Capítulo 6: Filosofar é coisa de criança?!

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SÓCRATES: - Por Hermes, uma bela pergunta! Vejo que pela firmeza em suas palavras, você parece um sábio não só para o governo como também para grande parte da plateia que te assiste!

OTÁREO: - Sim, porque penso por mim mesmo!

SÓCRATES: - Fantástico! Algo raro na Grécia Antiga. Se permitir aprender com seu vasto conhecimento, diga-me: O que diferencia uma criança de um adulto?

OTÁREO: - O olhar de mundo! A criança não tem uma capacidade de interpretar a realidade como ela é. Por isso fantasia as coisas, cria falsas aparências, o que a impossibilita de filosofar!

SÓCRATES: - Trouxestes uma importante definição sobre o ato de filosofar: Interpretar a realidade em sua essência!

OTÁREO: - Exato! Filosofar não é mergulhar nos livros que só repetem ideias de autores, mas enxergar e refletir sobre o próprio cotidiano. Aquele pessoalzinho franco-uspiano só sabe fazer o primeiro, por isso não filosofam!

SÓCRATES: - Fantástico! Você acrescenta que o método de filosofar reside, em partes, na imersão da cotidianidade.

OTÁREO: - Correto.

SÓCRATES: - Porém, a qual cotidiano podemos nos referir? Aquele em que vivemos a todo o momento, sem refletir sobre ele ou uma forma combinada de cotidiano com o seu estranhamento, produzida por um reflexivo distanciamento?

OTÁREO: - O segundo, sem dúvidas!

SÓCRATES: - Bela resposta! Filosofar trata-se de realizar um deslocamento de percepção, de modo que possamos dar atenção diferente às coisas, talvez despercebidas no cotidiano!

OTÁREO: - Sim! Por isso digo que no Brasil quase não há filósofos. Eu sou um dos poucos que consigo ver coisas que ninguém percebe e que remetem a outras configurações da realidade.

SÓCRATES: - Estou diante de um gênio! E poderíamos dizer que, o filósofo, diferente da maioria da população, é aquele que não se perde em uma atenção flutuante?

OTÁREO: - Com certeza! Em meus cursos de Seminários de Filosofia Online digo que as sociedades escravocratas têm maior propensão a gerar filósofos, já que há tempo para filosofar.

SÓCRATES: - Bela ponderação! As condições de tempo são relevantes. Do contrário, se é levado pela desatenção quanto a temas fundamentais, quase sempre despercebidos pela maioria.

OTÁREO: - Claro! Por isso não gastei minha juventude estudando filosofia em uma universidade, sou um autodidata!

SÓCRATES: - E como você é uma exceção, deduzo que a maioria não reflete o cotidiano.

OTÁREO: - Sim... Somos um país de imbecis coletivos!

SÓCRATES: - E o que a sociedade diz daqueles poucos que filosofam? Não são eles vistos como intratáveis, perguntadores, incômodos, sem lugar, posto que colocam reflexões incomuns aos que vivem o cotidiano ordinariamente?

OTÁREO: - Com certeza! Por isso sou incompreendido pela academia!

SÓCRATES: - Portanto, a atitude do questionar é o que situa o filósofo como um tipo de consciência invertida de sua época, uma voz dissonante frente aos saberes, práticas e valores instituídos. Se me permite retomar um paralelo entre as crianças e adultos...

OTÁREO: - Vamos lá!

SÓCRATES: - No seu vasto conhecimento, em tese, quem possui mais tempo para observar o cotidiano?

OTÁREO: - Diria que as crianças, de um modo geral!

SÓCRATES: Respondestes bem! Possivelmente por não estarem em um cenário ritmado pelos afazeres do trabalho, pela pressa do tempo... E não são as crianças que possuem menos receios do que um adulto em realizar perguntas?

Tudo que você precisa saber para ser um ignorante: Sócrates no BrasilWhere stories live. Discover now