Só que a minha distração não durou muito e foi entrarmos na ala oeste que minha mãe murchou. Com cada passo o seu silêncio aumentava e eu me preparava mentalmente para o que estava prestes a vir.
Quando entramos no meu quarto, ela sentou na minha cama e olhou as minhas paredes cheias de desenhos e quadros. Tinha mantido tudo do mesmo jeito desde a última vez que eu estive lá, três anos antes.
— E, além de tudo, seu irmão está indo muito bem na faculdade aqui da cidade...
— Aposto que papai está bem orgulhoso. — comentei, levantando o canto da boca. Minha mãe também tinha orgulho, mas era diferente. Dona Monique pouco se importava para a faculdade, o que se importava era com os filhos. Comigo, principalmente.
— Ele está, o seu irmão está até começando a trabalhar na empresa, como você fazia.
Suspirei.
Ao me sentar do seu lado, tirei minhas botas e dobrei as pernas no colchão. Ela fez o mesmo, pegando minhas mãos para a conversa.
— Você podia voltar, não é mesmo? Ficar aqui na cidade? Era tão bom quando você estava aqui.
Não respondi, apenas acariciei suas mãos. Ela já estava começando a ter rugas, o cabelo estava todo grisalho e as manchas de sol adornavam o seu pescoço. Não a culpava por me querer ali, muito menos ignorava a sua saudade e a necessidade da companhia. Só não servia para o ramo da fazenda. Minha vocação era desenhar, criar publicidades, divulgar eventos diversos... não as burocracias que meu pai queria e meu irmão quase sempre errava.
Minha mãe sabia disso também, mas para ela a esperança era a última que morria.
— Mas você vai me ter aqui por 21 dias, é quase um mês! — exclamei, tentando fazer com que ela tirasse a tristeza do seu rosto. — Vamos aproveitar, que tal? Quando estiver no fim a gente vê isso.
Ela sorriu e era tudo o que eu precisava.
Dando um beijo na sua testa, me levantei e comecei a tirar minhas roupas da mala. A quantidade de camisetas de botão faziam minha mãe revirar os olhos a cada instante. Os tênis e as botas de couro falso fizeram ela dar uma meia cara de aprovação.
Eram roupas largas e confortáveis para usar ao longo da minha estadia, mas eram diferentes e — como ela descreveu — eram "da capital".
Com cada comentário, no final, eu agradecia por ter voltado a fazenda. São Paulo era grande demais e depois de três anos em função da faculdade e de amigos e festas, a tranquilidade do interior era bem-vinda, mesmo que de pequena a fazenda não tivesse nada.
Antes de ser o que era e termos a mansão, meu pai começou com 20 pés de laranja, crescendo até o que viria a ser 600 hectares de fazenda com árvores de laranja e dono de outras fazendas de soja. Eu, com meus 25 anos, acompanhei toda a transição da nossa família. Do casebre em Minas até ali, em apenas 20 anos.
O que não mudava era a minha mãe e a sua felicidade, o seu sotaque de quem não pertencia àquele lugar e os olhos amendoados que ninguém mais tinha.
— Vamos almoçar? — perguntei, enquanto dobrava a última camiseta e minha ela estava pensativa, olhando pela varanda as laranjas que dominavam quilômetros adiante.
— Ah! Sim, vamos. — levantou os braços e deixou com que caíssem nas suas coxas. — Tenho até novidades minhas pra contar.
Minhas sobrancelhas se juntaram com a facilidade que ela teve de comentar aquilo, mas segui com nossos braços entrelaçados até o primeiro andar e depois até a cozinha.
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ČTEŠ
Garotas, o Sol, e as coisas lindas do universo
RomanceCecília Lages não tinha visitado sua família há três anos, porém, cansada da capital e tentando escapar das festas e loucuras, decide volta para o interior de São Paulo e para a fazenda de laranjas da família durante as férias. Lá, as coisas estão d...
1. De volta à fazenda
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