Não Muito Princesa

By raquel_costa_

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A vida de Tina (Valentina Cortês) não é como a das jovens da sua idade, porque ela é uma princesa, mais espec... More

Apresentação dos personagens
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Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capitulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9

Capítulo 10

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By raquel_costa_

A minha mãe não parava de reclamar que as damas da corte estavam comentando que eu tinha voltado da viagem ainda mais desajeitada.

— Acho que essas senhoras deviam cuidar da vida delas, isso sim — bufei enquanto bebericava aquele chá horrível, sentindo muita falta daquela água de coco fresquinha de Porto Rico.

— Minha filha, onde foi que você aprendeu a dizer coisas tão rudes? — Mamãe franziu o cenho muito aborrecida. — Eu implorei ao rei que não a permitisse viajar sozinha para um lugar tão distante que, com certeza, estava cheio de pessoas promíscuas, mas ele nem deu ouvidos... — suspirou.

— Conheci pessoas maravilhosas — falei me levantando da cadeira da sala de chá, onde aguardávamos duas das "damas fofoqueiras da corte", umas duquesas, que eram parentes distantes, que não tinham mais nenhum afazer a não ser beber chá e bisbilhotar a vida alheia.

Olhei, ao longe, pela imensa janela de pedra, os jardins esplendorosos de Woodland Castle, desejando que a vista fosse o pôr-do-sol na praia.

— Que tipo de pessoa? O presidente? — Para uma rainha, mamãe sabia usar bem os tons de deboche.

— Não. Gente normal, gente de carne e osso — respondi ainda olhando para aqueles jardins, onde um riacho corria ao longe.

— Gente que te ensinou a falar desse jeito arrogante. Acho melhor chamar a madame Hortênsia de novo. — Hortênsia era a professora de etiquetas da corte.

— Não preciso de mais aulas de etiqueta, é só mais uma chatice desnecessária... e ninguém se importa de verdade comigo, nem sei para quê essas formalidades — apesar de chateada, falei em tom calmo, pois a brisa suave em meu rosto, fazia-me recordar as caminhadas noturnas, com os pés na areia, em San Juan.

— Eu estou muito preocupada com o que será de seu futuro, se continuar tão imatura. O príncipe Edgar pode ser uma oportunidade que nunca irá se repetir.

— Essa é a minha maior esperança, que ele desista — deixei escapar, enquanto me lembrava do calor do sol e do cheiro de maresia.

— Não deixe seu pai te ouvir falando essas bobagens infantis, ou ele pode mandar confiscar esse aparelho aí. —  Apontou para o meu celular. — Você deve estar aprendendo essas falácias e mal costumes na internet, aposto.

— Não mesmo. Eu preciso dele. — Segurei firme o meu smartphone contra o peito, pois ele era minha única esperança de ter algum sinal de vida do Daniel.

Apesar de que já fazia quase um mês que eu tinha voltado a Âmbar e nada. Nem sinal de fumaça. Nenhuma carta, nem ligação, nem mensagem de texto...

Eu, provavelmente, tinha sido mais uma aventura de verão para Fernandez, e já devia ter aceitado esse fato, se não fossem as palpitações cardíacas que eu sentia cada vez que meu celular apitava.

Para minha desventura, a maioria das notificações pertencia ao príncipe Edgar, insistindo que eu voltasse ao castelo de Ametista, pois ele gostaria de me oferecer um banquete especial.

A maioria das damas de Âmbar dariam os dois rins por um convite como aquele, pois o presunçoso Ed raramente dava banquetes, e, quando o fazia, era para um número completamente restrito de pessoas. Eu odiava a simples ideia de estar naquele mar de indivíduos interesseiros, portanto, ignorava tais convites pomposos tanto quanto podia.

Mamãe já estava prestes a começar um discurso rigoroso e articulado sobre o quanto um bom casamento poderia ser um divisor de águas na vida de uma dama, quando, para minha sorte, ou não, fomos interrompidas pelo mordomo Sidney.

— Vossa Alteza — reverenciou, flexionando levemente o pescoço. —, as convidadas já estão presentes.

Ótimo, lá estava mais uma seção de tortura com chá amargo e mulheres com línguas mais amargas ainda!

Querida Valentina, quanto tempo! — Aurora, uma das duquesas cumprimentou-me cheia de cortesia exagerada e aquela falsa fleuma, muito típica de Âmbar.

— Acho que a senhorita engordou um pouquinho nessa viagem, melhor fechar a boquinha — Wanda, a encantadora donzela, filha de Aurora, despejou, dando uma risadinha.

— A senhorita acha? — Mamãe perguntou-lhe olhando-me de cima abaixo com preocupação.

— Pelo menos dois quilinhos — a moça arregalou os olhos pesados de tanta maquiagem cor púrpura.

— Verdade — respondi tranquila —, nunca comi tão bem quanto em Porto Rico. Aquilo sim é banquete! — Esfreguei as duas mãos na barriga, o que fez as duas convidadas me olharem horrorizadas.

Vossa Alteza, que fizeram com a menina?!  Aurora falava com as duas mãos enluvadas sobre a boca — Certamente uma lavagem cerebral! 

Não controlei minha vontade de rir do espanto daquelas damas. Tudo bem que eu tinha aprendido a ser gentil e agradável com as pessoas, sobretudo as pessoas mais velhas, e esse tipo de princípio eu obedecia sempre. Só que, às vezes, eu só queria me sentir respeitada pelas outras pessoas também, e aquelas mulheres viviam opinando sobre o meu corpo, sobre a minha maneira de me vestir e me portar, sobre o meu suposto dever de me casar com o príncipe Edgar, enfim, sobre tudo. Só que, depois da minha aventura em San Juan, percebi que, se de qualquer jeito as pessoas iriam querer opinar, eu não deveria me privar de ser a Valentina de verdade.

Às vezes, eu me perguntava se não tinha sido trocada no dia do meu nascimento, tomando o lugar do bebê de sangue real, porque, definitivamente, não me encaixava nos padrões de uma princesa. Nada que eu fizesse era o suficiente para agradar todas aquelas pessoas, nem mesmo aos meus pais. Eu era como o patinho feio, só que sem a parte de me tornar um cisne perfeito. Em San Ruan, fora a primeira vez que senti pertencimento e acolhimento, coisas que, até então, eu não fazia ideia de que era exatamente o que estive procurando em todos aqueles livros.

— Deixe-a hospedada por uns dias na mansão da madame Hortênsia, vai pô-la nos trilhos rapidinho — Wanda me olhou como se eu fosse um cãozinho que tivesse acabado de fazer as necessidades no tapete e precisasse ser adestrado.

A verdade era que Wanda era uma das moças solteiras de Âmbar que estava obcecada por Edgar. Uma das damas que me odiava gratuitamente por eu ser a infeliz a quem o príncipe, convenientemente, escolhera.

— Perdoem-na queridas, ela só está brincando. — Mamãe me olhou com a aura de repreensão. — Coisas da juventude. Mas eu vou mandar chamar a madame Hortênsia tão breve possível.

Resolvi permanecer calada durante todo o chá das 16h, pois concluí que nada do que eu dissesse mudaria a percepção daquelas ladies sobre mim. Eu era a "deslocada e sem educação, muito sortuda pelo príncipe Ed ter se interessado por mim", e nada tiraria isso da concepção daquelas tagarelas.

Em alguns casos, concluí, o silêncio é a melhor resposta. Mas em outros, como entre o Daniel e eu, o silêncio é mais perturbador do que mil agulhas perfurando os ouvidos. Exagerada?! Talvez...

— Vossa Majestade está convocando Vossa Alteza a se apresentar diante dele, agora mesmo, em sua recamara — Louise apareceu na soleira da porta do meu quarto.

— Obrigada, eu só preciso antes me vestir de uma maneira mais adequada... — respondi. Eu estava debruçada em minha cama, escrevendo sobre a minha viagem em meu diário, vestida com a jaqueta de Daniel, sobre um vestidinho florido que eu tinha comprado em um brechó em San Ruan. Era muito mais confortável do que os  vestidos rendados que eu tinha que usar diariamente em Woodland Castle.

— Ele já ligou? —a minha babá sussurrou logo após se certificar se não havia mais ninguém por perto.

— Não, e nem vai... — fingi não me importar. — Foi uma aventura de verão, só isso.

— Sei... — Sorriu torto, revirando os olhos. Até que eu gostava mais da nova versão da Louise, era mais autêntica e espontânea.

— É sério... não devíamos nem ter começado esse romance, para início e conversa.

— Fale baixo, alguém pode escutarr — Advertiu-me, checando mais uma vez o imenso corredor forrado com carpete azul-marinho. — Se querr a verrdade, gostei muito mais dele do que do prríncipe Edgar — deixou escapar em meio a um sorriso irreverente.

— Eu também, minha amiga... — Suspirei com pesar, olhando para as páginas do meu diário onde eu havia descrito o sorriso de Daniel, e como ele me fazia falta. — Mas se tem uma coisa que eu aprendi é que não se pode ter tudo o que se deseja — falei enquanto a senhora me ajudava a abotoar aquele longo vestido apertado que o meu pai tinha me dado de presente no dia em que cheguei de viagem.

— Acho que nós podemos menos ainda quando nem sequer tentamos...

Aquelas palavras ficaram rodopiando pela minha mente enquanto eu me dirigia às recamaras do rei de Âmbar, meu pai.

— Com licença — reverenciei quando cheguei à sua mesa de trabalho, que estava escrevendo alguma coisa em seu enorme diário. Não era um diário cheio de sentimentos como o meu, era um diário de negócios, de acordo com a minha mãe. — Vossa majestade mandou me chamar.

— Sim, minha filha, sente-se. — apontou para a poltrona vermelha aveludada diante da mesa de escritório.

Obedeci sentindo uma coisa estranha no peito. Algo no olhar de papai me dizia que ele desconfiava da minha aventura amorosa ilícita.

— Sim, senhor — falei, olhando-o apreensiva.

— Como foi a viagem? Conte-me sobre os passeios... sobre o clima da cidade... sobre os jardins... quais personalidades interessantes conhecestes... — Em resumo, o rei queria dizer "por acaso você cometeu algum delito? Quebrou as regras? Pegou carona com um estranho e ainda por cima o beijou?".

— Eu não vi muitos jardins, mas praias. Muita água salgada, areia... nada demais... — Sorri sem jeito.

— A madame Louise disse-me que havias ficado maravilhada com as terras de Porto Rico, então, por que estás economizando elogios? Algo a está aborrecendo?

Não! — Apressei-me em lhe assegurar. — Não é isso, eu amei mesmo tudo. É um lugar deliciosíssimo, o clima muitíssimo agradável, e as pessoas muito educadas. Foi o melhor presente de aniversário, eu agradeço muito, de coração — teci elogios pomposos, que eram como música aos ouvidos das pessoas nobres.

— Creio que não fora nada demais, pois me pareceste ainda mais entristecida do que antes desse passeio. O que pode ter acontecido? — Arqueou uma sobrancelha, como se estivesse me desafiando a tentar escapar do interrogatório.

Entristecida?! Pois estou bem, e apreciei muito conhecer Porto Rico — respondi com toda a fleuma e elegância para parecer convincente.

— A sua mãe me disse que está sobremaneira preocupada com os teus modos. Contou-me que a senhorita está ainda mais... rústica do que antes da viagem. — Pigarreou constrangido.

— Eu nunca conseguirei ser tão encantadora e educada como a rainha. Ela tem uma graça natural que eu infelizmente não herdei — justifiquei-me.

— Sua mãe é mesmo encantadora... — Papai sorriu e seus olhos brilharam, o que me fizeram lembrar de como era bom ser admirada por Daniel, pois me sentia amada, sem que eu precisasse ser uma garota perfeita. — E ela se preocupa muito contigo. Quer que teu futuro seja abençoado...

— Eu sei, eu sei... — Anuí com a cabeça, desanimada. — É só que... não sei... não sei se quero ser uma rainha — despejei por fim.

— As tuas antepassadas estão revirando no túmulo, diante de uma sentença como essa... — Riu despreocupado, porque o meu pai não dava muito crédito ao que eu dizia, como se fosse apenas "futilidades de adolescente"

— Eu não tenho suportado ser uma princesa, quem dirá rainha... não sou digna, não tenho vocação alguma.

—  És corajosa como a tua mãe, e imponente, como teu pai.  Se tiveres sabedoria para se unir a um cavalheiro honrado, irás guiar o nosso povo tão ou bem melhor do que eu.

— Só ladeira abaixo — sussurrei me imaginando casada com o príncipe Edgar, o que me embrulhou o estômago, pois apesar da boa aparência física, dentro dos padrões da sociedade, o jeito bajulador daquele cavalheiro o fazia perder todos os atrativos.

Como? — O meu pai franziu o cenho.

— Nada... só estava pensando em voz alta.

— Ouça, chamei-te aqui porque, no mês que vem, terás um banquete em Ametista, para que o príncipe Edgar lhe apresente à sociedade como sua noiva...

O quê?! Noiva?! — Sobressaltei-me, quase caindo daquela poltrona. —Não recebi nem sequer um pedido formal de noivado. E tampouco aceitaria. — Olhei-o sentindo-me frustrada.

— És muito nova para escolher acerca de seu futuro, portanto, aos mais experientes é dada essa função. Hoje, não compreendes, mas, um dia, irás me agradecer.

— É claro... aliás, muito obrigada por considerar os meus sentimentos.  — Levantei-me prestes a me retirar, com os olhos pingando raiva em forma de lágrimas. Eu sabia que não adiantaria de nada questionar uma ordenança do rei, pois ele não estava me convidando a ir ao baile, estava me comunicando que eu iria, nem que fosse arrastada. Era assim a minha vida, e eu tinha que aceitar essa sorte.

"Mas não era porque eu compareceria a esse banquete que ficaria noiva", pensei quando retornei aos meus aposentos.

Não mesmo. Faria o evento de Edgar ser tão infeliz ao ponto de ele mesmo me rejeitar, com a própria boca, diante do rei, meu pai. Naquela noite, adormeci tarde, pois passei horas a fio anotando, em meu diário, o plano perfeito para arruinar o meu próprio noivado.

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