— Ei, tudo bem, eu não mordo — você disse suavemente. — De qualquer forma, não há outros lugares, a não ser que você queira se sentar com a família Addams, ali.

Segui seu olhar até uma mesa onde havia cadeiras vazias. Estava quase toda ocupada por uma mesma família. Duas crianças pequenas engatinhavam sobre a mesa enquanto os pais discutiam.

Eu me perguntei o que aconteceria se eu tivesse me sentado com aquelas pessoas. Talvez conversássemos sobre as férias das crianças e milk-shakes de morango. Depois eu voltaria para meus pais.

Olhei para o seu rosto; seu sorriso formava rugas em torno da boca. O verde profundo dos seus olhos guardava segredos. Eu queria conhecê-los.

— Eu acabei de escapar da minha família -eu disse. —Não quero outra por enquanto.

— Muito bem —você deu uma piscada. — Um cubo de açúcar, então.

Você me guiou até o lugar onde estava sentado. Havia outros clientes nas proximidades da pequena mesa, o que me deixou mais confiante. Em dez passos cheguei lá. Numa espécie de torpor, sentei na cadeira em frente à janela. Vi você levar o copinho até o balcão de autos serviço e retirar a tampa. Vi você colocar o açúcar. Os cachos dos seus cabelos cobriram seus olhos quando você se inclinou.

Você sorriu ao perceber que eu estava olhando. Eu me pergunto se foi quando tudo aconteceu. Você estava sorrindo quando fez isso? Acho que desviei os olhos por um instante.

Olhei pela janela para observar os aviões que estavam decolando. Vi um jumbo aterrissando. O atrito das rodas traseiras com o chão formava rolos de fumaça negra. Vi um avião se preparando para decolar. Suas mãos devem ter sido rápidas quando você derramou a substância. Eu gostaria de saber se você usou alguma técnica de distração ou se ninguém realmente estava olhando. Era algum tipo de pó, suponho, mas não em grande quantidade. Talvez parecido com açúcar. Não senti nenhum gosto diferente.

Eu me virei e vi você caminhando de volta, se desviando com facilidade dos passageiros que cruzavam à sua frente segurando xícaras de café. Você não olhava para nenhum deles.

Só para mim.

Talvez seja por isso que ninguém tenha reparado em você. Você se movia como um caçador, se esgueirando rente às plantas de plástico em direção à mesa.

Você pousou dois cafés sobre a mesinha e empurrou um deles para mim, ignorando o outro. Você pegou uma colherinha e agirou preguiçosamente entre os dedos, fazendo com que contornasse o seu polegar. Olhei para seu rosto.

Você era bonito, num estilo rústico, mas era mais velho do que eu tinha pensado. Velho demais, na verdade, para que eu estivesse sentado ali com você. Vinte e poucos anos, talvez vinte e muitos. À distância, quando vi você na fila do check-in, seu corpo me pareceu pequeno e esbelto como o dos garotos de dezoito anos da minha escola. Mas olhando de perto pude ver que seus braços eram musculosos e bronzeados, e que a pele do seu rosto era curtida.

— Meu nome é Harry. —você disse.

Quando você me estendeu a mão, seus olhos se desviaram de mim. Seus dedos quentes e ásperos envolveram minha mão, mas você não a sacudiu. Apenas ergueu uma das sobrancelhas. Percebi o que você queria.

— Louis — eu disse, sem pensar.

Você meneou a cabeça como se já soubesse. Presumo, é claro, que já sabia.

— Onde estão seus pais?

— Já foram para o portão, estão me esperando lá. — Nervoso, acrescentei:  Eu disse que não iria demorar, só queria tomar um café.

Stolen (L.S Version)Where stories live. Discover now