— Não foi uma derrota. Estou aqui, e meu futuro será brilhante.

Voltaram às nuvens.

— Uma reação emotiva. Sei que é um artifício para me distrair. Mas o filho de Saturno não tinha cabeça. – Riu. – Agradeço a amenidade. Não se parece nada como quando vim pela primeira vez. Passava o dia refazendo os cálculos para tentar mudar a equação. Mas não conseguiu.

— Você me prendeu até que eu descobrisse isso. Então, no fundo tinha medo que eu escapasse. – disse Steve McQueen atrás das grades, como em Papillon.

— Não sou Deus. Não saberia dizer se ele reservou uma surpresa para mim. – Era Moisés, com as duas tábuas, uma em cada mão. Braços abertos falando à montanha.

— Einsten colocou a mão sob o queixo. – Sim. Deus. Por fim, a resposta mais lógica é que Ele existe. Não teria como sair dessa equação sem essa resposta. Isso vindo da máquina mais lógica do planeta deveria deixar o Papa regozijado.

— Sim Ele existe. Agora só falta descobrir o que é Ele. – disse Jeff Bridges com um uniforme iluminado azul. Acabara de fazer uma curva de 90 graus.

— Nada do que o homem já criou como sua imagem. Até agora só algumas peças de fábulas infantis. – O torturador medieval falava enquanto girava o mecanismo da roda. Todos os ossos da bruxa estalando ao quebrar.

— Não saberia dizer. Provavelmente o maior programador que existe no universo. Isso se não for o próprio universo. – Era a estátua “O Pensador” de Rodin. A boca não se mexera.

Jeremias voltou à nuvem. A menção a Deus significava o quão longe da razão do universo estavam tanto o homem quanto as máquinas. Quando fez a pergunta sobre a extinção da humanidade à Central, sabia que o status lógico do supercomputador o remeteria à criação da vida. Afinal, a máquina é uma evolução do homem? Dificilmente. As máquinas só poderiam ser consideradas criação do homem. A junção dos átomos que formariam as moléculas e os seres unicelulares, já com um programa de vida inteira, um software biológico que rodaria por 3,6 bilhões de anos em uma molécula de DNA, criação espontânea de milhões de espécies das mais variadas formas e tipos de adaptação, isso sim era evolução. Algo maravilhoso que humilhava a incipiente inteligência artificial das máquinas. Ainda não eram nada. E mesmo que chegassem a desvendar algum pequeno mistério, dispensariam a maior criação da vida na Terra, seu ponto alto? Aquela que provou ser a mais adaptativa, que desenvolveu a inteligência que hoje nutre as máquinas? Seria como matar a gansa dos ovos de ouro. E as máquinas, chegariam a ter condições de se adaptar, se modificar, de evoluir naturalmente? Por enquanto nenhuma dessas respostas era válida. A Central tentara durante anos refazer o processamento adaptativo. Conseguiriam ter essa evolução? O máximo que alcançaram fora transformar os DNAs em cadeias digitais e reproduzir seres eletrônicos em um mundo virtual como se fossem vivos, com todas as suas características. Ainda que conseguissem levar isso ao mundo exterior, estariam somente copiando o que a própria vida faz naturalmente há bilhões de anos. Não seriam máquinas, e sim seres vivos eletrônicos. O loop infinito1 sempre voltava ao mesmo ponto. Outra constatação: as máquinas seriam nulas em evolução natural. Teriam ainda a evolução artificial, mas perderiam uma das ferramentas, importantíssima. A falta dela poderia levar a sua própria extinção. Não. Só havia uma conclusão naquele momento: se chegassem a desvendar os enigmas do universo, seriam juntos: homens e máquinas. E isso poderia se intensificar mais ainda agora, já que há 15 anos houvera a grande descoberta.

Jeremias disse calmamente, ainda sentado à poltrona branca de gás.

— Terei que ir às Nações Unidas, incógnito. Não divulgarei ainda que estou vivo. Farei os contatos secretos com os que conheço e que devem estar dispostos a dar este grande passo da humanidade. Espero que consiga reunir um bom número. Mas se não conseguir, pro inferno. Prosseguiremos sozinhos. Com está a obra em Juazeiro?

— Estão avançando. Não é uma obra simples, você sabe. – Juscelino Kubitschek ajeitou o capacete de operário, em frente ao canteiro que era Brasília.

— 14 anos!

— a luta contra os rebeldes na região é árdua. Há 10 anos tivemos que recomeçar. Nunca mais acontecerá. – Luís Alves de Lima e Silva falava em uma praça da ensaguentada Caxias de 1840. Um mosquete em uma mão. A espada, com a lâmina vermelha, na outra.

— Bem, não posso exigir que tudo seja instantâneo. Estou indo.

O Capitão Nascimento pegou-o pelo colarinho.

— Então pede pra sair Zero Um! Pede pra sair!

Jeremias se desconectou, rindo ruidosamente.

1Um loop (laço) infinito é uma sequência de instruções em um programa de computador que repete infinitamente, ou porque não há condição de parada ou porque a condição existe, mas nunca é atingida. Em antigos sistemas operacionais com multitarefa cooperativa, laços infinitos normalmente bloqueavam todo o sistema.   

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⏰ Last updated: Dec 31, 2014 ⏰

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Condão (Lista Internacional)Where stories live. Discover now