A Entrevista

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O carro dobrou a esquina e veio devagar, espantando um casal de pássaros que estava no asfalto se aquecendo nos raios do sol naquele início de manhã de outono. A motorista entrou à esquerda, parou diante de uma cancela, olhou para o letreiro escrito em um metal polido "Centro de Convivência Souto Lima".

O guarda uniformizado saiu da guarita com um tablet e olhou para o automóvel importado SUV esportivo novo em folha, de cor branca, design arrojado, com película escura nos vidros que impediam ver o seu interior.

O vidro do motorista desceu com um leve barulho e o guarda sorriu para a bela mulher que surgiu por trás do vidro, usando óculos escuros. O seu cabelo era claro e liso, o rosto era fino, em perfeita harmonia com o nariz e a boca delicada.

— Bom dia! – disse o guarda.

— Bom dia! — respondeu a jovem sorrindo.

— Até que enfim parou de chover e o sol resolveu sair.

— É verdade, há dias que não vejo o sol e um dia como hoje é uma benção. Deixe me apresentar, eu sou a doutora Caroline e tenho uma entrevista com a doutora Laura.

— Um momento, por gentileza.

O guarda olhou o tablet por alguns instantes.

— Doutora Caroline Guedert, entrevista às 09:00h com a doutora Laura. Sim doutora, sua reunião está confirmada. — Disse o guarda sorrindo.

— Obrigada.

Ele olhou no relógio e conferiu o horário.

— A senhora chegou cedo, ainda faltam vinte minutos para as 09:00h.

— Gosto de chegar um pouco antes, para compensar eventuais imprevistos.

— Pela placa do seu carro, percebi que a senhora veio da Capital. É bem longe daqui, doutora Caroline.

— Sim, é verdade.

— E para chegar neste horário, a senhora dirigiu a noite toda ou está hospedada em algum hotel na cidade?

— Confesso que dirigi a noite toda.

— É por isso que está usando esses óculos escuros assim tão cedo?

A jovem observou melhor o guarda a sua frente. Ele era um negro de cabelos grisalhos, nariz achatado e sorriso farto.

— Para dizer a verdade, sim, mas estou acostumada a dirigir grandes distâncias.

— Então deseja trabalhar conosco?

— Sim.

— Por acaso a doutora está concorrendo à vaga do doutor Michel?

— Sim, estou.

— Ele era um médico muito especial e todos nós sentimos muita saudade dele. Desde que aquela tragédia aconteceu, o Centro Médico Souto Lima procura alguém para substituí-lo. Muitos já foram entrevistados pela doutora Laura, mas ela ainda não escolheu ninguém, é muito exigente com os médicos que trabalham neste lugar.

Ela achou estranho aquele guarda falar com ela daquela maneira, mas a forma com que conversava, sua simpatia e seu sorriso faziam com que ela parecesse conhecê-lo há muito tempo.

— Eu não conheci o doutor Michel pessoalmente, mas li alguns de seus livros e, sem dúvida ele era um excelente médico. A sua morte foi uma grande tragédia.

O guarda fechou o rosto lembrando do médico, de sua história e da dor de sua perda.

— Tem toda razão. Sabe de uma coisa, doutora Caroline, ele era um bom homem, um dos melhores que já passou por aqui e todos os funcionários e pacientes sentiram muito quando aconteceu aquela tragédia. Desculpe-me perguntar, doutora Caroline, mas a senhora gosta de velhos? É que o Centro Souto Lima cuida de velhos e pessoas especiais, e o doutor Michel cuidava dos velhos muito bem. Velhos não, quero dizer, dos pacientes idosos.

Segredos de GuerraWhere stories live. Discover now