Mulheres | Taekook [oneshot]

By thvsunmi

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Taehyung, um romântico de alma, nunca entendeu o motivo de não conseguir se apaixonar pelas mulheres que se r... More

Um alguém

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Taehyung tentava desesperadamente achar felicidade completa. Não que fosse uma pessoa triste, não tinha essa visão de si. Era um cara animado, até. Ouvia uma mpb de manhã, fazia suas tarefas, era bem organizado, trabalhava num barzinho que um dia já tinha sido do pai e tinha bons amigos. O seu negócio eram as mulheres. Taehyung tentava desesperadamente achar felicidade completa em seus inúmeros relacionamentos, com mulheres.

Não tinha um tipo, nem conseguia pensar em um tipo ao pensar nas mulheres. Já buscou por todas, com qualquer personalidade e aparência. Tentou desesperadamente se apaixonar por todas.

Por algumas, até achava que chegava a acontecer. Se sentia bem e adorado por um tempo, mas começava então a duvidar se aquele realmente era o sentimento que chamavam de paixão. Era morno; raso demais o que sentia por elas. Mas Taehyung odiava ficar sozinho. Sentia a necessidade de ter alguém ao seu lado, quase como a de tomar banho e beber água. Era encantado pela ideia de se entregar a alguém por inteiro e se apaixonar por cada mínima característica desse ser de um jeito profundo e cômodo, sentir um frio na barriga ao receber um flerte e dar risinhos bobos com qualquer merda que aquela pessoa lhe dissesse no pé do ouvido. Então, pulando de um namoro a outro, buscava incansavelmente pela mulher que causasse qualquer uma dessas experiências por ele desconhecidas, sem perder a esperança.

Apesar de ser difícil não perder a esperança quando se sente que não tem mais tempo.

Como naquele fim de tarde em que limpava o balcão do botequim, vendo pessoas que nunca tinha visto dançarem bêbadas e sorridentes, agarradas e gritando umas com as outras. Com uma cara de quem perdeu um parente e um pano de prato úmido no ombro esquerdo, trabalhava, tentando seguir em frente após mais um término.

- Não sei porquê continua fazendo isso - Yoongi suspirou, unindo as sobrancelhas com um copo cheio de whisky na mão. Usava uma camiseta com estampa de onça e o cabelo repartido no meio com um topete.

- Hum? - Inclinou a cabeça para poder escutar melhor. Tinha se concentrado de novo, sem querer, na letra de "Gostava Tanto De Você" do Tim Maia, que estava tocando. Era uma tortura trabalhar num bar e viver um pós término.

- Você sempre tenta a mesma coisa e acaba do mesmo jeito, cara.

Taehyung fez uma careta e estalou a língua no céu da boca.

- Ah, Yoongi, você não entende! Sério, fala isso porque já encontrou sua parceira da vida toda - trocou o lado da boca em que estava o palito de dente, indicando a aliança dourada do amigo com o olhar. - Eu só estou à procura da minha.

- Tem que ser natural, cara. Você pula de galho em galho e não consegue achar sua árvore.

Taehyung revirou os olhos com a analogia sem sentido. Yoongi estava bêbado.

- E o que quer que eu faça, então?

- Fica sozinho por um tempo. Vai se conhecer - disse com seu tom manso e despreocupado.

- Não tenho mais o que conhecer! - Arregalou os olhos e bateu um copo no balcão. - Já me conheço! Tenho 31 anos. 31! Não é como se eu fosse um adolescente que não sabe dizer nem o que gosta de comer no almoço. Só quero ter alguém.

Silêncio.

Yoongi ficou sem respostas. Isso era de se preocupar.

Não tinha mesmo mais alternativas, então? Das milhões de mulheres no planeta em que vivia, nenhuma delas era boa para despertar aquela felicidade em Taehyung? E porque elas não faziam Taehyung feliz? Inteiramente feliz? O que era tão errado para que ele não sentisse que estivesse genuinamente apaixonado por nenhuma daquelas tantas mulheres incríveis as quais ele conheceu? Os beijos não pareciam ser tão instigantes e a excitação demorava para vir. As mãos entrelaçadas eram até legais mas não a ponto de fazê-lo se sentir ansioso como quando via a Amanda Seyfried apaixonada por um cara bonito na televisão. Tinha a sensação de que cultivava amigas muito próximas, que era até gostoso trocar um pouco de afeto, mas não era completo. Não se sentia completo.

Só queria um amor. Profundo, sem muitas preocupações, feliz.

Eram 21:30h de sexta-feira. Hora que a galera mais nova chegava, Yoongi dizia como se fosse um velho. Taehyung via de forma meio aérea a timeline do Instagram quando notou um garoto se aproximando do balcão. Parecia ter uns 23, no máximo. Era bonito. Era bem bonito. Tinha traços singulares, usava um óculos escuro laranja na ponta do nariz e tinha um cabelo ondulado longo até um pouco abaixo das orelhas numa cor castanho. A blusa de botão preta e larga era presa bem na cintura fina por baixo de uma calça social. Tinha seis brincos, três em cada orelha. Taehyung pôde contar assim que ele parou em sua frente.

- Duas doses de tequila, por favor?

Taehyung soltou a respiração que prendia com uma lufada de ar.

- Ahn... Hein?

- Tequila, moço, tem? - Perguntou de um jeito muito gentil e sentou numa das banquetas com os braços apoiados no balcão. - É pra mim e pra minha amiga ali - apontou para uma garota ruiva que se aproximava do grupo pequeno de homens em volta da mesa de sinuca no canto do bar.

- Sim! Claro! - Riu de si mesmo, se sentindo meio bobo de repente, e se agachou para pegar uma das garrafas de tequila antes de distribuir em dois copinhos.

- Se bem que não tenho certeza se ela vai querer beber. - Deu de ombros e esfregou uma mão na outra direcionando seu olhar ao loiro. - Nayeon gosta de jogos, então deve ficar ali por algum tempo.

- Aham - jogou o pano de prato em um canto qualquer.

Taehyung ajeitou as mangas da camisa de botões florida laranja e o olhou brevemente de novo enquanto ele virava o líquido na garganta como se fosse água, então respirou fundo e voltou sua atenção ao telefone, quando viu uma foto de uma garota de traços fortes, alta e cabelos cheios cacheados vestida num vestido branco enorme.

- Nossa - soltou num tom melancólico.

- O que foi? - O garoto bonito que olhava em volta do bar sem muito interesse perguntou, virando a cabeça com olhos amplos e curiosos.

- Ah! Nada... Minha ex, uma delas, parece que se casou.

O menino chegou a se inclinar para olhar o telefone na mão de Taehyung, como se fossem amigos próximos.

- E você ainda segue ela? Pra ver foto assim no Instagram? - Levantou as sobrancelhas entortando os lábios - Meio mico, né?

- Tenho pena de dar unfollow, e não terminamos mal - tombou a cabeça pro lado e mordeu o canto do lábio inferior. - Fico até contente por ela.

- Nem sempre quem casa é feliz pra sempre.

- Eu quero. Quer dizer, quando for pra eu casar, quero que seja pra ser feliz. Não ia casar com qualquer pessoa.

Se fosse assim, já teria se divorciado mais vezes do que gostaria de contar.

- Às vezes nem é isso.

- Como se soubesse muito sobre esse tipo de coisa - disse, desconfiado de que aquele garoto soubesse alguma coisa sobre relacionamentos de longa data.

Bem, não que Taehyung soubesse alguma coisa sobre relacionamentos de longa data. Mas era mais reconfortante pensar que por ser claramente mais velho, já tinha vivido o bastante para ter uma visão ampla sobre relacionamentos.

Não tinha. Não mesmo.

- Divorciado - deu um sorrisinho com as sobrancelhas levantadas e um tom de deboche autodepreciativo enquanto balançava didaticamente o dedo anelar.

- Você?! - Não fez questão de disfarçar a surpresa.

- Uhum - pegou o outro copo, o que deveria ser para a amiga, e virou também. Dessa vez fez uma careta deixando a bebida presa nas bochechas por um segundo, os olhos apertados.

- Como? - Apoiou uma das mãos no balcão. - Quero dizer, por quê?

- Fui descobrir as maravilhas da bissexualidade! - Taehyung ficou boquiaberto. - Quer dizer, não me leva a mal, ela era ótima, mas eu era novo demais. Na verdade, foi muito bom pra mim - ele falava de um jeito muito natural, tinha um ar confiante e convidativo.

- Porque as pessoas ficam juntas, se não se sentem bem umas com as outras? - Perguntou triste, quase como se o casamento desfeito fosse dele.

- Ah, eu me sentia! Sentia mesmo, foi maravilhoso. Mas eu comecei a descobrir coisas que só não... - arregalou os olhos enormes em meio a uma pausa dramática - davam pra descobrir com ela. Bom, - deu uma risadinha sapeca encolhendo os ombros - não só com ela. Então me separei.

- E como foi?

- Chato. Foi uma burocracia infernal e minha família me acha um desgraçado. Sou tão cruel por querer me dar prioridade, só um pouquinho?

- Ela se sentiu muito mal?

- Agora ela já está bem. Quero dizer, foi melhor eu ter sido claro com ela do que se eu tivesse mentido para que continuássemos juntos. Ela abriu uma manicure há pouco tempo, não tão longe daqui - balançou as mãos no ar se entortando no banco. - Tenho certeza que deve ter se conhecido melhor também. Não seria nada justo com ela se eu não tivesse feito o que fiz.

- E você deixou de se sentir bem no casamento em um certo momento?

- Eu me senti curioso sobre as coisas que eu poderia experimentar fora dele.

- A bissexualidade?

Ele riu uma risada bonita antes de responder:

- Também - Taehyung sorriu sem um motivo lógico. - Eu só tinha 19 quando casei - apontou o queijo que tinha sobrado numa tábua que um dos outros garçons tinha cortado. - Posso comer?

- Claro! - deu um pulo lembrando que ainda estava trabalhando e se pôs a cortar o queijo em quadradinhos. - Nossa, 19 anos. Você achava que já tinha achado o amor da sua vida?

- Não com todo esse romantismo - falou fazendo uma careta. - Mas acho que algo perto disso. Eu fui impulsivo, ela também.

- E tem quanto tempo?

- Nos separamos quando eu fiz 23. Foi um presente de aniversário que eu dei a mim mesmo, eu acho. A vontade de me descobrir, descobrir o que eu podia fazer sozinho, não me deixava continuar ali. E agora tenho 27.

- 27?! - parou de cortar os queijos. - Você parece mais novo!

- É - soltou uma risada fraca - as pessoas dizem isso.

- Tenho 31.

- Que foda! - Sorriu. - Qual a sensação de chegar nos 30?

- Solteiro, sem filhos, morando no mesmo lugar e com o mesmo emprego de sempre, acho que pior do que eu pensava.

- Sério? - Perguntou num tom de desapontamento. - Por quê?

- É que é assim: você faz trinta anos - levantou a tábua e colocou os queijos num prato. - Um terço do que você vai viver, na média.

- Aham. - respondeu entretido.

- E o esperado é que você já tenha conquistado boa parte do que quer. Você já não é mais jovem e começa a ter outras responsabilidades para arcar, entende?

Taehyung colocou o prato com queijos no espaço do balcão à frente do homem e recolheu os copos de tequila já vazios.

- Sim.

- Mas o que mais me falta é alguém. Procuro uma pessoa para amar há anos, durante toda essa minha última década, e eu não sinto isso. Com nenhuma delas eu sinto o que imagino que seja amor.

- Qual o seu nome?

- Taehyung - fez menção para o garoto contar o dele.

- Jungkook. - Pegou um palito de dente, espetou um quadradinho de queijo e enfiou na boca, comendo e pensando no que tinha sido dito.

Jungkook.

- Nome lindo - pensou alto e o viu dar um sorriso breve.

- Então o que mais te incomoda é não namorar?

- É mais que isso. Eu tenho um problema.

- Continua - apoiou o queixo em uma das mãos, extremamente interessado.

Taehyung suspirou um riso frouxo e nervoso quando o viu tirar os óculos e colocá-los pendurados na camisa. Olhou para os lados e viu os outros funcionários do seu bar atendendo os clientes e preparando os quitutes.

Eles dariam conta.

Desamarrou o avental amarrado na altura da cintura e o deixou pendurado em um dos ganchinhos da parede. Fez um "Psiu!" para um dos baristas, Hoseok, e mostrou um polegar amigável indicando que sairia do turno. Passou pela portinha lateral do balcão e sentou-se na banqueta ao lado de Jungkook, que só assistiu a cena com um sorriso arteiro no rosto.

- Então.

- Então...

Jungkook o esperava continuar com expectativa e brilho no olhar. Era a primeira vez que mantinham um contato visual por certos segundos e Taehyung se sentiu meio perdido. Ele era diferente dos caras com quem parava para conversar. Se bem que nunca tinha parado com um cara para conversar. Não pela primeira vez, nem sobre esse tipo de coisa.

- É que eu sempre gostei de romance. Sonho com alguém que me faça bem de um jeito muito genuíno, sabe? - Jungkook balançou a cabeça, concordando. - E nos namoros que eu tenho, posso até gostar daquela pessoa, mas acho que nunca chego a me apaixonar.

- Como assim?

- Eu gosto da ideia de namorar. E eu gosto de dar em cima, beijar, ficar junto, me sentir amado. Esse calor humano e essa excitação, acho muito bom. Só que quando eu fico com alguma mulher, nunca me sinto tão atraído assim. Sinto que nunca me apaixonei. E eu queria tanto! Jungkook, eu quero tanto. Mas é tão difícil pra mim. E eu não entendo o porquê.

Ele ainda comia queijinhos enquanto pensava no que tinha sido dito.

- Que merda. - Disse de boca cheia.

- É! Não é? E eu acho que fico cada vez mais atrasado. Vendo as pessoas em volta de mim se casando e tendo filhos. É esquisito. E sei que o problema sou eu, porque - deu um sorriso divertido - sem querer parecer escroto, mas muitas delas se apaixonam mesmo por mim! - Jungkook riu. - E eu só... ah, não acontece.

- E você só se relacionou com mulheres? - Disse terminando de mastigar um queijinho e Taehyung concordou. - Não quero que soe do tipo "Oh meu Deus! - Balançou as mãos no ar de forma irônica. - O viado está tentando transformar os héteros em viados também!" Mas, hum... talvez você só não saiba do que gosta.

Jungkook disse de forma simples e terminou de comer os queijos olhando em volta, procurando pela amiga.

Silêncio.

Taehyung já tinha sido questionado sobre coisas do tipo. Lembra de três namoradas que terminaram com ele dizendo que ele era gay. Ele nunca procurou entender ou considerou essa possibilidade de verdade. Quer dizer, achava caras atraentes. É normal reparar nos outros, nada demais. Já sonhou com certas coisas, mas foi doideira, sonhos não dizem nada, são fantasias. É normal fantasiar coisas. E quando transava com garotas, era ok. Se não gostasse de garotas seria ruim, não? Não era ruim. Ele não achava sexo muito extraordinário, mas...

- Mas não quero que isso seja mais uma confusão perturbadora para você - deu de ombros depois de ver a amiga cheia de gracinhas com um alguém qualquer e voltou a olhar Taehyung, que já tinha pensado confusões perturbadoras demais naqueles segundos de silêncio.

- Tá. Tá bom - respondeu, concordando com a cabeça. Talvez devesse pensar nas coisas de forma mais ampla dali pra frente.

- Mas enfim... - Respirou fundo e colocou uma mecha do cabelo grande atrás da orelha. - Espero que dê tudo certo pra você.

- Desculpa, não queria deixar o clima ruim.

- Ah, não! - ele riu - Eu gosto de saber da vida dos outros. E você é bem interessante na verdade.

- Eu sou?

- São poucos os caras românticos como você, - Taehyung arqueou as sobrancelhas - digo, essa história de querer se apaixonar perdidamente por alguém, é muito fofo. Primeiro achei que estava falando para tentar me comer, mas foi surpreendente!

- Não! Não era!

- Eu sei! É muito fofo. É que os baristas são bem safados.

- Nunca percebi - fez uma expressão teatralmente sonsa. - Juro, e trabalho com isso a vida toda.

Jungkook riu, inclinando o corpo para trás.

- Você é- Nossa! - Exclamou com uma expressão surpresa. - Eu entendo - disse balançando a cabeça, os lábios comprimidos.

- O que? - Perguntou, tentando conter um sorriso.

- Você tem isso. - Apontou para o rosto de Taehyung. - Com esse seu cabelo loiro jogado pro lado e essas coisas que você fala. Sério! É óbvio que namora fácil.

E então Taehyung se sentiu brevemente envergonhado.

- Você também é muito bom de papo. E sim, acho que tenho um charme.

Jungkook concordou balançando a cabeça e levantou o braço para um dos funcionários pedindo duas cervejas.

- Tem uma autoestima bem alta, né?

- Acho a confiança muito importante. E, sinceramente, eu aprendi a gostar bastante de mim. - Taehyung ajeitou as pernas abertas e girou o banco apoiando as costas no balcão.

O barista deixou as duas cervejas lado a lado.

- Também gosto bastante de mim. Esses anos de solteiro me fizeram muito bem, mesmo. - Abriu a garrafa e deu um gole, Taehyung repetiu o ato. - Aprendi coisas que nunca imaginaria sobre mim.

- O que, por exemplo?

- Adoro pop brasileiro - Taehyung levantou as sobrancelhas e Jungkook concordou com a cabeça sorrindo. - Eu até ouvia normalmente, mas depois peguei gosto mesmo!

- Eu também amo! Tenho vários discos, ouço sempre.

- Sério?!

- Posso te mostrar. Meu apartamento é aqui em cima - aproveitou a brecha para o convite, porque não queria que a noite acabasse tão rápido.

Jungkook ergueu uma sobrancelha e deu um sorrisinho de canto.

- Em cima do bar? Você mora aqui?

- Sou o dono!

- Puta merda, Taehyung! - Ele exclamou, surpreso. - Então é por isso que pode se dar uma folga pra bater papo com qualquer cliente?

- Só os mais intrigantes - disse com um sorriso levando a garrafa até a boca. Jungkook respondeu mordendo o lábio inferior com um olhar nada sútil.

E Taehyung tremeu quando percebeu o que tinha acontecido.

- Só vou avisar a minha amiga e podemos subir - deu um sorrisinho de canto, bebeu o resto da cerveja que tinha na sua garrafa e levantou, deixando aquele tempinho de silêncio criar uma tensão gostosa no ar. - Aqui, - tirou a carteira do bolso. Taehyung não parava de olhar para ele - quanto deu?

- Eu posso pagar.

Jungkook soltou um riso frouxo, tirando o dinheiro da carteira.

- Não, Taehyung. Eu pago, é assim que funciona - deu de ombros, deixando as notas presas embaixo da garrafa de Taehyung. - A gente tem uma primeira conversa maneira e eu te pago uma cerveja, depois vamos pro seu apartamento e transamos loucamente - disse, sério e provocante demais.

- O que?! - Perguntou fechando as pernas.

- Brincadeira! - Ele riu de repente. - Só quero conhecer seus discos. - Deu mais um sorrisinho, dos tantos que ele dava, aquele não tinha claras intenções, e enfiou a carteira no bolso de novo antes de se virar e ir andando até onde estava a amiga.

E ao observar aquele homem de ombros largos e um metro e setenta e nove de altura conversar de um jeito amistoso com aquela mulher que era menor e feminina em contraste com ele, Taehyung teve a certeza de que seria diferente. Já estava sendo diferente. Então pegou o dinheiro no balcão e pagou a conta, depois terminou de beber o líquido da garrafa esperando pela sua inusitada companhia da noite. Fosse com segundas intenções ou não, sua conversa com Jungkook era gostosa e natural. Tudo bem conhecer alguém novo, tudo normal, nada diferente.

- Ela vai sair com um cara, então... - ele falou assim que voltou.

- Vamos subir? - Levantou do banco.

- Uhum.

- É só me seguir.

Tocava "Vida Louca Vida", do Cazuza, quando foram andando em direção aos fundos, onde tinha uma escada minúscula de ferro em formato caracol. Os dois subiram um atrás do outro sem muita conversa e pouco contato visual, dando aqueles sorrisos sem graça quando acabavam por se encarar. Jungkook apoiava a mão no ferro do corrimão ao lado da porta do apartamento enquanto Taehyung enfiava a chave na fechadura. Se olharam cúmplices antes de entrarem no novo lugar.

O apartamento era de um tamanho razoável, tinha as paredes claras e estava organizado, como se fosse um lugar preparado para sempre receber novas visitas. Tudo gritava a personalidade de Taehyung. Sofás confortáveis, uma estante enorme amontoada de discos, uma cozinha cheia de coisas na bancada, porta-retratos em cima dos móveis e quadrinhos com frases divertidas. As decorações eram simples e tinham vasinhos de plantas espalhadas por aí. A casa era uma mistura de verde com amarelo, branco e vermelho. Era amistoso, sem dúvidas. E tinha cheiro de casa limpa.

Taehyung fechou a porta e andou até a cozinha, vendo no canto dos olhos com um meio sorriso Jungkook observar cada canto da sua casa com a curiosidade imensa que já tinha percebido que ele tinha.

- Quer uma taça de vinho?

Ele negou com os braços cruzados, olhando os porta-retratos do móvel da sala que tinha a televisão velha.

- Fico meio avoado. Mas um copo d'água seria bom.

Taehyung gostava de como ele era espontâneo, nunca tinha conhecido ninguém assim.

- Tá bem.

- Não entendo toda essa importância que dão para bebida. - Reclamou, virando para Taehyung - Sabe quantos caras já me pagaram uma bebida?

- Alguns?

- Muitos! A maioria com quem fiquei. Agora, sabe quantos já me ofereceram um jantar? Ou só uma conversa comendo alguns lanches?

- Mas-

- Não! Sério, parece que as pessoas só querem ficar juntas e terem alguma coisa se estiverem bêbadas. Nós estamos aqui, tendo um papo legal, e mesmo que eu não esteja sóbrio, não é como se eu tivesse tomado um monte de drinks. Não quero ficar bêbado, quero conversar com você. Isso já é suficiente. Não?

Taehyung sorriu e soltou uma risada divertida levantando os braços em rendimento.

- Claro! Você é ótimo, podemos continuar conversando. É que... não sei. Mas você está certo! É quase automático - riu e Jungkook se virou, voltando a olhar os cantos. - O que você achou? - Pegou uma jarra na geladeira e um copo no escorredor de louças - ...Do apartamento.

- Esse é seu pai? - Apontou para uma das fotos e olhou Taehyung, que espremeu as pálpebras para poder enxergar. Na foto era ele quando garotinho, sendo segurado nos braços por um homem bonito na praia.

- Aham - respondeu, colocando a água no copo.

- E vocês se dão bem? Parecem tão fofos - comentou, segurando a foto nas mãos. Tinha um olhar carinhoso.

- É, acho que sempre fui mais próximo dele do que da minha mãe. Foi ele quem construiu isso aqui - Jungkook o olhou com as sobrancelhas levantadas e deixou o porta-retrato no lugar. - E depois que fez 50 anos passou pra mim.

- E é difícil cuidar de um lugar assim? - Ele andou para perto do loiro e pegou o copo d'água, tocou na sua mão por mais tempo do que o normal.

- Ah... Não sei - encostou as costas na bancada e apoiou as mãos em cada lado dela, de frente para Jungkook, pensando enquanto olhava para o teto. - Acho que não, sou amigo das pessoas que me ajudam com tudo aqui, e gosto do clima que consegui dar pro lugar. Combina comigo. Gosto de conhecer pessoas, então ter um estabelecimento que constantemente vem todo tipo de gente para se divertir ou só passar o tempo, é bem gostoso pra mim. Tirando a parte da administração, trabalhar aqui é como se eu não estivesse trabalhando.

- É um bom jeito de pensar. Acho importante trabalhar com aquilo que você gosta - ele disse e Taehyung percebeu que Jungkook tinha uma mania adorável de arregalar os olhos enquanto bebia água.

- Você faz o quê?

- Sou professor de sociologia e filosofia - Taehyung entortou os lábios e ele riu. - Eu juro que sou bom! - Exclamou dando um soquinho no peito de Taehyung, tinha um sorriso de canto nos lábios. - E consigo ganhar dinheiro. Na verdade, sou o preferido de muitos dos meus alunos, viu?

- Eu acredito! É que acho que eu nunca ia conseguir lidar com adolescentes.

- Eles são controversos, eu gosto - deu de ombros. - Não pensava que ia ser tão bom dando aula. Quando fui fazer ciências sociais nem pensava que viraria professor, mas encontrei algo que realmente amo fazer.

- Por quê escolheu ciências sociais?

- Eu sempre me interessei na forma das pessoas se relacionarem. Era bobo, como pensar no porquê de elas serem como são, ou tentar entender aquele sentimento que eu tinha ao olhar em volta de achar que aquela gente toda sofria e cobrava por umas coisas tão... - revirou os olhos - Argh, sabe? Então na hora de decidir o que eu ia fazer depois de me formar no ensino médio, pensei no que acrescentaria algo na minha vida de verdade. E deu nisso.

- Então você sempre foi maduro assim? - perguntou com as sobrancelhas arqueadas, atraente quase sem querer.

- Ah, não mesmo - ele riu, uma risada diferente, acanhada. - Quero dizer, claro que eu tô deixando as coisas mais bonitas para impressionar você... - passou a língua nos lábios, contendo um sorriso, - Mas, quando eu era adolescente, só pensava que sabia das coisas, e na verdade até hoje não sei é de coisa nenhuma. Sou mesquinho e infantil como todo mundo é.

Taehyung sabia que ele estava flertando, já tinha percebido. Mas era a primeira vez que estava nessa posição, então sem saber muito bem como fazer aquilo, só continuou conversando.

- Mesquinho e infantil? Tá bom, senhor "me divorciei aos 23 porque queria me conhecer melhor".

- Cala a boca... - Respondeu com uma risada e deixou o copo vazio na pia. - Como você era quando estava na adolescência?

- Era bem diferente - foi andando até a sala e Jungkook o seguiu.

- Diferente como?

- Eu era mais introvertido, me soltei mais depois que saí do ensino médio. E não pintava o cabelo ainda, então ele era castanho.

- Tem foto?

- Essas ficam guardadas - disse num tom divertido. - Mas eu não tinha essas visões complicadas de mundo, era mais do tipo...

- Normal?

- É.

Taehyung sentou no sofá marrom com as pernas arreganhadas e Jungkook sentou ao seu lado, com um cotovelo apoiado no encosto do sofá e a cabeça apoiada na mão, uma das pernas dobradas no estofado. Taehyung o achou estonteante. Foda-se, achou mesmo.

- Não consigo te imaginar sem o loiro.

- Eu tô bem melhor agora, acredite.

- Eu só pintei o cabelo uma vez, de rosa - revirou os olhos sorrindo. - É, é a minha cara. Hoje eu acho tosco. Mas depois que ele voltou pro castanho o máximo que faço é trocar de corte, tô deixando ele ficar grande por uns tempos.

- Você fica lindo assim - tentou.

Jungkook olhou Taehyung, sorriu e desviou seu olhar para baixo.

Conseguiu!

- Você também é uma graça. Nem parece que existe.

- Você acha? - Tombou a cabeça, tentando mostrar seu melhor lado.

- Por quê acha que aceitei vir ao seu apartamento, bonitão? - Perguntou com um tom de deboche e deu um sorriso brincalhão.

- Para ouvir meus discos? - brincou.

- Quer que eu ouça eles agora? - provocou, de um jeito mais explícito do que pareceu.

- Pode escolher algum e colocar no rádio - apontou para o rádio ao lado da estante com os CDs. Desviou do flerte, se sentindo meio ridículo depois de fazer.

- Hum... - arqueou as sobrancelhas levantando do sofá, andando devagar até a estante. - E depois vai querer que eu vá embora?

- Você vai embora só quando quiser.

Ele concordou num movimento lento com a cabeça enquanto lia os álbuns e artistas que tinham em cada um dos porta CDs de plástico. Taehyung soltou um arzinho pelo nariz se sentindo mais leve. Se pôs no seu lugar. Estava tentando algo novo, e mesmo que não tivesse feito nada demais, aquela primeira noite já estava sendo mais atraente do que qualquer uma das primeiras noites que teve. Sentiu o coração palpitar mais rápido quando o viu colocar uma mecha atrás da orelha de novo. Pôde ver com mais atenção o nariz grande, a boca num biquinho e os olhos atentos de perfil.

- Você tem muita coisa boa por aqui - falou sem olhar para ele, mordeu o lábio inferior enquanto se inclinava para observar e escolher algum deles. - Ouve muita música?

- Todo dia - Inclinou a cabeça pro lado, sem desviar o olhar atento no rosto dele.

- Ah, Você tem! Aqui - pegou um dos porta CDs e abriu, colocou o CD dentro do rádio e, depois de ligar e colocar na primeira faixa, deu play. Soltou uma risadinha frouxa quando olhou para Taehyung, parecia estar se divertindo com alguma coisa que não soube decifrar.

- Qual você pegou?

Jungkook não respondeu, só deu um sorrisinho e girou quando a melodia começou a tocar.

"Já tive mulheres de todas as cores,
De várias idades, de muitos amores.
Com umas até certo tempo fiquei.
Prá outras apenas um pouco me dei."

"Mulheres", do Martinho Da Vila, era o que tocava no rádio. Taehyung não entendeu o motivo da escolha, mas não se importou em pensar sobre o assunto assim que viu Jungkook começar a dançar sozinho pela sala. Céus, ele parecia sempre tão leve, era bonito de se ver. O observava dançar de um jeito desajeitado com um sorriso abobalhado no rosto até sentir ser puxado pelas mãos por aquele garoto sorridente. Dançaram juntos de mãos dadas durante mais alguns versos, misturando alguns passinhos de samba com direito a mãos receosas na cintura e pés meio desgovernados. A melodia deixou com que ficassem mais soltos. Não tinham com o que se preocupar. Só estavam passando um tempo juntos, afinal.

"Procurei em todas as mulheres a felicidade,
Mas eu não encontrei e fiquei na saudade.
Foi começando bem, mas tudo teve um fim
Você é o sol da minha vida, a minha vontade.
Você não é mentira, você é verdade.
É tudo que um dia eu sonhei prá mim."

E aí, Taehyung entendeu. Nossa, não tinha como não entender. Então ele riu, uma risada gostosa, daquelas que vem sem aviso. Jungkook correspondeu com um sorriso.

Canalha!

- Por quê está fazendo isso comigo?! - Perguntou olhando nos olhos dele, quase como uma súplica.

- Eu não tô fazendo nada! - As sobrancelhas levantaram junto dos ombros.

- É? - Pensou brevemente no que dizer, ainda trocavam olhares. - Mas está tudo bem se você fizer.

- Eu prefiro que você faça, se você quiser - rebateu quase na mesma hora. Foi automático, simples.

- Então eu posso?

Jungkook fechou os olhos em resposta. Taehyung respirou fundo, segurou na lateral do seu pescoço com uma das mãos e se aproximou. Foi rápido, um estalo. Um beijo como aqueles que normalmente é dado pela primeira vez quando você tem 15 anos, por causa de um verdade ou desafio ou uma paixonite infantil. Foi surreal se libertar desse jeito. Sentiu um formigamento da cabeça aos pés e as pernas ficaram moles. Só com isso, uma rápida junção de lábios. Instantaneamente se achou ridículo, por estar tendo todo aquele tipo de reação pela primeira vez com alguém depois de tanto tempo perdido, por perceber que já passou do prazo de ter o primeiro contato com esse tipo de sentimento. De repente teve vontade de chorar.

Jungkook o observou e soube. Ele sempre sabia de tudo. Deu um sorriso reconfortante unindo as sobrancelhas e balançou a cabeça concordando.

- Tudo bem - disse baixinho. Taehyung o deu um meio abraço, e sentiu lágrimas fininhas caírem dos seus olhos.

Afundou os dedos entre seu cabelo e o beijou novamente. Estava envergonhado, mas fez com vontade, uma vontade enorme que nunca teve na vida. Iniciou de forma curiosa e devagar, em meio ao choro silencioso. Jungkook fez um carinho na sua cintura e retribuiu na mesma medida, sem fazer menção de ultrapassar barreira alguma. E quando se sentiu mais confortável, Taehyung começou a tomar um ritmo diferente, estava todo arrepiado e sentia as mãos nervosas querendo fazer mais. Eles tinham muita atitude, os dois, o que fez o beijo ficar mais excitante que o normal. Dedilhou o pescoço e os ombros de Jungkook e soltou um som abafado com a boca quando sentiu os braços dele cruzados em volta da sua cintura. Jungkook riu em resposta.

- Você é fofo - ele falou com a boca rente a de Taehyung, que apertou suas bochechas com as mãos antes de distribuir selares e beijos rápidos entre a boca e as bochechas de Jungkook. Eles riram juntos, achando aquilo divertido e gostoso.

Taehyung findou o contato com um beijo mais demorado e encostou suas testas.

- Obrigado.

- Você não precisa-

- Obrigado.

Os dois abriram os olhos. Se encararam por alguns segundos e sorriram. Se sentiam bobos, no bom sentido. Jungkook deslizou uma mão até a bochecha de Taehyung e passou o polegar onde antes tinham lágrimas. Eles se afastaram, riram meio sem graças e soltaram suspiros fundos.

Ficaram num silêncio desconfortável, um silêncio de "E agora, o que a gente faz?". Então Taehyung entrou em um mini pânico, como se estivesse à beira do implorar para que ele ficasse e de também querer que ele não quisesse que aquilo evoluísse para mais muito rápido. Movido pelo mini pânico, tentou puxar assunto.

- Você quer casar?

Os olhos de Jungkook multiplicaram de tamanho antes de ele dar uma risada estridente em reação.

- Acho que agora preciso de um vinho!

- Ahn? Ah! Não! - Riu, mas tinha o rosto em completo desespero. - Disse, no futuro. Com alguém.

- Como você é fofo! - Exclamou, a mão apoiada no ombro de Taehyung enquanto controlava o riso.

- Me sinto meio ridículo agora.

- Te deixa mais gostoso - segurava o sorriso inabalável no rosto. - Não sabe como agir comigo, e está sendo muito bonitinho.

- Acho que quem precisa de vinho sou eu.

- Podemos dividir uma taça - apertou o lóbulo da orelha de Taehyung e deu dois tapinhas no seu ombro antes de se sentar em cima do balcão da cozinha e batucar com os dedos ali como se já fosse de casa.

Taehyung ficou olhando para ele, perplexo. Ele era confiante, de uma forma que o deixava mil vezes mais charmoso. Tinha resposta para tudo e também sabia puxar assunto. Não parecia se importar em manter o mínimo de discrição, o que para muita gente seria incômodo, mas para Taehyung - que era expert em ter que elogiar e falar gracinhas incansavelmente até conseguir quebrar o gelo com as mulheres, a ponto que elas dessem uma abertura direta, - um cara que acabou de conhecer sentado no seu balcão chamando ele de fofo e o fazendo repensar em todos os relacionamentos que já teve na vida era bastante atraente.

- Quer ficar avoado, então? - perguntou após ir até o armário e ficar indeciso entre duas garrafas. - É porque me beijou?

- Não vou ficar avoado, quero aproveitar essa noite com você - deitou a cabeça no próprio ombro. - Talvez só fique com a língua mais solta.

- Uhum - decidiu pegar a garrafa com vinho branco até a metade. - Dividimos uma taça, então. Acho que já estou bem solto hoje.

- Eu gosto.

- Que bom.

- Você gosta? - Perguntou vendo Taehyung derramar o vinho numa taça grande. - Está tudo bem, não é? Também quer aproveitar essa noite comigo - afirmou e questionou ao mesmo tempo, demonstrando uma ponta de insegurança pela primeira vez naquela noite.

- Quero - respondeu olhando para ele. Arqueou as sobrancelhas. - Acha que não?

- Não sei se ficou assustado.

Taehyung balançou a taça, segurando a haste entre os dedos e deu um primeiro gole.

- Assustado, não.

Jungkook pegou a taça da sua mão, a haste entre o indicador e o dedo do meio, a mão fechada na parte do vidro onde estava o vinho. Deu um segundo gole.

- Como, então?

- É uma surpresa para mim. Você sabe, nunca tinha pensado nisso aqui - apontou para os dois. - Mas isso aqui funciona bem mais do que aquilo lá - balançou a mão em desdenho no ar. - Então só quero ter isso aqui por enquanto.

Jungkook tinha os olhos entreabertos e um sorriso pequeno, com os lábios repuxados sutilmente para o lado, o que o deixou com uma expressão como se ele estivesse inebriado sob efeito de droga - pura dopamina, talvez. Seu olhar era direcionado a Taehyung de cima, mas era como se ele pudesse cair aos seus pés a qualquer segundo. O tronco inclinado para trás, sendo segurado arduamente por um dos braços, uma mecha do cabelo grande presa atrás de uma orelha. Deu outro gole no vinho.

- Vai me deixar maluco.

E a confiança dele tinha sido renovada por completo. Vívida, bem ali na sua frente. Taehyung viu.

- Hum?

- Vamos brincar de uma coisa! - Falou num pulo, Taehyung franziu as sobrancelhas e bebeu do vinho, depois que pegou a taça da mão dele. - Não faz essa cara, é para a gente se conhecer melhor e passar o tempo.

- Ok.

- Vou falar três coisas sobre mim, você tem que descobrir qual das três é mentira. Depois é você.

- E, de repente, me sinto com 20 anos.

- Vai ser divertido! Quero flertar com você e ao mesmo tempo saber que tipo de pessoa você acha que eu sou.

- Tá bem - concordou entre risos e deixou a taça no balcão ao lado de Jungkook. - E quem ganha?

- Não tem quem ganhe, depois a gente só se beija e se conhece um pouco mais.

- Então nós dois ganhamos - apoiou os cotovelos no balcão, estavam um ao lado do outro.

- Você ganha. Ter meus beijos é um privilégio.

- Meus beijos também são muito gostosos.

- Eu sei, já vou ter mais deles. Por enquanto a gente cria um clima e joga conversa fora.

- Pode começar, acho que vou precisar pensar um pouco.

Jungkook concordou em silêncio, bebendo mais um pouco do vinho, depois deixou ele no balcão de novo.

- Já namorei com homem - falou com uma expressão neutra, concentrado para não dar pistas sobre a brincadeira -, já morei fora do país e tenho um gato.

- Que aleatório! - Taehyung riu se curvando sobre o balcão, como se a situação fosse tosca.

- É mesmo! Não tem critério, vai. Qual a mentira? - Ignorou o deboche.

- Não faço ideia, os três parecem verdade. Esse jogo não tem sentido.

- Achei que você fosse mais divertido.

- Nunca morou fora do país - disse sua resposta numa incerteza evidente.

- Pêêê - fez um barulho de sirene com a boca, uma careta com os lábios torcidos para o lado no rosto. - Sou muito alérgico a gatos!

- Não! - Gritou com um biquinho.

- É, eu começo a me coçar e minha pele clarinha fica mais vermelha que pimenta, juro. Nunca pude ter um na vida.

- Já estava planejando criar gatinhos com você, estava pensando nos nomes.

- O único gatinho que posso ter é você.

Taehyung revirou os olhos com um sorrisinho envergonhado, bateu um dos cotovelos na coxa de Jungkook.

- Onde você morou?

Jungkook respirou fundo antes de responder:

- Fiz um cursinho com bolsa integral na faculdade, passei dois meses morando no Canadá. É, querido, I do speak english - disse levantando as sobrancelhas, os lábios formando uma linha em forma de "U" para baixo.

- Você é tão... - deu uma risada, erguendo o corpo e bebendo mais do vinho, a taça já estava quase vazia.

- E namorei com esse cara por um tempo também, ele era um fofo. Mas me traiu. Quero dizer, aprecio muito as pessoas desapegadas e liberais, que tem isso de não se importar com seus parceiros tendo contato íntimo com outras pessoas - deu de ombros. - A Nayeon, minha amiga que veio no bar hoje, ela é assim com o namorado. Mas a arte da não-monogamia é uma coisa muito além pra mim.

- Nunca pensei no assunto.

- É! Tem gente que namora, e não se sente incomodado de ver a pessoa que namora ficar com outras, é um acordo do casal. Acho que essa evolução espiritual é muito pra mim. Quer dizer, sou confiante e não acho que contato físico é realmente uma coisa hiper relevante num relacionamento mas...

- Quando eu me apaixonar, aquela pessoa vai ser tão importante para mim que não vou sentir necessidade de ficar com outras. Já terminei por isso também, quero ficar fissurado por quem for namorar. Sou de dar tudo de mim, então gostaria de ter tudo de volta também.

Jungkook suspirou fazendo um "Ah...". Seu peito subiu e desceu com a lufada de ar.

- É um pecado que só tenha te conhecido agora - terminou com o resto do líquido que tinha na taça. Entornou tudo, jogando a cabeça para trás. - Você fala como se tivesse saído de um livro de romance.

- Não sou de se jogar fora - respondeu num tom brincalhão.

- Olha que posso criar falsas esperanças...

Taehyung o encarou, ele tinha o dedo indicador apontado na sua direção numa brincadeira e as bochechas vermelhas numa seriedade misturada com uma pitada de álcool. Ele estava querendo uma confirmação. Um sinal verde de que aquilo estava mesmo sendo mais do que só um flerte com um desconhecido. Que ele era um pouco mais do que uma experiência de uma noite para Taehyung saber se gostava mesmo de caras ou não.

Se era mesmo isso, então Jungkook só parecia saber de tudo.

- Não seriam falsas - ficou na ponta do pé por um segundo para esticar o corpo e deu um beijinho rápido em Jungkook, o que fez um barulho de estalo.

- É sua vez - deu um empurrãozinho no peito de Taehyung, mas tinha um sorriso grato sutil nos lábios. - Duas verdades e uma mentira.

- Depois que terminei o colégio só morei sozinho, nunca fui traído e... - sua fala morreu por uns segundos.

Sentiu necessidade de tomar uma atitude maior.

Sua mente não pensava racionalmente sobre tudo que estava sentindo ou tudo que pensava ao conversar e olhar para ele. Não tinha nem tempo, estavam num fluxo contínuo de declarações sutis em meio ao conhecimento mútuo. Mas não sairia do lugar se não fosse mais fundo nas coisas que falava. Estava tentando entregar tudo de si.

- E...

- Estou sentindo mais coisas hoje do que nunca.

Jungkook curvou as costas, murchando como se o corpo tivesse acabado de derreter.

- Não faz isso comigo...

- Não tô fazendo nada - sorriu e se colocou na frente dele. Honestamente, não tinha ideia de onde tirou coragem para dizer aquilo. Sentia que todos os seus órgãos estavam tremendo dentro do corpo.

- Espero não ser egoísta querendo que a última seja verdade - afastou as pernas e envolveu o pescoço de Taehyung com os braços, puxando ele para mais perto. Tinha uma expressão serena, estava todo mole.

- Isso é um chute? - Apoiou as mãos nos espaços do balcão ao lado dos quadris dele.

- É.

- Acertou!

- Agora tenho que saber a mentira.

- As outras duas são mentiras, você já acertou, ué.

- Falou duas mentiras?

- É, já morei com um amigo por mais de um ano. Foi com ele que aprendi a ser tão limpo e a cozinhar direito. E é óbvio que já fui traído.

- Que ladrão! Você roubou! - Exclamou, boquiaberto. - Nossa, deve ficar um gostoso cozinhando - suspirou, numa falsa frustração. - Mas roubou!

- Eu não sabia!

- São literalmente duas verdades e uma mentira.

Eles riram, Jungkook com uma expressão desacreditada e Taehyung com olhos em súplica.

- Desculpa!

- Desculpo - alternou o olhar entre a boca e os olhos de Taehyung, soltou um arzinho pelo nariz e o deu um selinho antes de dar início a um beijo sem língua. Foi um contato rápido, porque em poucos segundos ele se afastou de repente e perguntou: - Como assim "óbvio"? - com o cenho franzido e um tom quase indignado.

- O que? - Perguntou sem entender, os punhos fechados num limite seguro longe da cintura fininha a sua frente.

- Não é óbvio que já foi traído. Não penso numa pessoa sã traindo você.

- Já aconteceu algumas vezes, não é tão surpreendente. Já namorei muito - falou como se fosse evidente.

- Mulherengo ou romântico de alma?

- Desesperado - disse depois de sorrir com a piadinha.

- Ainda vai encontrar alguém.

E Taehyung sentiu um embrulho estranho no estômago ao ouvir a frase. Não foi pela agonia de querer desesperadamente ter um alguém, nem pelo terror de estar sozinho. Foi pelo uso do futuro.

Entre a fração de segundos em que ele percebeu isso e processou essa informação, ficou em estado de choque. Mas só percebeu isso depois de ouvir um bem baixinho:

- Tudo bem?

Ele ficou preocupado, e Taehyung teria achado adorável se não estivesse com as mãos formigando para tocá-lo.

- Quero te beijar.

- Tá bem - deu uma risada entretida, as mãos agora apoiadas nos ombros do outro.

- Muito.

- Te dou tudo que quiser.

Ele disse fazendo contato visual sem muita intensidade, mas foi o suficiente para Taehyung dar às mãos a satisfação que foi apertar a cintura de Jungkook pela primeira vez.

- Eu quero.

- O que você quer? - Perguntou num sopro, as pálpebras parecendo pesadas de repente.

- Tudo.

Sexo para Taehyung sempre foi algo perto do nada. Era superestimado, um ato que realizava por consideração pela pessoa com quem estava. Um nada que beirava ao esquisito, em certos momentos.

E naquela noite, com Jungkook, o sexo foi algo. Foi indescritível. Nunca pensou que algum dia veria o sexo como uma necessidade, nunca achou que fosse sentir uma ansiedade extrema a ponto de beirar a agonia para fazer. Que seu corpo pudesse ficar à mercê tão facilmente de outro e que o caótico fosse tão atraente.

Também nunca pensou que fosse achar alguém que combinasse de verdade com ele. Nem que sua pseudo paixão por mulheres fosse mais um sentimento de pura admiração.

Mas o tempo que passava com ele só deixava mais claro o fato de que Taehyung nunca tinha sentido nada perto da paixão, mesmo que tivesse se relacionado com tanta gente. Não até conhecer Jungkook.

O relógio pendurado na parede do quarto marcava mais de 2 da manhã, e apesar de sentir o corpo pesar que nem chumbo sobre o colchão, Taehyung não sentia sono. Estava pensando em silêncio, os únicos sons que ecoavam pelo quarto eram do ventilador capenga de teto e de Jungkook no banheiro do lado. Ele deixou as portas abertas - disse que era porque tinha medo do escuro - e mesmo que estivesse fazendo muito esforço para disfarçar, dava pra escutar ele mexendo em todos os armários.

- Tá procurando alguma coisa? - Perguntou num tom despretensioso. Até que gostava da curiosidade dele.

- Você tem alguma xuxa? - A voz perguntou distante.

- Xuxa?

- Xuxinha, elástico, para prender o cabelo.

- Porquê acha que eu teria uma xuxinha?

Jungkook enfiou a cabeça entre o batente da porta, olhou para ele com as sobrancelhas arqueadas.

- Tem uma caixinha azul...

Ele fez uma cara de convencido antes de sumir de novo para o banheiro.

- ...No armário do espelho. Tem umas coisas que minhas ex esqueceram por aqui, eu guardei aí.

- Que bizarro!

- Não é de lembrança!

Jungkook riu antes de gritar:

- Joga isso fora! - Remexeu a caixinha azul.

Ali dentro tinham anéis, pulseiras e brincos, um batom, algumas presilhas e enfim duas xuxinhas.

- Eu guardava para caso elas quisessem de volta. Eu acho quando tô fazendo faxina.

- Não sabe como fica atraente falando essas coisas - falou meio esquisito, porque a xuxinha estava presa entre os dentes.

- O que?

- Isso de- Porra... - murmurou, frustrado com os tufinhos de cabelo que não juntavam no penteado que tentava prender - Calma aí.

Um tempo depois - um tempo mais longo do que o usual para só prender o cabelo - Jungkook apagou a luz do banheiro e deu uma corridinha até o quarto. Fechou a porta e deu o mesmo sorriso arteiro de algumas horas atrás, só que agora tinha um rabinho de cavalo no topo da cabeça, fios da franja grande bagunçados no rosto e só uma Boxer preta vestindo o corpo.

- Vem cá - disse olhando ele de cima a baixo, dando duas batidinhas no espaço vazio da cama.

Ele apagou a luz do quarto e deitou ao seu lado. Ficaram um de frente para o outro, o ambiente estava escuro mas não chegava a ficar um breu, então eles ainda conseguiam se olhar direito. Era íntimo, como se fossem companheiros de longa data.

- É atraente quando fala sobre ser limpo e organizado - jogou a perna por cima da cintura de Taehyung. - Eu sei que é o mínimo, mas os caras são mais relaxados, então um que faz o básico acaba se destacando.

- Entendi - não entendeu. Na verdade, estava mais focado em memorizar o rosto dele. Segurou na lateral do seu pescoço e deu um beijo em uma das suas bochechas. - Você é muito lindo - falou com a voz grossa num tom mais baixo pela proximidade que estavam. - Acho que é a pessoa mais linda que já vi na vida.

- Fala sério... - estalou a língua no céu da boca. Fingiu desdém, mas o sorrisinho envergonhado e o desvio do olhar não mentiam. - Agora que me comeu vai falar assim comigo?

- Assim como?

- Todo sedutor com esse ar de quem me tem na mão.

- Eu não-

- Eu gosto.

Taehyung ficou sem graça por um segundo, depois deu uma risadinha manhosa abaixando a cabeça e esfregando o nariz no pescoço de Jungkook.

- Você é muito direto.

- E você demora bastante para ser também - fechou os olhos e segurou no cabelo dele, sentindo ele distribuir beijos breves no seu pescoço.

- Com você fiquei mais tímido - confessou baixinho.

- Por quê?

Ele deu um último beijo, perto da nuca, antes de voltar a deitar a cabeça no travesseiro a sua frente.

- Com você é de verdade.

- Hum? - Abriu os olhos curiosos.

- Antes eram tentativas muito rasas. Acho que nunca cheguei a gostar de ninguém de verdade.

Jungkook apoiou o cotovelo na cama e a cabeça no punho fechado. Com a outra mão, começou um cafuné em Taehyung, como uma motivação para que falasse mais.

- Uhum...

- Nenhum cara também nunca chegou a dar em cima de mim - deu de ombros. - Mas acho que sempre reparei bastante.

- Nos caras?

- É. Tenho gosto em achar homens bonitos.

- Uhum.

- Você já mexeu comigo logo quando eu te vi! - Falou como se estivesse tendo uma epifania.

- É? - Parou o cafuné, surpreso também.

- Nossa, olhei tudo em você - deu um tapa na própria testa. Um tapa de "Não sei como não percebi antes." - E tive uma época na adolescência que fiquei obcecado pelo Leonardo DiCaprio. Eu vi todos os filmes! Pintei meu cabelo de loiro por causa dele - Jungkook não fez questão de segurar a risada. - Eu tô falando sério. Eu pensava que queria ser igual a ele, mas agora acho que queria ele pra mim!

- Você dá de 10 nele!

- Não exagera - falou num tom de repreensão, como se o elogio a ele fosse uma ofensa. - Já viu o Romeu e Julieta com ele?

- Sim.

- Não tenho nem palavras.

- Dava muito.

- Acho que eu também!

- Ficou animado com essa história de ser gay, né? - Deu uma risada divertida. - Vou ficar com ciúmes.

- Você não precisa- Eu não... - ele disse, preocupado de repente.

- Eu tô brincando! Não sou de sentir ciúmes - deu um selinho nele, com a mão pousada em seu peito.

- Desculpa, é que já lidei com isso. Muito - deitou de barriga para cima, os braços cruzados sob a cabeça. - Normalmente as pessoas... - Jungkook deu um bocejo audível e piscou os olhos devagarinho, Taehyung ficou apreensivo. - Desculpa, você está com sono? Eu falo demais.

- Não, não - deu uma risadinha com os dentinhos da frente, franzindo o nariz. - Fofo. É que eu acordo muito cedo. A essa hora já tô dormindo. Mas estou te ouvindo, não quero dormir.

- Ah... - esticou um braço por debaixo do cobertor e começou um carinho com as pontas dos dedos na cintura dele. - Ok.

- Continua - começou com um carinho no peito de Taehyung de volta.

- Muita gente já se incomodou bastante por eu ter muitas ex. E não é nem como se eu falasse delas toda hora, na verdade deixo na surdina. Mas já vi todo tipo de ciúme, de verdade.

- Eu não ligo pra essas coisas.

- Dá pra perceber, não se incomodou de eu ter falado delas e nem fez cara feia por saber que já fiquei com muitas, não perguntou quantas ou algo do tipo.

- Isso não é da minha conta, não me importo mesmo. Mas ainda acho bizarro você ter coisas delas - riu, todo sonolento. - Sério, joga aquilo fora.

- Eu vou.

Ficaram em silêncio por alguns instantes, naquela pausa que tem nas conversas entre um assunto e outro. Poderia ser desconfortável como era normalmente, mas ali estava se tornando um costume gostoso.

- Eu quero casar.

Taehyung olhou para ele sem falar nem expressar nada, depois murmurou um:

- Hum?

- Tinha perguntado se eu queria casar. Eu quero. Mesmo depois do estresse e das coisas ruins que tive com meu casamento, ainda quero casar no futuro.

- Eu sempre quis.

- É uma cerimônia bonita, apesar de hoje em dia muita gente tratar ela de várias e várias formas negativas. Como um jeito de tomar posse umas das outras ou de deixar vários valores sem sentido subentendidos.

- As pessoas são maldosas com tudo.

- É. Apesar disso, tem um significado que eu valorizo. Faria se me apaixonasse de novo.

Taehyung sorriu e fez um carinho da cintura até a mão de Jungkook que estava em seu peito, a puxou até que ele caísse em cima dele e o beijou. Um beijo lento e profundo, cheio de intimidade, como se já fizessem aquilo há tempos. Jungkook tinha os braços largados sobre a cama, o máximo que mexia além da boca eram os dedos das mãos no cabelo loiro, enquanto Taehyung explorava todos os cantos das costas e do peito dele, até parar com as mãos no pescoço, os dedos indicador e médio fazendo um pouco de pressão na lateral, sentindo os batimentos acelerados dele. Jungkook soltou um barulho que pareceu com um gemido quando percebeu o que ele estava fazendo, e acabou por separar o beijo assim. Encheu o pulmão com ar antes de dizer:

- Você é muito-

- Bom?

- Gostoso. É tão-

- Gostoso?

- Que não consigo nem falar direito.

- Você também é muito-

- Incrível.

- Também.

Riram juntos.

- Estou ficando grogue. É melhor a gente dormir logo, antes que eu fale algo bobo e você pare de gostar de mim.

- Não vou - deu um beijinho estalado nele -, mas tudo bem - fez um carinho na pintinha embaixo da boca dele com o polegar. - Você parece bem cansado mesmo.

Os olhos de Jungkook pareceram brilhar por um segundo, mas ele estava com sono demais para falar mais alguma coisa. Então se ajeitaram um ao lado do outro novamente e Taehyung fez menção a abraçar ele por trás.

- Sou a conchinha maior - puxou o cobertor para cima, virando de frente para ele. - Vai, vira.

Não protestou, e acabaram por dormir de conchinha, mãos dadas e dedos entrelaçados, com o nariz de Jungkook fazendo cócegas na nuca de Taehyung.

Aquela tinha sido uma das noites mais bem dormidas de Taehyung em anos. Teve um sono pesado, sem sonho algum, e tão confortável, que não levantou uma única vez para beber água como normalmente fazia. Um sono tão profundo, que quando acordou, ficou mais de um minuto estático, com a mente vazia, o olhar fixo na fresta de luz da janela.

A primeira coisa que fez quando ficou consciente foi olhar as horas - 11:02h da manhã -, depois passou a mão no cabelo analisando o lugar a sua volta. E quando viu o chão vazio, metade da cama arrumada e suas roupas dobradas, sua reação foi como a de um personagem de filme de terror.

- Ele foi embora? - Foi a primeira frase que soltou, ofegante.

E aí, sentiu sua respiração falhar por um segundo. Sentou na cama, a coluna curvada, se espreguiçou e respirou fundo.

Sentiu vontade de chorar, mas no segundo seguinte se auto repreendeu por estar sendo tão emotivo.

- Ai, Taehyung - Fungou, esfregou a ponta do nariz e pousou a mão na bochecha. - Você é um homem adulto.

Levantou da cama. Só usava uma cueca e seus fios de cabelo estavam todos desgrenhados. Seus braços tinham marcas do lençol. Foi andando lentamente para fora do quarto, arrastando os pés como se fosse uma criança fazendo birra. Passou pelo corredor e de lá deu para ver a cozinha toda arrumada, louça lavada e guardada. Deu um sorriso de canto, que rapidamente virou uma expressão sofrida. Expressão essa que também mudou numa fração de tempo, assim que pisou os pés no início da sala.

Ele estava lá. Assoprando uma xícara de café forte o qual Taehyung, só depois de ver, se ligou do cheiro, com as perninhas cruzadas e cabelo úmido, sentado numa poltrona com a luz do Sol batendo no rosto e o óculos laranja preso em uma camiseta larga creme que Taehyung já não via fazia tempo.

Ele estava lá.

- Você está aqui.

Jungkook virou a cabeça assim que ouviu sua voz, e sorriu com os dentinhos da frente antes de dar uma risada entretida, como se ele estivesse engraçado.

- Bom dia. Você está uma bagunça - tomou um gole de café e fez uma careta desgostosa.

- Achei que tinha ido embora.

- E perder a oportunidade de experimentar café de uma cafeteira francesa chique? - O sorriso de sempre brincava nos lábios. - Isso tá uma merda - olhou para os pózinhos de café, boiando na xícara como se estivessem debochando da sua cara. - Mas acho que é porque fiz errado.

- Tá usando minhas roupas?

- Ah, é - olhou para baixo e segurou na aba do shortinho preto curto de tactel que usava por debaixo da blusa. - Peguei de uma gaveta sua. Até seu armário é todo organizado, achei tão fofo - levantou e foi andando até Taehyung. - Eu também fiz café para você, só que acho que não vai querer beber - parou bem na frente dele, e estendeu a xícara mostrando o líquido.

- Estava esperando eu acordar?

- Sim.

Taehyung deu um grande sorriso genuíno, e recebeu um beijo na bochecha por isso.

- Quase chorei pensando que não ia mais te ver.

- Ah, para - deu um empurrãozinho no ombro dele, deixou a xícara no balcão da cozinha. - Você fala essas coisas e eu acredito.

- É verdade! - Exclamou, erguendo as sobrancelhas. - Pensei que tivesse pego suas coisas e ido embora, e me senti um idiota por não ter pedido seu número de telefone.

- Deixei no seu banheiro.

Falou de forma natural. As torradas que estavam sendo preparadas antes de Taehyung acordar pularam da torradeira e ele as colocou num prato.

- O que?

- Deixei no seu banheiro ontem - mordeu uma das torradas. - De batom, no seu espelho, escrevi meu número de telefone.

- Você-

- Fiquei com medo de você não notar se eu escrevesse num pedaço de papel - ele deu um riso sonolento em resposta. - Espero que não demore para me mandar mensagem. Não sou do tipo que gosta de fazer esses joguinhos de desinteresse.

Taehyung revirou os olhos e cruzou os braços.

- Tenho 31 anos, Jungkook.

- Se soubesse o tanto de marmanjo que me deixa dias esperando ou que fura encontro para pagar de evoluído...

- Então ainda vai querer me ver?

- Ainda pago um jantar para você - deu de ombros, terminando de comer uma das torradas. Tinha os cotovelos apoiados na bancada.

- Quer que eu te chame pra um encontro, onde vai pagar um jantar pra mim? - Sentou em um dos bancos do balcão, de frente para ele, que ajeitou seu cabelo com os dedos de uma das mãos e com a outra levou uma torrada até sua boca.

- Isso. E da próxima vez, vamos para o meu apartamento.

- Você já pensou em tudo, não é? - Falou de boca cheia, e então deu uma risada contida.

- Você demorou para acordar. Acabei fantasiando aqui no silêncio.

- Achei que talvez não quisesse manter contato.

- Fiquei pensando que talvez você quem não quisesse manter contato.

- Estava bem errado.

- Você também.

- É que parece estar num momento da vida que não quer muito compromisso.

- Não é como se você quisesse me namorar - disse num tom divertido, como se a ideia fosse engraçada, e deu-lhe um selinho rápido. - Hum?

- Não sou tão emocionado quanto pareço ser, tá?

Disse como se correspondesse à brincadeira, mas se sentiu meio estranho depois de falar.

- Já namorou alguém que conheceu no mesmo dia?

Taehyung abriu a boca e sentiu as bochechas ficarem quentes. Jungkook deu uma risada arqueando as sobrancelhas, esfregou as mãos tirando os farelos delas e depois molhou-as na água da pia.

- É, mas...

- Vamos só deixar as coisas caminharem. Tudo bem por você? - Deu a volta no balcão e pôs as mãos no pescoço dele. - Até horas atrás a ideia de ficar com um homem nem passava na sua cabeça. E fico feliz se não vê isso como um problema - deu um sorrisinho descendo o olhar rapidamente, para depois voltar a encarar seu rosto -, na verdade, acredito que já tenha achado sua solução. Mas posso te dar certeza que sua dúvida se quero algo com você por agora ou não é o menor dos seus problemas.

- Eu entendi o que quer dizer.

- Vamos devagar e sempre. Se entende um pouco melhor primeiro. A gente sai, se conhece mais... e no que deu, deu.

- Deve ter tanta coisa que ainda não sei sobre você - ele soltou num suspiro.

Jungkook o olhou de um jeito diferente. Era doce, tinha um bico nos lábios.

- Pode ter certeza que também quero saber mais sobre você.

- Não sou das pessoas mais reservadas do mundo.

- Mas também não é tão transparente quanto pensa.

Taehyung deu um beijo na ponta do nariz dele.

- Você precisa ir embora?

Jungkook sorriu, e a luz do sol iluminou metade do seu rosto de um jeito quase divino. Riu colocando uma mecha de cabelo atrás da orelha, os brincos de prata balançaram.

- Você quer que eu vá embora?

- Vai embora só se precisar.

- Eu não preciso. Não agora.

- Então fica - deu um beijo em sua bochecha, uma das mãos apoiada em seu ombro. - Fica mais algumas horas.

- Fico.

Depois disso, Jungkook esperou Taehyung tomar um banho. Viram um filme antigo juntos na sala e almoçaram uma comida que Taehyung pediu de um delivery rápido. Trocaram beijos breves e conversaram sobre assuntos leves até o fim da tarde chegar, quando Jungkook teve que ir embora porque tinha coisas em casa para botar em ordem e porque sabia que Taehyung tinha um bar para cuidar.

A despedida em si não foi dolorida.

- Vou te ligar.

- Me manda mensagem - Jungkook deslizou a mão pela cintura dele, seu olhar passeava por cada partezinha que pudesse captar de Taehyung.

- Ok - tinha um sorrisinho que não saía do rosto por nada. O antebraço apoiado no batente da porta, bem acima do topo da cabeça de Jungkook, enquanto segurava na base do pescoço dele com a outra. - Não precisa me devolver as roupas.

- Vou usar de desculpa para voltar aqui - apertou as próprias roupas da noite passada que apoiava no peito dobradas, as botas pesadas sendo seguradas pela mão.

- Não precisa de desculpa.

- Posso vir a qualquer hora pra te pedir uma tequila, então?

- E eu não vou cobrar nada.

Deram risadas cúmplices.

- Sou um cliente VIP?

- Eu tô querendo muito te dar um beijo agora.

Ele fechou os olhos e esperou. Taehyung se aproximou devagar e uniu seus lábios num primeiro toque sutil. Foi Jungkook quem tomou iniciativa quando puxou seu lábio com os dentes, tão fraco que era quase imperceptível. E iniciaram um beijo de língua, lento e recíproco, pois os dois queriam que fosse proveitoso. Não tinha nada com segundas intenções, não foi nada além de uma troca sincera de carinho, selada com alguns selinhos e sorrisos. Foi o mais longo de todos os que eles tinham dado, porque definitivamente não queriam que fosse o último.

- Tchau.

Taehyung falou, rápido, como se tivesse arrancado um band-aid.

- Até logo.

Jungkook respondeu, ainda com o sorriso inabalável e deu um pequeno aceno antes de se afastar de verdade descendo alguns degraus da escada de ferro.

- Até logo!

Falou uma última vez, quando ele já estava longe, e fechou a porta.

A despedida em si não foi dolorida, mas quando ele viu que Jungkook foi embora, foi como acordar de um sonho bom.

E quando mais tarde, no meio do seu turno, Yoongi apareceu no bar, Taehyung não chegou nem a cumprimentá-lo.

- Yoongi, eu sou gay.

Foi a primeira coisa que disse.

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