Aviso e 1. Impasse

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Ele, fracote que era, não tomava iniciativa; ela, apenas não achava que devesse arriscar o único amigo que tinha em uma tentativa que podia ser frustrada.

Acho que ela aceitaria qualquer outra opção que lhe aparecesse, mas sua tentativa de permanecer invisível a todas as pessoas do campus era completamente bem sucedida.

Talvez eu fosse a única exceção, embora estivesse ignorando-a publicamente em boa parte do tempo.

- Bom, então acho que nos vemos em fevereiro - ele disse.

Em uma das raras vezes que ele se atrevia a ter algum contato físico com ela, deu-lhe um tapinha nas costas e um beijinho na bochecha. O clima desconfortável se instalou entre os dois porque ele sabia - todo mundo que tivesse algum conhecimento sobre Ludmila sabia - que ela teria três meses tediosos, implorando por algum evento social na cidade, que normalmente ficava vazia porque os estudantes retornavam todos para a casa de seus pais.

Algumas vezes, ela dava sorte; outras, apenas ficava em casa com a cara enfiada em livros e mais livros ou com o nariz inchado de tanto chorar vendo filmes românticos bregas.

Se esse fosse um cara esperto, podia abdicar umas férias para ficar com ela e tenho certeza que ele conseguiria o que queria sem muito esforço, mas - e eu ficava muito contente com isso - ele nunca pensou nisso, então o clima de despedidas era sempre desconfortável porque ambos sabiam que ela estava sendo abandonada para mais meses de tortura e reclusão.

- Eu vou tentar voltar antes e te ligo todos os dias! - Ele prometeu.

E essa história de ligar era mentira porque, como já relatei, ele era burro. Nem para se esforçar em mostrar interesse, ele conseguia. Ligava nos primeiros dias, trocava mensagem por, as vezes, duas semanas. Aí parecia encontrar algo mais interessante para fazer. Talvez tivesse mais desenvoltura com garotas desconhecidas ou tivesse alguma prima que ele pegava nas férias, mas esquecia-se de Ludmila com facilidade.

Ela sabia disso, então apenas lhe sorriu de forma triste, querendo acreditar, mas já não conseguindo. Léo não ligaria, não mandaria mensagens e retornaria em cima da hora para as aulas do próximo período. Talvez, se ela estivesse com azar, só retornasse depois do carnaval. Por isso, ela revirou os olhos para ele e, sem jeito, passou os braços ao redor de si mesma, um abraço que eu tinha certeza que ela gostaria de ter dado nele, mas havia alguma aversão a contatos físicos por ali, em algum lugar entre os dois.

- Tudo bem - ela disse, ao invés de gritar e acusá-lo de negligência, como ela provavelmente faria comigo.

Bom, toda essa solidão era por conta do pai dela, claro. Se ele não fosse um babaca ausente - e ela estava rodeada desse tipo -, ela não precisaria passar por esse tipo de coisa. Na época, eu não sabia porque ela escondia a informação, também se ocultando, mas o pai dela era um grandão em Brasília, um ministro importante. Ele apenas casara de novo em algum momento durante o seu primeiro e segundo período e dissera para ela que a nova esposa não queria ter contato com ela e que ela podia ficar onde ela quisesse.

Ludmila tinha todo o dinheiro que precisasse, mas era só. Podia viajar, é claro, para qualquer outro lugar, mas eu acreditava que ela devia achar isso um pouco chato de se fazer sozinha e nunca convidava Léo porque ele sempre tinha seus próprios planos.

Então ela se mantinha trancada no seu quarto na torre, esperando ser resgatada, como uma romântica.

Como já disse, era patético.

- Vou dar uma passada na xerox pra pegar uns papéis e me vou. - ele disse - Se você quiser me levar na rodoviária mais tarde, vou agradecer, tá?

Jogando os Dados com o Prazer [Indisponível]Where stories live. Discover now