O som da água corrente tinha costume de deixar os humanos calmos e relaxados, se esquecendo de certos problemas do momento. Entretanto, a única sensação que corria pelo corpo de Fai Chen era a ansiedade. Ansiedade por encontrar a pessoa que tantos falavam e a que, talvez, poderia tirar toda a angústia dentro de si.
A Deusa Curandeira parou sua meditação e se aproximou dos jovens, colocando seus pés em terra firme. Ela tinha quase a mesma altura do que Fai Chen, o que surpreendeu bastante Hu Long que, ao perceber essa característica, murmurou baixinho:
"Porra... Por que eu não podia ser um pouco mais alto?", ele olhou para o cultivador, que passou seus olhos por todo o corpo de Hu Long e riu como resposta. Porém, antes que o assassino pudesse falar algo sobre aquela risada tão graciosa, a Deusa Curandeira tomou atitude e começou a se pronunciar.
"Poucos conseguem chamar a minha atenção e bem, estou vendo que há uma mulher entre vocês que precisa de ajuda", a Deusa Curandeira olhou de relance para Xia Ling, que continuava nos braços de Li Ming-Yue. "Aparentemente sua pele está cercada de queimaduras. Agora, seu corpo inteiro está lutando contra uma febre criada pela infecção das abertura e hum..."
A mulher se abaixou e ficou de joelhos à frente de Li Ming-Yue e o corpo adormecido de Xia Ling. Ela estendeu a mão, com o intuito de distinguir uma febre forte de uma febre mediana, porém, antes mesmo dela tocá-la, a cultivadora demoníaca puxou o corpo da falsa concubina para mais perto de si e olhou com tamanha frieza para a Deusa Curandeira, que reagiu àquilo com um sorriso no rosto.
"Essa falta de confiança que tem pelas pessoas pode te ferir futuramente", a mulher mais alta disse, encarando a outra, que parecia estar pronta para golpeá-la se ousasse tocar em Xia Ling. Então, usando a paciência ao seu lado, a Deusa Curandeira continuou sua fala: "Se eu não posso cuidar da jovem em seus braços, o que vieram fazer aqui?"
Ao ouvir o jeito calmo de falar e agir da mulher, Fai Chen lembrou-se vagamente de memórias passadas, as quais faziam relação a uma pessoa querida em sua vida, que o ajudou em momentos mais desesperadores dentro de seus dias no clã Wei. Por conta dessa lembrança, a presença da Deusa Curandeira não estava mais causando tamanha ansiedade e sim uma leveza dentro de si, pois, se ela tivesse realmente um jeito parecido ao de seu velho conhecido e amigo, certamente poderia dialogar com mais facilidade.
Hu Long, por outro lado, estava de braços cruzados e um pouco arrisco a pessoa desconhecida. Por mais que ela falasse que era a Deusa Curandeira, ele sentiu de longe a repulsa de Li Ming-Yue sobre a tal e isso o pegou de jeito.
Sua amiga e companheira de batalha nunca errou sobre seus inimigos. Então, decidiu ficar atento a quaisquer que fossem as próximas ações da mulher.
De qualquer forma, eles também não podiam deixá-la sem uma resposta ao seu questionamento. Então, o próprio assassino decidiu respondê-la e de uma forma carismática, não tentando preocupar o cultivador com seus pensamentos controversos sobre a Deusa Curandeira.
"Viemos realmente em busca de uma ajuda por Xia Ling. Mas, acho que você conseguirá entender, né? Quando gostamos de alguém, não queremos que pessoas desconhecidas toquem nela. Por isso, A-Yue está agindo dessa forma!"
"Hu Long, cale a boca...", Li Ming-Yue respondeu, com suas bochechas completamente coradas. "Eu não deixo essa outra mulher tocar em Xia Ling porque..."
A Deusa Curandeira olhou para Li Ming-Yue e sorriu novamente, parecendo entender melhor a situação. Então, ela se levantou da terra um pouco molhada e começou a caminhar para a cabana. Sem pensar muito, Fai Chen, todo entusiasmado, decidiu ir atrás dela.
"Ei, Cegueta! Espere por mim!", Hu Long caminhou rapidamente para o lado de seu amado, que parecia estar com pensamentos avoados. Preocupado com o cultivador, o assassino pegou sua mão com carinho e a alisou, pedindo por sua atenção. "Você está bem, Cegueta?"
Fai Chen realmente estava muito empolgado por ter encontrado a Deusa Curandeira, mas, depois de sentir a mãozinha de Hu Long em cima da sua, sua mente voltou à realidade em apenas um estalo. Ele percebeu que estava criando uma grande expectativa sobre a presença "milagrosa" e isso poderia gerar consequências ruins.
"Estou bem, Hu Long. Obrigada por sua preocupação", Fai Chen retribuiu o carinho na mão do assassino e abriu um breve sorriso. Logo, ele olhou para a direção da cabana e percebeu que a Deusa Curandeira já havia entrado naquele local. "Vamos ficar por perto dela. Caso aconteça algo, estaremos preparados."
"É assim que eu gosto, Cegueta. Sua inteligência é muito atraente", Hu Long concordou com a cabeça e assim, ambos andaram rapidamente para a cabana e em poucos segundos, já estavam dentro e olhando a Deusa Curandeira mexendo em certos armários empoeirados.
Quando Fai Chen e Hu Long haviam entrado pela primeira vez na cabana, tinha várias flores de lótus espalhadas pelos cômodos e isso os trouxe uma grande atenção. Porém, agora, todas as flores de lótus haviam desaparecido e o ar estava inexplicavelmente pesado. Era como se uma força estivesse sugando energias e essa teoria, que surgiu dentro da mente do cultivador, só se tornou ainda mais forte quando Hu Long, por ter sangue de yaomo correndo por suas veias, começou a se sentir tonto e enjoado.
"Cegueta... Tá doendo...", o assassino apontou para sua cabeça e depois se apoiou no ombro do mais alto, que estava tentando entender o porquê desse ar pesado ter aparecido justamente quando a Deusa Curandeira entrou na cabana.
Entretanto, os pensamentos do cultivador logo foram respondidos quando a mulher virou para ambos os homens e se sentou em uma cadeira, cruzando seus braços.
"Desculpem por isso. Quando estou em casa, eu ativo um encantamento de proteção contra qualquer criatura que tenha alguma ligação com Diyu. Seu amigo possivelmente tenha alguma relação com os yaomos. Então, terá que aguentar a dor de cabeça ou pode optar por descansar fora de minha cabana", ela mencionou em um tom claro e esclarecedor.
De uma certa forma, essa proteção fazia sentido. Porém, uma pessoa tão poderosa quanto a famosa Deusa Curandeira, que tantos homens falavam sobre e tinham curiosidade, precisava mesmo de proteção?
Fai Chen, angustiado em ver Hu Long naquele estado, olhou bem fundo nos olhos do assassino e disse:
"Não se preocupe comigo. Fique lá fora e me espere."
"Mas... Cegueta e se você..."
"Não acontecerá algo terrível. Vai ficar tudo bem."
O assassino xingou baixinho, mas decidiu obedecer ao cultivador. Entre segundos, o menor já estava sentado em um dos degraus da frente da cabana, esperando Fai Chen e a Deusa Curandeira saírem de lá o mais rápido possível.
"Você tem muito carinho por esse amigo. Estou certa?", a mulher comentou, levantando-se da cadeira e continuando a vasculhar suas prateleiras, que estavam cercadas de livros e pequenos frascos de vidros.
"Ele não é apenas um amigo para mim", Fai Chen respondeu de imediato, o que, dentro de um curto tempo, fez suas mãos suarem.
A Deusa Curandeira soltou uma risadinha leve de seus lábios e finalmente pegou um livro de sua prateleira. Ela o abriu e começou a vasculhar as páginas. Enquanto realizava tal ação, decidiu continuar o assunto:
"Compreendo. Ter um vínculo com uma pessoa que lhe trate como um ser completamente único é algo bem especial. Aliás, por que seu companheiro tem algo relacionado aos yaomos dentro de si? Ele não aparenta ser uma criatura de Diyu. Isso é bem diferente."
"Problemas com o pai... Em um resumo...", Fai Chen coçou a nuca, tentando ser o mais direto possível sobre esse assunto, tão cheio de detalhes trágicos.
"Hum... Bem diferente mesmo. De qualquer maneira, deixe-me perguntar uma outra coisa. Vocês vieram até aqui apenas por aquela garota ou há mais motivos?", a Deusa Curandeira parou de folhear, mas manteve sua cabeça abaixada, ainda não mantendo um único contato com os olhos de Fai Chen.
"Há mais uma coisa e é sobre mim... Eu tenho um certo dom em meus olhos. Dizem que esse dom foi me concedido por meios divinos. Porém... Depois..."
"Esse dom foi usado de má forma? E depois, visto como algo terrível?
Os olhos azuis escuros de Fai Chen se arregalaram. Era tão óbvio que isso poderia acontecer?
"Desculpe pelo mistério todo, mas eu já ouvi falar de você. Não sabia que o Jovem Mestre Fai viria até mim para lhe tirar esse dom. Você tem certeza que deseja retirá-lo?", a mulher continuou a dizer, agora já caminhando para fora da cabana.
"Eu...", Fai Chen desejava responder àquela pergunta feita pela Deusa Curandeira, mas, assim que ela abriu a porta, Hu Long simplesmente correu para dentro da cabana novamente e o abraçou fortemente, não se importando nem um pouco com o encantamento de proteção.
"Você demorou muito, Cegueta... Eu fiquei preocupado...", o mais baixo comentou, ainda abraçando o mais velho, que ao ser atingido por aquele carinho excessivo de repente, apenas paralisou todo seu corpo e voz.
Por outro lado, a Deusa Curandeira, mesmo tendo sua saída atrapalhada, continuou a caminhar até Li Ming-Yue e Xia Ling. Mas, por agora, com um livro em suas mãos e uma página marcada.
"Hu Long, não se preocupe. Eu disse que não aconteceria algo comigo...", Fai Chen voltou a falar, retribuindo o abraço por um tempo, porém, depois se afastando aos poucos do corpo de Hu Long, para que eles pudessem ir em direção às mulheres. "Vamos, eu tenho certeza que a Deusa Curandeira poderá ajudar Xia Ling e..."
Antes que os dois homens pudessem voltar a postura, eles viram uma cena que, dessa vez, aos olhos de ambos, foi completamente sem sentido.
Li Ming-Yue tinha empurrado a Deusa Curandeira para longe de si e de Xia Ling. Mas, esse empurrão não foi um daqueles leves.
Foi um arremesso.
O corpo da Deusa Curandeira foi literalmente arremessado a uma árvore próxima.
"Isso tudo por que ela tocou em Xia Ling? Li Ming-Yue, você está com algum probleminha de ciúmes?", Hu Long comentou enquanto corria, ao lado de Fai Chen, para Li Ming-Yue e Xia Ling. "Sabe, é compreensível o ciúmes. Mas, porra... Você arremessou a outra e..."
"HU LONG, CALE A BOCA!", Li Ming-Yue gritou, segurando o corpo de Xia Ling com mais força com apenas um braço cercando-a. Por mais que a cultivadora tivesse uma força sobrenatural, controlar o cultivo com uma única mão enquanto segurava um corpo com a outra, era algo fora do alcance de qualquer cultivador. Eram duas forças que estavam se misturando, a física e a espiritual, e isso poderia abalar alguma delas a qualquer momento.
"A-Yue... Você está muito irritada...", Hu Long comentou, se escondendo atrás de Fai Chen, que estava tão confuso quanto o assassino.
Porém, ao contrário do menor, o cultivador sabia se orientar em um momento de dúvidas. Ele respirou fundo e enquanto olhava a Deusa Curandeira se levantando a uma distância sobre eles, questionou Li Ming-Yue:
"O que aconteceu? Você reagiu a alguma coisa que ela disse ou..."
"Jovem Mestre Fai, você não percebeu?", Li Ming-Yue retrucou, com os olhos enraivecidos e com um suor escorrendo pela sua testa. "Ela tem aquela marca."
"Aquela marca? Do que você está falando?", Fai Chen perguntou com inocência nos olhos. Ele realmente não sabia do que a jovem estava falando. Mas, isso não durou por muito tempo, pois, as próximas palavras de Li Ming-Yue fizeram o cultivador relembrar de seus estudos.
"A marca de submissão dos..."
As palavras da cultivadora foram completamente paradas assim que, sem nenhum dos três jovens conscientes perceberem, uma flecha perfurou seu peito.
A jovem abriu seus lábios para complementar sua frase, mas um punhado de sangue estava sendo produzido em sua garganta, o que deixou a última palavra que faltava, um tanto confusa.
"C-Clãs..."
Logo após tal final, a cultivadora caiu de joelhos no chão, mas não deixou o corpo de Xia Ling se machucar. Mesmo em um momento tão doloroso, Li Ming-Yue se recusava a deixar a falsa concubina escapar de suas mãos, o que, aos olhos da atiradora, foi uma cena realmente nojenta.
A atiradora era a Deusa Curandeira.
Ela estava portando um arco em suas mãos. Sua construção tinha uma imensa dedicação. O arco era prateado, com detalhes florais em suas bordas. Seus cabos eram dourados e brilhantes, algo que realmente chamava atenção e muita.
Fai Chen sentia já tê-lo visto.
Porém, não era o momento certo para forçar sua memória. Ele tinha que lutar contra a presença que, agora, estava bem diferente da versão anterior. A Deusa Curandeira, além de seus olhos exaltarem um brilho amarelo, como a de um animal faminto por carne, mostrava unhas compridas e cortantes; e, em seu rosto, ela esboçava um sorriso formidável, com caninos afiados aparentes e uma longa língua correndo por seus lábios.
"Meu objetivo não era atacar você, Machado Branco. Mas... Como mulheres podem perceber detalhes que homens sequer prestam atenção? Inacreditável...", a Deusa Curandeira comentou, abaixando o arco e aproveitando para olhar friamente a cultivadora demoníaca, que tossia sangue sem parar. "Para uma cultivadora que passou anos desaparecida, eu esperava bem mais em seu retorno. Enfim, sua descoberta sobre minha marca foi algo que não estava presente nos meus planos e isso... Me irritou..."
A Deusa Curandeira jogou o arco em suas costas, prendendo-o por corda e correu em direção a Li Ming-Yue, sem pensar na possibilidade que Fai Chen ou Hu Long poderiam ser tão rápidos para pegá-la. Entretanto, suas expectativas foram quebradas quando o cultivador ficou na frente da jovem impossibilidade de lutar e a parou com sua espada, machucando-a com um corte profundo em um de seus ombros.
Um grito grosso saiu dos lábios daquela criatura, que certamente não era humana ou divindade. Fai Chen, pronto para um segundo golpe, acabou sendo surpreendido com a nova ação da Deusa Curandeira. Ela cruzou seus dois braços e criou sombras azuis escuras, que rodearam completamente seu corpo.
Antes de sumir, o cultivador conseguiu ver uma segunda figura por dentro daquela sombra, o que deixou-o receoso em partir para cima da mesma, decidindo assim permanecer na mesma posição e ficar na retaguarda.
Os olhos do cultivador estavam tremendo de raiva, por ter realmente sido enganado pela falsa esperança que desde o começo de sua jornada com Hu Long estava procurando.
Seus sentimentos misturados entre ódio e decepção foram apenas mais ressaltados quando, de dentro daquela névoa, uma voz foi escutada e um pouco diferente da Deusa Curandeira. Porém, assim como a dela, seu tom conseguia ser calmo e tranquilo.
"Eu disse que nos veríamos no Rio Amarelo, Fai Chen. Agora, só espere mais um pouco e logo, estaremos juntos novamente."
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- ale yang on -
HAHAHA A SOCIEDADE ELA... (fazendo pose de vilã)
Brincadeiras à parte. Mas, eu estou MUITO empolgada por esse arco. Eu mal posso esperar para ler as reações de vocês sobre essa tal "Deusa Curandeira", que como puderam perceber, não é humana e nem uma divindade.
Prestem atenção nos detalhes e segurem as emoções. De agora em diante, virá muitas revelações sobre diversos personagens.
Agora recadinhos especiais:
- Muito obrigada por terem sido tão compreensíveis sobre meu TCC. Amanhã (dia 06/12) será oficialmente minha apresentação e estou bem nervosa, devo admitir. Mas, sou eternamente grata a toda ajuda e apoio que vocês me deram. Foi algo que realmente me deu forças para terminar e chegar onde cheguei. Obrigada, de coração!
- Como agradecimento a todo esse apoio, vocês terão a oportunidade de fazer Perguntas, Comentários, Cantadas ou até Confissões para QUALQUER UM dos personagens dessa novel. Pode ser vivo ou morto! (pelos céus, isso foi triste...)
Anotarei tudo que mandarem para os personagens responderem. Então, é a hora de vocês se divertirem!
Até o próximo domingo!