Olhar

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Juliana.

O alarme do meu celular tocava pela milionésima vez e por mais que eu amasse It's Time do Imagine Dragons, eu precisava confessar que essa música já estava me dando nos nervos por me despertar de um sono tão pesado quanto o que eu estava tendo. Olhei rapidamente a tela do aparelho e logo notei o horário: 7:35. Ótimo, estava atrasada, bem atrasada, e logo no primeiro dia aqui no inferno mais conhecido como Santa Luisa de Marivac, ou Marillac, não sei, não sou religiosa, perdoe-me, universo.

Levantei-me rapidamente e coloquei a primeira roupa que achei, como ainda não tinha desfeito as malas, tudo estava uma bagunça, eu cheguei quase de madrugada nesse lugar, mal dormi, e tive praticamente uma noite de combate com meus progenitores até finalmente vir parar aqui.

Realmente não estava fácil para o meu lado.

Achei um chiclete no bolso da minha jaqueta e aquela seria minha pasta de dentes agora pela manhã, era o melhor que eu podia fazer. Saí do quarto enquanto tropeçava nas minhas coisas caídas pelo chão, minha colega de quarto já havia deixado o lugar havia muito tempo, não fez questão de trocar nenhuma palavra comigo e eu também não fiz de trocar com ela, então estávamos em um consenso. Aliás, nota mental: ligar para El Chino assim que eu tivesse a oportunidade e perguntar por que infernos esse homem me colocou nesse quarto sendo que podia pagar por todas as suítes individuais, se quisesse. Bem, no fundo eu sabia a resposta, mas não iria perder a oportunidade de irritá-lo, eu nunca perdia.

Corri pelo campus e adentrei no refeitório, eu tenho fome o tempo todo, em qualquer horário do dia, e agora não era diferente. Enchi minhas mãos com tudo que tinha disponível e me senti menos exausta depois disso, mas logo reparei olhares sobre mim. Anyway, não ligo para os olhares, eles que façam o que quiserem.

Menos um, no meio da multidão, tinha um olhar que não era debochado ou puramente curioso, uma loira com um belo par de olhos azuis, me olhava como se eu fosse um enigma, e isso me instigou. Eu nunca dei importância para a cor dos olhos das pessoas, embora a cor dos dela me pareça linda, mesmo que eu só tenha visto de longe. Acontece que eu reparo mesmo é no olhar, por mais bobo que seja, os olhos são realmente a janela da alma, e algo no olhar dela fez com que eu sentisse que ela é diferente da maioria besta que se encontra aqui.

Dei um sorriso despretensioso para ela, só para ver até qual ponto iríamos, me virei e fui embora, estava super atrasada e não fazia ideia de onde era a minha sala. Como já dei a entender antes, estar aqui não foi, e ainda não é, parte dos meus planos.

Após muitas caminhadas para lá e para cá, acabei finalmente achando minha sala e bati na porta, talvez minha intenção não fosse bater tão forte, mas eu estava tão possessa que sequer medi minha força naquele instante.

Quando abri a porta já esperava ser repreendida ou punida, mas a professora me pareceu ser mais do tipo compreensiva, o que me fez abaixar um pouco a guarda com ela. Não foi a coisa mais agradável do mundo para mim todos saberem logo de cara do meu sobrenome, ele não passa de um fardo que eu carrego para onde eu vou, mas há coisas na vida que, por mais que a gente tente, não temos como fugir delas, e o Valdés era essa coisa para mim.

A loira dos olhos azuis me encarou quando eu entrei, não retribui o olhar porque estava preocupada demais tentando sair daquela situação chata que era estar ali parada na porta da minha nova turma com todos me encarando feito um animal exótico em exposição. Porém, eu reparei nela ao longo da aula: Destra, aparentemente organizada e caprichada, ótimo, tudo que eu não sou. Embora já tenha ouvido de algumas pessoas que desenho bem e tenho uma criatividade gigante para moda e arte, confesso que não me dedico de fato a nada disso já faz um bom tempo. Talvez até tenha deixado de acreditar que tenho potencial, se é que um dia já acreditei mesmo que tinha.

Selvagem|JuliantinaOnde histórias criam vida. Descubra agora