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Sophia
O céu estava nublado, assim como o meu humor. Millie estava no quarto, dormindo um sono profundo sob as cobertas grossas, meu coração se apertou só de pensar em acorda-la. Virei-me mais uma vez para a senhora de bochechas salientes e tentei, pela última vez fazer com que ela permitisse que a gente ficasse mais um pouco.
- Por favor, eu imploro, por Millie...
A senhora fechou os olhos e disse num sussurro:
- Não posso. Tenho contas para pagar e você não tem dinheiro o suficiente. Se eu deixar ficar mais um pouco, vou perder o controle, vou ficar deixando e deixando...
- Mas... nós corremos perigo andando por aí atrás de abrigo.
- O que é ainda pior para mim se vocês ficarem. Se eles descobrem vocês aqui o que pensa que eles vão fazer com uma velha como eu?
Não tem jeito, ela não pode fazer mais nada para nos ajudar.
- Tudo bem. Vou acordar Millie.
- Eu fiz o café, vocês podem comer antes de ir embora.
- Obrigada.
Ela deu um sorriso leve e foi para cozinha. Eu não a culpava, entendia que estava preocupada com a própria segurança e também em relação às finanças. O que eu poderia fazer? Era só uma estranha, que veio do interior da Inglaterra, com uma irmã a tiracolo, sem dinheiro, roupas, nada que passasse um pouquinho só de segurança, sem contar que eu acabara de deixar escapar que estamos correndo perigo. Eu já tivera bastante sorte por Judith ter permitido que ficássemos uma semana com ela. Subi as escadas devagar, prolongando ao máximo o tempo de subida. Quando cheguei na porta do quarto, abri aos poucos para não fazer barulho.
- Sophia. - olhei para trás. Era Judith, com uma pequena pilha de roupas em mãos. - É para Millie... e você também.
- Judith... Eu... eu não posso aceitar, você já fez muito por nós.
- Eu sou uma covarde, querida. Poderia fazer mais, deixar que ficassem aqui, mas... Eu preciso pagar as contas, comprar meus remédios e eu também tenho medo, se é como você disse, estamos as três correndo perigo.
- Tudo bem, Judith, não precisa se explicar. Eu agradeço muito, por tudo.

Coloquei as roupas com cuidado na mochila e sentei na beirada da cama para acordar Millie. 
- Ei dorminhoca, vamos acordar?
Ela se espreguiçou e cobriu o rosto com o lençol.
- Só mais um pouquinho...
Sorri. Nunca era só mais um pouquinho.
- Vamos, Millie, Judith fez comida pra gente e precisamos conversar sobre algo.
Ela baixou a coberta e abriu os olhos aos poucos. Esperei ela sentar para começar a falar. Eu sentia uma aperto no peito e falar parecia ser um ato muito doloroso, afinal não é fácil você chegar para uma criança e dizer mais uma vez que terão que se mudar, ainda mais sem poder dar uma justificativa. Traguei uma boa quantidade de ar antes de começar.
- Então, nós precisamos ir.
Millie tentou ao máximo não deixar transparecer o quanto ficou triste com a notícia, mas eu a conhecia bem o suficiente para saber que ela não estava bem.
- Tudo bem. - disse, com um fraco sorriso.
Ela colocou a mão sobre a minha, o que me fez ter vontade de chorar, mas eu fiz um esforço para não deixar as lágrimas escaparem.
Após tomar uma xícara de chá de frutas vermelhas, peguei meu sobretudo e deixei Millie com Judith. Eu precisava ir atrás de alguma coisa, algum lugar para me refugiar com Millie. O céu continuava nublado, só que agora gotas geladas caíam dele. Eu podia senti-las escorrendo pela minha nuca, gerando arrepios.
Tentei em diversos lugares, livrarias, cafeterias, lojas de conveniência, bares e restaurantes, porém nenhum se dispôs a me oferecer uma vaga. Talvez o fato de eu estar encharcada da cabeça aos pés estivesse me prejudicando, mas o que eu poderia fazer?

Matthew
Merda.
- Por que essa empresa?
Lucy se sobressaltou diante meu tom brusco. Não queria assusta-la, mas eu não esperava ouvir esse nome mais uma vez, na verdade, por mim eu faria de tudo para nunca mais ouvir esse nome.
- Sr. Harris, peço desculpas se não é do seu agrado, mas não podemos ignorar a Ward, eles são os melhores quando o assunto é marketing. Tenho certeza de que eles trarão excelentes resultados para a imagem da empresa.
Fechei os olhos e inspirei. Eu precisava me acalmar, Lucy não estava errada, de fato a Ward era a melhor empresa para cuidar da comunicação da Harris. Tínhamos uma ótima comunicação interna, mas institucional ainda pecava em muitos aspectos e com pequenas correções e inovações poderíamos aumentar ainda mais nossa abrangência.
- O senhor sabe que precisamos melhorar nossa divulgação. É claro que a Harris faz sucesso, mas dentro de um grupo seleto de clientes, aqueles com mais poder aquisitivo. A ideia é levar a Harris para todos os públicos, por isso precisamos da assessoria da Ward. Além disso, temos o projeto para lançar a coleção inspirada nesse filme adolescente que está fazendo o maior sucesso.
Revirei os olhos.
- Ah, não me venha falar nesse filme de novo. Não sei como concordei com essa ideia maluca, de associar minha empresa com um filme tão estúpido.
- A franquia faz muito sucesso, o senhor precisa concordar. Minhas netas mesmo amam.
- Lucy, você esqueceu que sou eu que vou ter que desenhar essa coleção de joias?
- O senhor poderia começar lendo os livros. - sugeriu, com um brilho nos olhos.
Dei risada. Algo que eu me permitia somente  na frente dela. Lucy era uma senhora de cinquenta e pouco anos, que amava trabalhar e que era muito atenciosa comigo, às vezes sentia como se ela fosse a minha avó, principalmente quando ela dava tapinhas nas minhas costas.
- Você sabe que eu nunca perderia meu tempo lendo essa porcaria.
- Não se preocupe, semana que vem dou para o senhor a coleção completa.
Mais uma curiosidade de Lucy, ela insistia em me chamar de senhor, mas cortaria minha cabeça se eu lhe chamasse de senhora.

O TRATO [EM BREVE]Tempat cerita menjadi hidup. Temukan sekarang