Os últimos dias têm sido um borrão com todos os preparativos para a conferência.
A Freya põe meus dons artísticos em ação, pintando placas e banners.
(É bom me sentir útil enquanto faço uma coisa que gosto.)
Shelia: Achei mesmo que era aqui que você ia estar.
Shelia espia pela porta, e eu quase pulo de susto.
(O que ele está fazendo aqui?!)
(Eu nunca o vi em nenhum outro lugar a não ser na praia.)
Aurora: Bom dia, Shelia.
Como está a sua bochecha?
Shelia: Bem.
Depois de um minuto de silêncio, eu me dou conta que a responsabilidade de falar é minha.
Aurora: Então... O que você está fazendo aqui?
Shelia: Eu fiquei curioso com relação ao que pode acontecer hoje na conferência.
Aurora: Entendi... Mas o que você está fazendo aqui na casa da Freya?
Shelia: Eu fiquei com essa... sensação incômodada.
Ele parece irritado.
Então ele baixa o tom de voz enquanto continua.
Shelia: Sobre você.
Eu sei que você está tentando ir pra casa.
Depois da forma como você me ajudou naquele dia...
Eu quis me certificar que você está bem.
(Ele estava mesmo preocupado comigo?!)
Aurora: Obrigada pela sua preocupação. É muito gentil da sua parte.
Apesar de tudo, eu estou bem.
Shelia: Sim, estou vendo.
Ele para, e faz-se um silêncio constrangedor entre nós enquanto procuramos alguma coisa para dizer.
Shelia: Foi só uma sensação estúpida. Eu não devia ter vindo.
Ele se vira para ir embora, mas eu não posso deixá-lo ir pensando que sua preocupação é estúpida.
Aurora: Você não precisa ir.
Por favor, fique.
Shelia para imediatamente mas continua de costas pra mim.
(Eu queria poder ver o rosto dele, saber o que ele está pensando...)
Shelia: Eu não estou acostumado com isso, sabe?
Aurora: Com o quê?
Shelia: Me preocupar com alguém.
A voz dele é estável e fria como sempre, mas eu sinto uma pontada de confusão.
Shelia: É desconfortável.
Não tem lógica nem racionalidade nisso.
Ele muda o peso do corpo de um pé para o outro e olha pra mim.
(Coitado. Ele tem passado por tanta coisa...)
Aurora: Eu te entendo, Shelia.
Aurora: Quando você se importa com alguém, quando você se preocupa com a pessoa.
Não é uma sensação agradável, e nem sempre faz sentido.
Finalmente Shelia se vira para me olhar.
(Ele fica receptivo quando eu expresso que entendo como ele se sente.)
Shelia:Eu não consegui deixar pra lá, mesmo sabendo que você provavelmente estaria bem.
Eu tinha que ver com os meus próprios olhos.
(Acho que ninguém nunca se preocupou em fazer isso antes.)
Aurora: Foi muito gentil da sua parte.
Eu sinto muito por não terem te mostrado tanta bondade na sua vida.
Aurora: Mas você vir até aqui ver como eu estou mostra o quão bom você é apesar da forma como você foi criado.
Obrigada.
Shelia olha pra mim com as sobrancelhas erguidas.
Aurora: Eu disse alguma coisa de errado?
Shelia: Eu... Eu.
É que eu não estou acostumado a uma mulher me agradecendo.
Nem demonstrando compaixão.
Aurora: É estranho, não é?
De onde eu venho, as mulheres frequentemente são consideradas mais compassivas que os homens.
Shelia: Sério?
Isso sim é estranho.
Aurora: Isso só mostra que todo mundo tem a habilidade de demonstrar compaixão, você não acha?
Shelia acena lentamente com a cabeça, mordendo o lábio inferior.
Aurora: Você gostaria de se sentar?
Shelia: Não, eu estou bem.
Aurora: Posso te oferecer alguma coisa para beber?
Shelia: Não se incomode.
(Me pergunto se essas pequenas gentilezas também são estranhas pra ele...)
Aurora: Não seria incômodo nenhum pegar alguma coisa pra você beber.
Só porque as Undine te tratam mal não significa que eu vou tratar também.
Minhas palavras pairam no ar e Shelia fica inquieto enquanto evita meus olhos.
Shelia: Você vai comparecer à conferência?
Aurora: Precisei convencer o Fan, mas a Freya me ajudou, então eu posso me sentar e assistir.
Aurora: E você?
Shelia: Não, eu sou proibido de ir.
Shelia: Eu só posso ficar por aqui e ver como as coisas se desdobram.
Aurora: Eu nunca fui a nada como isso antes.
Shelia: Pelo que eu entendi, é só um monte de falação.
Aurora: Eu também fiquei curiosa sobre os Gnomos depois daquele dia.
Shelia: Os Gnomos?
Aurora: Ah, é mesmo!
Quando eu encontrei o Oráculo, os Gno-
Shelia: Você encontrou o Oráculo?!
Aurora: Encontrei, mas logo depois que ele apareceu, nós fomos atacados.
O Oráculo parecia pensar que foram os Gnomos.
Ele teme que eles estejam planejando uma revolta.
Shelia: O desfecho lógico para a discriminação é a retaliação.
Aurora: Eu não sei como alguém pensou que esse sistema de classificação resultaria em qualquer coisa além disso...
Shelia: Você concorda comigo?!
Aurora: Totalmente! As pessoas só aguentam por um tempo serem tratadas como os Gnomos são tratados.
Shelia me dá um sorriso largo-a primeira vez que eu o vejo sorrir.
(Ele é bem bonito quando não está com a cara fechada...)
Shelia: Me conta sobre o Oráculo.
Por favor.
Aurora: Claro. Enquanto eu falo, você pode me ajudar a esticar isso?
Shelia me ajuda com o último banner enquanto eu conto sobre o encontro com Lolo.
Ele ainda não é a pessoa mais acessível de todas, mas eu posso ver que ele está se esforçando para ser mais sociável.
(Talvez isso seja o começo de alguma coisa pro Shelia...)
(Talvez para nós dois.)
━━━━━━━━━━// ━━━━━━━━━━━
Por mais empolgantes que os primeiros momentos da conferência sejam, fica entendiante conforme as horas se arrastam.
Freya: O que você achou?
Aurora: Achei divertido, porém decoração não é meu forte.
Freya: Preparar a conferência é mais divertido do que a reunião propriamente dita.
Aurora: Concordo. E eu acho que o Oráculo está errado a respeito dos Gnomos.
O líder deles, Kidan, pareceu sensato o suficiente, e sorriu com frequência.
Freya: Pelo bem de nós todos, eu espero que o Oráculo esteja errado.
Shh-olha quem está vindo na nossa direção.
Kidan vem apressado em nossa direção.
Kidan: Com licença. Eu notei você na conferência.
A qual clã você pertence?
Aurora: Eu?
Ele sorri e acena com a cabeça.
Aurora: Oh! Bem, eu não faço parte de nenhum clã. Eu sou humana.
Kidan: Humana?! Aqui em Paracelsa?!
Freya: Ela está tão surpresa quanto o resto de nós por ter chegado aqui.
Kidan: Isso é muito empolgante!
Os olhos de Kidan dançam de satisfação e ele solta uma gargalhada como a de uma criança.