Ardente Perdição - Duologia V...

By AutoraLua_M

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Uma missão não finalizada. Uma traição dentro de uma salaz paixão. Dois marcos dentro da história de duas bom... More

Ardente Perdição
Guia de personagens
Book Trailer
Prólogo
INÍCIO DE POSTAGENS
Capítulo I
Capítulo II
Capítulo III
Capítulo IV
Capítulo V
Capítulo VI
Capítulo VII
Capítulo VIII
Capítulo IX
Capítulo X
Capítulo XI
Capítulo XII
Capítulo XIII
Capítulo XIV
Capítulo XV
Capítulo XVI
Capítulo XVII
Capítulo XVIII
Capítulo XIX
Capítulo XX
Capítulo XXII
× Recado ×
Capítulo XXIII
Capítulo XXIV
Capítulo XXV

Capítulo XXI

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By AutoraLua_M

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× Pode conter erros.

× Boa leitura.

× Nota: A autora é imparcial e esganaria os dois protagonistas

× 0...

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Ethan Blake

O diabo que eu tanto procurei estava em minha frente, apesar do cabelo cortado e claro, o corpo mais magro e da pouca luz, era ela.

As ônix em seu olhar vazio, os lábios cheios e rosados, os traços imparciais de Eleanor, era inegável sua presença.

Precisa ser uma mentira, estava debaixo do meu nariz o tempo inteiro.

Não conseguia pronunciar nada, não conseguia sentir nada, parecia que estava em queda livre em um abismo de confusão, questionamentos e loucura. Sequer existia a vontade de esganá-la por seu ato há meses, ou o desejo de mantê-la o mais próximo possível por sua falta.

— Bastou adereços e massa nos lugares certos para criar traços, a maquiagem uma nova essência, enquanto a cor dos olhos gerou um outro vislumbre. Um novo rosto. — Desenhou por sua pele como se ainda tivesse algo a esconder. — Novas cores, moldes e roupas, criam um novo corpo, uma nova pessoa. — Soprou um falso riso. — Soube de primeira mão que deseja atear fogo em mim.

Meu coração lembrou que precisava bater, contudo parecia uma bomba prestes a explodir em meu peito enquanto bombeava a raiva para cada artéria, minha respiração era quase nula entre os dentes e meus músculos ficaram completamente rígidos.

Sua voz clareou minha mente e em um piscar de olhos estava em sua frente, um passo de distância da mulher que me enlouqueceu e brincou de marionete com todos que poderia, a inteligente e traiçoeira Rosalie Aubry.

Imediatamente levantou a cabeça para me encarar à altura, a proximidade não foi suficiente para sanar minhas dúvidas, estava dividido entre meus instintos que gritavam por torcer seu pescoço com todo ódio que detinha por sua decisão unilateral, até mesmo banhá-la de álcool e a incendiar como tramava a meses, e encontrar um detalhe que mostrasse que não era ela, que não estava ali o tempo todo, brincando com todos.

Era incalculável a cólera por sua traição, por ir contra sua palavra e manipular tudo para que ficasse distante o suficiente para seu golpe de misericórdia. Poderia ser o melhor plano, ou o golpe certeiro para o momento, mas na altura do campeonato não importava, uma questão nova foi levantada, de qual lado deveria estar agora?

Ou melhor, qual mentira contaria agora?

— Sua conversa com Lowell acabou — afirmou, entregando-me a arma.

— Cinco meses — sussurrei a única coisa coerente que conseguia — Cinco meses, Rosalie — repeti mais alto, era como uma pedra rasgando minha garganta.

A arma estava entre nós dois, apontada e pressionada contra sua barriga, estava destravada, tudo dependeria de lucidez ou loucura. Não era uma má ideia fincar uma bala em seu corpo, e não seria distante de nossa realidade retirar quem entrasse em nosso caminho.

Qualquer sinal de traição.

Uma corrente elétrica percorreu meu braço, seu toque frio não tentou afastar a arma, pelo contrário, com os olhos presos aos meus, arrastou-a até o lado esquerdo de seu peito. Na direção de seu coração, como se não tivéssemos mais nada a perder.

Era o que parecia, o abismo que se formou em minha mente era meu cerne, enquanto seu olhar e expressão vazia enunciaram que também não perderia nada, algo que uma vez me causou um aperto no peito de medo, agora causava raiva.

Uma ilusão criada por ela.

Claro que não desejava morrer, seu desejo por ganhar a guerra era maior que qualquer outro e estava aliado a sua manipulação implícita em pequenos atos, ao menos aos olhos de outros.

— Você mentiu. — Eram as malditas palavras em minha cabeça. — Você mentiu para mim, manipulou as informações e me manipulou, foi contra sua palavra — enumerei para seu vazio. — Eu confiei em você e acha que isso vai resolver?

Travei a arma e a joguei no chão sem me importar se causaria algum defeito, exatamente como aquela mulher fez com todos, chutei o objeto contra alguma parte do quarto e em um impulso me apoiei na cômoda atrás de Rosalie, a encurralando.

— Atirar seria pouco para tudo isso e fácil demais para nós dois. — Ela assentiu minimamente. — Eu confiei que estávamos juntos e você apenas prezou sua opinião, como se apenas você estivesse jogando — rosnei próximo ao seu rosto, invadindo o espaço que lhe dava tanto poder e a fazia imbatível. — Poderia destroçá-la como a qualquer um que entrou em meu caminho.

Não havia nenhum sinal de raiva ou arrependimento em seu rosto, não se importava com nada e eu duvidava que em algum momento o fizesse, o que era como lenha para a fogueira de ódio e repulsa dentro de mim.

Como poderia ser tão fria ao ponto de não se arrepender por ir contra sua palavra? Essa era sua verdadeira natureza, tão desprezível ao ponto de ignorar o que todos sentiram e fizeram, desde que sua parte estivesse intacta.

A pior e mais traiçoeiras das serpentes. Pude conhecer homens e mulheres podres ao infectarem-se com ego e poder, pérfidos e asquerosos, ainda assim, nenhum chegou a me obrigar a lutar contra um turbilhão de pensamentos e seus impulsos.

— Todos ficaram perdidos, todos estavam atrás de você, esperando um mínimo passo para poder nos organizarmos para Oliver e sem lhe comprometer — ditei e a cada palavra percebia o quão patéticas minhas ações foram. — E você estava desfilando entre nós com seu querido marido russo, brincando com tudo e todos, como a merda de uma vadia controladora e ignorante.

Eu desejava aplicar todas as torturas e golpes que usei em pessoas para alcançar uma mínima informação sobre seu paradeiro ou abrir caminho na guerra entre os Sparks, porém parecia pouco.

Uma maldita chama estava acesa e consumia tudo, sentimentos e razão, era o resultado de uma faísca de traição e manipulação, ainda assim não poderia estar mais racional em meses.

— Eu quase enlouqueci por você e pela filha que você deixou sem dizer porra alguma.

— Tudo estava planejando.

— Com quem? — Disparei e fazendo ir minimamente para trás e retornar com um suspiro. — Ah, claro, era muito mais importante os russos saberem do que o outro líder da mesma equipe que você, quem precisou controlar as NYX, o homem que ficou responsável pela sua filha. A quem você deu sua palavra.

— Espero que tenha desistido de seu plano de se infiltrar — disse na tentativa de chamar a atenção da mulher na banheira.

O silêncio pendurou no banheiro, sua única resposta foi levantar o olhar de seu 'kindle' para a janela, era um sinal de teimosia, ainda desejava me provar que sua ideia era válida.

Tirei a roupa e segui em sua direção, adentrei a banheira e tomei o espaço atrás de seu corpo. Envolvi sua cintura com um de meus braços e virei seu rosto parcialmente para mim, um frio tomou minha barriga pela ideia de não poder mais vê-la ou tocá-la por seu plano.

— Rosalie.

— Traçamos outro plano, não é? — inquiriu ríspida.

— Não me parece uma resposta boa o suficiente. — As íris negras rolaram em desagrado. — Me dê a sua palavra de que não vai se colocar em jogo, não sabemos com quem estamos lidando e onde...

— Não farei nada além do planejado. — Suspirou. — Dou minha palavra e esquecemos a ideia.

— O que mais?

— Não farei nada sem lhe consultar antes, qualquer mudança ou informação que possa envolver esse plano, faremos juntos.

— A sua palavra?

— Sim.

Acenei com a cabeça validando sua confirmação, por sua vez me selou antes de se ajeitar em meu peito e voltar a atenção para o que lia em seu aparelho. Por segundos uma mínima dose de paz me tomou, beijei sua clavícula e apertei contra mim.

— Obrigado.

— Não era apenas a sua decisão ali, sabe por quê? Essa merda de guerra não é apenas sua, tem mais vidas em jogo, mesmo que não importem para seu ego e vingança. — Um mínimo trancar de sua mandíbula se fez presente. — Poderia ser uma briga da sua família por poder, mas não se limitou a isso, perdi amigos por não poder me mover, famílias inocentes ficaram na mira e no poder de Oliver porquê eu deveria me contentar com o que me contavam, com as investidas de alguém misterioso e com um acordo.

Não me recordava de poder odiar tanto alguém.

Sequer lembrava de como era ser traído e enlouquecido por alguém desta forma.

Poderia ser tão simples matar ou torturar, porém seria como aplicar tudo contra mim mesmo, era um beco sem saída com mil palavras e, ainda assim, nenhum sentimento presente.

Um desperdício de esforço.

— Isso nem se fechou a uma geração, ou se esqueceu de Agatha?

— Eu fiz de tudo para que nada acontecesse a ela.

— Me deixou de mãos atadas com ela, inesperadamente. — O som do móvel contra a parede se fez no quarto, entretanto não mudou a força que aplicava contra ele. — Eu não pude prometer nada a ela, porque eu sequer sabia onde ou como sua mãe estava, sequer qual era seu plano, se existia um. — O amargo parecia tomar conta de minha boca ao recordar das noites e dias com Agatha. — Ela sentiu a sua falta durante os cinco meses e nós dois sabemos como é isso, ela ficou sem falar ou comer e você estava próxima e...

— No momento certo, eu fiz o que não deveria, a coloquei em risco, porém cuidei da minha filha — rebateu e tomou espaço ao avançar em minha direção. — Pode continuar me condenando, no entanto o que está feito, não tem como desfazer e tive motivos.

— Motivos? — Provei uma risada ácida contra seu rosto. — E quais seriam os nobres motivos para tomar o controle de algo que não envolvia apenas você?

— Se você parasse de enfiar o rabo na merda que parece ter um ímã para problemas, poderíamos...

— O assunto não é esse.

— Você me deixaria ir?

Era uma maldita tática para criar uma linha de raciocínio ao seu favor, que se quer poderia garantir ser verdadeiro. Depois de meses em sua teia de mentiras, a única opção era adentrar sua ação e talvez conseguir algo.

— Você sabia quem era antes mesmo do ataque? — O silêncio me respondeu, era frustrante demais para ser verdade, empurrei o móvel e me afastei do lugar. — Você sabia, mais um ponto para suas mentiras e omissões.

— Me deixaria ir? — Insistiu.

— Não. — Era uma maldita resposta óbvia. — Não poderia confiar que ele deixaria a ilustração de sua perda viva, muito menos bem. — Voltei o olhar para ela, cada parte de seu corpo, dos pés a cabeça. — E eu estava certo.

— Ele não me matou.

— Você não é nem a sombra de quem conheci. — repliquei e pela primeira vez desviou o olhar, não foi um grande golpe, todavia foi capaz de reconhecer. — Não sei se foi efeito das torturas, de sua teimosia ou sua teia de mentiras, mas eu não estava errado. — Tornei a me aproximar dela mais uma vez, contudo havia um limite seguro para nós dois. — Me responda Rosalie, por que mentiu? Por que não me disse a gravidade da situação?

— O que faria?

— Diferente de você, honraria minha palavra, qualquer que fosse ela.

Pude perceber um segundo aperto em sua mandíbula, estava controlando algo, as palavras ou os atos, ainda assim o estreitar de seus olhos declarou que aquilo era um desafio, não se deixaria abater, não reconheceria, não cederia.

Respirei fundo e trinquei minha mandíbula antes que as palavras erradas saíssem, apertei o punho e mudei meu foco, entretanto pude perceber seu movimento no quarto. Éramos como animais ameaçados e enjaulados, não sabia quem correria até a arma para atirar primeiro, se me empurraria ou se a prensaria em algum lugar.

Fora do controle.

— Rosalie.

— Mentiras foram necessárias, Ethan — advertiu irreverente e incontestável. — Pode ter matado muitas pessoas, o que duvido que realmente se importe, contudo manterá quem eu quero vivo e me permitiu muita coisa.

Seu tom ignorante e suas palavras venenosas foram a centelha para uma explosão, uma explosão de emoções pela sua aparente indiferença com tudo o que foi exposto, com todos ao seu redor e com todo o passado.

O estrondo da explosão soou, golpeei um soco no armário, atravessando a porta.

Uma amaldiçoada mulher brincando de bonecas com todos, desenhando o que cada um deveria pensar e sentir, desde o início era seu jogo e eu apenas um dos brinquedos. Como pude me deixar ser enganado mais uma vez? Como caí nas palavras do diabo sem pensar duas vezes?

Arrastei meu braço pela madeira recém-quebrada, a onda de adrenalina me impediu de medir a força ou de me importar com os novos ferimentos em meus dedos. Poderia quebrar tudo como havia feito em outros acessos de raiva, no entanto agora não seria o suficiente, nada seria capaz de diminuir meus batimentos cardíacos e minha respiração, sequer desligar minha mente.

— E quantas mais você contou? Onde mais você mentiu? — Interpelei me aproximando dela que por sinal não recuava, embora atenta a qualquer movimento. — Qual a próxima mentira, Rosalie? Qual?

Minha mão ardia com o desejo de esganá-la.

Poderia apertar e torcer o pescoço exposto para uma expressão altiva, minha mão estava próxima ao alvo, era possível sentir o calor de sua pele e perceber os arrepios inconscientes com a situação.

Cada parte de mim era movimentada pela cólera.

Raiva de mim mesmo, de minha estupidez e da confiança depositada, da ingenuidade e burrice de meus pensamentos e de meus atos em todos esses meses. Raiva da verdade, daquela teia de mentiras e daquele jogo.

Discreta e lentamente, como se esperasse que não percebesse, moveu sua mão em minha direção, a parei rapidamente, evitando que tocasse em alguma outra parte minha. Envolvi seu pulso e o afastei fitando seus olhos como um aviso, não desejava seu toque, seu cuidado ou veneno.

— Não toque em mim — asseverei ao soltá-la.

— Acabamos nossa conversa.

— Não, não acabamos.

— Pode descontar sua ira depois, terá tempo para isso.

— Rosalie.

— Evite abrir seus pontos, pode não ser grande coisa, mas não podemos brincar no momento — repreendeu no tom baixo e duro o qual acabei me acostumando.

Antes que rebatesse, ela pegou algo na cômoda logo atrás de si, duas cartelas de comprimidos. A fitei por instantes, ela entendia minha desconfiança, era no mínimo justificada e esperada.

Vislumbrei rapidamente o nome e reconheci que poderia não ser veneno ou sonífero, mesmo não sendo algo relevante naquele momento. Um remédio para dor e outro para o corte, que sequer parecia fundo, parecia demais para algo banal.

— Precisa tomar seus remédios.

— Não preciso tomar nada, preciso ficar lúcido e resolver a sua bagunça.

— Alguns de seus pertences estão na cômoda, o restante está no gaveteiro e o que precisar está no armário e banheiro — explicou indiferente, indicando com os olhos para os lugares. — Hillary virá mais tarde para ficar com você, discuta com ela sobre o uso dos remédios.

— Ela sabe sobre você?

— Descobriu há pouco tempo e me intimou para dar o próximo passo, esse passo.

— Quem mais sabe, Blanche, Aubry, Sparks? Claro, todos poderiam saber...

— Não é o momento para isso — soprou com um olhar afiado sobre mim, estávamos exauridos. — Descanse, se precisar de algo basta pedir aos empregados, Hillary ou se preferir fique à vontade pelo apartamento.

Sem olhar para trás me deixou sozinho no quarto, mais uma vez.

Ainda que cogitasse ir atrás, a dor aguda em minha perna e cintura, me impediram, seria humilhante dar-lhe o gosto da razão ou da dor que sentia por todo meu corpo e a exaustão.

Era muita informação para associar, minha mente parecia quebrada, estava exausto e minha cabeça doía como se meu crânio fosse massacrado e cada parte de meu corpo respondia a isso, respondia a confusão, a tensão e a decepção.

Não sabia dizer o que era pior naquela situação, tudo era devastador, desgastante e repugnante o suficiente para que desejasse desligar-me, atear fogo em minhas ideias e memórias.

Meu inferno apenas tinha começado.


(...)


Despertei quase em um salto, se não fosse por um belisco em minha perna e fisgar em meu quadril, era apenas mais um dos malditos pesadelos que me acompanhavam há meses.

Minha visão desfocada pareceu girar por instantes, mas logo se estabilizou assim como minha mente no espaço-tempo, era a desprezível realidade. Estava no mesmo quarto que acordei há horas, o mesmo lugar da discussão, contudo estava sozinho desta vez, sem a companhia de Hillary.

Por segundos me vi perdido.

Mais uma vez havia pego no sono, aparentemente o efeito dos remédios que Rosalie me deu e que Hillary me obrigou a aceitar tomar nas condições médicas, sabia que se dependesse de mim ou da confiança em sua melhor amiga, não haveria acordo. Sequer me recordava de dormir tão bem assim em meses, apesar do pesadelo, parecia que o dia havia se passado.

Segui o olhar para a janela, uma pequena fresta de luz adentrava o quarto, já havia amanhecido, o relógio digital na cômoda esfregou isso em minha cara e me obrigou a levantar da cama em um movimento.

2:42 PM

Maio, 27, segunda-feira

Foi uma péssima ideia levantar em um salto, por segundos tudo escureceu e precisei apoiar meu corpo no móvel, era a, abominável, combinação que a platinada mencionou, "dor, poucas horas de sono, má alimentação e remédios fortes".

Por sinal precisava encontrá-la, ainda existia alguma chance de estar pelo local na companhia ou não de sua amiga, e conseguir algo para comer, ou acabaria como uma grande piada até para mim mesmo.

Antes de sair fui ao banheiro, tive algumas tentativas de melhorar minha atenção e equilíbrio, então segui para meu objetivo. O longo corredor deu a impressão de ainda estar em um pesadelo, parecia não haver sinal de outras pessoas pelo local, entretanto ao chegar na escadaria encontrei um dos seguranças mencionados há algum tempo, estava indo em direção a outro na sala.

Pareceram me analisar detalhadamente e trocar olhares, contudo não dei atenção, meu objetivo não era esse e o trabalho deles envolvia gravar a aparência das pessoas e ler cada ação.

Depois de cruzar mais alguns cômodos alcancei a cozinha e para minha sorte havia alguém, não estaria perdido. Parecia uma adolescente, ou jovem adulta, e parecia trabalhar na casa, os fios escuros presos e a atenção ao arrumar a bancada indicavam isso.

Antes que pudesse chamá-la, seus olhos claros subiram para meu rosto e imediatamente mudou a postura, tirou os fones de ouvido e me deu um sorriso gentil como cumprimento.

— Deve estar com fome, senhor Shadow, a senhora Brown disse que o senhor dormiu bastante enquanto esteve aqui — ditou curiosa. — Acabei de fazer um 'crumb cake', também temos frutas e pães, mas posso fazer algo para almoçar...

— Um lanche está bom, não se preocupe. — Ofereci um sorriso amigável em uma tentativa de soar como para Agatha e Arthur, os únicos que realmente detinham isso de mim. — Qual seu nome?

— Lucy, Lucy Diehl.

Lucy fez uma bandeja para mim, pratos carregados de bolo, fruta, aperitivos e pães, copos que variavam de vitaminas, suco e café. Tive tempo apenas de sorri como agradecimento, Diehl logo retornou aos seus afazeres na cozinha enquanto eu tomava meu "café".

Havia algo de errado com ela, não parecia uma adolescente qualquer ou uma jovem empregada, apesar de uma doce recepção e sorriso para esbanjar, sua postura, movimentos e olhares minuciosos a denunciavam. Ninguém à nossa volta era uma pessoa inocente, alguns estavam a mais tempo no ramo, outros ainda não aprenderam a esconder seus dotes e identidade.

Assim que terminei de comer, retirou os pratos e assim pude ver um corte em sua mão e outro em sua clavícula, uma vida perigosa para uma adolescente que parecia adorável.

— Sabe onde está uma mulher de cabelo platinado...

— A senhorita Fox? — Acenei. — Ela logo retornará, mas pode comer e ficar à vontade pelo apartamento.

— Obrigado, Lucy.

Concordei com a cabeça e fiz o que instruiu, segui pelas salas à procura de algum lugar confortável e de pouco acesso, era uma maneira de não precisar lidar com os seguranças ou cruzar com os possíveis donos do lugar.

Assim que alcancei uma sala distante que me pareceu de leitura, cogitei a ideia de me sentar e pensar ou buscar um dos livros na prateleira, contudo um movimento no canto de meus olhos me parou.

Não eram empregados ou seguranças, eram eles. O casal de manipuladores estava na sacada do apartamento, pareciam completamente alheios às pessoas enquanto conversavam baixo e observavam o movimento da rua. Ele estava vestido socialmente, enquanto ela trajava um hobby branco.

Anthony envolveu a cintura da mulher ao seu lado, a aproximou para falar algo em seu ouvido e beijar sua têmpora. Aquela aproximação parecia ter criado um bolo em minha garganta, não conseguia respirar corretamente, meu peito parecia entrar em chamas e meu corpo tomar uma resposta a ameaça.

Era repugnante, avassaladora e corrosiva aquela cena. Ele estava a tocando como eu desejava, enquanto ela aceitava o carinho em sua cintura e o rosto do homem próximo ao dela.

O quão próximos eles deveriam ser?

Até onde ele chegou?

Por que ela estava aceitando isso?

— Blake. — A voz baixa, porém firme, de Rosalie me tirou de meus pensamentos.

Ela não parecia surpresa com a minha presença, me observava de cano, entretanto o russo mostrou mínimos sinais de surpresa, estava focado demais em seu assunto para dar atenção ao seu entorno.

— Estou atrapalhando os recém-casados? — interroguei áspero com a mudança de postura de meu velho amigo.

— Creio que tenham muito o que conversar ainda — Kozlov declarou fitando a morena. — Seu presente estará no quarto. — Beijou sua testa e murmurou algo que não pude escutar. — Estarei no escritório.

Segurei o ímpeto de apertar meu punho e revirar os olhos, aquilo era apenas uma introdução sobre eles, e eu já não detinha poder nenhum sobre, não quando Aubry aceita demonstração de afeto de alguém.

Ridículo.

Kozlov lançou um último olhar para Rosalie, então tomou seu rumo. Entretanto, antes de sair da sala, cruzamos os olhares e batemos os ombros, era um alerta para ambos, um espaço pequeno demais para os dois e discussões demais para serem postas à mesa.

— Depois conversaremos — asseverei.

— Sim, conversaremos.

Deixei que saísse da sala, então segui em direção a sacada, contudo pude perceber movimentos pela casa, alguém me acompanhava em passos e olhares detalhados, decerto os seguranças ou empregados.

— Egorov e Gusev, parem de agir como cães de guarda sedentos por sangue. — Rosalie sequer precisou virar para repreender. — Podem ir para a sala de jogos ou seguirem com seus afazeres, mas nos deixem a sós.

— Vocês parecem um pouco tensos...

— Eu sei muito bem como lidar com Shadow.

A conversa seguia em russo, os seguranças certamente eram nativos russos pelo sotaque, no entanto a francesa não ficava para trás, o idioma soava forte e perfeito em suas palavras, sequer parecia deter a mesma voz ou ser a mesma pessoa.

— Não precisamos de plateia — completei os fitando por cima do ombro.

— Se precisar... — Rosalie finalmente se virou e os dispensou com um aceno e olhar.

Sem o efeito da dor e do sono, e com luminosidade, poderia enxergá-la melhor, não estava disfarçada, tão pouco parecia preocupada com sua apresentação, quem normalmente estaria com os lábios vermelhos, uma roupa social e saltos, optou por uma boca rosada, um hobby e pijama, e pés descalços.

Sua pele não estava tão alva quanto da última vez que nos vimos, decerto se obrigou a tomar dias de sol para que sua pele dourasse. Seu cabelo, antes preto e liso, estava castanho, ondulado e distante de sua cintura. Os olhos não detinham brilho, era como um breu completamente vazio, por tanto as únicas coisas conservada de sua identidade eram as tatuagens e os traços únicos.

Vil e sombria.

— Temos muito o que tratar, contudo pensei que desejava me manter longe de seus sentidos — zombou em um humor tão pernicioso quanto o meu. — O que o traz aqui, Blake?

Não estava em meus planos encontrá-la tão cedo, desejava não precisar ver seu rosto por muito tempo, todavia não conseguiria engolir a cena que o destino resolveu colocar em meu prato.

Era amarga e patética demais.

Rasgava minha garganta.

Existia muito o que desejava dizer, tanto quanto o desejo de envolver seu pescoço e amassá-lo até que não respire mais, contudo precisava de respostas para as perguntas que me perseguiram durante o sono.

— Parece um belo casamento. — Um olhar estreito me atingiu. — Conseguiram enganar a muitos.

— As palavras são amargas demais para você. Onde quer chegar?

— Gostaria de entender o que ele é para você. — O tom sórdido marcava meu interesse.. — Me pergunto se é parte do seu plano, um capricho ou...

— Sim, é parte de meu plano, uma peça muito valiosa

— Manipulação?

— Temos um longo e sinuoso passado.

— Se tratando dos últimos meses, duvido que seja verdade, imagino que esteja em sua teia de mentiras.

— Temos uma história e uma aliança com o mesmo objetivo, diferente de você e Lindsay. — contra atacou com desprezo. — Um relacionamento traiçoeiro. O que ela realmente é? Um brinquedo, um interesse ou realmente parte da missão?

— Ela foi a única forma de reverter a situação que você criou.

— Aquele cuidado e cumplicidade com sua pequena boneca de porcelana parece dizer o contrário, não acha? Tão empático e humilde que chega a ser patético para você, Blake.

— Tudo para muitas famílias não serem alvo da reação de seu jogo, para conseguir me mover dentro da ASSA e controlar a atenção de Oliver.

— Então deixou vidas e tempo nas mãos de alguém tão volátil? Espero que tenha controle sobre isso, porque é o seu trabalho e eu não arrumarei mais bagunça de ninguém.

Poderia ser seu sufocante narcisismo, como a última peça do tabuleiro, a única que poderia mudar o jogo inteiro, ou melhor a única capaz de um golpe certeiro. Ou poderia ser uma forma de conseguir informações sobre meu plano para Lindsay e os movimentos de sua inimiga.

De qualquer jeito, não era onde eu desejava tocar.

— E o que eu fui, Rosalie? Parte de seu jogo, uma simples manipulação. O que significou sua palavra sobre nosso acordo?

— O que está insinuando, Blake?

— Que realmente existe uma diferença entre minha relação com Lindsay e a sua com Anthony. — Seus olhos escuros me estudaram com acidez. — Valeu a pena quebrar nosso acordo?

— Eu quem deveria perguntar isso, Blake, estamos em patamares e encenações diferentes. Eu defronte ao público e você atrás das cortinas.

— Não tente jogos de culpa e palavras, com certeza não tirei proveito da situação como você, ou ele não te olharia daquela forma.

— Acredite no que quiser. Porque se quiser olhar por esse lado, não fui apenas eu que quebrei esse acordo, você se afundou com quem deseja me destruir.

— Você se casou com Kozlov. Não, não fiquei com Lindsay, sequer existe alguma ligação entre nós.

— Ah, que homem virtuoso você é, Shadow, uma pena que continua levando apenas o que é conveniente para si — replicou com seu irritante sarcasmo, minhas veias arderam mais.

— Conveniente?

— Imagina se existisse algo entre vocês, não é mesmo? Tamanha cumplicidade com quem pode dar seu pescoço a qualquer momento, quanta doçura estúpida — exasperou. — Claro que fui eu quem mimei o que era para ser apenas uma marionete, beijei longe dos holofotes e desenvolvi empatia em um acordo que sequer envolvia algo além de destruição e poder. — Riu alto. — Se quer me acusar, conheça ao menos e saiba que, com certeza, foi mais abaixo que eu, é tão sujo quanto por um acordo de merda.

— Ir mais abaixo que você Rosalie? Você tem noção do que fez? — Repliquei me aproximando mais, apenas um passo. — O que são algumas fodas perto de um casamento? Não acho que irá se importar com algumas fodas, já que o "acordo de merda" não vale.

A morena mordeu o lábio parecendo conter as palavras, quando na verdade desejava segurar o sorriso cínico que logo desenhou em seu rosto. Ao menos uma vez minhas palavras pareceram lhe afetar, talvez o fino véu de seu glorioso ego, o suficiente para se aproximar e destilar seu veneno.

— Por que não o fez antes se detinha tanto desejo? Não pouparia meu tempo por uma discussão falida ou meus atos. — Era evidente o ódio em seu olhar, pela primeira vez. — Agora pode ir atrás de quem desejar, se afogar em Lindsay ou qualquer outra. Espero que goste de seu próprio veneno e não venha mais me importunar.

Novamente caímos em um jogo, um desafio implícito entre ambos, onde apenas um poderia sair ganhando com o ego inflado e outro enlouquecido, uma questão de vaidade e poder.

Uma tentativa de retalhar um ao outro.

— Esqueça tudo o que leu naquela carta.

— Duvido que algo era verdadeiro.

— Considere que era apenas parte do nosso jogo.

Tiros saíam de nossos olhos, era um desejo mútuo de alvejar o outro, ou jogá-lo da sacada ao chão, contudo nenhum de nós moveu um músculo para isso, assim como não desviou o olhar.

— Tratamos sobre o que desejava, agora é a minha vez. — Retomou. — A última coisa que tenho a dizer, ou melhor, aconselhar que não faça nada precipitado contra Oliver — atinou como um aviso perverso. — Ou teremos um embate ao fim e vemos quem tirará o outro do caminho primeiro.

— Isso me parece impossível de evitar em qualquer situação nosso embate, Aubry, cuidado com suas escolhas.

Suas íris negras me fitaram de forma felina, não havia provocação, mas um aviso de que estava de acordo e que faria o que precisasse na altura do campeonato, assim como eu. Por fim concordou com a cabeça e seguiu para dentro do apartamento.

Uma verdadeira guerra fria se iniciaria, porém essa poderia não se limitar a provocações.

▙▚▚▚▚▚▚▚▚▚▚▚▚▚▚▚▚▜

Lua Mazzine

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