Capítulo Um

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A noite estrelada se via ofuscada pelas luzes coloridas e banners gigantescos na Industrial Road. Afinal, qualquer estrela longínqua perderia o brilho em meio aos cassinos e clubes de strip de Las Vegas.

O tilintar das taças se escondia sob a música ambiente e os holofotes no Turquoise Strip Club. Mas Freya ouvia tudo, em cada detalhe. As unhas compridas e vermelho-sangue contrastavam com a bebida transparente na taça em sua mão direita. Se apoiava no balcão do bar, portando um corpo invejável dentro do vestido preto decotado. Observava cada movimento, sentindo o ar pesado que preenchia o salão. Entre os corpos femininos semi-nus, voavam os pensamentos sujos, indecentes, e alguns até criminosos dos clientes do local. Sorriu.

- É, Petrus. Parece que hoje meu trabalho será bem fácil.

Tomou um gole do Martini e virou-se para o homem no balcão. Petrus era razoavelmente alto. Tinha ombros largos e cabelos castanhos bem arrumados. A pele bronzeada era iluminada pelas luzes violeta do bar, que também faziam brilhar seus olhos negros e profundos.

- Certamente que sim, Freya. - ponderou - mas não sei se levará alguém hoje. Os acidentes por aqui tem diminuído...

- Bobagem, Petrus. Veja só.

Com um breve movimento de cabeça, ela indicou uma cena no canto do salão. Um velho se divertia entre inúmeras canecas de cerveja, perdendo-se nas curvas da stripper que o entretia. Ela fazia a linha "policial" e agora estava se preparando para revelar a lingerie que se escondia por baixo da farda.

- Acha mesmo que aquele velhote aguenta esse tranco? Ainda mais com esse monte de álcool nas idéias... O vovô ali já tem uma bela cirrose e veias lotadas de gordura. Já o venho observando há um tempo, contando os minutos pra levar esse cara.

- Hum... parece promissor.

- Nem tanto... há alguns por aqui que eu gostaria muito mais de levar. Veja só o Clarks, na poltrona à direita.

Ela apontou um homem muito branco, meio gorducho, de bochechas vermelhas e mãos curiosas demais.

- Esse cara sim, me dá até nojo - dizia Freya - é o responsável pelos estupros assassinatos que andaram rolando por aqui, nas últimas semanas. Um deles inclusive de uma adolescente.

Os olhos do barman se arregalaram.

- Não sabia que esses crimes tinham acontecido por aqui...

- Mas é claro - disse a mulher - você acha que a mídia divulga algum crime contra prostitutas? - ela riu. O escárnio estampado nos lábios vermelhos. - é óbvio que eu sei disso porque eu vi tudo acontecendo. Sou louca pra levar esse cara pro setor 7.

- Pelo menos você ganhou as almas das moças, não?

- Só levei uma. - respondeu, calmamente.

Petrus parecia confuso.

- Ora, como assim? E as outras?

Freya revirou os olhos. Pousando a taça sobre o balcão, aproximou - se do barman, puxando a gola de sua camisa branca e dizendo, entre dentes:

- O que o faz pensar que a condição de prostituta leva sempre uma mulher ao título de pecadora? Não sabe quantas delas tem filhos pra criar. Quantas foram rejeitadas em empregos inúmeros por motivos estúpidos. Por serem mulheres, simplesmente...

- Freya, eu..

Ela o interrompeu.

- Não terminei ainda. - continuou, muito séria, encarando firme os olhos castanhos. - Sabe quantas foram despejadas sem justificativa? Quantas são constantemente desrespeitadas e agredidas por babacas como Bruce Clarks, mesmo fora do ambiente de trabalho?

Herdeiros do CaosWhere stories live. Discover now