A rainha está morta - Atarah

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– Tão complicado quanto era seu pai? – Dei um meio sorriso.

– Sim. – Disse ela sorrindo com os dentes tortos.

– Se a mamãe souber que você está nesta sala. E que você estava tocando o piano acho que ela será capaz de botar as duas de castigo. – Disse Lyan da porta. – Agora vamos. As duas. O café está na mesa.

Seu tom foi frio e ele não ficou para nos esperar, no corredor Meira me pediu para chamá-la apenas de Mei, já que detestava o próprio nome. Apenas concordei, o que a deixou feliz. No caminho para a sala de jantar ela me contou sobre como sempre sonhou em ter uma irmã e em como todas as antigas noivas de Lyan era absurdamente chatas. Não sei dizer se só estava me falando aquilo para me deixar feliz ou porque era realmente a verdade.

O café foi bom, sou uma mentirosa esplêndida. Inventei toda uma vida passada para mim, e mal teve furos. Acho que conquistei o coração da senhora Hollis com o papo do sonho de ser mãe. Mesmo que isso jamais tenha sido um sonho para mim, mas sim uma obrigação com o meu país, para proteger a linhagem da minha família. Um filho sempre foi para mim algo muito mais político do que um real desejo.

E após eu ter entregue o dinheiro para a mãe de Lyan na noite anterior não havia volta, eu me casaria com seu filho. Durante todo o café percebi que a real vontade dele era de dar com a cabeça na parede, mas não o julgo, esse tipo de assunto é um saco.

– Então, estava pensando em ir ao centro da cidade, vi que possui uma costureira, e realmente preciso de vestidos novos. Gostaria de saber se poderia levar Mei comigo.

Isso fez a menina se animar, um ar contagiante de felicidade a cercava, e como estava ao meu lado acabou me contagiando também, mas a sua mãe que estava do outro lado da mesa não. Ela era fria e bem grossa.

– Mei precisa se tornar uma mulher de respeito, e pelo seu comportamento nos últimos anos não a considero merecedora de qualquer aparição pública. Não quero que ela estrague a imagem da minha família.

Que família? Pensei.

– Eu como antiga dama de uma rainha posso lhe assegurar que nada do que ela faz é anormal, mas se te incomoda tanto os modos de sua filha, por que não a educa? Professores nem sempre são as melhores opções para esse tipo de coisa.

Acho que a ofendi. Por mim Mei é completamente normal. E eu nunca me dei realmente bem com meus professores, minha mãe me deu todas as aulas de etiqueta.

– Eu não tenho tempo para isso, mas você terá. Se era dama de uma rainha conseguirá educá-la. Acho que será um bom teste para ver se será uma boa mãe para os meus netos.

Matar a mãe do meu noivo não é uma boa ideia, mas mentalmente já a torturei e matei de tantas formas diferentes... Uma mais criativa que a outra, mas com um sorriso no rosto a respondi.

– Será um prazer. Então levarei Mei comigo, ela irá se comportar. Tenho certeza.

– Meu filho vai com você. Já que não anda fazendo nada de útil. – Ela o olhou com certo desdém. – Deve se vestir para agradá-lo. E acho que será um ótimo jeito de vocês começarem a se conhecer melhor.

Nunca me vesti para agradar ninguém, para mim roupas sempre foram uma das formas mais poderosas de demonstração de poder e de declaração de algo que existe. Eu sou o branco, essa cor me pertence, e não vou mudá-la. Pois Adenna é o preto. Opostos. Sempre. A rainha branca e a preta. Peças em um tabuleiro.

Fomos de carruagem até a costureira, a cidade não é nenhuma vila de cem moradores, é uma cidade, uma cidade esquecida, mas grande o suficiente para eu saber que existia. Para eu ter tido que estudar sobre.

O alfaiate era bem maior e bonita do que achava que seria. Por dentro era luxuosa, para algo que estava ali. E havia muitos, mas muitos tecidos de diversas cores e texturas, mas havia só duas funcionárias. Uma era jovem, reconheci ela, estava tentando ter meu noivo. E a outra provavelmente era sua mãe. Ambas bonitas, mas não eram tudo isso.

– Viemos ver alguns vestidos. Para Virginia. – Começou Lyan.

– E para a Mei. – Completei.

Ele revirou os olhos, as mulheres não pareceram gostar de mim, e nem de Mei, já que ela saiu olhando e tocando nos tecidos. Foi direto nos roxos, o engraçado é que o vestido que ela usa hoje e que usou ontem eram ambos cinzas e sem graça.

Fui direto para os tecidos brancos, mas assim que pedi para olhar mais de perto. Lyan apareceu mandando a mulher não pegá-lo. Virei-me para ele irritada, ninguém diz não para uma rainha... Mas para Virginia Isleen dizem. Respirei fundo e esperei uma explicação.

– Você fica péssima de branco, parece um fantasma.

Meu queixo caiu quando com a sua sinceridade, ou pela sua falta de filtro e bom senso. Cruzei os braços e respirei fundo para não matá-lo. O que esse garoto do mato, de uma cidadezinha de nada acha que sabe sobre moda? Sobre o que fica bom ou não em mim?

– Por quê?

– Você é branca de mais, seu cabelo, sua pele, seus olhos são claros... Precisa parecer viva. – Assim que ele se virou apontou para um tecido azul claro que estava no alto de uma enorme pilha. – Quero ver aquele. E todos os tecidos azuis e vermelhos que tiver... – Então meu noivo voltou o olhar para mim e me analisou dos pés a cabeça. – Roxo e dourado também.

Revirei os olhos e isso o fez esboçar um sorriso. Olhei um por um, mas nenhuma daquelas cores me agradava, então Mei escolheu por mim. Então tiraram minhas medidas e as da menina, escolhemos em um caderno os desenhos dos modelos que queríamos. Levaria três dias no mínimo para cada vestido.

Deixei também um bilhete para as mulheres e dinheiro, sei que é uma ideia péssima, mas sempre se deve ter um plano “B”. E... Era tarde de mais para eu correr atrás e pegar o papel e o dinheiro.

Quando voltamos para casa percebi como compramos vestidos, já que Lyan me entregou a nota com o valor anotado de tudo. Era o valor que eu havia dado... Um pouco mais, mas eram muitos vestidos.

Mas seriam para mim, dois vestidos azuis claros, um escuro, um vermelho, outro lilás, um dourado, dois roxos, um rosa claro e um creme. Mei comprou dois, dos mesmos modelos que os meus, um roxo e outro azul claro. Achei que seriam os menos pesados, nenhum era muito esvoaçante, não como os que eu estava acostumada a usar.

Passei o resto do dia com Mei, gostei dela, mais do que gostei de Lyan, mas não acho que sou incapaz de amá-lo, se eu me esforçar, me esforçar muito, acho que posso gostar dele, acho que podemos ser felizes e quem sabe um dia eu descubra que o amo.

Assim que anoiteceu a menina foi dormir, mas não era tarde, não muito, havia ficado em seu quarto até ela pegar no sono, só que assim que fui sair escutei uma discussão no primeiro andar.

– Ela é poderosa de mais para nós. – Disse a senhora.

– Mãe. Virginia é igual a todas as outras garotas. Nem sabemos qual é sua área. – Respondeu Lyan.

– Uma mulher mais fraca seria menos difícil.

– Colocamos pó de pedra de Dhara em nossa comida mesmo, que diferença faz? Ela já se casará comigo de qualquer forma... Temos que contar para Virginia mais cedo ou mais tarde.

Apenas agora reparei que não sei que área da magia a família Hollis segue. São oito áreas que existem. Ilusão, conjuração, invocação, abjuração, necromancia, adivinhação, encantamento e transfiguração. As quatro partes de um círculo dividido em criação, espectral, alteração e fortificação.

Será que achariam que eu fugiria? Se estavam preocupados com o meu poder, que está quase completamente camuflado, pense caso saibam que eu tenho a força de uma deusa... Que sou uma deusa. Acho que meu noivado acaba na hora. E não é isso que eu quero. Atarah está morta, e essa é agora a minha nova vida, e não botarei tudo a perder.

Ainda não.

A queda das rainhas do norte (Em processo de reescrita) Where stories live. Discover now