeno, não posso esquecer também sobre o fato que você foi traído pela pessoa que estimava, e claro, seu namorado foi jogado em Azkaban — Remus possuía um tom amargo, porém cínico, Snape sorriu para aquilo. — Mas você não pode achar ruim, na verdade todos dizem para você agradecer, afinal tem sorte que não era você ali, morto, preso, órfão ou fugitivo.

— Veja, podia ter reclamado sobre ser lobisomem e talvez funcionasse, lobisomem livre, vivo em um mundo recheado de comensais, com a mãe viva, porém uma fera noturna sangrenta. — Remus não possuía certeza sobre a entonação das palavras do mestre de poções, não tinha certeza se era sarcasmo, deboche com a sua cara ou qualquer outra coisa, mas havia achado aquilo hilário, então só conseguiu rir alto.

— Acho que parei de chorar por tudo isso aos quatorze. — Lupin ainda ria ao dizer aquilo

— Fiquei sabendo da profecia e corri como nunca, quando cheguei Lily estava morta. — Severus ria ao dizer aquilo, como se achasse o trauma hilário, e de certa forma Remus também achava ao rir junto.

— Tive que enterrar James e Lilian, segurando Harry no colo. — As risadas continuavam no meio das lamúrias.

— Fiquei por horas sendo torturado por Voldemort para dar tempo da ordem resgatar Harry dos tios.

— Vi Sirius ser preso, e ele não teve a audácia nem de me olhar, me deixou acreditando que havia sido ele a matar nossos amigos! — Remus continuou a rir, mas duas lágrimas grossas desciam os olhos.

— Francamente, você nunca acreditou nisso. — Não era uma pergunta, Snape afirmou aquilo olhando os olhos de amêndoas, finalmente sanando a risada.

— Nem quando ele fugiu. — Sorriu triste, respirou fundo e usou a costa da mão para limpar o rastro deixado pela água.

— Vocês chegaram a reatar? — Severus terminou outra taça.

— Não deu certo. — Lupin suspirou, se jogando contra o estofado. — Havia muito entre nós. Sua prisão, Harry, a fuga, traição do Peter, meu caso com Tonks..

— Você teve um caso com Tonks? — Severus cortou o outro, surpreso.

— Sim, foi algo rápido... — A fala saiu leviana entre os últimos goles de vinho. — Temos um filho.

— Puta que pariu — murmurou. — Ela não é tipo vinte anos mais nova que você? Porra!

— É estranho vê-lo falando palavrão.

— É estranho saber que não é gay, que teve um caso com Ninfadora, quase uma criança, e tem um filho. Eu falando palavrão é o menos estranho de tudo isso.

— De certo. Mas pare de frisar a idade da Tons, ocorreu, temos 13 anos de diferença, não me trate como um abusador. — Deu de ombros. — Entretanto, Sirius também achou muito estranho. — Riu fraco.

— Ah sim, Sirius! Quase esqueço o núcleo da prosa. Enfim, vocês tiveram um reencontro fervoroso ou nem isso?

— Severus, você está me perguntando se transamos? Ou fodemos, fervoroso me lembra foda — Remus disse incrédulo, mas com um óbvio ar de riso, as palavras já saíam macias, consequência do álcool fazendo efeito.

— Sim, só que de uma forma culta. Você tem uma fala chula, Lupin.

O lobisomem soltou uma lufada de ar incrédula antes de pegar a garrafa da mesa e servir ambos.

— Quanta pretensão, nem lhe mostrei o quão chulo posso ser. — Mal notou quando a frase saiu, maliciosa na voz rouca, a atmosfera mudou de repente.

— Remus, Remus... — Severus possuía um sorriso perigoso nos lábios enquanto advertia o outro.

— O que te assombra, Severus? — Remus questionou impiedoso, cheio de ambiguidade.

— Muitas coisas, Lupin. — Ele cerrou o olhar, obviamente respondendo só um lado daquela pergunta.

— Sabe, isso explica muita coisa. — Desviou o olhar, sua fala saiu debochada desviando a conversa novamente para o lado sensual, Severus cerrou o olhar em direção ao grifinório, como desafio.

— Permita-se esclarecer.

— Digo, de certa forma você sempre foi alguém reprimido...

— Veja bem para onde está levando essa conversa, Lupin.

— Ah, não se preocupe, sei exatamente para onde estou indo com essa conversa. — Era mentira, a mais pura delas, Remus não tinha ideia do que estava fazendo ali, flertando descaradamente com o mestre de poções, mas de certa forma estava fluindo de forma natural.

Eram aqueles momentos que lhe mostravam o quão grifinório era.

— Vou gostar de saber o que exatamente você tem em mente?

— Não. — Riu fraco, levando sua bebida até os lábios. — Nenhuma das linhas de pensamento iriam te agradar, e a minha favorita te tiraria o eixo.

Remus piscou ao terminar de dizer aquilo, Severus riu descrente com o descaramento.

— Aproveite a liberdade do álcool, conte-me.

— Acabou de me surgiu uma coisa, e essa vai ser a escolhida para te dizer!

— Certo, fale.

— Sua implicância  com Sirius era simplesmente porque ele que me fodia — Remus soltou antes de bebericar seu vinho novamente. Snape se engasgou com o seu, o que fez o grifinório rir. — Que pudico você! Imagine se eu tivesse falado a pior coisa que me veio à mente.

— Mesmo que eu ache encantador você achar que meu ódio por Sirius venha de você, ou melhor, de ele foder você, devo dizer que ele junto a James não eram os melhores dos homens comigo. — O sonserino se recompôs mudando o tópico, Remus permitiu que a provocação morresse por medo do que a própria língua o traria naquela noite.

— Devo dar o braço a torcer sobre, entretanto você não era um anjo, exatamente. — Lupin juntou as sobrancelhas no meio das muitas expressões que fazia para falar, o que indicava estar se deixando levar no álcool.

— De certo, — Snape falou arrastando a frase, as íris negras se encontraram com as de mel, um aviso de um para o outro que estavam trilhando espaços perigosos — porém a vida ensina melhor que qualquer outra coisa.

— Isso eu afirmo, com muita dor, eu afirmo.

— Não é à toa que não permito nenhum tipo de bullying nas minhas aulas — Severus concluiu, findando as últimas gotas em sua taça, a deixando repousar na mesa.

— Isso não é verdade — respondeu entre uma lufada de ar e outra, incrédulo.

— A não ser os praticados por mim, óbvio. — Sorriu maquiavélico.

— Severus! — ralhou, mas riu depois. — De qualquer forma não falava disso, dessa sua linha tênue entre um abuso pedagógico e sua personalidade, falo de Harry e Draco.

— Isso é diferente. — Bebericou o vinho. — Eles não se ofendem de verdade.

— Você só pode estar brincando ou defendendo demais seu afilhado!

— Remus, por favor, chamar Harry de cicatriz e satirizar os apelidos que a mídia deu não pode ser considerado bullying severo. — Snape gesticulava com as mãos grandes e elegantes enquanto falava, as palavras lentas, mente letárgica do álcool. — Fora, o melhor episódio da saga de coisas vilanescas, meu favorito honestamente, mandar um cisnezinho de papel ao seu arqui-inimigo sendo acertado por um raio. Como eu deixo Draco à solta? Ele é um perigo para a sociedade.

— Você bebeu demais, já está até fazendo piadas!

— Eles não se odeiam, só gostam muito de implicar um ao outro. — Severus finalizou dando de ombros, como se aquilo estivesse há muito concluído em sua mente, e estava. — Uma hora eles se acertam, definitivamente não era assim que pretendia entrar na família de Lily.

— Quê? Como? — Lupin demorou um tempo para assimilar as palavras murmuradas em um tom de falso amargo. — Draco e Harry? Família? Severus Snape, você está dizendo o que eu acho que está dizendo?!

— Que eles vão namorar? — Cerrou o olhar na direção de Lupin. — Sim, estou dizendo, e tenho certeza.

— Sem chance. — Lupin se jogou contra a cadeira enquanto Snape riu baixo do choque dele.

— Vamos lá, você já foi mais esperto que isso. — Severus serviu mais um pouco de vinho a si, Remus ergueu a taça pedindo por mais, assim finalizando a primeira garrafa.

— Ficou louco, Severus, completamente. — Havia certa birra na fala do grifinório, como quem não queria dar o braço a torcer.

— Nós já fomos jovens, quantos casais começaram assim? Diga. — Snape bebeu mais do vinho já doce na boca. — Quantos casais, apenas na sua época de professor, surgiram assim? Brigando até se beijarem e começarem a melação pelos corredores?

— É diferente!

— Não se trata de um... Como os jovens chamam mesmo...? — O sonserino ficou pensativo por poucos segundos. — Enemies to lovers.

— Arg, você está indo tão longe! — Remus falou, fingindo nojo ao beber mais.

— Certo, ficarei por perto, então. — Snape sorriu malicioso, recebendo um olhar confuso do outro professor. — Remus, diga-me, Harry Potter é filho de quem?

— Céus, você está certo, eles vão namorar! — A fala saiu quase cansada com a conclusão, como se os anos de James perseguindo Lily viessem na mente de uma vez só, todas as vezes que ajudou em um plano ou parou um que parecia ofensivo. Severus estava certo.

E assim Snape caiu no riso pelo olhar de descrença e choque que Lupin tinha no rosto enquanto bebia mais um gole de vinho.

— Eu sempre estou certo. — Deu de ombros.

— Teremos que fingir choque quando eles se assumirem? — perguntou em tom de brincadeira.

— Eu já informei ao Draco que ele irá namorar o Potter — respondeu simples, como quem dá bom-dia, assustando de novo Lupin.

— Você é cruel! — Remus afirmou se pondo em direção dele para empurrar seu ombro com a mão. — O que ele disse? Melhor, como você falou?

— Eu falei exatamente o que acabei de te dizer, que quem muito atiça quer algo a mais e que eles iriam namorar, Draco arregalou tanto os olhos que quase saltavam para fora do rosto, e depois soltou um "Vai se fu", aí se tocou do que falaria e calou a boca — Severus disse, revirando os olhos. — E teve uma crise existencial durante uma semana.

— Você tirou seu afilhado do armário — sussurrou risonho.

— Deveria fazer o mesmo com o seu — sugeriu sorrindo. — O meu só ficou um pouquinho em surto e deve ter chorado uma ou duas vezes.

— Podre. Você é podre.

— Prefiro ser... — Severus parou um pouco de falar, como se ponderasse continuar o assunto, analisando se poderia continuar sua fala. — Eu tenho que ser, se eu não tirar Draco da sua zona de conforto, ele vai definhar ao bel prazer de Lucius.

— Lar conturbado? — sugeriu.

— Lar abusivo — corrigiu.

— E por que você não denuncia?

— Pois estamos falando de Lucius Malfoy. — Ele suspirou e se pôs a dar longas goladas em seu vinho, finalizando outra taça. — Narcissa faz o que pode para amenizar as coisas durante as férias, e eu para tornar Draco menos flexível aos desejos do pai durante as aulas, posso admitir que faço vista grossa para as festas com álcool no dormitório dele e suas saídas na madrugada também, o deixo viver um pouco.

— Imagino que deva ser difícil. — Suspirou. — Eu me sinto culpado por tudo que Harry passou na infância, Lily morreria de desgosto. — O homem esfregou as palmas no rosto.

— No fim, nós somos extremamente parecidos — soltou como se falasse consigo mesmo. — Acho hilário, mas deve ser mais uma das coisas classificadas como "humor negro." — Estalou a língua no céu da boca de forma boçal.

— Pois estou disposto a ouvir... — zombou. — Em que sentido você fala?

— Somos dois adultos amargurados — começou a enumerar com os longos dedos —, tivemos nossos amores tirados de nós pela morte e tentamos fazer com que quem amamos viva bem, mesmo que isso nos maltrate.

— I-isso, nossa...! — Remus suspirou novamente, se limitando a franzir a expressão, voltando para a poltrona na frente de Severus. — É uma péssima forma de ver as coisas.

— Talvez — Snape brandou sem se preocupar de verdade com isso.

A sala caiu em um silêncio estranho. Os dois se olhavam buscando apoio um no outro, ambos compreendiam a dor de forma crua. Simpatia, sinergia e compaixão. Esses eram os sentimentos que se destacavam na sala.

— Eu já gostei de você — Remus declarou, fazendo Snape tossir em meio ao gole de vinho.

— Certo, por isso eu não esperava. — Conseguiu dizer depois do quase engasgo.

— Nós éramos dupla em poções, você era tão inteligente e sagaz, ah não sei, eu era jovem — contou sem dar muita importância.

— Você gostava do meu cérebro, grifinório idiota. — Lupin riu do tom ofendido dele. — Isso foi bem sonserino da sua parte. — A provocação veio em tom infantil, faltando apenas dar a língua para uma perfeita birra.

— Talvez  — imitou a resposta e o tom anterior de Severus.

— Touché — Snape sussurrou resiliente. — Mas acabou namorando Sirius...

— Ele também era inteligente, ao seu modo — Remus defendeu o falecido ex-namorado. — Ele era alguém prático, de uma inteligência prática, o melhor em gerir crises. Possuía inteligência emocional.

— Isso eu definitivamente não tenho. — O homem sorriu plácido.

— Se te acalenta, nem eu. — Deu de ombros.

— Olha, você fala difícil quando quer.

— Sempre observador.

— Eu desconfiei que você gostava de mim.

— Mentira!

— Juro. — Sorriu. — Eu só achei impossível, digo, Sirius era oficialmente seu fã número um, vocês viviam juntos e...

— Calma, calma, Hogwarts inteira sabia que ele gostava de mim? — O lobisomem gesticulava afoito com a constatação.

— Acredito que Londres inteira.

— Não...

— Você realmente não sabia? Por Salazar. — Ele riu. — Tão idiota para certas coisas.

— Eu disse, sem inteligência emocional!

— Justo.

Ambos sustentaram um olhar penoso. Outra taça sendo esvaziada conforme o clima pesava no ambiente.

— Merecíamos ser felizes — Remus soltou de repente, apenas mais um pensamento fugindo de sua mente por sua boca.

— Talvez, você — Snape retrucou rápido.

— Você também.

— Infelizmente não posso concordar. — Severus cruzou as pernas longas de forma elegante, seu calcanhar batendo de leve contra a parte de madeira frontal da mesa.

— Poderíamos nos fazer felizes.

— Ou companhia, Lupin. — Snape colocou a taça de cristal na sua mesa quando Remus levantou da cadeira e sentou na sua mesa afastando ambas as garrafas, tanto a pela metade como a vazia. Ele fazia tudo em uma lentidão pensada, como se desse espaço para o sonserino remediar, porém ele apenas o olhou curioso.

— Os dois são possíveis. Hoje é um dia ruim, podemos tornar melhor.

— Ou isso só pioraria tudo.

— São muitos ou's, muitas possibilidades.

Remus segurou o queixo dele antes que houvesse resposta, viu quando seus ombros tensionaram e também notou quando as íris se fixaram nos seus lábios. Havia expectativa entre eles. Com um ato estupidamente grifinório, Lupin avançou, juntando os lábios, e se assustou quando sem pestanejar Snape correspondeu. De certo modo, mesmo vendo os sinais, ele esperava alguma reluta, porém recebeu um beijo voraz. Severus levantou da mesa, mergulhando seu corpo contra o do castanho e sua mão esguia nos fios encaracolados.

— Uau, digo, não esperava...

— Shiu, Remus, chega de falar.

Severus avançou contra os lábios dele novamente, calando os questionamento e a própria cabeça que girava em pensamentos insanos. A boca de Lupin era muito mais apetitosa do que seus devaneios fugazes e indagações nada pertinentes para o momento.

Remus pensou como aquilo era loucura quando seus lábios se separaram e eles ficaram se olhando, viu os lábios de Snape tremerem como quem quer rir e fez o mesmo. Poucos segundos depois, ambos riam por nada.

— Isso foi loucura.

— Por Merlin, Remus, estamos iguais dois adolescentes — respondeu aos risos.

— Que mal tem? O que te assombra?

O homem arqueou a sobrancelha pelo desafio e sorriu. Muita coisa o assustava, mas não a petulância de Lupin, e o mesmo valia para ele, muita coisa o assustava, mas não as respostas ácidas de Severus.

(4.5k)





Notas Finais:

Sim, eu sei que ninguém esperava para essa fic com esse shippe. Também sei que tem muita gente julgando.

A questão geral é que eu tenho ideias de enredos (plots) e imagino personalidades ali, depois encaixo em quem vai casar com a história, foi assim que Bifurcantion foi uma fanfic Blon invés de Wolfstar (apesar de muitos terem estranhado na época) e o mesmo para Mrs. Office sendo Pansmione e não Drarry.

Quando essa ideia surgiu não havia outros personagens em minha mente que não Snape e Remus. Simples assim!

Na primeira vez que abri esse arquivo, no mesmo dia que tive a ideia, escrevi toda a base (quase 3k) em uma noite, depois não peguei mais para refinar o texto por puro medo de ser lixada, entretanto resolvi largar isso de mão um pouco em prol dessa fanfic, amei escrever ela e acho o desenvolvimento incrível.

Minhas oneshot são experimentações, nenhuma delas representa como escrevo de forma fidedigna pois são testes, mas muito acaba indo para minha vida como escritora normalmente.

Foi isso, espero que tenham gostado e obrigado por terem dado uma oportunidade 💜

Sexta irei postar um novo Capítulo de Vital, explicar o atraso e conversar com os leitores. ⚠️

Um beijo da Fada✨🧚🏾‍♀️

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