- Não está com medo? - você perguntou. - De entrar aqui?

- Eu deveria estar? - Olhei para outro lado. - O que você vai fazer?

- Nada, só que... - você abanou a cabeça rapidamente. - Um dos empregados de papai me disse uma coisa um dia. Ele me disse que há espíritos nas pedras daqui: que as pedras têm uma razão para existir, um propósito... disse que se eu não respeitasse as pedras, elas iriam cair e me esmagar. Essas histórias me deixavam morto de medo. - Você deu mais uns passos e parou no início da trilha. Olhou então para os rochedos que se agigantavam ao seu lado. - Desde essa época eu sempre cumprimento as rochas antes de entrar... e espero um pouco para elas saberem que estou aqui.

Você arranhou as pedras com o dedo, soltou um pouco de poeira e a esfregou entre o polegar e o indicador. Depois tocou os lábios. Antes de começar a andar pela trilha, olhou para mim. Esperei alguns segundos e segui você, mantendo uma boa distância. Minhas pernas tremiam um pouco, me fazendo cambalear. Uma vez mais, apoiei as mãos nas grandes paredes rochosas e caminhei com uma perna de cada lado do cano.

Eu não gostava do gemido baixo que o vento fazia ao passar entre as pedras. E detestava pensar que aquela trilha através dos rochedos parecia ser o único caminho de saída. Tinha a sensação de que estava entrando em uma armadilha. Você andava rápido. Quando cheguei à clareira, já estava encostado numa árvore de casca rugosa, rodopiando uma coisa entre os dedos.

- Noz-do-deserto - você disse.

Você a estendeu para mim. Parecia uma pedra e era igualmente dura. Bati com a unha em sua casca.

- Elas falam quando são cozidas - você disse. - Quando as conchas delas explodem no fogo, elas estão falando com você... é o que as pessoas dizem. Na primeira vez que cozinhei essas pedras, achei que eram os espíritos dos rochedos me dizendo que eu iria morrer.

Você deu um sorriso torto. Depois pegou a noz de volta e a enfiou no bolso. Antes de se afastar da árvore, deu uma palmada no tronco.

- Nogueira-do-deserto... ela nos dá doces, sal, castanhas... e abrigo também. É a nossa maior amiga aqui.

Você atravessou a clareira e foi até as gaiolas com as galinhas. Abrindo a porta da gaiola principal, depositou um punhado de sementes e frutinhas em um canto. Depois verificou o suprimento de água. As galinhas se precipitaram em direção à comida. Você tateou a gaiola em busca de ovos. Ao não encontrar nenhum, deu um muxoxo.

- Elas ainda não estão saudáveis - você murmurou. - Ainda estão abaladas com a viagem.

Você afagou as galinhas e falou com elas em tom suave. Olhei sua mão deslizar delicadamente pelos finos pescoços. Com um pouco mais de pressão, suas mãos poderosas as estrangulariam.

Você fechou a porta. Enfiei o dedo pela grade e toquei nas penas da ave cor de laranja. A seguir, você examinou as plantas, checando se estavam sendo bem abastecidas pelos canos de água.

- Laranjas-do-mato, tomates-do-mato...

Você falava com as plantas como se elas fossem suas amigas, me informando os nomes delas. E remexia nas folhas e nos frutos, procurando sinais de doenças ou de insetos. Depois se dirigiu à lagoa, seguindo o cano de água. Você atravessava confiantemente as touceiras de mato, fazendo bastante barulho.

- Tem cobras aqui? - perguntei.

Você assentiu.

- Mas se você fizer bastante barulho, elas vão embora. Na verdade, elas sentem medo.

Embora contra a minha vontade, segui você mais de perto. Todos os raminhos que havia no chão me pareciam cobras, até você pisar neles e quebrá-los.

Stolen (L.S Version)Donde viven las historias. Descúbrelo ahora