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By lia_cullen

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By lia_cullen

sim, a maior de todas está de volta

não esperem muito desse capítulo, eu odiei o resultado. acho que enferrujei durante a pausa 🚶🏻‍♂️



🌒🔥


Eu já tinha tomado o chá contraceptivo antes, mas fazia tanto tempo que não pude evitar em fazer uma careta, em surpresa e descontentamento, ao dar o primeiro gole. Aquilo tinha gosto de sovaco. E veneno. Bem, não importa, certamente era o gosto de algo que poderia me matar rapidamente. Então eu o larguei sobre minha velha escrivaninha, enrolando para não tomá-lo, ao ponto de não ver mais vapor algum escapar da louça fina.

A ponta da caneta deslizava habilmente sobre os papéis, sendo o único som no quarto. Nada tinha mudado alí. Meu antigo espaço ainda abrigava um sentimento de solidão, enterrado no fundo de meu peito. Eu não queria e muito menos iria pensar sobre isso. Mas era engraçado pensar que, a minha realidade era e é muito diferente do que todos pensam. Sim, eu sou popular, mas não no sentido de ter muitos amigos. Tá mais para "filha de vocês sabem quem." E exatamente por isso, eu tinha me obrigado a sair da cama, para responder as cartas dos moradores de Velaris.

"Feliz aniversário mini Rhysand". - Uma dizia.

"...Venha buscar uma sacola de nabos, por nossa conta. Sei que sua mãe adora e..." - Outra dizia.

"Querida Velarie, guardiã de Velaris, espero ser como você quando crescer. Feliz aniversário". - E essa veio acompanhado de um desenho de giz em uma folha branca. Era explícito que a carta não tinha sido escrita pela mesma pessoinha que fez o desenho, visto que o que provavelmente deveria ser eu, parecia uma árvore de vestido com frangos pretos no lugar das asas.

Mas, ironicamente, essa tinha sido uma das únicas cartas que eu respondi além do que se é permitido para não soar rude. Respondi porque quis, não apenas por educação. Porque me senti verdadeiramente querida, vista.

E é sobre isso que estou falando quando digo que sou popular. Um rosto familiar e um sobrenome é tudo que sou pra uma grande maioria. Minhas únicas três amigas estão longe, e nossos encontros eram agendados, planejados, sendo um deles dado mais como trabalho do que qualquer outra coisa. E isso era... frustrante. Era frustrante voltar pra casa e ter a solidão como companheira, mas eu escolhi assim.

Eu escolhi assim.

– Querida? - Meu pai soou atrás da porta após bater. Eu me virei, bem a tempo de vê-lo entrar segurando uma tigela. - Perdeu o café. - Ele disse, arrumando algumas folhas de lado para depositar o que parecia ser ovos mexidos com ervilhas e coisas nojentas.

– Arg, tomate, pai?! - Eu perguntei, remexendo a mistura com o garfo. O macho arrastou uma cadeira de madeira até a parede, se sentando ao lado da escrivaninha.

– Vai comer tudo, Velarie. - Ele disse seriamente, olhando em meus olhos. Um segundo após isso, se sentou elegantemente, cruzando o tornozelo sobre o joelho. - Nuala disse que você tinha descido, mas que só esquentou um pouco de água para um chá.

– Sim, eu... - Eu ergui a mão para pegar mais um envelope, mas parei, confusa. No meio do monte de cartas eu avisto um carimbo diferente e profissional, ao qual eu reconheço de imediato. - Eu acordei tarde e decidi esperar o almoço.

– Sabe que não deve fazer isso, não pode pular as refeições. - Ele disse calmo, sua mão ajeitando algo na lateral de sua bota.

– Sim, eu sei. - Respondi monótona enquanto lia palavra por palavra da carta recém aberta. Era da minha chefe. Ela queria conversar comigo após o horário de almoço. Eu peguei a xícara fria e dei um bom gole, já não ligando para o gosto.

– Não está com frio? - Eu ouvi sua voz soar após um momento. Era quase como se eu tivesse esquecido, sua presença estava perigosamente silenciosa. E olhando para seus olhos, eram como olhos de águias. Duas joias brilhando nas sombras.

– Como? - Eu perguntei, limpando a garganta.

– Não está com frio? - Ele repetiu, balançando a cabeça quase como um incentivo. - As janelas estão abertas, e está ventando muito ultimamente. - Ele indicou com os dedos. Meus olhos capitaram as cortinas leves balançarem ao vento.

– Estou me aquecendo, não percebi o vento. - Eu comentei, voltando meu olhar para seu rosto. Ele concordou com um zumbido. Sua boca exibiu um sorriso fraco, amigável, que não chegava em seus olhos, e eu retribui antes de voltar minha atenção para as cartas. Entretanto, seu olhar não me deixou, e o que eu pensava ser apenas uma interação breve, se tornou um encontro desconfortável. - Tudo bem, pai?

Seus olhos estavam em meu braço nu, focados nele. - Tudo. - Ele respondeu, passando o indicador no lábio inferior. Eu balancei a cabeça em concordância, voltando a ler uma das cartas. - É só que... - Voltei rapidamente meus olhos para o macho, esperando. - Não tinha prestado atenção nessa tatuagem. No desenho nela. - Ele disse devagar, calmo. Eu olhei pra baixo, para meu biceps e o círculo preto de desenhos trançados. Arregalei os olhos levemente, querendo gritar e me dar um soco. - Sabe o que significa? - Seu indicador desenhou alguns traços, e eu me senti suja. Traidora, mentirosa.

– A árvore da vida. - Eu disse, sem coragem de levantar os olhos de minha própria pele. - Vi em um livro da Corte Outonal. - Eu menti. - É lindo, não acha?

Nossos olhos se encontraram e, eu nunca me senti tão nua em toda minha vida. E isso não tinha nada haver com o fato de eu ainda estar vestindo minha camisola prateada. Seu rosto estava ilegível. - Acho. - Ele soprou. - Combina com você. - E então, mais um sorriso fraco, pouco antes de se levantar, beijar minha cabeça e sair, com a desculpa de que tinha uma reunião.

Assim que ouvi o baque da porta, me deixei derreter na cadeira. Meu coração batendo em meus ouvidos, e meus olhos cravados na xícara que ele ajeitou pouco antes de se levantar.

(...)

– Você entende, não entende? - A fêmea disse por fim, enquanto ajudava a limpar uma das mesas. Era o fim da hora de almoço e o restaurante estava completamente vazio. Eu apertei meu avental dobrado em minhas mãos com força.

– Na verdade, não. Eu não entendi. - Eu balancei a cabeça devagar. Meus olhos acompanhando cada movimento rápido da mais velha, e meus pés insistiam em persegui-la pelo salão. – Fiz algo de errado?

– Não, não! Velarie, querida... - Ela se virou, e eu tive que me obrigar a parar antes que esbarrasse nela. Um suspiro cansado deixou seus pulmões, e ela limpou a mão com o pano antes de jogá-lo sobre o ombro. - Olha, Velarie, eu só não... Não posso continuar cobrindo suas folgas. - Ela deu de ombros. - Você tem seus serviços na Corte, o que eu admiro muito, quero que saiba disso. - Seu dedo indicador foi apontado em minha direção. - E logo mais irá voltar para o treinamento lá fora, como você mesma disse. Então... Bem, é isso. Não tenho mais o que dizer, querida. Eu simplesmente não posso pagar mais um funcionário para te cobrir. - Seu rosto demonstrava tristeza, provavelmente um espelho do meu.

– Só trabalhei aqui por duas semanas. - Eu sussurrei, decepcionada - mais comigo do que com qualquer outra coisa. Duas semanas em um emprego era humilhante demais. Droga, o que meus pais iriam pensar disso?

Seu corpo se projetou para a frente agarrando meus ombros com as mãos. Seus olhos procuraram os meus, firmes. - E eu vou pagar cada centavo. Lhe dou minha palavra. - Seus olhos desviaram para o chão por um segundo, e ela me largou, apertando as mãos uma contra a outra. - Velarie, escuta... Se não estou me intrometendo, posse te dar um conselho de mãe? - Seus olhos brilharam ao se voltarem pra mim, incertos.

– Sempre. - Eu sorri fraco, entregando o avental em minha mão. Ela segurou, ajeitando e alisando o tecido antes de dizer:

– Você é jovem, querida. - Seus lábios se comprimiram ao suspirar. - E é a princesa desta Corte. Não deveria estar em um trabalho tão braçal.

– Não pude escolher muito.

– Sim, eu sei. - Ela balançou a cabeça devagar. Em seus olhos brilhava empatia e compreensão. - O que aconteceu conosco no último mês, o que aconteceu com essa cidade, foi terrível. Sei que não estava em seus planos ficar fora dos palcos, mas eu também acho que, lugares como este... - Sua mão indicou o lugar. - ...Não combinam com você.

Eu balancei a cabeça, entendimento escorregando amargamente por minha garganta abaixo. Eu sabia do que ela estava falando. Trabalhos na Corte.

– Quer saber de uma coisa? - Eu perguntei, passando a língua pela lateral da boca. - Seu lucro vai cair agora que meu rostinho não vai estar mais por perto. - Eu balancei meu indicador, fingindo pensar seriamente. A mais velha bateu com o pano em meu braço, me repreendendo enquanto sorria contida. - Sabe que é verdade! - Eu protestei, segurando o braço atingido.

– Vá embora e não volte, Velarie! - Ela abanou o tecido, me expulsando como um cachorro.

Enquanto eu saia, descendo as escadas, me virei para olhá-la. - Obrigada pelo conselho. - Eu sorri, recebendo seu sorriso cansado e cheio de rugas nos olhos e bochechas. Eram as marcas de uma vida corrida e difícil. Marcas essas que, dificilmente eram vistas em membros da Elite, como eu - não importa quantos séculos se passassem.

– É uma boa menina, Velarie. Sabe que te adoro. - Ela disse com ternura. Eu sorri, me afastando mais. - E não esqueça que prometeu ajudar meus filhos com álgebra!

– Toda quarta. - Eu disse alto, já de costas para a mesma, pra que ela pudesse ouvir bem. Meus dedos encontrando meus bolsos enquanto eu fazia um caminho solitário, cheio de pessoas e sorrisos, de volta para a minha casa.

(...)

– Você está bem? - Minha mãe perguntou amorosamente. Sua presença cobriu minhas costas, suas mãos apertaram pontos de tensão em meus ombros. - É uma pintura interessante.

– Sim. - Foi tudo o que disse enquanto admirava intensamente a tinta que mal notei ter espalhado pela tela. Eris não tinha saído de minha mente nem por um segundo desde que acordei. - Estou bem, mãe. - Eu me forcei a sorrir e olhá-la de soslaio.

– Você e Ares se tornaram bons amigos, então? - Ela disse, se sentando em um banco próximo ao meu, indicando a pintura com o queixo. Sua loja já estava vazia, limpa e organizada. E somente nós duas ocupávamos o local em meia luz.

Eu olhei pra baixo, diluindo a tinta do pincel em um pote de vidro com água turva. Minha cabeça balançou positivamente, e um sorriso triste se apossou de meus lábios. Eu nunca me acostumaria a mentir pra ela. Minha mãe não merecia isso. Meus pais não mereciam. - Traumas e dores estão por todos os lugares em Prythian. - Eu sussurrei, com apenas um nome, um rosto, um corpo, e uma voz em minha mente. - Descobri que temos muito em comum.

Sua única resposta foi o silêncio, e eu não me atrevi a olhar em sua direção. Mentirosa - uma voz sussurrava no fundo de minha mente.

– O que está te incomodando, Velarie? - Ela perguntou, sua voz gentilmente derretendo minhas armaduras. Pareceu uma súplica, uma ao qual eu não pude ignorar. - Por favor, filha, fale comigo.

– Fui demitida hoje. - Eu praticamente vomitei aquilo que estava remoendo o dia inteiro. Minha mãe abriu a boca, provavelmente sem saber ao certo o que dizer. - Por estar ausente, muito envolvida com a Corte. - Gesticulei com uma das mãos, completamente frustrada. - E sabe o pior de tudo? Ela está certa sobre isso. Mesmo agora, não consigo parar de pensar que estava tomando o lugar de alguém que realmente precisava daquele emprego e... Ah mãe. - Eu cobri os olhos em angústia. Pra onde eu fosse, o peso de meu sobrenome cairia sobre mim. - Eu só queria ter uma vida normal.

Uma de suas mãos alisou meu ombro, me ancorando, me impedindo de ir muito mais afundo em meus pensamentos torturantes. - Sinto muito, mas preciso te dizer que isso será impossível. - Eu levantei os olhos até os dela, surpresa, sentindo meus cílios úmidos. Definitivamente não era o que eu queria ouvir. - Se o que quer é uma vida no anonimato, pacata e livre de batalhas e problemas, terá que abdicar seu lugar de herdeira, de Valquíria. Terá que abandonar a vida como você conhece... - Suas mãos agarraram a minha. - Velarie, meu amor, quero que entenda que, pessoas como eu e você, servimos para isto, para fazer a vida ser normal para as outras pessoas. Enfrentamos coisas para que eles não enfrentem, nos machucamos, nos cansamos, perdemos a cabeça muitas das vezes, para que eles não precisem fazê-lo. E tudo isso, porque amamos nosso povo.

– Sim. - Eu concordei com a cabeça, devagar, mais porque não sabia o que dizer. Minha mãe deslizou os dedos por minhas unhas decoradas, admirando as cores confusas.

– Sei o que está sentindo.- Ela sussurrou depois de um tempo. - Nyx passou por isso há não muito tempo atrás, e eu também enfrentei isso, mais cedo do que o esperado. - Seus olhos escureceram com lembranças que eu jamais pude imaginar, histórias das quais eu não sabia completamente. - Amadurecer é assustador, mas ser obrigado à isso é um tormento que te acompanha pra sempre. E fazer isso sozinha é... é...

– Mãe. - Eu a chamei gentilmente. Minha cabeça se inclinou para baixo, para que eu pudesse encontrar seus olhos novamente. - Não sou você. Não preciso sustentar uma família e muito menos lutar para sobreviver. As coisas são diferentes agora. Vou ficar bem. - Seus olhos brilharam, e suas sobrancelhas se encontraram, apontando pra cima em uma expressão devastadora.

– Quero que fale comigo. - Ela pediu.

– Estou falando. - Eu sussurrei de forma idiota, recebendo um revirar de olhos que me fez rir.

– E saiba que seu lugar na Corte sempre existirá. - Ela balançou a cabeça enquanto dizia. - O cargo de Emissário ainda está vazio e-

Eu ouvi minha mãe falar, cada palavra. Mas quanto mais ela falava, mais eu pensava sobre minhas escolhas. No fim, era tudo uma grande mentira.

Eu nunca tive uma escolha.

Nunca.

E a única coisa que eu verdadeiramente amava e escolhera fazer, foi tirada de mim. Ir para Ilyria não foi minha escolha, participar do Rito não foi minha escolha, cortar a fita não foi minha escolha, ser instrutora não foi minha escolha. E eu nem mesmo sabia mais se realmente nasci pra ser uma guerreira, ou se apenas fui aceitando o que me fora empurrado.

Isso não parecia certo.

Eu nunca tive uma escolha, porque nunca houve uma.

Ah não ser... ah não ser-

– Prometo que vou pensar, mãe.

(...)

Se arrependeu? - Um papel surgiu em fogo no apoio de minha banheira. Eu me sentei, sentindo cócegas em meu estômago. Entortei a boca ao ler a mensagem, me sentindo mal por não ter lhe enviado ao menos um bom dia. Eris merecia mais do que isso por ter me... Bem, eu não poderia negar, dormi adoravelmente após nosso encontro.

Eu estava relaxada como nunca, apesar de minha mente idiota.

Muito pelo contrário. Daria qualquer coisa para estar com você agora.

Desculpe por não ter escrito antes, tive um dia cheio.

Eu enviei, me debruçando sobre a banheira. Fiquei brincando com as chamas de uma vela aromática, fazendo com que ela aumentasse e diminuísse.

Voce é obcecada por mim...

Mas eu também adoraria tê-la aqui, em vez de Ares.
Sabe que eu odeio mentir.

Me conte sobre seu dia.

Eu revirei os olhos, não conseguindo evitar um sorriso. Precisei de um papel maior para abrigar tudo que eu queria escrever. Eu nunca tinha dito tanta coisa em nossas trocas diárias, e muito menos Eris, mas ele não ficou muito pra trás.

Eris pareceu um pouco surpreso e até mesmo irritado com o fato de eu ter trabalhado em um restaurante. O que provocou uma pequena discussão entre nós dois, que foi imediatamente encerrada por ele ao se desculpar. O fato era que pessoas em nosso meio não faziam esse tipo de coisa. Somos intocáveis.

Posso fazer algo para melhorar seu dia? - Seu bilhete chegou enquanto eu me secava.

Acho que só vou me deitar um pouco. Obrigada por ontem, e por me ouvir hoje. - Eu escrevi rapidamente, antes de ir até o armário embutido na parede de meu quarto.

Depois de ter colocado um pijama de shorts larguinho, eu notei a demora da volta do bilhete. E quando achei que não iria aparecer mais, me sentei na cama, vendo um papel aparecer em meu colo.

Dormir para fugir dos problemas não resolve nada.
E é bom que você tenha comido algo.
Juro que invado sua corte se tivermos que discutir sobre isso também.

Eu simplesmente poderia atravessar até a Outonal somente para estrangular Eris. Eu odiava quando ele falava como se estivesse mandando em mim.

Não vamos discutir nada, não estou pedindo sua opinião.

Eu mandei, me deitando na cama e pegando um livro. Eu não estava com sono, nem um pouquinho.

Você tem a língua muito afiada fora da minha cama, meu amor.

E eu me preocupo, sabia? Penso em você muito além do nosso acordo.
Não estou blefando. É melhor comer algo se gosta da paz que reina em Prythian.

E depois, por que não sai um pouco? Pássaros não foram feitos pra ficar no chão, e certamente você também.
Ouvi dizer que o céu da Corte Noturna fica maravilhoso no outono.

Deveria voar um pouco, Velarie.

Sabe tudo, egocêntrico, cafajeste.

(...)

– O que você tá fazendo? - Nyx perguntou da porta da cozinha, me olhando no quintal de trás como se eu fosse uma criatura acéfala.

– O que você tá fazendo? - Eu perguntei, me virando para o mesmo, que segurava uma sacola de papelão sem alças.

– Comprei o macarrão cheio de coisinhas que você gosta. - Ele disse, descendo os degraus da varanda.

– Foi até a Corte Crepuscular só pra isso? - Eu me aproximei, espiando o saco. O cheiro delicioso do molho me fez suspirar.

– O que exatamente você estava olhando no céu? - Ele perguntou, parecendo confuso enquanto olhava pra cima.

– Hm, nada demais. - Eu disse já subindo a escada. - Estou com fome, traga isso aqui.

Eu preparei a mesa pra nós dois e nos servimos. Fazia um bom tempo desde a última vez em que eu e Nyx passamos um tempo juntos.

Meu irmão estava mais silencioso que o comum, olhando para a porta vez o outra. Eu estava intrigada com aquilo, Nyx sempre fora meio misterioso pra mim, por ser mais velho e estar em outra fase da vida. Mas, ironicamente, sempre fomos confidentes um do outro. É claro que, algumas coisas estão além da relação fraterna, porque todos tem segredos.

– Um pensamento por outro. - Eu disse quando terminamos. Nyx cruzou os braços sobre a mesa, sorrindo levemente enquanto passava a língua pela bochecha.

– Me prometa que sempre será minha irmã, mesmo que eu faça algo que não goste, ou que te aborreça muito. - Ele disse, me olhando nos olhos, humor e estrelas passeando alí.

– É biologicamente impossível negar isso, Nyx. - Eu disse, me encostando na cadeira. - E você meio que já me aborrece há uns dezenove anos, então...

A risada rouca e gostosa de meu irmão ecoou pela minha cozinha. - Então prometa que sempre será minha amiga. - Ele pediu, ainda sorrindo.

– Prometo. - Eu sussurrei, beliscando seu braço ao me levantar, levando a louça suja para a pia. - E eu estava pensando em você. Apenas isso. - Dei de ombros, começando a lavar as coisas.

– Sabe, eu andei pensando e, percebi que não tenho amigos agora... Não como tinha há dez anos. - Ele disse calmamente. Eu olhei para trás enquanto lavava os talheres.

– Eles vêm e vão. - Eu sussurrei pensativa. Nyx só tinha alguns anos a mais que eu, mas a diferença se tornava significativa quando se tratava de vivência. Muita coisa poderia acontecer entre seis e sete anos. Muita coisa poderia mudar também.

- Não preciso de amigos, isso não me afeta. - Ele deu de ombros, olhando para o lado. - Mas preciso de você, Velarie.

Enquanto eu secava as mãos, encarei meu irmão de volta, que me lançou um olhar cheio de ternura. Eu sorri mínimo e abri os braços, esperando que ele viesse ao meu encontro.

– Você tá bem? - Eu perguntei em seu pescoço quando nos abraçamos. Eu não precisava saber o motivo de sua declaração momentânea, só precisava saber se ele estava bem. Nyx me amava, e demonstrava isso de diversas formas, não necessariamente dizendo. Fala sério, ele tinha comprado minha comida favorita no mundo. - Eu te amo.

(...)

Longe da Corte Noturna, e da harmonia entre irmãos, Eris ouvia Anteros esbravejar. Ele estava surpreso com toda a situação já que, bem, não ouvia a voz do irmão há meses. E pra ser sincero, Anteros sempre fora de natureza monossilábica. Ele sempre iria preferir balançar a cabeça, dizendo sim ou não, do que te olhar nos olhos e sustentar um diálogo normal. E somente por isso, o Vanserra mais velho trocou um olhar cúmplice com o irmão mais novo, Ares, que estava sentado bem no canto de seu escritório, como fazia toda noite antes do jantar.

– Vai mesmo gastar nosso dinheiro dessa forma? O dinheiro que nosso pai-

Ele falava e falava, irritado com o fato de Eris ter gastado uma fortuna com presentes para a princesa de Velaris.

– Quem é seu pai? - Eris questionou, cortando a fala do mais novo de forma ríspida. Ares, decidiu se encolher na poltrona de couro, desejando fundir-se ao móvel.

– Ora, que pergunta é es-

- Quem lhe ensinou a ler e escrever? Quem lhe ensinou a se vestir? Quem lhe ensinou equitação? Quem lhe ensinou a caçar? - Sua voz era baixa e rouca, e Anteros pôde jurar que havia ressentimento em seus olhos. Ele estava expondo algum tipo de ferida, uma que nunca cicatrizou. Então, por incrível que pareça, sua voz soou baixa e contida quando voltou a falar:

– Se acha que vou lhe chamar de pai...-

– Não estou pedindo isso, apenas não quero lembrar da existência desse verme. - Ele olhou para seus anéis e ajeitou o do mindinho, de forma elegante. - E trate de usar a educação que te dei ao falar de uma dama. Me chateia ver como você escolhe não usá-la.

– Aquela fêmea está longe de ser uma dama. - Ele cuspiu, zombando. Eris girou um de seus anéis mais algumas vezes, tentando se controlar. Mas estava claro, em sua forma de olhar, que ele não aguentaria ouvir a voz do próprio irmão por muito tempo. - Não vê como Helena passou a se comportar depois dessas tais aulas?

– Você quer dizer, menos submissa? - Ares perguntou de seu canto, não conseguindo se conter porque, de todos os irmãos, ele sempre fora o mais influenciado pela presença de Helena. Então, ele se levantou, enfurecido para dizer: - E ela é sua mãe! Pelos deuses, não consegue nem mesmo falar a palavra em voz alta?

Anteros olhou para o irmão mais novo, sem ter ideia de onde ele havia surgido. Nem mesmo havia notado sua presença. E em seu rosto havia nojo e confusão, como se Ares fosse um inseto irritante. O mais novo sentiu a pancada invisível e familiar daquele tratamento em seu peito, Anteros tinha aprendido perfeitamente como fazê-lo assistindo os irmãos mais velhos.

– Cansou de se esconder de mim, Ares? - Ele sorriu ardilosamente, caminhando em lentidão até sobrepor sua sombra sobre o mais baixo. Ares tremeu, mas não era sua culpa totalmente. O irmão sempre teve um brilho insano nos olhos que o aterrorizava. - Por que não vai brincar com as maquiagens da sua mãe? Nos faça esse favor e suma daqui. - Ele riu e depois cuspiu as palavras na face do mais novo, como se ele fosse algo repulsivo.

– Anteros. - Eris soou rouco, entre dentes, enquanto se levantava. Mas nenhum de seus irmãos ouviram.

– Você é uma pessoa horrível, Anteros. - Ares disse, seu corpo inteiro tremendo de raiva, seus olhos nublados. Não era atoa que evitava a presença do irmão, ele sempre saberia o que dizer para o desestabilizar. - Merece a vida miserável que tem. Merece viver nesse palácio, sozinho e sem ninguém, porque é um ser repulsivo! - Ares cuspiu de volta, sem saber que estava acertando o golpe em cheio pela primeira vez.

– Ares! - Eris o chamou, repreendendo-o. Suas mãos apoiadas na mesa de madeira, como se precisasse segurar em algo. Ver discussões como essas traziam memórias antigas e terríveis de seus outros irmãos. Brigas que Eris sempre tinha que apartar, já que seu pai não ligava. Beron normalmente ria mais ainda se houvessem facas no meio.

– Você é igual a ele, Anteros! Você é igual ao nosso-

As coisas aconteceram muito rápidas para Ares, em um segundo estava gritando com o ruivo, e no outro, estava sendo enforcado contra uma estante de livros. Ele sentiu medo, nunca fora bom de briga e já não tinha mais os musculos e o peso de quando era obrigado a atuar ao lado dos irmãos. Anteros, mais velho, alto e forte, poderia matá-lo sem nem mesmo usar seus poderes.

– Nunca mais repita isso. - Ele sussurrou, nariz contra nariz. Com os pés fora do chão, Ares tentou segurar o ar que lhe restava. Estava apavorado, os olhos cólericos de Anteros, arregalados, mostravam uma intensidade assassina que ele não estava disposto a conhecer.

Porém, tão rápido quando aconteceu, acabou. Anteros caiu no chão, queimando as mãos ao tentar segurar a coleira de chamas que circulava seu pescoço. Eris o arrastou para longe de Ares, que permaneceu de pé, se apoiando na poltrona, segurando a própria garganta. O general gemeu de dor, fazendo Eris libertá-lo imediatamente, porque para ele, soara exatamente como o Anteros que ele tanto protegeu no passado.

E quando o viu deixar a sala correndo, como um bandido em fuga, ele o seguiu. O seguiu porque estava cansado de vê-lo viver desta forma.

– Anteros, não me alegra nem um pouco infringir-lhe dor. - Ele disse seriamente, alcançando os passos apressados do irmão. - Eu não queria que as coisas fossem assim... E não precisam ser! Eu sei que você-

– Você não sabe de porra nenhuma, Eris! - O mais novo se virou, apontando o dedo tão próximo de seu rosto que teve que desviar. Transtornado, completamente, sua respiração pesada soava por todo o corredor de mármore.

– Sim, você tem razão. - Ele disse, tentando parecer calmo perante o caos de seu irmão. - Mas, não precisa carregar essas ...coisas com você. - Deuses, ele nem mesmo conseguia falar sobre o assunto.

Anteros olhou pra baixo. Com seu olhar perdido, e o cabelo curto e bem cortado caindo sobre a testa, ele sussurrou. - Não sou como ele.

– Não. Você não é. - Eris balançou a cabeça,  dando um passo em direção ao mais novo. Algo sobre a postura prostrada do mesmo o fazia querer abraçá-lo fortemente. Mas as coisas eram diferentes com Anteros, assim como eram para ele próprio no passado.

Para Eris, demorou uma década completa para conseguir receber afetos vindos de Ares, e levou mais uma década inteira para poder retribuir espontaneamente. Porém, Anteros parecia viver ainda no passado, convivendo com seus fantasmas e traumas e lembranças de morte dentro daquele palácio. Se negava a sair, se negava a viver.

– Escute. - Eris disse baixo o suficiente para que as pedras brilhosas não refletissem sua voz. Se aproximando mais um passo de seu irmão, que parecia frágil de uma maneira que só ele tinha a permissão de ver. - As coisas são diferentes agora. Muita coisa mudou em duas décadas. - Sua voz era tão gentil, tão melodiosa, que Anteros o olhou confuso, e durante a ação, Eris teve um vislumbre de um um medalhão embaixo da gola de sua roupa. Aquele, era talvez o único presente que ele o dera em toda a vida. E por isso, por perceber que talvez ele fosse a única pessoa no mundo que o jovem general se importava, Eris disse: - Pode parar de lutar agora, Anteros.

Algo nos olhos do irmão revelaram muita coisa à ele. Era como se fosse um reflexo, e por isso doía, por isso o corroía o peito. Anteros não tinha deixado sua máscara para trás após a queda de Beron e dos outros irmãos. Na época, viver desta forma era necessário, era preciso para sobreviver. Mas as coisas não eram mais assim. Não precisavam ser.

– Saia deste lugar. - Ele pediu, quase implorou, quando viu uma brecha. Era a segunda vez que pedia desde a construção da nova casa. - Sabe que temos um quarto para você, como prometi. - Ele lembrou, olhando em seus olhos. Mas raiva o tomou novamente, em um conflito interno, uma batalha dolorosa que Eris reconhecia muito bem.

– Aquela é a casa de Helena, para que ela fique segura. Para que se sinta bem. - Ele disse, olhando para qualquer lugar que nao fosse o irmão, porque sabia que ele veria a melancolia em seus olhos. Eris não pôde deixar de perceber o significado das palavras.

– Aquela casa também é sua. - Ele disse firmemente. - E eu sempre serei seu irmão. - Ele acrescentou, porque achou necessário, porque precisava dizer. Era o que ele queria ter ouvido. Eris sabia como era se sentir sozinho, perdendo uma batalha contra sua própria mente.

Os olhos carmim do irmão, em um tom quase castanho, brilharam, quase transbordando no limite de sua fragilidade. Sua boca se abriu, tremendo, mas ele nada disse. Em vez disso, olhou para algo atrás de Eris, algo esse que trouxe de volta sua armadura fria. O Grão Senhor quis gritar, e virou para berrar com quem quer que fosse, mas acabou encontrando sua mãe e irmão, de mãos dadas.

Era o retrato da união. Da união contra um vilão que Eris nunca aceitaria, nunca diria ser real. Porque, se Anteros era um ser isento de perdão e segundas chances... Isso significava que ele também era.

E quando escutou seus passos apressados sumirem corredor afundo, ele fechou os olhos com força.

– Você precisa parar de passar a mão na cabeça dele! - Ares esbravejou, com raiva. E ele não tirava seus motivos. - Todos nós passamos por merdas, mas você não me vê atirando flechas contra Velarie, ou gritando com as pessoas. - Ele disse entre dentes. Eris viu sua mãe pousar sua palma livre sobre o peito do irmão, tentando o acalmar de forma materna.

E por mais que tentasse, não conseguia sequer se lembrar de Helena fazendo algo parecido com Anteros. Em nenhuma fase de sua vida. Nenhuma.

Nunca.

– Há certas coisas na vida, Ares, que estão muito além do nosso conhecimento e entendimento. - O Grão Senhor disse rouco, pela tristeza que pesava seu peito.

Seus olhos voltaram para o fim do corredor, e memórias de seu irmão o invadiram. Beron, o demônio, destruiu a vida de cada um de seus filhos de uma forma específica e dolorosa. E Eris sabia muito bem que feridas onde ninguém mais poderia ver, eram as mais difíceis de cicatrizar.
















___________________________________

vish mano

o contraste de famílias é muito visível, né

eu quis trazer um pouco desse lado do eris, tem muito dele que ele não vai contar pra vel e eu acho importante mostrar

Anteros é um vilão, que esteja claro, mas ele é meu vilão fav.

e eu gostaria de falar um pouco dele, já que o vai ter um papel importantíssimo no futuro. eu o criei já sabendo de tudo em volta dele, eu já sabia o destino dele muito antes de decidir o dos personagens principais. Anteros tem uma história pesada e sensível para muitas pessoas, por isso, quando vir à tona, irei deixar um aviso previamente.

eu sei que soa estranho falar que gosto de um personagem tirano, mas, no fundo, eu só nele como alguém com motivos o suficiente para se tornar um vilão. muitas circunstâncias o levaram até esse destino, e o eris fala muito disso. pra quem é fã de carteirinha dessa história, já percebeu que o Eris olha muito pro irmão com outros olhos, e isso se dá ao fato dele sempre ter sido o espectador

e essa é outra parada meio triste do nosso kingo, né? fala sério o cara foi "pai" de um monte de muleque que ele não queria

enfim, falando da vel

a gata só mentiu descaradamente esse capítulo  INTEIRO

sério, ela mentiu pra literalmente todo mundo que interagiu com ela, se vc parar pra ler direitinho

e eu fiz isso de propósito, pq sou CANALHA

outra coisa é que eu mudei MUITAS falas nesse capítulo, principalmente do Anteros. existe um trecho em que ele seria homofobico, e diria a palavra "bicha" e etc

só que eu pensei, ué eles nem tem esse xingamento. dai eu mudei pra deixar subentendido.

sinto muito pelas Arezetes

enfim enfim vcs não sabem o prazer que é estar de volta

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