Shouta estava cansada.
Ele vinha dizendo isso há anos, é claro, mas ele quase desejou poder voltar na cabeça dele de dois anos atrás e bater um pouco de gratidão em sua cabeça estúpida e cansada. Ele nem tinha percebido o quão bem descansado ele costumava estar antes de tudo desmoronar e ele se viu com mais responsabilidade do que ele já pediu em sua carreira.
Tudo começou com Eri, é claro. Quando ela acabou sob custódia da polícia, eles não tinham certeza de qual era sua peculiaridade e ela obviamente não gostou de falar sobre isso, mas depois de algumas sessões com um psicólogo, ela finalmente se abriu sobre Rewind e revelou quão letal poderia ser, especialmente porque ela não tinha praticamente nenhum treinamento para controlá-lo. Já era certo que ela seria colocada sob proteção de herói. Mesmo que a gangue de Overhaul tivesse sido exterminada, havia muitos outros vilões que aproveitariam a chance de usá-la da mesma maneira que ele e uma família adotiva civil normal simplesmente não estaria equipada para lidar com isso. Depois que eles descobriram as especificidades de sua peculiaridade, no entanto, era lógico colocá-la com Shouta, que poderia facilmente desligar sua peculiaridade se ela ficasse fora de controle e que tivesse experiência com ensino e discriminação de peculiaridades. Ele não estava planejando adotá-la, mas... bem, ele era uma das únicas pessoas que ela estava disposta a confiar, então era lógico tornar isso oficial.
O fato de que ele podia desligar sua peculiaridade tinha feito muito para ganhar sua confiança. A revisão a fez acreditar que sua peculiaridade era má ou uma doença e levaria muito tempo para ela se curar dessa doutrinação, mas isso significava que Eri não tinha tanto medo de machucá-lo porque ele poderia se proteger de dela. Ele não estava planejando basicamente se tornar um pai de fato para uma garotinha traumatizada, mas depois de meses de pesadelos reconfortantes e ensinando-a a controlar sua peculiaridade, ele teve que admitir que não conseguia imaginar sua vida sem ela.
Mas ter uma criança constantemente por perto o deixava mais cansado do que quando as únicas coisas que ele tinha para manter vivo eram seus gatos.
A próxima grande coisa que estava aumentando sua exaustão era o aumento das taxas de criminalidade. O reinado de terror de Mastermind encorajou os criminosos locais e os encorajou a trabalhar de forma mais inteligente. Acrescente a isso a influência da Liga dos Vilões que iniciou uma tendência em direção a grupos de vilões maiores e trabalho em equipe e igualou muito mais trabalho para os heróis que ainda não haviam sido mortos por serem empurrados para a aposentadoria.
E então, é claro, a comissão do herói caiu e eles tiveram que redesenhar todo o curso do herói. Desde que a UA existiu, sempre houve um impulso para a criação de heróis que seriam populares e se sairiam bem nos holofotes da mídia. Foi algo que a comissão incentivou e foi uma grande parte da razão pela qual a UA ganhou o título de escola de heróis, mas agora era realmente uma desvantagem distinta. De acordo com as inscrições para o próximo ano, as poucas crianças que ainda pretendiam ser heróis estavam escolhendo outras escolas para ir precisamente porque a UA criou esses heróis populares. Ninguém queria ir a um programa que pintasse um alvo em suas costas para Mastermind ou qualquer outro vilão com uma agenda semelhante, então se a UA iria sobreviver neste novo mundo, eles teriam que se adaptar. Muito.
E a quem Nedzu recorreu como especialista em heroísmo subterrâneo? O herói subterrâneo: Eraserhead. Ele era um mestre em ficar fora da mídia e operar nas sombras, então o único curso de ação razoável era encarregá-lo de liderar o novo programa de heroísmo. Por um lado, foi uma oportunidade maravilhosa para finalmente consertar as coisas que Shouta odiava desde que era estudante. Ele se livrou do festival de esportes, por exemplo, para que eles não transmitissem as peculiaridades dos alunos para seus inimigos, e ele realmente conseguiu aprovação para mudar o exame de admissão para algo que realmente medisse a dedicação e o controle de peculiaridades do aluno, em vez de simplesmente procurar por peculiaridades chamativas e destrutivas, então ele ficou grato por essas vitórias. Por outro lado, porém, ele estava tendo que criar um currículo quase totalmente diferente para incluir fundamentos subterrâneos como parkour, coleta de informações e furtividade, o que dava muito trabalho. As aulas de manipulação da mídia haviam mudado de como manter a atenção do público e obter uma boa reputação para como evitar repórteres e como espalhar informações erradas para que qualquer artigo escrito não equivalesse a uma sentença de morte. Os outros professores e a maioria dos alunos estavam completamente perdidos enquanto tentavam seguir uma carreira que agora era fundamentalmente diferente daquela para a qual se inscreveram.
E todos eles estavam olhando para ele para guiá-los através disso.
Shouta suspirou quando terminou de lavar o rosto e olhou para seu rosto no espelho. Era normal começar a ficar grisalho aos 30? Provavelmente não, mas Shouta realmente nunca se importou com seu cabelo antes, então ele não estava prestes a começar agora. Ele pegou um elástico ao lado da pia e puxou o cabelo em um coque sem entusiasmo enquanto saía do banheiro para começar o café da manhã.
Eri já estava acordada, o que não era uma surpresa. A insônia era um sintoma de TEPT bastante comum e Shouta tinha sido muito cuidadoso para deixar Eri saber que estava tudo bem e ela podia fazer coisas como desenhar ou assistir tv quando não conseguia dormir. Em vez de um desenho animado, porém, esta manhã ela estava assistindo ao noticiário, um desenho esquecido e giz de cera sobre a mesa à sua frente.
“... atualmente aguardando julgamento no Tártaro.” O repórter disse, a tela verde atrás dele piscando para fotos da prisão de Midoriya.
Parecia que os abutres não estavam falando de mais nada ultimamente. Foi Mastermind isso e Midoriya aquilo e seu favorito pessoal, alguém poderia realmente fazer tudo isso? Era ridículo. Isso foi o que eles conseguiram por enfatizar consistentemente peculiaridades poderosas, no entanto. A peculiaridade de alguém não equivale ao seu potencial e definitivamente não equivale ao seu nível de perigo, se a ascensão de Midoriya ao poder provou alguma coisa, mas os preconceitos das pessoas os cegaram para esse fato. Shouta passou a mão pelo cabelo de Eri. Se alguém tentasse tocá-la, ela teria congelado e entrado em pânico, mas com Shouta ela se inclinou para o toque.
“Ei criança.” Ele se sentou pesadamente ao lado dela no sofá. “Como você está nesta manhã?”
Eri franziu a testa e olhou para a tela, onde os repórteres ainda estavam falando sobre os mesmos fatos exagerados que desenterraram sobre a ascensão do poder de Mastermind, “O Mastermind-sama vai ficar bem?”
Shouta suspirou. Eri estava tendo dificuldades com a prisão de Midoriya, obviamente. Ele a salvou de seu agressor, mesmo que originalmente não tivesse a intenção, então era obviamente confuso para ela que ele estava sendo tratado como um vilão quando ela o via como seu herói.
“Ele vai ficar bem.” Shouta disse pela centésima vez. “A prisão é o lugar mais seguro para ele estar, tanto para ele agora quanto para todos os outros.”
Eri assentiu. Esta não foi a primeira vez que eles tiveram essa conversa e Shouta sabia que não seria a última. Seria mais simples se Shouta pudesse dividir o mundo em preto e branco para ela, dizer a ela que havia algumas pessoas que eram boas e outras que eram más e que havia linhas duras entre elas, mas a sociedade não tinha mais o luxo de ignorando o cinza. Midoriya se certificou disso.
“Eles estão dizendo coisas tão ruins sobre ele...” Eri fez beicinho. “E se ele os ouvir?”
“Ele não tem acesso às notícias onde está.” Shouta explicou pacientemente, deixando de fora o fato de que Midoriya era inteligente o suficiente para descobrir exatamente o que a mídia estava dizendo sobre ele. “Ele não vai ouvi-los.”
“Mas eles são tão maus!” Eri choramingou. "Ele é legal! Eles estão mentindo!”
Shouta colocou a mão em seu ombro e olhou em seus olhos, “Mastermind machucou muitas pessoas, Eri, e ele deixou muitas pessoas com raiva porque às vezes ele machucava pessoas ruins como Overhaul, mas às vezes ele machucava pessoas boas como All Might. As pessoas vão ficar com raiva dele por isso e tudo bem.”
“Eu sei...” Eri pegou uma de suas unhas. “Mas eu gostaria que eles pudessem ver como ele é legal! Ele me salvou!”
“Que tal desligarmos isso?” Shouta sugeriu. “Posso ligar o filme de princesa que você gosta, aquele sobre a garota escapando de sua torre?”
Os olhos de Eri se arregalaram, “Aquele com a peculiaridade de cura que foi salvo por um vilão também?”
Os ombros de Shouta caíram um pouco e ele resmungou, “Eu acho que Flynn Rider era uma espécie de vilão, não era? Não é à toa que você gosta tanto desse filme. Bem, que tal? Você quer assistir ?”
Eri quase sorriu enquanto assentiu. Quase.
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Inko não conseguia sair de casa desde que Izuku foi preso, tanto por causa dos manifestantes que estavam acampados do lado de fora quanto porque na maioria dos dias, ela mal conseguia encontrar forças para sair da cama. Ela se sentiu tão traída, tanto pelos heróis quanto por seu próprio filho. Saber que seu filho era um vilão procurado foi um choque suficiente, mas perceber que a polícia usou sua ignorância contra ela apenas para pegá-lo? Dizer que isso a havia quebrado parecia tão dramático, mas não havia outra maneira de descrevê-lo.
Claro, Nedzu explicou pacientemente por que esse tinha sido o único curso de ação disponível e Inko teria sido capaz de entender a lógica disso se não fosse seu filho! Como as coisas teriam funcionado de forma diferente se ela tivesse percebido as verdadeiras implicações do caderno que encontrou antes de levá-lo à polícia? O pensamento vinha surgindo em momentos aleatórios nas últimas semanas como uma coceira que não ia embora, não importa o quanto ela coçasse. Ela o teria entregado por vontade própria? Ela teria guardado o segredo dele? Ela o teria expulsado?
Se ela tivesse implorado para ele parar, ele teria escutado?
Suas respostas pareciam mudar a cada dia até que estavam tão confusas que ela só queria puxar o cabelo para fora e os gritos constantes da multidão do lado de fora não ajudaram. Ela teve que ligar o rádio 24 horas por dia, 7 dias por semana, apenas para abafá-los. Eles a estavam chamando de mãe ruim, e por mais que ela tentasse negar, Inko tinha que admitir que era a verdade. Se ela tivesse sido uma mãe melhor, talvez ela tivesse percebido o quão ruim as coisas estavam para Izuku e poderia ter parado o bullying antes que ele fosse empurrado para o limite. Talvez se ela tivesse percebido o quão inteligente seu filho era, ela poderia tê-lo encorajado a se tornar um médico ou até mesmo um analista de peculiaridades que ajudasse heróis, em vez de machucá-los. Se ela fosse uma mãe melhor, as centenas de pessoas que Izuku matou ainda estariam vivas.
Ela queria se desculpar e consertar as coisas, mas parecia tão barato. Afinal, seu pedido de desculpas foi parte do que começou toda essa confusão, não foi? Se ela tivesse dito a Izuku que ele poderia ser um herói quando ele perguntou em vez de se desculpar e destruir seus sonhos…
Ela se encolheu quando ouviu um ovo se quebrar contra sua janela. A proteção policial que eles colocaram geralmente era capaz de conter o manifestante violento e impedi-lo de chegar à casa, mas.... ela sabia que a maioria dos policiais a odiava também, apenas por causa de quem era seu filho. Ela aumentou um pouco a música e tentou ignorar seus próprios pensamentos.
Ela sentia falta de seu bebê.