— " E a chuva que o vento traz,
Caindo sobre as colinas,
Despertam em mim
O sonho da sua lembrança."
A voz suave ressoou na floresta, acompanhada das notas em um alaúde. A manhã parecia ter parado para escutá-la,
— Ainda não está bom, talvez precise ajustar o tom. O que você acha, Orvalho? – A moça ruiva estava sentada de lado no cavalo cinza, o instrumento deitado em seu colo. O animal soltou um relincho suave e continuou no caminho.
— Hunf, todos são críticos hoje em dia. Aposto com você que irei ganhar o concurso de menestréis em Saturnia. E com essa música!
Dessa feita, o cavalo a ignorou e Marianna passou a dedicar-se a ajustar as cordas, pensando em como adequar letra e melodia. O concurso era um dos mais prestigiados dos Cinco Reinos e tinha certeza de que, se fizesse uma boa apresentação, poderia conseguir um lugar em alguma corte e se estabelecer. Seria uma surpresa para seu pai, o mesmo que não aceitara sua vontade de seguir a vida de uma trovadora itinerante, apesar de tratá-la como um incômodo.
Um galho partido no silêncio a despertou de seu devaneio. Com um estalar de língua, parou Orvalho.
— Quem está aí?
Ninguém respondeu e ela só conseguia escutar a sua respiração e a do cavalo. Ela segurou as rédeas com força e respirou fundo.
— Eu sei que tem alguém aí!
Outro galho quebrado denunciou a posição do desconhecido, que pulou na frente de Orvalho. Era um homem alto e corpulento, loiro de barba e cabelos compridos. Sem camisa, usava uma calça de couro muito gasta e tinha um machado na mão.
— Olha aqui, bonitinha. Se você me der seu cavalo, seu dinheiro e suas provisões, eu até posso deixar você inteira, mesmo que seja um desperdício...
— Ah, não, por favor! Orvalho foi presente do meu pai... – disse em voz chorosa, os olhos estavam cheios
— Anda, mulher, sai desse cavalo.
— Como você quiser, idiota!
Antes que ele pudesse entender o que ela tinha dito, a jovem já estava no chão. A saia rodada do vestido permanecia presa na sela do cavalo, enquanto Marianna estava na frente do assaltante, as pernas cobertas por uma calça masculina e uma espada na mão direita.
— O quê? Que inferno! – Ele tentou se recuperar e sacudiu o machado na direção da mulher, que era muito mais ágil. Ela desviou para a esquerda e o fez perder o equilíbrio. Aproveitou o impulso e o derrubou com um chute ligeiro na parte de trás dos joelhos. Colocou a lâmina na nuca do homem caído.
— Desculpe o mau jeito, mas o Orvalho e eu somos inseparáveis.
— Como você fez isso? É algum tipo de feitiçaria?
— Não vou revelar meus segredos. Mas posso garantir que não teve nada de mágico ali. Bom, e agora, o que eu faço com você?
Ele fez menção de se levantar e a ponta da espada marcou a pele do seu pescoço.
— Você podia me deixar ir embora. Não roubei nada, ninguém se machucou...
— Aí na primeira oportunidade, você volta e me ataca quando eu estiver dormindo. Claro. Você vem comigo. Vou te entregar para os monges... vai ser só um pequeno desvio e devemos chegar lá antes de anoitecer.
Ela o amarrou nas rédeas de Orvalho e assim seguiram pelo resto da manhã, sem trocar palavras. No meio do dia, pararam para comer. Marianna cedeu um pedaço de pão e queijo ao seu prisioneiro e comeu sua porção em silêncio. Somente quando voltaram a andar é que o estranho resolveu puxar assunto.
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Caminho para Mandalay (Andarilhos da Tempestade I)
FantasyUma antiga profecia falava do fim do mundo e da arma dos deuses que o impediria. Forças da luz e das trevas se unem para que isso aconteça. Porém, nem tudo está sob controle.