– Leve Sua Alteza aos seus aposentos e diga à ama que compareça aqui imediatamente!
Só no dia seguinte Caspian percebeu o que tinha feito, ao descobrir que a ama fora despedida sem poder sequer dizer-lhe adeus. Foi informado, então, que iria ter um preceptor.
Sentiu muita falta da ama e derramou muitas lágrimas de saudade. Muito infeliz, voltou a pensar nas velhas histórias de Nárnia, ainda mais do que antes. Todas as noites sonhava com anões e dríades, e tentava desesperadamente fazer com que os gatos e cães do castelo falassem com ele. Mas só conseguia que os gatos rosnassem e que os cães sacudissem a cauda.
Caspian tinha certeza de que ia detestar o preceptor; mas quando este apareceu, passada uma semana, viu que era uma dessas pessoas a quem é impossível querer mal. Nunca tinha visto um homem tão baixo e tão gordo. Usava uma barba pontuda e prateada, que lhe descia até a cintura; o rosto, moreno e enrugado, era muito feio, mas ao mesmo tempo muito bondoso e inteligente. Sua voz era grave, mas ele tinha olhos tão alegres que só quem o conhecesse bem podia dizer quando ele estava brincando ou falando a sério. Seu nome era doutor Cornelius.
De todas as aulas que tinha com o doutor Cornelius, aquela de que Caspian mais gostava era
História. Tirando as histórias que a ama lhe contara, nada sabia até então da história de Nárnia. Foi assim com grande espanto que aprendeu que só recentemente a família real se instalara no país.
– Foi um antepassado de Vossa Alteza, Caspian I, que conquistou Nárnia e fez dela o seu reino – disse o doutor Cornelius. – Foi ele quem trouxe a sua gente para cá. Porque vocês não são narnianos de origem, mas telmarinos. Vieram todos de Teimar, para lá das Montanhas Ocidentais. Por isso, Caspian I é chamado de Caspian, o Conquistador.
– Mas, doutor Cornelius, quem vivia em Nárnia antes que viéssemos de Teimar?
– Antes da conquista dos telmarinos não havia homens em Nárnia... ou melhor, havia poucos.
– O que, então, o meu antepassado venceu?
– O que não, Alteza, quem – corrigiu o preceptor. – Acho que está na hora de deixarmos a História e passarmos à gramática.
– Ainda não, por favor. Só queria saber se houve alguma batalha, e por que é que chamam Caspian de Conquistador, se não havia ninguém com quem lutar?
– Eu falei que havia poucos "homens" em Nárnia – disse o doutor Cornelius, olhando de um modo muito estranho para o jovem príncipe.
Durante um momento, Caspian não percebeu nada, mas de repente teve um sobressalto.
– Quer dizer que havia outras coisas? – perguntou, ansiosamente. – Quer dizer que era mesmo como nas histórias? Havia...?
– Psiu! Nem mais uma palavra! – interrompeu-o doutor Cornelius. – Já esqueceu que a ama foi despedida por falar da antiga Nárnia? O rei não gosta dessa conversa. Se me apanha revelando-lhe segredos, dá-lhe uma surra de chicote e corta a minha cabeça.
– Mas por quê?! – indagou Caspian.
– Vamos à gramática – disse o doutor Cornelius, voltando a falar alto. – Queira Vossa Alteza abrir na página 4 do seu Jardim gramatical ou Árvore morfológica aprazivelmente ao alcance de talentos jovens.
A partir desse momento, só falaram de verbos e substantivos até a hora do almoço; mas acho que Caspian não aprendeu muito. Estava muito nervoso. Tinha certeza de que o doutor Cornelius não lhe teria dito tanta coisa, caso não tivesse a intenção de dizer-lhe outras, mais cedo ou mais tarde.
4 - O ANÃO CONTA A HISTÓRIA DO PRÍNCIPE CASPIAN
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