Elise e suas formas de amar

By ashistoriasdegss

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No final do século XIX, Elise e sua família se mudam de Lisboa para São Paulo, onde passam a serem donos de u... More

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Era uma vez

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By ashistoriasdegss

Brasil, São Paulo.

Março de 1887.

— Ela olhou para a aliança em seu dedo e se perguntou como faria para se livrar dela. A campainha tocou, lhe dando um susto. Era ele, aquele que ela queria que fosse o dono da aliança. Ao encontrar seus olhos, ela se lembrou que o amor, mutável, incontrolável e puro, sempre a surpreenderá. Ele deu um passo à sua frente e a puxou para si, ambos ansiavam por aquele momento, e apesar do absurdo daquela cena, ele aproximou os lábios dos dela...

— Ah, não! Que nojento! — Um garotinho protestou cruzando os braços em frente ao peito.

— Ele a beijou? Ah! O amor é lindo! — Uma menina suspirou.

— Lindo? É nojento! Não creio que a história irá acabar com um beijo asqueroso! E o Barão? Onde está? — Um menino loiro se levantou impaciente.

— Se deixarem-me continuar, tuas perguntas terão respostas. — Elise calmamente virou a página do livro, revelando a continuação da história diante de seus olhos azuis. — Antes que seus lábios se tocassem, um grande... pêssego! — Tomou um susto quando foi interrompida pela fruta, que caiu da árvore aterrissando diretamente no meio do livro, manchando a página que ela estava lendo.

As crianças riram da feição furiosa que se formou no rosto da garota. Teatralmente ela pegou o pêssego, e começou a falar com ele:

— Ora essa! Senhor pêssego, já lhe disseram ser muito inapropriado interromper quando alguém está a contar uma história? — Uma menina tirou-o de sua mão.

— Eu amo pêssegos! — Ela o mordeu fazendo com que Elise sorrisse ao ter uma ideia.

— Não! A senhorita nem pense em subir nesta árvore enquanto estou aqui. — Desaprovou a dama de companhia, Lúcia, fazendo uma coroa de flores brancas que destoava da pele escura de seus dedos.

Elise apenas a ignorou, tirou os sapatos e começou a escalar o pessegueiro tentando alcançar os frutos. Assim que os apanhava, ela os jogava para as crianças.

— Elise desce daí! Tua mãe não gostará disto! — Lúcia se levantou aflita. — Depois sou eu quem leva a culpa! Desça agora mesmo, isto não é o comportamento adequado de uma dama! — Torcendo as mãos em seu avental, ela olhava para cima preocupada, pensando se deveria ou não chamar a mãe de Elise.

Neste momento, uma carroça entrou pela portaria, e estacionou há cerca de dez metros do pessegueiro. O pai de Elise, que estava perto da entrada principal, se aproximou do recém-chegado.

— Elise! Seu pai está vindo! — Desesperada, Lúcia suplicou balançando as mãos ao vento, pedindo que a garota se aproximasse do chão. — Vamos, desça, por favor!

Ela finalmente cedeu, e quando encostou os pés descalços na grama, as crianças abraçarão suas pernas manchando seu vestido ao oferecerem os pêssegos.

Elise mordeu a fruta e levantou a cabeça para procurar por seu pai, esperando vê-lo em sua direção, mas o achou parado, há uma distância maior do que esperava, conversando com o visitante.

O senhor fez um sinal de "espere" e deu a volta na carroça. Em seguida, surgiu puxando alguns garotos que pareciam doentes, alguns até tinham ferimentos expostos, e todos estavam unidos por uma única corda de sisal, amarrada em suas mãos. Com rostos jovens, peles escuras, e corpos magros, eles se deixaram guiar pelo homem que puxava a corda.

Elise saiu da sombra da árvore e as crianças a seguiram alegremente. Os jovens a notaram, e desviaram o olhar baixando a cabeça, como se estivessem com medo, talvez vergonha.

Foi então que Elise teve outra brilhante ideia ao perceber que seu pai e o visitante conversavam sem prestar atenção nos garotos. Ela se abaixou e pediu para que as crianças, que estavam cheias de pêssegos em seus bolsos, fossem até os jovens e oferecessem as frutas. Todas saíram correndo sem hesitar, e Elise ficou feliz ao vê-los aceitarem e comerem. Eles pareciam famintos quando uma menina colocou um pêssego no bolso das calças de cada um deles.

De repente, a atenção de Elise foi tomada por um dos jovens que aproximou o pêssego da boca. Ele o mordeu fechando os olhos, envolvendo-o em seus lábios cheios, fazendo com que o suco escorresse por seu queixo, passando pela barba cerrada, e deslizando pelo pescoço do rapaz. Ele sorriu como se aquilo fosse divertido de se sentir, deixando uma feição de prazer tomar conta de seu rosto bem desenhado.

Neste momento, Elise paralisou, perdeu o ar, sentiu o coração bater mais forte, as mãos começarem a suar, a barriga ficou estranha e as bochechas coraram. Por um instante, ela ficou confusa com a mudança das estações e podia jurar ser verão novamente, já que o calor tomou conta de seu corpo. A jovem se virou de costas, subitamente ficando de frente com Lúcia, que ao ver sua expressão, ela estendeu os braços se aproximando rapidamente.

— Venha, senhorita Elise, vamos entrar! Depressa, venha! — Lado a lado, elas adentraram a casa principal e foram diretamente para o quarto de Elise.

— Nossa! Nossa! Nossa! — Elise passou à andar de um lado para o outro, no assoalho de madeira, quando Lúcia fechou a porta atrás de si.

— É melhor ficarmos aqui dentro até a cor de tuas bochechas voltarem ao normal.

— Está bem, eu ficarei aqui, mas preciso que desças e prestes atenção em tudo que está a se passar entre meu pai, aquele senhor e os garotos. — Elise a olhou determinada, e Lúcia negou com a cabeça.

— De modo algum deixarei a senhorita Elise para ir bisbilhotar a vida alheia. — Ela se distanciou da porta indo em direção a penteadeira.

— Lúcia! — Chamou Elise se aproximando e segurando as mãos dela. — Eu preciso que vá e fique de olho no que estás a se passar no jardim!

— Mas senhorita...-Lúcia a mirou com seus olhos negros e incertos sobre o que Elise a estava pedindo.

— Lúcia! Pelo amor de Deus, é uma ordem! — Suplicou Elise apertando as mãos dela.

— Pare de bobagens, senhorita! — Se desvencilhando bruscamente ela se voltou para os acessórios na penteadeira, enquanto Elise se deu por vencida e foi em direção a cama. Frustrada, ela se jogou de costas no colchão, fazendo com que uma das almofadas azuis caísse no chão.

— Oh! Céus, eu enlouqueci! Não consigo esquecer aquela cena... — Ela puxou um travesseiro para si, abraçando-o contra o peito. — Isto é tolice! Nem o conheço! E, além disso, como uma mordida em um pêssego pode causar paralisia em outra pessoa que não é aquela que o mordeu em primeira instância? Não sei, mas causou! Isso é verdade! Devo ter enlouquecido então! Deveras! Isto explicaria tudo! Contudo, se enlouqueci ficaria como a tia Maria... e isso não quero para mim, não! Claro que não! — Exclamou Elise subitamente ficando em pé e largando o travesseiro sobre a cama. — Acreditas que estou louca, Lúcia?

— Não, senhorita. Mas claro que, devo confessar, o rapaz tem uma beleza que pode causar paralisia às jovens ao seu redor. — A dama de companhia enrolou uma fita de cetim, e a guardou.

— Sei bem disso, Lúcia! Me conheces, eu jamais perco a postura por garoto algum, e mesmo assim, esse fez-me ficar com as bochechas vermelhas só por assistir ele comer aquele maldito pêssego! Como isso pode ser possível? — Perguntou Elise mais para si mesma do que para Lúcia, e voltou a se jogar na cama abraçando uma de suas almofadas. — Não sei! Mas eu queria ser aquele pêssego!

— Acho melhor a senhorita parar com estas bobagens, pois se continuar assim tuas bochechas jamais voltaram normal.

— Mas até que concordo com a minha confissão anterior... o pêssego deve ter se sentido incrível naqueles lábios...E aquele sorriso? Ah! — Suspirou ela se virando de barriga para baixo. — Eu preciso daquele sorriso para mim Lúcia...

— Está bem! Retiro o que eu disse, agora é loucura comprovada! — Lúcia soltou o espelho que estava em sua mão e virou-se para Elise. — Observarei o que está a se passar no jardim, suponho que se ficar aqui, sou eu quem irá enlouquecer. — Ela andou em direção a porta e logo em seguida desapareceu da visão de Elise.

Alguns minutos de angústia se passaram até que Lúcia adentrou o quarto novamente, fechando a porta atrás de si, fazendo com que a jovem que lá estava pulasse se sentando na cama.

— E então?

— O senhor, que aqui estava, veio oferecer mão de obra escrava para teu pai. Ele os vendeu, pois, eram seus desde que nasceram, netos dos escravos mais antigos de sua propriedade. Que no momento está em processo de falência! — Explicou Lúcia dando um passo em direção a Elise enquanto gesticulava com as mãos. — Teu pai comprou todos, mas como sabes ele é contra a escravidão, por isso ofereceu trabalho aqui no cafezal para os rapazes.

— E então? O que mais? — Elise se levantou da cama ansiosamente se aproximando da dama de companhia.

— Todos aceitaram a proposta, menos um. Teu pai estava prestes a assinar os papéis quando o visitante percebeu que alguns documentos estavam em falta, então ele e seu pai combinaram de assinar os contratos amanhã de manhã. — Concluiu Lúcia na esperança de que Elise fosse finalmente se acalmar.

— Qual? Qual, Lúcia? Qual não aceitou ficar e trabalhar aqui? — Agoniada ela encarou-a ansiando por respostas.

— Não sei o nome deles, Elise! Está a deixar-me aflita! — Lúcia se irritou e foi arrumar a cama. Elise voltou a andar de um lado para o outro em frente a porta de seu quarto.

— E se for ele, Lúcia? Logo o que me chamou atenção! Agora sou eu quem está aflita! — Lúcia a olhou confusa enquanto afofava um travesseiro.

— Ele quem? — Elise parou e se virou para ela irritada.

— O do sorriso! O que fez-me paralisar!

— Pare com isso! — Lúcia revirou os olhos continuando sua tarefa.

— Não estou a brincar, e se for ele quem não ficará aqui? Eu preciso saber...

— Bom, amanhã saberás, agora tudo que lhe resta é esperar e ocupar a tua cabeça com assuntos mais importantes, como, por exemplo, o teu casamento. — Lúcia organizou duas das almofadas sobre a cama.

— Verdade, preciso elaborar um plano para impedi-lo. — Elise se sentou no banco ao pé da cama sentindo-se frustrada.

— Bom, porque não podes apenas dar uma oportunidade ao rapaz?

— Porque nem o conheço, e meus pais já assinaram o contrato de casamento, sem ao menos perguntarem-me sobre. — Ela cruzou os braços.

— Se lhe perguntassem, dirias que não. Afinal, todos sabem que não queres se casar. — Lúcia alisou o edredom terminando de arrumar a cama.

— E quem, em sã consciência, gostaria de se encarcerar em um casamento, Lúcia? Ainda mais com um desconhecido? Escolhido pelos pais! — Elise virou a cabeça para olha-la sentindo-se incrédula.

— Já deverias ter te acostumado com esta ideia, afinal, com sua irmã não aconteceu o mesmo e já passastes da idade de se casar. Teve diversas oportunidades de escolher teu noivo, nos anos que se passaram, quando debutou em Portugal, mas apenas se concentrou em despistar todos os pretendentes com tuas peripécias. Agora, poderias apenas tentar dar uma oportunidade para este rapaz, afinal, teus pais não escolheriam qualquer um. — Lúcia se aproximou dela.

— Não me importo! A única coisa de que quero saber neste momento é quem é aquele garoto, e por aquele pêssego é mais sortudo do que eu!

— Está bem. Só tens que tomar cuidado para não se apaixonar. — Provocou, Lúcia, pois sabia que isto era tudo que Elise menos queria. — Basta de tolices por hoje! Vás para a casa de banho se banhar, que pegarei um vestido limpo, este está todo sujo! — Lúcia puxou Elise pelo braço levantando-a.

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Eu deixei esse livro disponível aqui completo de forma gratuita por mais de um ano, primeiro porque antes escrever era só um hobbie pra mim, segundo porque eu queria testar o meu trabalho, ver se as pessoas gostariam de ler as minhas histórias, para a minha surpresa gostaram! Então, como uma escritora profissional, eu não posso mais desvalorizar o meu trabalho a ponto de deixá-lo de graça! Eu sei que você me entende, e que vai querer ler pra saber quem é esse tal "ELE" afinal... Ah, e eu tenho novidades! Já saiu a continuação, o segundo livro da série.

 O link dos livros está no link deste capítulo e no link da minha bio, nele você também encontra as minhas redes sociais e pode vir me encher de mensagem surtando! Eu amo! 

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