crescent moon - Lua Nova

By Violetaever

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Depois que Kris se recupera do ataque de um vampiro que quase lhe tirou a vida, ela decide comemorar seu aniv... More

CAPÍTULO I
CAPÍTULO III
CAPÍTULO IV
CAPÍTULO V
CAPÍTULO VI
CAPÍTULO VII
CAPÍTULO VIII
CAPÍTULO IX
CAPÍTULO X
CAPÍTULO XI
CAPÍTULO XII
CAPÍTULO XIII
CAPÍTULO XIV
CAPÍTULO XV
CAPÍTULO XVI
CAPÍTULO XVII
CAPÍTULO XVIII
CAPÍTULO XIX
CAPÍTULO FINAL
EPÍLOGO

CAPÍTULO II

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By Violetaever

APENAS CARLISLE PERMANECEU CALMO. Os séculos de experiência no pronto-socorro eram evidentes em sua voz tranquila e cheia de autoridade.

– Emmett, Rose, levem Jasper para fora.

Sem sorrir sequer uma vez, Emmett assentiu.

– Vamos, Jasper.

Jasper lutou contra o abraço inflexível de Emmett, girando o corpo, lançando-se para o irmão com os dentes à mostra, os olhos ainda irracionais.

O rosto de Edward estava mais branco do que osso quando ele se virou e se abaixou junto a mim, assumindo uma clara posição defensiva. Um rosnado baixo de alerta resvalou por entre seus dentes trincados. Eu sabia que ele não estava respirando.

Rosalie, o rosto estranhamente complacente, meteu-se na frente de Jasper — guardando uma distância cautelosa dos dentes dele — e ajudou Emmett a carregá-lo pela porta de vidro que Esme mantinha aberta, uma das mãos cobrindo com firmeza a boca e o nariz.

O rosto em forma de coração de Esme revelava que ela estava envergonhada.

– Eu sinto muito, Kris – gritou ao seguir os outros para o pátio.

– Deixe que eu me aproxime, Edward – murmurou Carlisle.

Um segundo se passou, Edward assentiu lentamente e relaxou.

Carlisle se ajoelhou ao meu lado, inclinando-se a fim de examinar meu braço. Eu podia sentir o choque congelado em meu rosto e tentei recompô-lo.

– Tome, Carlisle – disse Alice, passando-lhe uma toalha.

Ele sacudiu a cabeça.

– Há vidro demais no ferimento. – Ele estendeu a mão e rasgou uma tira longa e fina da bainha da toalha de mesa branca. Enrolou-a em meu braço pouco acima do cotovelo, fazendo um torniquete. O cheiro de sangue me deixava tonta. Meus ouvidos tiniam.

– Kris – disse Carlisle de modo delicado. – Quer que eu a leve ao hospital ou prefere que cuide de você aqui?

– Aqui, por favor – sussurrei. 

– Vou pegar sua maleta – disse Alice.

– Vamos levá-la para a mesa da cozinha – disse Carlisle a Edward.

Edward me levantou sem qualquer esforço, enquanto Carlisle mantinha a pressão firme em meu braço.

– Como está se sentindo, Kris? – perguntou Carlisle.

– Estou bem. – minha voz era quase estável, o que me agradou.

O rosto de Edward parecia de pedra.

Alice estava lá. A maleta preta de Carlisle já estava na mesa, uma mesa pequena, mas reluzente, embutida na parede. Edward me sentou gentilmente em uma cadeira e Carlisle assumiu outra. 

Edward ficou de pé ao meu lado, ainda protetor, ainda sem respirar.

– Pode ir, Edward – suspirei.

– Eu posso lidar com isso – insistiu ele. 

Mas seu queixo estava rígido; os olhos ardiam pela intensidade da sede que ele combatia, tão mais forte para ele do que para os outros.

– Não precisa ser um herói – eu disse. – Carlisle pode cuidar de mim sem sua ajuda. Vá tomar um ar fresco.

– Vou ficar.

– Por que é tão masoquista? – disse, irritada.

Carlisle decidiu interceder.

– Edward, você poderia aproveitar e encontrar Jasper antes que ele vá longe demais. Tenho certeza de que ele está aborrecido consigo mesmo e duvido que agora vá ouvir alguém que não seja você.

– É – concordei. – Vá falar com Jasper.

Estremeci quando Carlisle fez alguma coisa que doeu em meu braço.

– Você podia fazer algo de útil –  acrescentou Alice.

Os olhos de Edward se estreitaram ao ver que nos uníamos contra ele, mas, por fim, concordou e saiu suavemente pela porta dos fundos da cozinha. Eu tinha certeza de que ele não respirara sequer uma vez desde que cortei o dedo.

Uma dormência se espalhava por meu braço. Embora anulasse a pontada de dor, lembrava-me do corte, e fiquei olhando o rosto de Carlisle com atenção para me distrair do que suas mãos faziam. Seu cabelo tinha um brilho dourado na luz forte enquanto ele se curvava sobre o meu braço. Eu podia sentir o desconforto se agitando fraquinho na boca do estômago. 

Se ela não estivesse em minha linha de visão, eu não teria percebido Alice desistindo e saindo do cômodo. Com um sorriso mínimo de desculpas nos lábios, ela desapareceu pela porta da cozinha.

A calma de Carlisle era ainda mais incrível em contraste direto com a reação de todos os outros. Não consegui ver nenhum vestígio de angústia em seu rosto. Ele trabalhava com movimentos rápidos e seguros. O único som além de nossa respiração baixa era o plinc, plinc delicado dos pequenos cacos de vidro largados um a um na mesa.

– Como consegue fazer isso? – perguntei. – Nem Alice e Esme... – minha voz falhou e eu sacudi a cabeça, pasma. 

– Anos e anos de prática – disse-me ele. – Agora mal percebo o cheiro.

– Acha que seria mais difícil se tirasse umas férias longas do hospital? E não houvesse mais sangue por perto?

– Talvez. – ele deu de ombros, mas as mãos continuavam firmes. – Nunca senti necessidade de férias prolongadas. – Ele abriu um sorriso luminoso para mim. – Gosto muito do meu trabalho.

Plinc, plinc, plinc. Surpreendi-me com a quantidade de vidro que parecia estar em meu braço. Fiquei tentada a olhar a pilha crescente, só para ver o tamanho, mas sabia que a ideia não seria útil para minha estratégia de não vomitar.

– Do que é que você gosta nele? – perguntei. Não fazia sentido para mim; os anos de luta e autonegação que ele deve ter vivido para chegar ao ponto de suportar isso com tanta facilidade. Além de tudo, eu queria que ele continuasse falando; a conversa afastava minha mente da náusea em meu estômago.

Seus olhos escuros eram calmos e pensativos quando ele respondeu.

– Hmmm. O que mais aprecio é quando minhas... capacidades aprimoradas me permitem salvar alguém que, de outra maneira, seria perdido. É agradável saber que, graças ao que posso fazer, a vida de algumas pessoas é melhor porque eu existo. Às vezes até o cheiro é uma ferramenta diagnóstica útil. – um lado de sua boca se ergueu em um meio sorriso.

Refleti sobre isso enquanto ele examinava meu braço, certificando-se de que todos os cacos de vidro haviam sido retirados. Depois ele mexeu em sua maleta em busca de novos instrumentos e eu tentei não imaginar a agulha e a sutura.

– Você se esforça muito para compensar uma situação que não foi culpa sua – comentei, enquanto um novo tipo de puxão começava na beirada de minha pele. – O que quero dizer é que você não quis isso. Não escolheu esse tipo de vida, e ainda assim tem que se esforçar tanto para ser bom.

– Não sei se estou compensando alguma coisa – ele discordou alegremente. – Como tudo na vida, só tive de decidir o que fazer com o que me foi dado.

– Isso faz tudo parecer fácil demais.

Ele examinou meu braço de novo.

– Pronto – disse, cortando o fio de sutura. – Está terminado. – ele esfregou uma bola de algodão enorme, pingando um líquido cor de xarope por todo o local do procedimento. O cheiro era estranho; fez minha cabeça girar. O xarope manchou minha pele.

– Mas, no começo – falei, pressionando enquanto ele colocava no lugar outra longa tira de gaze, prendendo-a em minha pele –, Por que chegou a pensar num caminho diferente do óbvio?

Seus lábios se ergueram num sorriso reservado.

– Edward lhe contou essa história?

– Sim. Mas estou tentando entender o que você estava pensando…

Seu rosto de repente voltou a ficar sério.

– Meu pai era um clérigo – disse ele ao limpar a mesa com cuidado, esfregando tudo com gaze molhada e repetindo todo o processo. Meu nariz ardeu com o cheiro de álcool. – Ele tinha uma visão muito rigorosa do mundo, que eu já começava a questionar antes da época de minha mudança.

Carlisle colocou toda a atadura suja e os cacos de vidro numa tigela vazia de cristal. Não entendi o que ele estava fazendo, mesmo quando ele acendeu um fósforo. Depois ele o atirou nas fibras encharcadas de álcool e o clarão repentino me fez pular.

– Desculpe – disse ele. – Foi necessário fazer isso... Assim, eu não concordava com a crença particular de meu pai. Mas nunca, nem em quatrocentos anos, desde que nasci, vi algo que me fizesse duvidar de que Deus existe, de uma forma ou de outra. Nem mesmo o reflexo no espelho.

Fingi examinar o curativo em meu braço para esconder minha surpresa com o rumo que tomava nossa conversa. Religião era o último tema que eu esperava, considerando tudo aquilo. Minha própria vida era destituída de crenças. Charlie se considerava luterano, porque os pais dele eram, mas ele nunca ia à igreja. Renée de vez em quando ia à igreja, mas, assim como suas breves passagens por aulas de tênis, cerâmica, ioga e francês, ela abandonava a prática no momento em que eu tomava conhecimento da novidade.

– Sei que isso parece meio estranho, partindo de um vampiro. – ele sorriu, sabendo como seu uso despreocupado daquela palavra jamais deixaria de me chocar. – Mas estou esperando que ainda haja algum sentido nesta vida, até para nós. Admito que as chances são muito poucas – continuou ele, num tom ameno. – Todos dizem que somos amaldiçoados, apesar de tudo. Mas eu espero, talvez como um tolo, que levemos algum crédito por tentar.

– Não acho que seja tolice – murmurei. Não conseguia imaginar ninguém, incluindo um deus, que não ficasse impressionado com Carlisle. – E não acho que alguém acharia.

– Na verdade, você é a primeira a concordar comigo.

– Os outros não pensam o mesmo? – perguntei, surpresa, pensando em uma única pessoa.

 Carlisle adivinhou o rumo de meus pensamentos.

– Até certo ponto, Edward concorda comigo. Deus e o paraíso existem... e o inferno também. Mas ele não acredita que haja outra vida para nossa espécie. – a voz de Carlisle era muito suave; ele olhava a escuridão pela janela grande acima da pia. – Imagine, ele acha que perdemos nossa alma.

Imediatamente pensei nas palavras de Edward naquela tarde: A não ser que se queira morrer... Ou o que quer que aconteça conosco. 

Carlisle falou devagar.

– Eu olho para meu... filho. Sua força, sua bondade, a luz que emana dele... E isso só alimenta essa esperança, essa fé, mais do que nunca. Como pode não haver mais nada para alguém como Edward?

Eu assenti.

– Como você tomou a decisão de transformá-lo? 

– Foi a mãe de Edward quem me fez decidir. – a voz de Carlisle era quase um sussurro. Ele fitava sem ver as janelas escuras.

– A mãe dele? – sempre que eu perguntava a Edward sobre os pais, ele dizia apenas que haviam morrido muito tempo e que suas recordações eram vagas. Percebi que a lembrança que Carlisle tinha deles, apesar da brevidade de seu contato, era perfeitamente clara.

– Sim. O nome dela era Elizabeth. Elizabeth Masen. O pai dele, Edward Senior, não recuperou a consciência no hospital. Morreu no primeiro surto de gripe espanhola. Mas Elizabeth ficou alerta quase até o fim. Edward é muito parecido com ela... Elizabeth tinha cabelos do mesmo tom de bronze e os olhos eram daquele mesmo tom de verde.

– Os olhos dele eram verdes? – murmurei, tentando imaginar.

– Sim... – Os olhos ocre de Carlisle estavam a cem anos de distância. – Elizabeth tinha uma preocupação obsessiva com o filho. Ela anulou as próprias chances de sobrevivência tentando cuidar dele no hospital. Pensei que ele fosse primeiro, seu estado era muito pior do que o dela. Quando chegou o fim de Elizabeth, foi muito rápido. Era pouco depois do poente e eu havia chegado para render os médicos que tinham trabalhado o dia todo. Era tão difícil fingir... Havia muito trabalho a ser feito e eu não precisava descansar. Como eu odiava voltar para casa, esconder-me no escuro e fingir dormir enquanto tantos estavam morrendo!

Ele continuou:

– Fui ver Elizabeth e o filho primeiro. Eu me apegara a eles; uma postura que é sempre perigosa, considerando a natureza frágil dos humanos. Logo vi que ela havia piorado. A febre aumentava de modo descontrolado e seu corpo estava fraco demais para continuar lutando. Mas ela não parecia debilitada quando olhou para mim de seu leito. “Salve-o!”, exigiu na voz rouca que era o máximo que sua garganta conseguia emitir. Farei tudo o que estiver em meu poder, prometi, pegando-lhe a mão. A febre estava tão alta que ela não devia sentir como minha mão era estranhamente fria. Tudo parecia frio para sua pele. “Deve fazer isso”, insistiu ela, segurando minha mão com tal força que me perguntei se ela, afinal, havia superado a crise. Seus olhos eram duros, feito pedra, como esmeraldas. “Deve fazer tudo o que estiver em seu poder. O que os outros não podem fazer, é o que deve fazer por meu Edward.” Isso me assustou. Ela me fitou com aqueles olhos penetrantes, e por um momento tive certeza de que sabia de meu segredo. Em seguida a febre a dominou e ela não recuperou a consciência. Morreu uma hora depois de fazer seu pedido. Eu passara décadas considerando a ideia de criar uma companhia para mim. Simplesmente outra criatura que pudesse me conhecer de verdade, em vez de apenas o que eu fingia ser. Mas não podia justificar isso para mim mesmo — fazer o que fizeram comigo. Lá estava Edward, morrendo. Era evidente que só lhe restavam algumas horas. Ao lado dele, a mãe, cuja face até então não estava tranquila, ainda não estava morta.

Carlisle viu tudo de novo, a lembrança nítida ao longo do século que se passou. Eu também podia ver com clareza enquanto ele falava — a desesperança do hospital, a atmosfera de morte que a tudo sobrepujava. Edward ardendo de febre, sua vida se esvaindo a cada movimento dos ponteiros do relógio... 

– As palavras de Elizabeth ecoaram em minha mente. Como ela saberia o que eu podia fazer? Será que alguém de fato iria querer isso para um filho? Olhei para Edward. Havia algo de puro e bom em seu rosto. O tipo de rosto que eu desejaria que um filho meu tivesse. Depois de todos aqueles anos de indecisão, eu simplesmente agi por capricho. Primeiro levei a mãe dele ao necrotério, depois voltei para levá-lo. Ninguém percebeu que ele ainda respirava. Não havia mãos nem olhos suficientes para atender nem à metade das necessidades dos pacientes. O necrotério estava vazio — pelo menos, de gente viva. Eu o levei pela porta dos fundos e o carreguei pelos telhados até minha casa. Não tinha certeza do que devia ser feito. Preparei-me para recriar as feridas que eu mesmo recebi, tantos séculos antes, em Londres. Mais tarde me senti mal por isso. Foi mais doloroso e mais demorado do que o necessário. Mas eu não lamentava. Nunca lamentei por ter salvado Edward.

Ele sacudiu a cabeça, voltando ao presente. Sorriu para mim:

– Agora acho que devo levá-la para casa.

– Eu faço isso – disse Edward. Ele passou pela sala de jantar escura, andando devagar até Carlisle. Seu rosto era suave e indecifrável, mas havia algo de errado nos olhos; algo que ele se esforçava muito para esconder.

Senti um espasmo de ansiedade no estômago.

– Carlisle pode me levar – eu disse.

Olhei minha blusa; o algodão azul-claro estava ensopado de meu sangue. Meu ombro direito estava coberto de uma espessa crosta rosada.

– Eu estou bem. – a voz de Edward não tinha emoção. – Vai precisar se trocar. Charlie teria um infarto se a visse desse jeito. Vou pedir a Alice para lhe arrumar alguma roupa. – ele saiu de novo pela porta da cozinha.

Olhei ansiosa para Carlisle.

– Ele está muito aborrecido.

– Sim – concordou Carlisle. – Esta noite aconteceu exatamente o tipo de situação que ele mais teme. Você em perigo devido ao que somos.

– Não é culpa dele.

– Nem sua.

Carlisle me ofereceu a mão e me ajudou a sair da mesa. Eu o segui para a sala principal. Esme voltara; estava limpando o chão onde eu havia caído — com água sanitária, a julgar pelo cheiro que senti.

– Esme, deixe que eu faça isso. – eu podia sentir meu rosto vermelho de novo.

– Já terminei. – Ela sorriu para mim. – Como se sente?

– Bem – garanti. – Carlisle costura mais rápido do que qualquer outro médico que conheci.

Os dois riram.

Alice e Edward entraram pela porta dos fundos. Alice correu para meu lado, mas Edward ficou para trás, o rosto indecifrável.

– Vamos – disse ela. – Vou lhe dar alguma peça menos macabra para vestir.

Ela encontrou para mim uma blusa de Esme que era de uma cor próxima à que eu usava. Charlie nem perceberia, disso eu tinha certeza. A longa atadura branca em meu braço não parecia mais tão grave, agora que eu não estava mais suja de sangue. 

– Alice – sussurrei quando ela voltou à porta.

– Sim? – Ela também manteve a voz baixa e olhou para mim com curiosidade, a cabeça tombada de lado.

– A coisa está muito ruim? – eu não podia ter certeza se meus sussurros eram um esforço inútil. Embora estivéssemos no segundo andar, a portas fechadas, talvez ele pudesse me ouvir.

O rosto de Alice ficou tenso.

– Ainda não tenho certeza.

– Como está Jasper?

Ela suspirou.

– Está muito infeliz. Isso tudo é um desafio muito maior para Jasper, e ele odeia se sentir fraco.

Edward estava esperando por mim na porta da frente. Quando cheguei ao pé da escada, ele abriu a porta sem dizer uma palavra.

– Leve suas coisas! – gritou Alice, enquanto eu andava com cautela até Edward. Ela pegou os dois pacotes, um aberto pela metade, e minha câmera no piano, e os colocou em meu braço bom. – Pode me agradecer depois, quando tiver aberto.

Esme e Carlisle deram um boa-noite em voz baixa. Vi que eles trocavam olhares rápidos com o filho, tão impassível quanto eu.

Foi um alívio sair dali; passei correndo pelas lanternas e pelas rosas, agora lembretes inadequados. Edward me acompanhou em silêncio. Abriu a porta do carona para mim e eu entrei.

No painel havia uma grande fita vermelha, presa ao novo sistema de som. Quando Edward entrou no carro ele não olhou para mim, nem para o som. Nenhum de nós o ligou, e o silêncio de algum modo foi intensificado pelo ronco súbito do motor. Ele dirigiu rápido demais pela rua escura e sinuosa.

O silêncio estava me deixando louca.

– Diga alguma coisa – pedi, por fim, enquanto ele entrava na estrada.

– O que quer que eu diga? – perguntou, numa voz indiferente.

Ele olhou pelo para-brisa, a expressão sombria.

Revirei meu cérebro, procurando alguma ideia para salvar a noite. Quando encostamos na frente de minha casa, eu ainda não tinha pensado em nada.

Ele desligou o motor, mas as mãos continuavam grudadas ao volante.

– Vai passar a noite aqui? – perguntei.

– Tenho que ir para casa.

A última coisa que eu queria era que ele se afundasse em remorso.

– Por favor!

– Tudo bem.

Eu saí do carro, pegando meus pacotes. Ele franziu o cenho.

– Não precisa levar isso.

– Eu quero – respondi automaticamente e depois me perguntei se ele estava usando de psicologia reversa.

Enfiei os presentes sob o braço bom e bati a porta. Em menos de um segundo ele tinha saído do carro e estava ao meu lado.

– Pelo menos me deixe levar – disse ele ao pegá-los. – Estarei em seu quarto.

Eu sorri.

– Obrigada.

– Feliz aniversário – ele suspirou e se inclinou para tocar meus lábios com os dele.

Fiquei na ponta dos pés para que o beijo durasse mais quando ele se afastou. 

Ele abriu meu sorriso torto preferido e desapareceu na escuridão.

O jogo ainda não havia acabado; assim que passei pela porta da frente, pude ouvir o narrador divagando mais alto que o murmúrio da multidão.

– Kris? – chamou Charlie.

– Oi, pai – eu disse ao aparecer no canto. Mantive o braço junto do corpo. A leve pressão provocou ardência e franzi o nariz.

– Como foi? – Charlie estava estendido no sofá, com os pés descalços no braço do móvel.

– Alice exagerou. Flores, bolo, velas, presentes... O pacote completo.

– O que eles deram a você?

– Um som para meu carro e várias incógnitas.

– Puxa vida.

– É – concordei. – Bom, vou dormir.

– Vejo você de manhã.

Eu acenei.

– Tchau.

– O que aconteceu com seu braço?

Eu me virei e xinguei em silêncio.

– Não foi nada.

– Kris – suspirou ele, sacudindo a cabeça.

– Boa noite, pai.

Corri para o banheiro, onde eu mantinha o meu pijama. Depois do banho, vesti o conjunto de blusa e calça de algodão que agora substituía os moletons furados que antes eu usava para dormir, estremecendo quando o movimento puxou os pontos da sutura. Escovei os dentes e pulei para meu quarto.

Ele estava sentado no meio da cama, brincando ociosamente com uma das caixas prateadas.

– Oi – disse. Sua voz era triste. Ele estava chateado.

Fui para a cama, tirei os presentes das mãos dele e subi em seu colo.

– Oi. – eu me aninhei no peito de pedra. – Posso abrir meus presentes agora?

– De onde veio esse entusiasmo todo? – perguntou ele.

– Você me deixou curiosa.

Peguei o retângulo comprido e achatado que devia ser de Carlisle e Esme.

– Permita-me – sugeriu ele. Ele pegou o presente de minha mão e rasgou o papel prateado com um único movimento. 

Entregou-me a caixa branca retangular.

– Tem certeza de que consigo levantar a tampa? – murmurei, mas ele me ignorou.

Dentro da caixa havia uma longa folha de papel grosso com uma quantidade imensa de letras impressas. Levei um minuto para entender a essência daquelas informações.

– Nós vamos a Jacksonville? – E eu fiquei animada. Eram passagens de avião, para mim e para Edward.

– A ideia é essa.

– Nem acredito. Renée vai ficar louca! Mas você não se importa, não é? É ensolarado, você terá que ficar entre quatro paredes o dia inteiro.

– Acho que posso lidar com isso – disse ele, depois franziu o cenho. – Se eu fizesse alguma ideia de que você ia reagir desse jeito, eu a teria feito abrir na frente de Carlisle e Esme. 

Eu revirei os olhos.

Ele riu.

Coloquei as passagens de lado e peguei o presente dele, minha curiosidade inflamada de novo. Ele o tirou da minha mão e o desembrulhou, como fizera com o primeiro.

Edward me passou uma caixa de CD sem capa, com um CD prateado dentro dela.

– O que é? – perguntei, perplexa.

Ele não disse nada; tirou o CD e estendeu o braço em volta de mim para pegar o CD player na mesinha de cabeceira. Apertou play e esperou em silêncio. Depois a música começou.

Eu ouvi, muda e de olhos arregalados. Sabia que ele esperava por minha reação, mas eu não conseguia falar.

– Seu braço está doendo? – perguntou ele, angustiado.

– Não, não é meu braço. É lindo, Edward. Não poderia ter me dado nada que eu amasse mais. Eu nem acredito. – fiquei quieta para poder ouvir.

Era a música dele, as composições dele. A primeira peça no CD era minha cantiga de ninar.

– Não achei que me deixaria comprar um piano para eu tocar para você aqui – explicou ele.

– E tem razão.

– Como está seu braço?

– Está bem. – na verdade, começava a arder por baixo do curativo. Eu queria gelo. 

– Vou pegar um Tylenol para você.

Ele me tirou do colo e foi para a porta.

– Charlie – sibilei. Charlie não estava exatamente ciente de que Edward costumava ficar aqui. Na verdade, ele infartaria se o fato chegasse a seu conhecimento. 

– Ele não vai me pegar – prometeu Edward ao desaparecer sem fazer barulho pela porta... e voltar, chegando à porta antes que ela tocasse o batente. Ele trazia o copo do banheiro e o frasco de comprimidos em uma das mãos.

Peguei sem questionar os comprimidos que ele me entregou.

Minha cantiga de ninar continuava, suave e linda, ao fundo.

– Está tarde – observou Edward.

Ele me levantou da cama com um braço e puxou o cobertor com o outro. Deitou-me com a cabeça no travesseiro e prendeu o cobertor em volta de mim. Deitou-se ao meu lado — por cima do cobertor, para que eu não ficasse com frio — e passou o braço por meu corpo. Encostei a cabeça em seu ombro e suspirei, feliz.

– Obrigada de novo – sussurrei.

– Não há de quê.

Fez-se silêncio por um momento, enquanto eu ouvia minha cantiga de ninar se aproximar do fim. Começou outra música. Reconheci a preferida de Esme.

– No que está pensando? – perguntei, num sussurro.

Ele hesitou por um segundo antes de me dizer.

– Estava pensando no certo e no errado.

Senti um arrepio gelado percorrer minha espinha.

– Hoje é meu aniversário – disse logo, esperando que não ficasse claro demais que eu queria distraí-lo.

– Sim – concordou ele, cauteloso.

– Bom, eu estava pensando, uma vez que ainda é meu aniversário, eu gostaria que me beijasse de novo.

– Está gananciosa esta noite.

– Sim, estou... 

Ele riu ao colocar a mão sob meu queixo e puxar meu rosto para o dele.

O beijo começou normal — Edward foi cuidadoso, como sempre. E depois algo pareceu mudar. De repente seus lábios ficaram muito mais urgentes, sua mão livre girava por meu cabelo e segurava meu rosto com firmeza no dele. E, embora minhas mãos também mexessem em seu cabelo, embora eu claramente estivesse começando a atravessar os limites da cautela, mas ele não me impediu. Seu corpo era frio no cobertor fino, mas eu me espremi contra ele com ansiedade.

Quando parou, foi repentino; ele me afastou com as mãos firmes e gentis.

Eu desabei no travesseiro, arfando, minha cabeça girava. Algo surgia em minha lembrança, esquivo, nas margens.

– Desculpe – disse Edward, e ele também estava sem fôlego. – Isso não estava nos planos.

– Eu não me importo – disse, ofegando.

Ele franziu a testa para mim no escuro.

– Procure dormir, Kris.

– Não, quero que você continue me beijando.

– Está superestimando meu autocontrole.

– O que é mais tentador para você: meu sangue ou meu corpo? – eu o desafiei.

– Dá empate. – ele abriu um breve sorriso, contra a vontade, depois ficou sério de novo. – Agora, por que não para de abusar da sorte e vai dormir?

– Tudo bem – concordei, aninhando-me mais perto dele.

Já me sentia exausta. Fora um longo dia em muitos aspectos, e no entanto não senti alívio algum com seu fim. Era quase como se algo pior fosse acontecer no dia seguinte. Era uma premonição boba — o que podia ser pior do que aquele dia? Era o choque que só agora me ocorria, sem dúvida.

Tentando me esquivar dessa sensação, apertei o braço machucado contra o ombro dele, para que sua pele fria atenuasse a ardência. Melhorou imediatamente.

Eu estava meio adormecida, talvez mais, quando percebi o que o beijo dele me lembrou: na primavera passada, quando precisou me deixar para desviar James de mim, Edward me deu um beijo de despedida, sem saber quando — ou se — nos veríamos outra vez. Este beijo teve o mesmo toque quase doloroso por um motivo que eu não conseguia perceber. Estremeci em minha inconsciência, como se já estivesse tendo um pesadelo.

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