Capítulo Único

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Antony sentia a câmera fotográfica pendurada em seu pescoço balançar a cada passo que dava naquela iluminada galeria de arte. Andava devagar enquanto prestava atenção no podcast que soava de seus fones de ouvido e nas belíssimas fotografias expostas nas paredes da galeria: cada uma mostrava um momento diferente do dia a dia e conseguia extrair beleza e graça do simples fato de ali estarem seres humanos.

As fotos tocavam o coração de Antony e ele desejava profundamente poder estar em uma delas. Elas traziam magia e movimento, mesmo capturando apenas um milésimo de segundo dentre tantos outros de uma vida. Um instante mais tarde e a foto já não seria a mesma, o momento já teria passado, no entanto, quando o botão era apertado e a fotografia tirada, aquele instante estava imortalizado para sempre.

Parecia quase irônico desejar tanto algo tão simples quanto aparecer em uma fotografia quando questão tão mais importantes eram debatidas no mundo humano sobre a raça de Antony. No podcast que ouvia, a apresentadora estava justamente tratando desses assuntos enquanto Antony estava bobamente observando uma foto:

São temas que não podem virar tabus, não acham? Para discutirmos um pouco mais sobre o assunto, tenho a honra de ter comigo hoje o professor George Days, especialista no direito vampírico e diretor da ONG Acolher e Amar. — Dizia a apresentadora do podcast que Antony ouvia quase todas as manhãs. — Professor, esse mês comemoramos 15 anos desde que a Lei de Proteção aos Vampiros foi aprovada. Depois de tanto tempo, por que o senhor acha que existe ainda tanta desigualdade entre vampiros e humanos?

Antony parou diante de uma das fotografias exposta que achava mais bela. Era uma foto em preto e branco que mostrava uma menininha se olhando no espelho enquanto sorria para o reflexo da fotografa, que tinha o rosto escondido pela câmera. A menininha estava vestida de princesa e era evidente que se sentia como uma naquele instante.

A desigualdade social entre humanos e vampiros não é atual, ela é resultado de um contexto histórico de séculos de guerras que quase levaram os vampiros à extinção. Não é fácil mudar a visão dos humanos sobre nós depois de tanto tempo e isso gera uma série de dificuldades para nós, vampiros. — O professor George Days respondia pelos fones de ouvido de Antony. — Podemos passar despercebidos entre os humanos, mas, no momento em que mostramos quem somos, a exclusão começa. Quando me mostrei pela primeira vez no ambiente de trabalho, fui demitido com desculpas esfarrapadas. Vampiros e humanos são iguais perante a lei, mas ainda existem muitos tetos de vidro dos quais não conseguimos transpor e...

A atenção de Antony foi completamente deturpada quando teve seu corpo recoberto pela luz do flash de uma câmera fotográfica e então ouviu o familiar som de quando a foto é tirada. Virou-se bruscamente, arrancando os fones de ouvido, e então arregalou os olhos com a pessoa que viu diante de si.

— Vi você aqui ontem. — A garota disse, sorrindo abertamente enquanto segurava a câmera fotográfica entre as mãos. — Você tirou uma foto minha quando pensou que eu não estava vendo, não foi? Agora estamos quites!

Antony abriu e fechou a boca sem conseguir dizer qualquer coisa. Era verdade, no entanto, estivera ali no dia anterior e, enquanto vagava pela exposição, seus olhos recaíram sobre aquela garota. Ela estava parada perto da janela e seu cabelo curto pintado de rosa brilhava intensamente com a luz do sol; estava vestida com uma saia longa e floral que dançava graciosamente graças ao vento que entrava pela janela aberta.

Fora uma cena tão bela que Antony não resistira e tirara uma foto. Não costumava fazer aquele tipo de coisa e sempre perguntava às pessoas se elas permitiam serem capturadas em foto, mas não teve coragem no dia anterior. Não poderia ter o azar de perder aquele momento, aqueles instantes preciosos.

"I saw you"Onde as histórias ganham vida. Descobre agora