Desse dia em diante, me afundei na nicotina e no álcool. O bar era o meu refúgio, nele eu afogava meus sentimentos e ateava fogo. Engoli a traição e segui minha vida, mas sempre sentindo um vazio imensurável dentro do peito. Um ano depois, a dor já não era tão constante e a lembrança não era mais tão nítida. Acho que bebi tanto Bourbon puro na época, que os pensamentos se esvaíram junto com as ressacas. Dois anos mais tarde, eu já não sentia absolutamente nada. Minha mente estava despreocupada, meus sentimentos escondidos atrás de uma generosa camada de proteção e meu coração intacto.

Até ela.

Anastásia Walker surgiu em minha vida e derrubou todas as barreiras de proteção que eu havia construído em torno de mim. A ruiva desarmou minhas defesas e me fez questionar os meus conceitos com sua manha e sua teimosia irresistíveis. Nutri uma falsa expectativa de que ter o coração partido pela segunda vez não traria tantos danos como da primeira, mas ela me mostrou que a dor pode ser ainda mais impiedosa se o corte for feito por alguém que amávamos mais do que a nós mesmos.

Não vou culpar o destino por nossos pequenos encontros, pois meus próprios pés me guiavam até ela. Haviam segredos em seu olhar que me incitavam a desvendá-los. As frases soltas, os gestos… tudo indicava que nossos passados não eram tão diferentes assim. E, embora na época disséssemos várias vezes um ao outro que não tínhamos absolutamente nada em comum, o que nos uniu não foi um simples trabalho de artes, mas sim, nossa súbita necessidade de mostrar ao mundo que éramos fortes quando, na verdade, estávamos desmoronando por dentro.

Com o passar dos dias, eu queria ser o seu garoto favorito no mundo; aquele que lhe abraçaria em momentos difíceis, que contaria piadas idiotas para vê-la sorrir e aquele em que ela pensaria ao acordar e antes de dormir. Por um tempo – mais especificamente sete meses – acho que consegui. Anastásia Walker se abrigou em meu coração sem pedir permissão e eu deixei, pois estava entorpecido demais pelo sentimento que há muito tempo eu não sentia; o amor. Não consigo me lembrar do momento exato em que meu corpo começou a desejá-la de uma maneira nada amigável, mas me lembro com clareza do instante em que a minha alma reconheceu a dela como a sua outra metade.

Era sexta-feira, dia de Ação de Graças e eu fui convidado por Robert Walker – seu pai – para um almoço em família. Anastásia estava nervosa porque iria conhecer a madrasta e seu meio-irmão, então resolvi dar o meu apoio lhe acompanhando até lá. O dia foi divertido, embora no final da tarde, quando a levei para casa, eu tenha ficado de cara fechada; não era nada com ela e nem com sua família, mas comigo mesmo. Puta merda, fiquei tão furioso ao constatar que meu coração estava sem nenhuma proteção em suas mãos, que meu interior simplesmente entrou em colapso. Tentei dispensá-la quando me convidou para ir a um ponto turístico de Snowdalle, dizendo que iria estudar para uma prova de biologia. Porém, Anastásia sempre fora insistente e teimosa. E eu, nunca consegui dizer a porra de um simples não para ela.

Fomos parar na Misty Mountain e foi a primeira vez que me abri verdadeiramente com ela, sem exigir nada sobre o seu passado em troca. Quando Anastásia me disse que não era justo que o amor verdadeiro não batesse na nossa porta, senti vontade de admitir que ela já havia derrubado a minha há muito tempo. Entretanto, apenas cantarolei Can't Help Falling In Love do Elvis Presley. Com aquele simples trecho, quis dizer a ela que ter o coração partido e passar por certas situações dolorosas eram inevitáveis, porém necessárias. Quanto a mim, foi o checkmate para compreender que meu coração, corpo e alma não a viam mais como uma simples amiga.

Lembrar de Anastásia Walker ainda machuca, mas a raiva e o rancor que sinto por ela conseguem sobressair todos os sentimentos e memórias boas que havíamos construído. Eu entreguei meu coração de bandeja em suas mãos e ela simplesmente espetou milhares de alfinetes, perfurando o órgão que a abrigava em seu interior. Anastásia saiu por ele, fechou a porta atrás de si e nunca mais retornou. Cacete. Ainda me lembro claramente do momento em que o universo conspirou contra nós e instalou o caos no dia 23 de maio de 1998. Pago pelos pecados do meu pai até hoje, toda vez que deito minha cabeça no travesseiro e lembro que, do outro lado do mapa, mesmo sabendo que sou inocente, a pessoa que eu mais amei no mundo me odeia por erros que não cometi.

Danger Storm 2 | EM ANDAMENTO Where stories live. Discover now