- Bom o que vocês vieram fazer aqui? - Perguntei me escondendo atrás da porta um pouco tarde demais.

- Viemos encontrar vocês para ir à praia. A Luísa e eu combinamos isso ontem. Ela não te avisou:

- Acho que ela se esqueceu desse detalhe. - Falei entre dentes.
Os convidei para entrar. Lucas foi ao banheiro enquanto fui acordar minha prima. Quando cheguei no quarto ela estava arrumando sua cama.

- Que bom que já acordou, seu namorado esta na sala te esperando, Ou melhor, nos esperando.

- Sim, sim. Vamos à praia com ele.

- Ah, sim. Obrigada por me avisar Luísa!

- Não avisei? Me desculpe Sara, jurava que eu tinha comentado com você!

Troquei de roupa rapidamente e enquanto Luísa ficou no quarto terminando de se arruma, fui entregar a camisa e o blusão que Filipe me emprestou noite passada.

O encontrei sentado no sofá com cada cotovelo apoiado em um joelho. Sua cabeça estava abaixada, de forma que eu não conseguia ver seu rosto.
Parei em sua frente com a mão estendida com seu casaco.

- Obrigada.

Ele levantou o rosto e me encarou, o que durou aproximadamente um minuto antes dele pegar suas roupas e dizer:

- Não me olhe assim, eu também não sabia que iriamos a praia hoje. E pior que não dormi nada essa noite...

- Não estou te olhando de modo nenhum.

- Está sim. Quando inclina a cabeça um pouco para trás, aponta o queixo em minha direção, estreita os olhos e puxa os lábios levemente para o lado. Definitivamente esta com raiva e ainda fazendo um esforço absurdo para esconder isso.

Ele sorriu e falou isso tudo de modo íntimo como se fossemos amigos desde sempre. Sentei do eu lado em silencio. Ele me irritava e realmente pensei em dizer poucas e boas para aquele metido. Mas eu estava de mau humor e com sono por ter sido acordada do modo que fui então me limitei a ficar em silencio.

Passados dez minutos, Luísa apareceu seguida de Lucas. Fomos caminhando até a praia. Luísa do meu lado esquerdo, Lucas do direito e Filipe atrás de nós.

- Sara, Luísa me contou que você vai embora daqui a dois meses.
Demorei alguns minutos para perceber que ele estava falando comigo. Fui pega de surpresa, não esperava que Lucas escolhesse justamente esse tema como maneira de puxar assunto e quebrar o silêncio. Antes que eu pudesse responder chegamos na esquina da praia onde havia uma padaria.

- Estou morrendo de fome. Poderíamos parar e comer algo.
Definitivamente eu não estava com fome, e sim totalmente enjoada. Somente o cheiro da comida que vinha da padaria me deixava pior. Filipe se manifestou:

- Na verdade, não estou com
fome. Vocês três podem ficar na padaria enquanto eu vou indo para a praia arranjar espaço na areia antes que fique cheio demais e isso se torne impossível.
Parei para pensar. Eu tinha duas opções: Passar mal com o cheiro da comida ou passar mal com a presença de Filipe. Escolhi minha segunda e nada agradável opção.
- Bom, acho que terei que ir com ele. Meu estomago não está muito bem. Prefiro não comer por enquanto.
Filipe me olhou, quase como se estivesse suspeitando de que eu realmente iria com ele.
Lucas olhou para mim e em seguida para Filipe antes de dizer:
- Ok. Ficarei com Luísa na padaria. Assim que acabarmos aqui, ligo para o Filipe para nos encontrarmos. Até mais.
Nos despedimos com um rápido aceno e assim que Luísa e Lucas entraram, fiquei sozinha com Filipe. Ele ainda carregava sua prancha grande de surfe.
- Vamos.
Assenti levemente com a cabeça e seguimos caminho. Comecei a reparar no calor que estava fazendo, se me dissessem que a temperatura estava acima dos 40 graus acreditava fácil. Estava tão quente que tive que reconhecer que ir a praia não havia sido uma má ideia. Percebi que não piso em uma praia desde antes da viajem. Não, faz mais tempo... Desde antes de meu avô ficar doente! O que me lembra de que preciso ligar para os meus pais. Acho que inconscientemente eu estava adiando esse fato.
Latidos chamaram minha atenção. Olhei para a direita e vi um beagle passeando com seu dono. Como amo essa raça! Uma vez meu pai quis comprar um para mim como forma de presente de aniversario mas minha mãe, claro que não deixou afirmando ser uma raça muito bagunceira e de quase impossível adestramento. Ela ate tinha razão, mas isso não me impediu de ficar bem triste. Afinal, tinha ate escolhido o nome, estava pensando em chama-lo de...
- CUIDADO!
Não tive tempo de entender o que estava acontecendo. Filipe em um rápido movimento com a mão que alguns segundos atrás segurava a prancha, me empurrou para trás fazendo tanta força contraria ao meu movimento, que meu corpo fez um grande impulso para trás e antes que eu caísse em direção a calçada a minhas costas ele me segurou, assim como fez na noite em que conheci o '' maluco do refrigerante''. O encarei. Nossos rosto estavam tão próximos que pude ver o fundo de seus olhos. Nos olhamos assustados. Eu não tinha noção do que havia acontecido.
- Você é maluca?
Franzi a testa em sinal de confusão, não tinha ideia do que estava acontecendo. Continuei encarando-o. A face estava vermelha, a respiração acelerada e as pupilas levemente dilatadas, indicavam o mesmo nervosismo que sua voz alterada.
- Você esta bem?
Tentei lhe dizer que sim, por que não estaria? Mas sons de buzina abafaram minha resposta, então afirmei apenas com a cabeça.
Filipe ajudou-me a voltar para um aposição que pudesse ser considerada normal. Logo seus olhos rodearam o local a procura de algo e foi só quando estes fixaram-se, arregalados, que ao olhar na mesma direção pude entender, em um ponto próximo a nós, sua prancha encontrava-se partida ao meio. Meus olhos arregalaram-se tanto quanto os dele.
- Oh, meu, Deus!
Levei as duas mãos a boca e foram as únicas palavras que consegui dizer Sua prancha estava destruída. Nunca poderia pagar, até porque não tinha ideia de quanto custava. Mas a julgar pelo que antes eu tinha visto, parecia ser cara.
Filipe pegou cada pedaço da prancha com uma mão.
- Não se preocupe. Tivemos sorte, ela quebrou ao meio e o corte foi reto. Deve ter algum modo de concertar. Tem um shopping aqui perto. La tem uma loja de um amigo meu. Ele entendi disso e pode nos ajudar.
Caminhamos na orla da praia de Santos. Eu com uma metade da prancha e ele com a outra. Andávamos lado a lado. Eu só pensava quanto custaria o concerto e quanto dinheiro eu tinha na carteira. Fui interrompida por Filipe que subitamente parou.
- Olha, na próxima vez em que atravessar a rua, olhe para o lado. Você podia ter sido atropelada.
Finamente entende o que havia acontecido. Filipe acabava de impedir que eu fosse atropelada e a única coisa que eu fiz foi quebrar sua prancha.
- Me desculpe. - Murmurei.
Filipe suspirou e voltou a caminhar.
Demoramos uns dez minuto para chegarmos ao shopping. Tempo o suficiente para meu rosto ficar vermelho por causa do sol. Porem, assim que entramos no shopping, meu rosto ficou mais vermelho ainda e dessa vez o sol não tinha nada a ver com isso.
Todas as pessoas estavam super bem vestidas. O que era bem estranho para um shopping frente ao mar. Bom, e eu estava com meus velhos e rasgados short jeans, meu chinelo brando, uma blusa de renda e por baixo meu biquíni preto. E como se tudo não bastasse, meus cachos estavam armados e desconexos graças a minha experiência de quase morte ou ao vento da caminhada. Não sabia ao certo. Me senti na obrigação de ficar um pouco mais apresentável e fiz o coque, o que eu esperava, que tivesse melhorado em algo. Para ser franca isso não fez que com que eu me sentisse menos desconfortável com os olhares das madames e dondocas daquele shopping que agradeci mentalmente quando Filipe avisou-me de que tínhamos chego a tal loja.
Saindo dos meus devaneios, reparei que a loja era toda azul da cor do mar. As paredes estavam lotadas de pôsteres de surfistas com fama internacional. Havia uma grande diversidade de pranchas espalhadas pela loja. Fiquei parada na entrada da loja, observando tudo enquanto Filipe se dirigia ao balcão para falar com o vendedor ali sentado.
Nem esperamos muito tempo e pudemos ouvir passos vindo do fundo da loja. Um cara alto, queimado de sol e loiro desceu e veio em nossa direção. Seus olhos eram por coincidência, azuis como o mar e seus músculos pareciam que iam rasgar sua camiseta branca. Seu cabelo era um pouco arrepiado e bagunçado, o que fazia com que ele ficasse mais bonito do que era antes. Assim que ele avistou Filipe, abriu um sorriso e em contraste com sua pele alaranjada, parecia ter vindo direto de uma propagada de creme dental. Acho que ele não me viu, pois foi logo abraçar Filipe e nem sequer dirigiu o olhar para mim.
- Como vai cara? Faz tempo que não vem aqui.
Filipe também sorria e retribuiu o abraço do amigo.
- Verdade. Como anda as viagens em busca de suas ondas perfeitas?
- Incríveis! O próximo programa será imperdível. Passará na TV sábado que vem. Acabei de receber o CD da filmagem pelo correio. Podemos assistir juntos depois de me contar o que te trouxe aqui.
Filipe dirigiu seu olhar em minha direção e seu amigo fez o mesmo.
- Essa é a Sara. Uma amiga minha.
- Por um segundo achei que diria namorada. Quase me fez sentir inveja de você Filipe. Prazer sou Daniel. - Disse ele sorrindo e puxando minha cintura em sua direção e me dando um beijo no rosto.
Sorri de forma nervosa. Daniel era além de lindo cheiro e com esse pensamento não pude deixar de ficar envergonhada. Me perguntei se novamente eu estaria vermelha.
- Prazer também. Como o Filipe disse, sou Sara.
Daniel me olhou dos pés a cabeça, o que não fez com que eu me sentisse mais a vontade.
- Pode ter certeza de que ouvi e jamais esquecerei seu nome ou seu rosto. Costuma vir muito na praia?
Por um breve momento me perdi naqueles olhos azuis e não consegui pronunciar uma só palavra. Um cacho havia se soltado do meu coque e Daniel se aproximou de meu rosto para coloca-lo atrás de minha orelha. Quando finalmente iria responder, Filipe pigarreou alto e tratou de mudar de assunto.
- Daniel, aconteceu um acidente com minha prancha. Ela partiu ao meio e se alguém pode concertar é você.
Daniel me encarava mesmo depois de Filipe falar. Me esforcei para sustentar seu olhar, seu jeito me deixava bastante envergonhada. Finalmente ele tratou de focar sua atenção na prancha (ou em partes dela) que estavam comigo e com Filipe.
- Acho que nesse caso nem eu sei se sou capaz de concertar. Esperem aqui um minuto.
Daniel voltou para os fundos da loja de onde veio e passados cinco minutos voltou com uma prancha azul e outra branca em baixo do braço.
- Pode ficar com essa. É bem parecida com a sua antiga.
- Eu pedi apenas para você concertar minha antiga prancha e não me dar uma nova. Não precisa cara, serio.
- Olha claro que precisa. Encare como um presente de aniversario adiantado. A sua antiga prancha não tinha concerto.
Filipe levantou uma sobrancelha e dirigiu seu olhar a Daniel.
- Ok, até tinha concerto. Mas ficaria péssima e não duraria muito. Aceite, estou a fim de surfar e você precisa de uma prancha.
Filipe finalmente se rendeu e pegou a prancha branca. Agradeci em silencio por não ter que pagar o mico de não ter dinheiro para reembolsar Filipe. Tudo havia dado certo no final.
Nos três fomos para a praia juntos. Mas parecia que só havia Filipe e Daniel conversando sobre para que lado da praia iriamos e onde estriam as melhores ondas. Às vezes Daniel me olhava e me lançava um sorriso. Tente fingir que não via e continuar caminhando, mas era difícil desviar de seus grandes olhos azuis e seu sorriso ofuscante.
Sentamos na areia em um local não muito distante da direção do shopping.
- Você gosta de surfar Sara? - Daniel perguntou.
- Na verdade, nunca tentei.
- Gostaria de descobrir como é?
- Acho que não é uma boa ideia. Muito perigoso para ela. Cero, Sara?
Filipe parecia irritado o que me deixou irritada por seu comentário impensado. Que garoto estranho!
- Bom, acho que não seria má ideia tentar Daniel. Você me ajuda? -Sorri para ele, feliz por estar presente e não me deixar sozinha com o chato do Filipe.
- Claro.
Ele sorriu e acariciou meu rosto.
Coloquei minha bolsa na areia junto com meus chinelos. Parei para pensar se não seria estupidez minha deixar minha bolsa sozinha na areia. Mas não tinha outra opção.
Quando me virei de volta, vi Filipe e Daniel tirando a camisa e ficando apenas de bermuda. Daniel era malhado e isso eu já sabia, afinal sua camisa anterior não escondia muito. Mas realmente me surpreendi com Filipe. Ele não parecia o tipo "rato de academia", mas ou eu precisava de óculos ou ele era bem musculoso. O que era uma surpresa.
- Sara não tem como surfar de camiseta e short. - Daniel me lembrou.
Olhei para os lados em busca de alguma escapatória. Daniel e Filipe verificavam as pranchas e percebi que eles me esperavam. Me virei de costas para eles e tirei o short e a blusa rapidamente para não chamar muita atenção ou mudar de ideia.
Quando virei, percebi que Daniel me encarava enquanto Filipe olhava fixamente para o mar. Tive a impressão de ver seu rosto um pouco vermelho, deveria ser o sol. Me perguntei se o meu rosto estaria tão vermelho quanto o dele.
Andamos em direção ao mar. Há muito tempo não sentia a areia fofa nos meus pés, ou a água fria em contato com minha pele, percebi que sentia falta inclusive do cheiro da maresia. O vento forte vindo do mar fez com que meu coque soltasse e meus cachos caíssem em minhas costas. Daniel me dava à mão e com a outra segurava sua nova prancha. Passamos a tarde toda surfando Ou melhor, Filipe surfava e Daniel tentava me fazer ficar em pé em uma prancha.
- Acho que eu não levo jeito. - Falei sentando na prancha e abraçando meus joelhos,
Daniel riu e se sentou em minha frente.
- Relaxa com o tempo você pega a pratica. Se quiser, amanha podemos tentar novamente.
- Acho melhor não. Foi frustrante demais perceber que não tenho talento algum. Acho melhor não insistirmos. Pode assumir, não nasci para isso!
Sorri com leveza. Daniel era uma boa companhia me surpreendi com o fato dele ser amigo de Filipe e eles dois serem pessoas totalmente diferentes.
- Então podemos jantar amanhã juntos amanha a noite.
- Está me convidando para sair? Se eu fosse você teria cuidado, não me conhece direito. Posso ser uma maluca e você nem sabe ainda. - Brinquei.
Ele me estudou com os olhos e finalmente disse:
- Acho que correrei o risco. Vejo que vale a pena.
Daniel me encarou com seus lindos olhos azuis e sorriu. Sorri também e olhei para a areia. Vi Filipe pegando seu celular que estava dentro de minha bolsa e fazendo sinal para que fossemos até ele.
Chegando lá descobrimos que Lucas havia ligado para contar que Luísa estava passando mal. Eles disseram que tinham pego um taxi direto para casa.
Vesti meu short e minha blusa o mais rápido que pude.
- Preciso ver como Luísa está.
Filipe já estava com sua blusa e segurava sua prancha no braço.
- Eu vou com você.
Afirmei com a cabeça. Mas Daniel nos deteve antes que pudéssemos sair correndo.
- Eu levo vocês. Será mais rápido se forem de carro.

Assim que estacionamos no prédio corri em direção ao elevado e Filipe e Daniel logo vieram atrás de mim. Perguntei pela milésima vez se Lucas não havia sido mais preciso do que estava acontecendo e Filipe deu a mesma resposta da primeira vez. Não sabíamos de nada especifico.
Assim que o elevador chegou ao sexto andar abri a porta e fui em direção ao quarto. Luísa estava deitada um pouco pálida. Me ajoelhei aos pés da cama e perguntei o que ela sentia.

- Estou melhor, acho que comi algo estragado.
Me certifiquei de que ela estava realmente bem e eu e Lucas ficamos ao seu lado enquanto Daniel ligava para meu tio explicado o que havia acontecido. Luísa insistiu para que Lucas fosse embora tranquilo. Daniel se ofereceu para leva-lo para casa. O que sinceramente achei muito gentil da parte dele.
Os acompanhei até a porta e enquanto Lucas chamava o elevador, Daniel falava comigo.
- Então, talvez não seja um bom momento, mas não sei quando terei outra oportunidade para perguntar o que você acha de sair comigo e com certeza não quero perder essa chance.
Ele estava de pé na soleira da porta enquanto eu segurava a maçaneta. Prometi que ligaria se Luisa melhorasse. Afinal, minha prima estava passando mal e meu tio chegaria tarde do trabalho. Não podia deixa-la sozinha.
********

AmazimaWhere stories live. Discover now