Yizin's - Tumba, primeira parte

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A primeira medida que deveriam executar, após suficientes discussões entre os pesquisadores - seis no total -, foi procurar algum outro mecanismo para não arriscar a vida de pessoas ao entrar nos limites da aterrorizante aparição. Pelo fim de tarde, drones içaram voo em direção à pirâmide, dois no total, um controlado pelo líder daquele esquadrão de soldados e outro por uma arqueóloga, ambos remotamente através de um controle com display. O físico observava atentamente o comportamento dos drones, altamente receoso em observar por muito tempo a pirâmide, como se o mero olhar fosse trazer de volta inúmeras memórias traumáticas. Mas isso não aconteceu, o que aconteceu foi que aparentemente a imaginação do homem estava lhe pregando peças; porém novamente suas ideias mudaram: e se não? Ele tentou manter o foco na tarefa em questão, coisa que conseguiu almejar sucesso, embora ainda com inúmeras dúvidas e temores em sua mente.

Ele observou os drones entrarem naquele domo imaginário por onde corriam as inúmeras dunas de sílica líquida; o líquido viscoso e alaranjado não reagiu com a entrada dos drones, como a imaginação do homem havia distorcido, mas sim as máquinas aparente e simplesmente pararam de funcionar, pela trajetória parabólica e descendente em direção ao lago de sílica. Ele esperou um pouco mais, observando os drones caírem rapidamente e sumirem na vastidão alaranjada. Escutou um alto xingamento do lado de dentro. "Porcaria de drone!", sendo a voz do líder da divisão. O físico abaixou os binóculos, indo de encontro com o restante do grupo e relatando o que havia acontecido em sua observação. A arqueóloga relatou o que havia ocorrido com o seu display, demonstrando certo desapontamento e pesar pelas máquinas, pois tinha noção do quão caro haviam custado. Não havia outra escolha, no entanto, seria perigoso tentar adquirir alguma amostra para análise utilizado o pessoal capacitado do exército. O líder estava irado e estressado, saindo daquele assentamento para os pesquisadores a passos raivosos e pesados; a mera presença deles naquele lugar, em conjunto com a sensação de inferioridade e horror perante à estrondosa e misteriosa aparição, parecia estar afetando negativamente tanto a moral quanto as ações do pessoal.

A tela subitamente desligou, após chegarem em um limite imaginário ao redor da construção arcaica, aparição ou o que quer que seja. O físico rapidamente chegou à conclusão que anteriormente havia teorizado. Aparentemente, as ondas eletromagnéticas, as usadas para controlar as máquinas remotamente, haviam sido repelidas pelo domo imaginário ao redor da pirâmide, impedindo a recepção de imagem e o controle do drone, que simplesmente caiu no lago de sílica. Claro, precisaria de novos testes para uma conclusão definitiva, mas tendo como base esse pensamento, apenas uma expedição com pessoas poderia ser feita, já que nenhuma imagem em vídeo sairia de dentro do domo. Eles resolveram fazer uma pausa pelo resto do dia, para descansar, visto o stress acumulado de alguns dos pesquisadores. No próximo dia, discutiriam sobre a próxima medida a ser tomada.

Muitos não conseguiram dormir, é claro. Com certeza por terem visto o que acontece com as pessoas durante o sono, que tipo de doença eles desenvolvem. Isso manteve-os acordados e alertas, estabelecendo em suas próprias mentes medidas de defesa contra esses pesadelos, como se beliscar ou ter noção de que era um pesadelo e acordar. E isso funcionou; vários pesadelos foram interrompidos pela metade, resultando, no entanto, em alguns dos pesquisadores saírem para ficar sob as estrelas, devidamente agasalhadas para suportar o terrível frio de quase zero graus. Todos observaram com certo temor e perplexidade o estranho movimento que as estrelas tomavam em relação à pirâmide, se afastando de cima dela o máximo possível, se aglomerando nas bordas. Seria uma ilusão? Quais tipos de efeitos isso poderia causar a estrelas, se aproximando dessa forma? Isso, como muitas das perguntas sem resposta, permanece desconhecido.

No entanto, também notaram que a sílica havia se solidificado, se tornando um vidro impuro que refletiria a luz da lua e das estrelas, se não fosse aquela estranha reação que a pirâmide causava. Havia três pesquisadores, que juntos debateram sobre o que poderia estar acontecendo, em um tom sussurrado e baixo; mas tais palavras, meras teorias sem muitos fundamentos científicos, rapidamente sumiram no gélido vento árido. Mas todo o silêncio foi rompido pelo som de um disparo. Um dos soldados, aparentemente acometido pela estranha doença adquirida pelo pesadelo, escolheu a saída mais fácil. Naquela noite, poucos dormiram e, até o amanhecer, mais três disparos foram ouvidos, em conjunto com alguns gritos assustados momentâneos. Os cadáveres foram cobertos para serem posteriormente enterrados sob as areias do deserto.

Ao amanhecer, cerca de um terço de todo o esquadrão estava acometido pela doença, desconhecendo-a de primeira, mas sentindo os mesmos sintomas dos moradores das vilas. Eles relataram o pesadelo; o mesmo para todos, embora com pequenas variações. Até mesmo dois dos pesquisadores estavam doentes, sendo incapacitados de despertar durante o pesadelo, ou se manter acordados durante a noite. Foram estabelecidas medidas, com medo de uma suposta epidemia, onde os soldados doentes foram fuzilados; o superior carregando toda a culpa e mantendo as vontades deles em escrito. Foi permitido, no entanto, que os pesquisadores doentes se mantivessem em uma tenda mais distante do grupo, pela própria argumentação dessas pessoas. Claro que isso traria uma situação de desunião entre os pesquisadores e os soldados, mas era necessário que, pelo menos, os pesquisadores discutam entre si, mesmo os doentes.

Relatando a ocorrência da solidificação ao comandante e a impossibilidade de exploração remota, logo foi decidido que, ao anoitecer, uma equipe de soldados seria mandada em conjunto com a arqueóloga para coletar amostras da areia e, sendo este segundo objetivo mais arriscado, lascas de pedra para uma análise química e datação de carbono. Eles não poderiam ficar mais do que dois dias mais, caso as baixas continuem no mesmo ritmo; o cansaço dos restantes também seria imobilizador, então deviam sair de lá o mais rápido possível, obviamente. E, enquanto a noite caía, mais e mais pessoas eram infectadas pela horrível doença, levando todos a pensarem que não era somente a noite que os pesadelos aconteciam, e de fato não: ninguém poderia dormir, não naquele ponto de cansaço, onde não conseguiriam acordar. Quando a lua estava alta no céu estrelado, quando a sílica já estava totalmente solidificada, eles partiram.

Uma equipe de seis soldados, mais a arqueóloga, partiram. Essa, em específico, pareceu receosa o dia todo; sua pele visivelmente se arrepiava apenas de pensar em se aproximar daquela colossal estrutura. Naquele momento, ela deveria ser fria, científica, como estudou para ser. Um dos soldados, escolhido aleatoriamente pela equipe, foi o primeiro a pisar dentro daquele visível limite. Ele sentiu o solo sob suas botas, percebendo uma mudança de temperatura para mais frio ainda, além dos quase 0 celsius do deserto. No entanto, era seguro para andar, sólido o suficiente. A arqueóloga foi logo após, quebrando um pedaço do vidro e o colocando dentro de um plástico de amostra, guardando-o com cuidado dentro de sua mochila. Conforme a equipe andava, o som predominante era o de vidro quebrando sob seus pés, o que os deixava ligeiramente desconfortáveis. Mas avançaram ainda sim, e a caminhada seguiu tranquila, com os soldados muito atentos a qualquer coisa, devido à sensação de profundo medo, misturado com cansaço. Embora sejam treinados para seguir em frente, era natural que sintam medo naquela situação, um medo irracional e enraizado, primitivo. Era fútil, então, tentar reprimi-lo. A sensação era como a de observar um gigantesco corredor subterrâneo com pouquíssima iluminação, se estendendo ao infinito, mas você está sozinho e com muito frio. Era enlouquecedor.

Após a angustiante caminhada, o grupo atingiu a base da gigantesca estrutura, que parecia muito maior do que qualquer montanha já vista. Era como se eles fossem formigas, ou pior, insetos perante ela. Alguma coisa os chamava, ressoando no mais profundo íntimo, martelando, lascando suas almas. E então, antes que pudessem perceber, todos estavam tocando a estrutura, embora ela também esteja os tocando. A sensação era como a de olhar e tocar o abismo de Nietzche, um profundo vazio e solidão perturbadora o bastante para faze-los tremerem e gritarem agonizados. E, com os inaudíveis gritos das pessoas na distância, eles sumiram em uma explosão abafada de vento e vibração. O lago de vidro começou a se quebrar e a se mover em um redemoinho, como se estivesse vivo, e os que estavam doentes começaram a gritar sem parar, sentindo as frias garras da morte, ou o que quer que seja aquela maldita criatura, se apossar de suas almas e rasgar-lhes totalmente. O que restou, logo após, foram corpos e mais corpos doentes, inchados com aquele líquido negro que lhes escorriam de todos os poros. Apenas alguns poucos sobraram, que olharam toda a cena, horrorizados.

E então, o grupo acordou, não como se acordasse como em qualquer outra noite, ou ao se recuperar da inconsciência, mas sim como se, durante toda sua vida, eles estivessem dormindo e presos numa ilusão fria. Antes dormindo, agora acordaram para uma realidade ainda mais gelada, como as profundezas do oceano...

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